ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Cimentoplastia acetabular percutânea guiada por imagem: relato de caso e revisão da literatura
Image-guided percutaneous acetabular cementoplasty: case report and literature review
Ricardo Miguel Costa de Freitas
Médico-Radiologista Intervencionista, Hospital Mater Dei, Belo Horizonte - MG, Brasil
Endereço para correspondênciaAv. Francisco Sales, 1.420/s.502
Belo Horizonte - MG, Brasil CEP: 30150-221
E-mail: ricardomcfreitas@gmail.com
Recebido em: 04/01/2009
Aprovado em: 06/05/2009
Instituiçao: Hospital Mater Dei Unidade de Radiologia e Diagnóstico por Imagem
Resumo
Relata-se o caso de paciente com risco de fratura acetabular por lesão osteolítica metastática dolorosa, submetido à cimentoplastia percutânea acetabular bem-sucedida, por intermédio da radiologia intervencionista. Discutem-se os aspectos clínicos, imagenológicos e técnicos do procedimento.
Palavras-chave: Neoplasias; Acetábulo; Radiologia Intervencionista.
INTRODUÇÃO
O teto do acetábulo, regiao sustentadora de peso, é comumente sede de lesões osteolíticas causadas por metástases ou mieloma múltiplo. A dor incapacitante e a limitação funcional decorrente de eventual fratura patogênica são fatores de restrição ao leito. O elevado risco cirúrgico ou a expectativa de vida curta do paciente contraindicam muitas vezes a cirurgia.1
A cimentoplastia percutânea do acetábulo (CPA) é técnica minimamente invasiva que trata a dor e estabiliza o osso.1 A literatura relata poucos casos envolvendo esse método, as maiores series com 18 pacientes.2-6 A técnica consiste na injeção percutânea intralesional de polimetil-metacrilato (PMMA), sob orientação imagenológica. Seus resultados permanecem promissores, apesar da reduzida experiência acumulada na literatura mundial.
Relata-se neste trabalho bem-sucedido de paciente com lesão acetabular metastática dolorosa, submetido à CPA guiada por tomografia computadorizada (TC) e fluoroscopia. Discutem-se os aspectos clínicos, imagenológicos e técnicos do tratamento.
RELATO DO CASO
Paciente masculino, 56 anos, procedente de Belo Horizonte, com metástases osteolíticas de origem pulmonar, uma delas no teto acetabular direito. Seu performance status (PS) manteve-se em 1,0 durante nove meses após o diagnóstico, quando apresentou fraqueza generalizada e dor acentuada e de caráter progressivo em regiao coxofemoral direita, pior ao ortostatismo e ao deambular. A TC pélvica evidenciou lesão osteolítica acetabular ainda restrita aos limites da cortical óssea (Figura 1a, b). Não havia foco de infecção ativa ou distúrbio da coagulação. A CPA foi proposta e após exposição dos riscos e benefícios obteve-se o termo de consentimento informado.
O paciente foi submetido à radiologia intervencionista. Após rastreamento da lesão óssea por imagens de TC com o paciente em decúbito dorsal, procedeu-se à anestesia local dos planos superficiais e profundos com lidocaína a 1%, após antissepsia rigorosa, sobre a mesa de TC (Figura 1c). Foi introduzida agulha calibre 13G por via percutânea anterior (Figura 1d) e injetados cerca de 10 cm3 de PMMA viscoso sob orientação fluoroscópica em tempo real, com o paciente sob analgesia neuroléptica (Figuras 2 e 3).
O procedimento durou aproximadamente 25 minutos, sem intercorrências. O paciente recebeu alta hospitalar no mesmo dia, deambulando e assintomático, sem necessidade de uso de opioides. Desenvolveu, 24 horas após, dor coxofemoral direita, que desapareceu em quatro dias de terapia anti-inflamatória não esteroide (AINE). Veio a falecer dois meses após o tratamento, com sintomas neurológicos agudos e progressivos decorrentes de metástases cerebrais.
