RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 18. (4 Suppl.1)

Voltar ao Sumário

Artigo Original

Tendência da anemia em crianças de creches da regional leste de Belo Horizonte, MG

Tendency of the anemia in infants of day care centers of the regional east of Belo Horizonte, MG

Mariana Rodrigues de Carvalho1; Thaís de Souza Chaves1; Joel Alves Lamounier2; Daniela da Silva Rocha3; Flávio Diniz Capanema4; Aline Bárbara P. Costa1; Flaviane Alves Toni5; Suellen Fabiane Campos1

1. Graduanda em Nutriçao pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil
2. Doutor em Saúde Pública e Nutriçao pela Universidade da Califórnia, Los Angeles e professor titular do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG, Belo Horizonte, MG, Brasil
3. Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da UFMG e professora do curso de Nutriçao do Centro Universitário UNA e do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, Belo Horizonte, MG, Brasil
4. Doutor em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da UFMG, professor da Faculdade da Saúde e Ecologia Humana, Vespasiano, MG, Brasil
5. Graduanda em Nutriçao pelo Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, Belo Horizonte, MG, Brasil

Endereço para correspondência

Joel A Lamounier
Faculdade de Medicina UFMG
Av. Alfredo Balena, 190
Belo Horizonte - MG CEP: 30.130-100

Resumo

OBJETIVOS: Verificar a evolução temporal da prevalência de anemia em crianças de 6 a 72 meses de creches de Belo Horizonte.
MÉTODOS: Estudo transversal com coleta de dados em dois momentos: 2000 e 2005. Participaram creches pertencentes ou conveniadas à prefeitura de Belo Horizonte. Nas duas etapas o tamanho da amostra foi calculado utilizando prevalência estimada do evento de 30%. A avaliação da anemia foi realizada com coleta de sangue por punção digital e leitura em hemoglobinômetro portátil. Foram consideradas anêmicas as crianças com hemoglobina inferior a 11,0g/dl. Utilizou-se o programa Epi-Info versão 6.04b na análise estatística.
RESULTADOS: Foram avaliadas 754 crianças, 350 em 2000 e 404 em 2005. Os dois grupos mostraram-se semelhantes na distribuição por sexo (49,4% e 48,3% de meninas, respectivamente), média de idade (46 ± 19,47 meses e 45,5 ± 16,3 meses, respectivamente), média dos níveis de hemoglobina (11,7 ± 1,4 g/dL e 11,8 ± 1,3 g/dL, respectivamente) e prevalência de anemia (28,9% e 27,0%, respectivamente). Observou-se também a relação diretamente proporcional entre a concentração de hemoglobina e a idade das crianças. A única variável que apresentou aumento estatisticamente significativo, entre os dois momentos, foi a média de hemoglobina das crianças com idade entre 24 e 48 meses.
CONCLUSÕES: Nesse estudo observou-se uma tendência à manutenção das taxas de anemia. Porém a prevalência encontrada foi significativamente alta, sinalizando a necessidade, nesse âmbito, de ações que devem considerar tanto a situação socioeconômica, a alimentação oferecida, assim como a oferta de ferro a estas crianças, fatores estes diretamente ligados à ocorrência da anemia.

Palavras-chave: Anemia; Criança; Pré-Escolar; Creches.

 

INTRODUÇÃO

A deficiência de ferro é uma carência nutricional muito comum e a mais disseminada no mundo.1 Atinge em torno de 2,1 bilhoes de pessoas, das quais um terço apresenta evidências clínicas do problema.2 As maiores prevalências são encontradas nos países subdesenvolvidos3, como mostra um estudo realizado na Argentina4 que encontrou incidência de 47% de anemia e uma associação desta com o baixo consumo de ferro.

A deficiência de ferro pode causar a anemia, caracterizada pela queda anormal da concentração de hemoglobina no sangue.5 Os principais grupos de risco para o desenvolvimento da anemia ferropriva são as gestantes e as crianças em fase de crescimento. Nas crianças de 6 a 24 meses de idade, faixa etária na qual ocorre o desmame, nota-se a maior suscetibilidade dessa carência. Com o crescimento da criança, há um decréscimo na ocorrência da anemia. No entanto, tal deficiência nutricional não deixa de ser um importante problema em crianças pré-escolares.6

