ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
25 anos de criação do ambulatório de doenças profissionais do hospital das clínicas da UFMG: celebrando o passado e construindo o futuro
Elizabeth Costa Dias
Este Suplemento de Saúde Coletiva da Revista Médica de Minas Gerais é dedicado ao tema Saúde do Trabalhador. Foi organizado como parte das comemorações dos 25 anos de criação do Ambulatório de Doenças Profissionais do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, atual Centro de Referência Estadual de Saúde do Trabalhador.
Criado em 1983, o serviço é pioneiro no Estado, enquanto centro especializado no diagnóstico, tratamento e orientação dos trabalhadores sobre as doenças relacionadas ao trabalho e na qualificação profissional e produção de conhecimento no campo da Saúde do Trabalhador. Nasceu comprometido com o objetivo de somar esforços na luta dos trabalhadores por melhores condições de vida e de saúde e contribuir para desvelar a ocorrência de agravos pouco reconhecidos e registrados em nosso meio, mesmo nos dias atuais. Um amplo leque de alianças sociais - academia, serviços públicos de saúde e organizações de trabalhadores - permitiu sua instalação. Esse compromisso persiste ao longo dos anos, atualizado com as novas realidades do mundo do trabalho e das políticas públicas para a área.
Inspirado no Ambulatório de Doenças Ocupacionais do SESI em São Paulo, criado nos anos 1950 pelo Prof Bernardo Bedrikow, escola que marcou a formação de várias gerações de profissionais no Brasil, é fruto do trabalho de muitas pessoas: professores, pesquisadores, alunos e profissionais de instituições públicas que têm como objeto as relações trabalho-saúde-doença, em particular, do Departamento de Medicina Preventiva e Social e do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. Entre as lideranças de instituições públicas que apoiaram a proposta, apesar dos riscos de esquecimentos imperdoáveis, não se pode deixar de citar: Prof. Cid Veloso, Diretor do Hospital das Clínicas da Universidade, à época, Prof. Luiz de Paula Castro, que abriu os caminhos para a parceria com a Previdência Social, Dr. Crisósthomo Rocha de Oliveira, Coordenador da Perícia de Acidente do Trabalho do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) cujo apoio incondicional foi fundamental para sua concretização, Dr. Delano Brochado, Diretor do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS), na época responsável pela assistência à saúde dos trabalhadores formais, ambos vinculados ao Ministério da Previdência Social. O apoio pessoal e institucional de Dr. Tarcisio Penteado Buschineli, do Centro Técnico Nacional da Fundacentro em São Paulo, também foi pedra angular nessa construção. Entre as contribuições da Fundacentro, é importante registrar a contratação e a disponibilização, para o serviço, da técnica de enfermagem Montserrat Tomás Ávila e da Dra. Raquel Maria Rigotto, companheira de primeira hora, que emprestou fé, talento e trabalho ao projeto.
Essa articulação interinstitucional confere aspectos particulares ao processo de constituição do serviço, pois era, ainda, prática pouco comum na área da saúde. Mas é a parceria estabelecida com os trabalhadores - por meio de seus sindicatos mais mobilizados em torno da luta pela saúde, entre eles, os Petroleiros de Minas Gerais, o Sinttel e os Metalúrgicos de Belo Horizonte e Contagem - que fez a diferença nesse processo. Aqueles que viveram e /ou conhecem a história brasileira daquele período sabem avaliar o significado dessa associação.
Entre as características originais do antigo ADP, como era carinhosamente chamado o atual CEREST-MG, deve ser ressaltado o esforço para articular o exercício da clínica, de forte expressão em uma escola médica tradicional como a Faculdade de Medicina da UFMG e as práticas da Saúde Coletiva. Tal fato causou incômodo e surpresa entre muitos colegas que não entendiam o que professores da "preventiva" estavam fazendo no Hospital.
Assim, a busca da atenção integral, as ações preventivas e curativas, a atuação nos planos biológico e social, a articulação interinstitucional reunindo na mesma proposta o Ministério do Trabalho, a Fundacentro, a Previdência Social, pelo INAMPS e o INPS e a Universidade, em estreita parceria com os trabalhadores são os alicerces do ADP e da construção do campo da Saúde do Trabalhador em nosso país.