DISCUSSÃO
A fratura acetabular nos pacientes oncológicos é causa de restrição ao leito, piora do PS e risco de tromboembolismo pulmonar. O benefício da CPA justifica-se diante do alívio da dor, da melhora ou preservação do PS, da redução do uso de opioides e de seus efeitos colaterais indesejáveis.1
A injeção percutânea de PMMA é utilizada para o tratamento da dor causada por fraturas osteoporóticas ou por metástases osteolíticas da coluna vertebral. A polimerização do PMMA ocorre rapidamente e o calor resultante da reação exotérmica destrói as estruturas nervosas vizinhas - uma das explicações teóricas para o alívio da dor. As principais complicações decorrem do escape inadvertido do PMMA: na rede venosa sistêmica pode causar embolia pulmonar; nas estruturas vizinhas pode resultar em lesões térmicas - por exemplo, nos feixes neurovasculares. A técnica adequada exige a injeção sob fluoroscopia em tempo real e treinamento adequado na manipulação dos materiais.7
Este relato mostrou o tratamento bem-sucedido de paciente com lesão osteolítica dolorosa e com risco iminente de fratura acetabular. A dor após o tratamento e aliviada por AINEs é um efeito colateral menor e explica-se pela artrite transitória secundária ao calor.8
A radioterapia local nem sempre oferece alívio imediato da dor e a CPA não exclui essa modalidade de tratamento. A estabilidade óssea advém usualmente após dois meses de tratamento radioterápico, ao contrário da CPA, que oferece estabilidade imediata. Em pacientes com melhor expectativa de vida, entretanto, a radioterapia deve ser considerada, preferencialmente após a CPA.8
A CPA, inicialmente descrita em 1995 por Cotten et al.8, ainda permanece mundialmente pouco explorada diante dos bons resultados obtidos e do elevado número de candidatos a esse tratamento. A medida que os modernos equipamentos de TC se tornam economicamente viáveis, a demanda na expansão das equipes de radiologistas intervencionistas aumenta. A consequência natural é que mais pacientes poderao se beneficiar desse tratamento minimamente invasivo, que oferece baixa morbidade, excelente resultado terapêutico e agrega conforto e qualidade de vida ao paciente oncológico.
REFERENCIAS
1. Cotten A, Demondion X, Boutry N, Cortet B, Chastanet P, Duquesnoy B, Leblond D, et al. Therapeutic percutaneous injections in the treatment of malignant acetabular osteolyses. Radiographics. 1999;19:647-53.
2. Weill A, Kobaiter H, Chiras J. Acetabulum malignancies: technique and impact on pain of percutaneous injection of acrylic surgical cement. Eur Radiol. 1998;8:123-9.
3. Marcy PY, Palussière J, Magné N, Bondiau PY, Ciais C, Bruneton JN. Percutaneous cementoplasty for pelvic bone metastasis. Support Care Cancer. 2000;8(6):500-3.
4. Carrafiello G, Laganà D, Recaldini C, Mangini M, Giorgianni A, Cuffari S, et al. Combined treatment of ablative therapy with percutaneous radiofrequency and cementoplasty of a symptomatic metastatic lesion of the acetabulum. Australas Radiol. 2007;51:344-8.
5. Harris K, Pugash R, David E, Yee A, Sinclair E, Myers J, et al. Percutaneous cementoplasty of lytic metastasis in left acetabulum. Curr Oncol. 2007;14(1):4-8.
6. Basile A, Giuliano G, Scuderi V, Motta S, Crisafi R, Coppolino F, et al. Cementoplasty in the management of painful extraspinal bone metástases: our experience. Radiol Med. 2008;113(7):1018-28.
7. Gangi A, Guth S, Imbert JP, Marin H, Dietemann JL. Percutaneous vertebroplasty: indications, technique, and results. Radiographics. 2003; 23:10e.
8. Cotten A, Deprez X, Migaud H, Chabanne B, Duquesnoy B, Chastanet P. Malignant acetabular osteolyses: percutaneous injection of acrylic bone cement. Radiology. 1995;197:307-10.
Copyright 2025 Revista Médica de Minas Gerais
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License