A etiologia da anemia ferropriva se dá através da combinação de vários fatores desencadeantes que causam um desequilíbrio entre as necessidades de ferro do organismo e a quantidade absorvida do mineral. Dentre os fatores de risco, os mais citados são: baixa renda familiar e escolaridade materna, falta de acesso aos serviços de saúde, precariedade nas condições de saneamento e a dieta inadequada em ferro.7-10 Entre os fatores associados à dieta, são relatados baixa ingestao de ferro e de alimentos facilitadores da sua absorção, deficiência de outros nutrientes envolvidos no metabolismo do ferro, como vitamina A e presença de inibidores da sua absorção.11-13 Nas crianças menores, destacam-se como fatores de risco a intensa velocidade de crescimento, o baixo peso ao nascer, o desmame precoce e a alimentação complementar à base de leite de vaca com introdução tardia de alimentos ricos em ferro heme (carnes).7-14

Há um consenso de que a anemia ferropriva traz prejuízos funcionais ao organismo. Dentre eles, o comprometimento da capacidade de trabalho, o aumento da morbimortalidade fetal e também do risco de baixo peso ao nascer, além de retardo no desenvolvimento psicomotor, dificuldades na aprendizagem cognitiva bem como distúrbios psicológicos e comportamentais, como falta de atenção, fadiga, transtornos na memória e irritabilidade.15-18

Estudos com pré-escolares mostram elevada prevalência de anemia no Brasil onde os valores alcançam 40% em algumas regioes do país.8,19,20 Além disso, estudos de tendência temporal têm demonstrado um aumento significativo na prevalência desse distúrbio nutricional nas últimas décadas.8, 20

Uma vez que não existe levantamento que avalie a prevalência de anemia a nível nacional, toma-se como referência estudos realizados na cidade de São Paulo e no estado do Paraíba, nos quais foi observado um aumento na prevalência de anemia em crianças com idade inferior a 5 anos, sem que houvesse piora significativa em seu indicadores socioeconômicos.8,20

Considerando a escassez de informações sobre a evolução da anemia por deficiência de ferro no município de Belo Horizonte nos últimos anos, assim como a importância dessa enfermidade e suas conseqüências no desenvolvimento de crianças, o presente estudo teve como objetivo verificar a evolução temporal da prevalência de anemia entre os anos de 2000 e 2005 em crianças de 6 a 72 meses incompletos, institucionalizadas em creches da regional leste de Belo Horizonte, MG.

 

MÉTODOS

A tendência da evolução da anemia em Belo Horizonte foi delineada com base em um estudo transversal constituído de duas etapas em crianças de 6 meses a 6 anos incompletos.

Elegeu-se como local de estudo a Regional Leste da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte (PBH) por razoes de operacionalidade e por ser representativa do universo da cidade. Nessa regiao estao concentrados 11,4% da população total existente. A regiao leste compreende uma área de 26,9 Km2 e limita-se com o município de Sabará e com os Distritos Sanitários Centro-Sul e Nordeste. Conta com 2.646 crianças distribuídas em duas creches próprias pertencentes à prefeitura e outras 24 conveniadas, abrangendo um total de 13,2% das crianças atendidas em creches públicas nesse município.21

A população residente na regional leste apresenta características heterogêneas em relação à condição socioeconômica, sendo constituída tanto por indivíduos em condições precárias de vida como por outros provenientes de famílias com razoável poder aquisitivo. Porém, as crianças atendidas nas referidas creches pertencem às classes socioeconômicas menos favorecidas, informação obtida através de questionário socioeconômico (dados não apresentados).

A coleta dos dados foi realizada em dois momentos, nos anos de 2000 e 2005 em crianças regularmente matriculadas em creches conveniadas com a PBH.

No ano 2000, para determinação do tamanho da amostra, foi consultado o número total de crianças de 0 a 6 anos incompletos matriculadas nessas creches, num total de 2.179 crianças, segundo relatório da Secretaria Municipal de Saúde da PBH21. Utilizou-se os valores de 30% de prevalência esperada de anêmicos em geral, considerando as estimativas dessa doença em várias regioes do Brasil na época do estudo, margem de erro de 5% e 95% de confiabilidade. Para se chegar ao valor mínimo de 281 crianças como amostra utilizou-se o programa Staltac do Software Epi Info, versão 6.04.22

Preservando-se a aleatoriedade desejada na composição da amostra foram avaliadas, para a realização do estudo, 322 crianças de 2 creches situadas no Bairro Nova Vista. Como critério na escolha das creches foi usada a maior concentração de crianças matriculadas e também a proximidade entre elas.

Para calcular a amostra a ser analisada em 2005 utilizou-se o mesmo programa estatístico usado no primeiro momento e o mesmo valor de prevalência esperada de anemia, com precisão de 5% e intervalo de confiança de 95%, alcançando assim o valor de 319 crianças.

