ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Simbolo da ética médica: o tema dos milênios
Alcino Lázaro da Silva
O ser humano passou à categoria de sujeito da ação (e não de objeto) no mundo contemporâneo. Tempo sem nome e sem identidade porque é pós-moderno, contemporâneo, informático, midiático, materialista e tecnológico.
O profissional que mais trabalha com a ontoética (a ética do ser humano) é o médico, entre os seus pares na área de saúde e nas outras áreas biológicas. O médico é gerado num currículo formal, tecnológico e preocupado com a solução dos grandes problemas, e se esquece de que o quotidiano possui uma demanda prevalente em 80% a 90% dos casos. São as sete grandes áreas básicas da medicina: Ações de Saúde, Clínica Médica, Cirurgia Geral, Obstetrícia e Ginecologia, Pediatria, Saúde Mental e Urgência.
Se os curriculistas se lembrarem disso, constatarão que não há Problem Based Learnig (PBL) tão distinto e importante quanto cuidar das áreas acima, em que o médico se confirma e, realmente, presta serviço ao ser humano, o seu sujeito-maior. Os restantes 10% ou 20% são de solução no nível de pós-graduação, em residências qualificadas e que se prezam.
Se não há estudo de Humanidades nessa área (por exemplo, Artes Plásticas, Artes Cênicas, Filosofia, Língua Portuguesa, Literatura, Música, Poesia, Política, Religiosidade), não há convivência, tolerância, equilíbrio psicossensitivo e, muito menos, o azul, cor da paz, no trabalho e na relação médico-paciente.
Preocupando-nos com isso, devemos nos lembrar de que o jovem precisa ser alertado, orientado e exemplificado nos princípios básicos da Etiqueta Médica. São toques de atitudes primárias, mas que tornam a relação médico-paciente a muralha para sustentar o sucesso terapêutico e o respeito mútuo doente-médico. É necessário valorizar o comportamento nos mais variados capítulos, v.g: uso do avental, vestuário, cumprimentos, chamar pelo nome, cuidado com as mãos, uso da palavra, diálogo, não mascar, pontualidade, não assentar-se no leito, objetos sobre o leito, visita (e não corrida), encenação, sigilo, consentimento (consenso pleno), exames da mulher e do homem, intimidade, acompanhante, encaminhamento, opinião médica, equipe médica, telefone, família, esposo(a), secretária, enfermagem, paramédicos, funcionários, conversa de corredor, chefia e administração superiores, sociedades médicas, convênios, SUS, representante de laboratório, conflito de interesse, convidado, relacionamento com aluno, professor e doente, sala de aula, na rua, no lazer, política, filantropia, funeral, internet, correio médico, tolerância, agradecimento, honorário, cultura geral.
A civilização contemporânea, no afogadilho para a solução de problemas, na complexidade do dia-a-dia, na angústia de realizações imediatas, na falta de introspecção ou reflexão, clama por Ética. Ética é a palavra em todos os setores e em todas as profissões. O lugar-comum retrata, pois, uma identidade de anseios.
Refletindo sobre o tema, ocorreu-nos uma curiosidade. Existe um símbolo para a Ética, desde que ela é requisitada por todos? Não o encontramos, ou não temos dele conhecimento ainda. Admitindo-se a hipótese de não haver nenhuma proposta, nada custa pensar sobre o assunto e propor algo para discussão.
O que seria mais adequado e coerente com o objetivo da Ética? Teria de ser um representativo com equanimidade (Aequaenimitas), biológica, mental, espiritual e transcendental ou preternatural? Qual o elemento da natureza, com essas características, em que a homeóstase se observa, tanto interna como externamente, na sua inter-relação com o ecossistema? Uma semente? Uma flor? Um fruto? Uma árvore? Uma pedra? Um animal? O ar? O fogo ? A água? A terra? Cada um por si, sem influências maléficas do entorno, poderia simbolizar a Ética, pois são equilibrados na sua biologia e na sua ecointegração. Alguns deles, facilmente, conseguimos materializar no esquema ou no desenho. Para outros, essa materialização é impossível.
Preocupados com o desafio, lembramo-nos da pessoa mais eticamente bem formada de que a humanidade teve conhecimento. Nasceu eticamente; cresceu eticamente; viveu eticamente; procedeu eticamente; exemplificou-se eticamente; pregou ética; resguardou os valores éticos e morreu eticamente. Ele foi a própria, pura e completa Ética: Jesus Cristo! A imagem divina no homem: "prudentia, justitia, moderatio, virtus, sapientia, disciplina" (Carl Gustav Jung).
Usar a sua imagem para misturar-se aos nossos valores incipientes não seria respeitoso. Lembramo-nos, então, de uma figura tranqüila, fluente, convivente, discreta, societária, respeitosa aos valores da comunidade, prolífica e compartilhante: o peixe.
Desde os tempos em que os cristãos se refugiavam nas catacumbas, perdura o monograma ICHTHYS, que significa peixe e era usado como senha.
Desdobrado, lê-se: Iesoûs Christós Theou Yiós Sotér, ou seja, Jesus Cristo Filho de Deus Salvador, cujas primeiras letras são as gregas: iota, qui, teta, ípsilon e sigma (J. A. Vasconcelos).
Se aquele personagem que mudou a humanidade, com a sua Ética absoluta, perene, eterna e imutável, tem o nome vinculado a ICHTHYS, peixe, nada mais adequado do que considerarmos este animal como símbolo dessa mesma Ética. E que ela possa nortear o caminhar dos povos rumo à sua plena realização e integração.
Alcino Lázaro da Silva
Professor Titular de Cirurgia do Aparelho Digestivo - UFMG
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