Desde então, o serviço vem funcionando ininterruptamente e contribuindo no processo de construção do movimento da Saúde do Trabalhador, no estado de Minas e no País, uma história que necessita ser registrada. Além do cuidado especializado de trabalhadores, enquanto serviço de referência estadual para o SUS, forma e qualifica profissionais de saúde, por meio de atividades como a Residência Médica, que já preparou, até 2009, 96 médicos especialistas em Medicina do Trabalho, no enfoque da Saúde do Trabalhador, cursos multiprofissionais, treinamentos e estágios de curta duração para profissionais dos serviços de saúde, auditores do Ministério do Trabalho e peritos da Previdência Social e para trabalhadores e representantes do controle social.
O CEREST-MG produz conhecimento técnico, registrado em publicações científicas nacionais e internacionais, em teses de doutorado, dissertações de mestrado, monografias de cursos de especialização, relatórios técnicos, protocolos, manuais e cartilhas, além de outras formas de divulgação, apoiando ações de órgãos públicos, na elaboração e no desenvolvimento de políticas públicas para a área, peças para a Justiça e o Ministério Público, além de outras modalidades de subsídios à luta sindical pela saúde e qualidade de vida.
Amostra da produção dos profissionais do serviço: médicos residentes, alunos do Mestrado em Saúde Pública e professores do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina está registrada neste número, o que justifica o perfil endógeno de seu conteúdo. Como honrosa exceção para nós, destaca-se o artigo especialmente preparado pelo Prof. Francisco Antonio de Castro Lacaz, da Escola Paulista de Medicina, intelectual e militante da Saúde do Trabalhador cuja contribuição tem sido fundamental na constituição desse campo.
O conteúdo dos artigos é diversificado: duas reflexões sobre os impasses vivenciados pela área; estudos que enfocam o manejo clínico, a prevenção do adoecimento e a reabilitação e recolocação dos trabalhadores que voltam ao trabalho; relatos de casos de doenças bem conhecidas, como as pneumopatias relacionadas à exposição ao asbesto e à pedra sabão, porém, ainda pouco reconhecidas em nosso meio, paradoxalmente um território no qual a mineração e o beneficiamento de minérios estão inscritos em seu próprio nome. Completando, temos uma revisão bibliográfica sobre tema pouco estudado: o trabalho dos bailarinos.
A foto da capa deste Suplemento - o Museu de Artes e Ofícios (MAO) de Belo Horizonte - é significativa. Trata-se de um espaço cultural dedicado ao trabalho do período pré-industrial no País cujo acervo reúne uma rara e valiosa coleção de cerca de 2.400 peças doadas ao patrimônio público federal pelo Instituto Cultural Flávio Gutierrez. As tecnologias de produção que deram origem a muitas profissões contemporâneas estão ali representadas, permitindo aos visitantes uma viagem aos fazeres, ofícios e artes dos últimos três séculos. A memória dos ofícios remete-nos ao destino bíblico de comer o pão com suor do rosto, e também ao trabalho que humaniza, meio pelo qual seres humanos constroem a própria subjetividade e a vida social.
A Comissão Editorial tem uma dívida de gratidão à Profa. Rosa Quadros Nehmy, que colocou sua inteligência e rigor técnico a serviço do aperfeiçoamento dos trabalhos. Agradecimento especial é devido ao Prof. René Mendes pelas sugestões enriquecedoras e pelo meticuloso trabalho de revisão e formatação final dos textos.
Assim, além da alegria pela possibilidade de trazer à luz este número, move-nos o sentimento de esperança de que este registro sirva de estímulo à continuação das atividades do ADP, como expressão da crença de que um outro mundo é possível onde o trabalho seja, cada vez mais, motivo de realização e saúde e, cada vez menos, de adoecimento e morte.
Elizabeth Costa Dias
Contribuíram para viabilizar este número
Comitê Editorial do Suplemento de Saúde Coletiva
Maria da Conceição Juste Werneck Cortes - chefe do DMPS
Elza Machado de Melo - sub-chefe DMPS
Rosa Maria Quadros Nehmy
Andréa Maria Silveira
René Mendes
Elizabeth Costa Dias
Pareceristas
Ciro Buldrini Filogônio
Claudia Sueli da Rocha
Gilmar da Cunha Trivelato
Marco Almeida Antonio Percope de Andrade
Soraya Belisário
Tarcísio Márcio Magalhães Pinheiro
Thais Lacerda e Silva
Copyright 2025 Revista Médica de Minas Gerais
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License