Para compensar possíveis perdas acrescentou-se 20% a esse valor, atingindo entao o total de 382 como número mínimo de crianças a serem avaliadas.

As crianças foram selecionadas através da randomização com uso do programa Excel 2003.23 Para determinação do número de crianças a serem analisadas em cada um das 25 creches foi levado em consideração o peso que cada creche representa em relação ao somatório de crianças matriculadas nas mesmas. O tamanho final da amostra foi de 407 crianças.

O responsável por cada uma recebeu informações a respeito dos objetivos da pesquisa assim como sobre a realização dos exames. Foi solicitada a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, e assumido o compromisso do repasse dos resultados ao fim do estudo conforme preconiza a resolução do Conselho Nacional de Saúde 196, de 10 de outubro de 1996.

Os critérios de exclusão do estudo foram apresentar no dia do exame sinais e sintomas de doenças infecciosas ou doenças crônicas; uso de medicamentos contendo ferro; as crianças sabidamente portadoras de outros tipos de anemia e aquelas cujo responsável não consentiu a participação na pesquisa.

Nos dois momentos, para avaliação da anemia, foi coletada em microcuvetas descartáveis uma amostra de sangue de cada criança por punção capilar. A concentração de hemoglobina foi medida através de fotômetro portátil (hemoglobinômetro) da marca Hemocue®. Foram consideradas como anêmicas as crianças com hemoglobina inferior a 11,0 g/dL1 e para definição dos graus de anemia foram utilizadas as seguintes categorias: anemia grave (hemoglobina < 7,0 g/dL); anemia moderada (hemoglobina entre 7,0 e 9,0 g/dL) e anemia leve (hemoglobina > 9,0 g/dL e menor que 11,0 g/dL).24

Os dados da prevalência de anemia obtidos nos anos de 2000 e 2005 foram comparados para se estabelecer a tendência da evolução da anemia.

Utilizou-se o programa Epi Info, versão 6.04b22 para compilação e análise dos dados. Para análise estatística foram utilizados os testes: de normalidade (Kolmogorov-Smirnov) para verificar o tipo de distribuição da variável hemoglobina, o teste T de Student para a comparação das médias de hemoglobina nos dois momentos, o teste de Mann-Whitney para comparação de medianas, e o Qui-quadrado para comparar as prevalências de anemia encontradas em 2000 e 2005 (intervalo de confiança - 95%).

Ambas as etapas do estudo foram aprovadas pelo comitê de ética e Pesquisa da UFMG - COEP sob os números: ETIC 123/00 e 273/04.

 

RESULTADOS

As prevalências de anemia global e por faixa etária, assim como os valores de hemoglobina por faixa etária estao na tabela 1.

 

 

A situação da anemia em 2000

Avaliou-se 350 crianças sendo 49,4% do sexo feminino. Do total de crianças 17,7 % tinha menos de 24 meses, 34% de 24 a 48 meses e 48,3% acima de 48 meses (62, 119 e 169 crianças, respectivamente). A média da idade das crianças foi 46 ± 19,47 meses.

A média de hemoglobina foi 11,7 ± 1,4 g/dL (Tabela 1). Valores compatíveis com o quadro de anemia grave (Hb < 7,0 g/dL) foram encontrados em menos de 1% das crianças. A prevalência global de anemia foi de 28,9%.

Analisando-se a hemoglobina em relação à faixa etária, encontrou-se valores médios de 10,5 ± 1,3 g/dL para crianças menores que 24 meses, 11,5 ± 1,3 g/dL entre 24 e 48 meses e 12,3 ± 1,2 g/dL para aquelas acima de 48 meses (Tabela 1). Houve diferença estatisticamente significativa entre a concentração de hemoglobina por faixa etária.

Levando-se em consideração o sexo, a média de hemoglobina encontrada foi 11,8 ± 1,3 g/dL para o sexo feminino e 11,6 g/dL ± 1,5 para o sexo masculino. Não houve diferença estatisticamente significativa nesse caso (p = 1) (Tabela 1).

A situação da anemia em 2005

Constatou-se que 48,3% das 404 crianças eram do sexo feminino. Do total de crianças 10,6 % tinham menos de 24 meses, 43,3% de 24 a 48 meses e 46% acima de 48 meses (43, 175 e 186 crianças, respectivamente). A média de idade foi de 45,5 ± 16,3 meses.

A prevalência de anemia encontrada no segundo momento foi de 27,0 %, com média de hemoglobina de 11,8 ± 1,3 g/dL (Tabela 1) . Observou-se que menos de 1% das crianças apresentou anemia grave.

Ao se observar a média de hemoglobina em relação às idades, encontrou-se 10,4 ± 1,4 g/dL em menores de 24 meses, 11,8 ± 1,3 g/dL para crianças entre 24 e 48 meses e 12,2 ± 1,2 g/dL para aquelas acima de 48 meses (Tabela 1). Houve diferença estatisticamente significativa na concentração de hemoglobina nas diferentes faixas etárias(p < 0,001).

Em relação aos sexos, obtive-se em ambos média de hemoglobina de 11,8 ± 1,4g/dL, não havendo, portanto, diferença entre eles.

Comparação dos resultados encontrados nos dois momentos

Não houve diferença estatisticamente significativa entre as prevalências de anemia nem entre as médias de hemoglobina nos anos de 2000 e 2005 no conjunto das crianças. Tais resultados mostram uma tendência de manutenção das taxas de anemia.

Ao se analisar separadamente as faixas etárias, conclui-se que nos grupos de crianças menores de 24 e maiores de 48 meses não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas nas médias de hemoglobina (p =0,665 e 0,342 respectivamente). Já no grupo formado pelas crianças com idade entre 24 e 48 meses, a média de hemoglobina aumentou significativamente (p=0,040). As prevalências de anemia por faixa etária nos anos de 2000 e 2005 estao representadas no gráfico 1.

 


Figura 1 - Prevalência de anemia em crianças de creches da regional leste de Belo Horizonte nos anos de 2000 e 2005

 

Quando os resultados foram avaliados separadamente de acordo com o sexo, não houve diferença estatisticamente significativa entre as médias de hemoglobina nos dois momentos de estudo.

 

DISCUSSÃO

As prevalências de anemia encontradas nos dois momentos da análise (28,9% em 2000 e 27,0% em 2005) foram inferiores às obtidas em diversos estudos realizados no Brasil.8,9,20,25,26 No entanto, observou-se prevalência de anemia de 27,0% em crianças de 0 a 59 meses em estudo realizado na cidade de Vitória, ES, valor semelhante ao encontrado no presente estudo.27

Através da categorização da variável idade, observa-se tendência das crianças mais jovens em apresentar concentrações de hemoglobina menores, dados esses compatíveis com os achados em outros estudos.8,20,28 A maior vulnerabilidade desse grupo de crianças poderia ser conseqüência de seqüelas do desmame precoce, da alimentação pouco variada, do consumo de leite fluido que pode provocar micro-hemorragias no trato gastrointestinal, e maior predisposição a doenças infecciosas e parasitárias.20

A distribuição da anemia segundo o sexo apresentou comportamento homogêneo, conforme achados de outros estudos, nos quais o sexo não foi um fator determinante da anemia.9,25 No entanto, tais dados diferem dos resultados obtidos em estudo na Paraíba no ano de 1992, no qual a prevalência de anemia em crianças do sexo masculino foi significativamente maior do que em crianças do sexo feminino. Essa diferença necessita de melhores explicações, uma vez que não foi encontrado fatores que expliquem a maior vulnerabilidade do sexo masculino a essa carência nutricional.20

Não houve mudança significativa na prevalência de anemia, bem como nas médias de hemoglobina das crianças avaliadas na regional Leste de Belo Horizonte entre os anos de 2000 e 2005. A tendência de manutenção das taxas de anemia difere dos resultados encontrados em estudos realizados nos estados de São Paulo e da Paraíba que mostram elevação da prevalência de anemia. Aumentos de 25% foram observados am São Paulo entre os anos de 1984/85 e 1995/96, e incremento de 88,5% na Paraíba entre 1981 e 1982.8,20 No primeiro estudo, não foram encontrados fatores determinantes para a ascensão da prevalência de anemia, uma vez que no período estudado houve uma melhora do poder aquisitivo, da escolaridade materna, do saneamento e do acesso aos serviços de saúde e não o contrário, como seria esperado. Porém, pode ter ocorrido uma mudança no padrao alimentar das crianças, contribuindo para o aumento da prevalência de anemia, fator que não foi avaliado de modo preciso.8 No estudo desenvolvido na Paraíba, a hipótese da tendência de aumento da prevalência de anemia seria a de que a crise política atravessada pelo estado nos 15 anos anteriores ao estudo repercutiu no perfil de saúde da população.20

A alta prevalência de anemia é bastante preocupante, levando-se em consideração que a população estudada é institucionalizada e teria, portanto, acesso garantido a uma alimentação balanceada, além de cuidados gerais com saúde.25

Dentre os fatores que podem ter contribuído para o quadro de anemia estao: provável ausência ou baixo conteúdo de alimentos fontes de ferro no cardápio oferecido pelas creches; presença de agentes inibidores e/ou reduzida presença de agentes facilitadores na dieta, levando a uma baixa absorção do ferro biodisponível.25 Porém o consumo alimentar das crianças não foi contemplado neste trabalho, constituindo-se um limitante do mesmo.

Outro aspecto relevante que precisa ser considerado é a baixa condição socioeconômica dessas crianças que impoe condições de vida que as deixam mais susceptíveis a infecções respiratórias, parasitoses intestinais e diarréia, o que pode comprometer fortemente a ingestao, absorção e utilização biológica do ferro.25

Era de se esperar que a prevalência no segundo momento fosse estatisticamente inferior levando-se em consideração a determinação do Ministério da Saúde que determina que toda farinha de trigo e milho produzida no Brasil a partir de julho de 2004 deve receber adição de ferro e ácido fólico26. O fato da estabilização do valor de prevalência suscita dois fatos importantes a serem discutidos sobre essa lei. A partir de quando se pode afirmar que todas as farinhas disponíveis no mercado realmente estao fortificadas? Será que os alimentos ricos em farinhas são freqüentemente consumidos pela faixa etária em questao no estudo?

Conclui-se que as ações estabelecidas pelo governo para prevenção da anemia ferropriva, em especial o programa de fortificação das farinhas de trigo e milho, podem não ter sido eficazes no que diz respeito à prevenção deste problema. A alta prevalência da anemia ferropriva indica uma situação preocupante e a necessidade da implementação de medidas corretivas a fim de impedir que mais crianças sejam acometidas pelos sinais e sintomas trazidos por essa deficiência. São ainda necessários estudos que possam analisar a real eficácia do programa de fortificação das farinhas na prevenção da anemia ferropriva, uma vez que o tempo decorrido entre a entrada em vigor da lei que determina a adição de ferro nas farinhas e a avaliação da prevalência de anemia nas crianças foi pequeno. São necessários, ainda, estudos que avaliem a eficácia de outras formas de combate a essa doença, como a fortificação de outros alimentos e da água.

 

REFERÊNCIAS

1. World Health Organization. Iron deficiency anaemia. Assessment, prevention, and control. A guide for programme menagers. Geneva: WHO; 2001.

2. World Health Organization. Complementary feeding of young children in developing countries: a review of current scientific knowledge. Geneva: WHO; 2001.

3. Administrative Committee on Coordination. Sub Committee on Nutrition (ACC/SCN). Third Report on the World Nutrition Situation. Geneva; 1997.

4. Calvo EB, Gnazzo N. Prevalence of iron deficiency in children aged 9-24 mo from a large urban area of Argentina. Am J Clin Nutr. 1990;52(3):534-40.

5. World Health Organization. Anemias nutricionales. Ginebra: WHO; 1972. (Série de Informes Técnicos, 456).

6. Administrative Committee on Coordination. Sub Committee on Nutrition News (ACC/SCN/News). 4th Report on the World Nutrition Situation. Nutrition throughout the life cycle. Geneva; 2000.

7. Oliveira MAA, Osório MM, Raposo MCF. Fatores socioeconômicos e dietéticos de risco para a anemia em crianças de 6 a 59 meses de idade. J Pediatr. (Rio J.) 2007;83(1):39-46.

8. Monteiro CA, Szarfarc SC, Mondini L. Tendência secular da anemia na infância na cidade de São Paulo (1984 - 1996). Rev Saúde Publica. 2000; 34(Supl 6):62-72.

9. Lima ACVMS, Lira PIC, Romani SAM, Eickmann SH, Piscoya MD, Lima MC. Fatores determinantes dos níveis de hemoglobina em crianças aos 12 meses de vida na Zona da Mata Meridional de Pernambuco. Rev Bras Saude Matern Infant. 2004;4:35-43.

10. Osório MM, Lira PI, Ashworth A. Factors associated with Hb concentration in children aged 6-59 months in the state of Pernambuco, Brazil. Br J Nutr. 2004;91:307-15.

11. Cozzolino SMF. Biodisponibilidade de minerais. Rev Nutr PUCCAMP. 1997;10:87-98.

12. Semba RD, Bloem MW. The anemia of vitamin A deficiency: epidemiology and pathogenesis. Eur J Clin Nutr. 2002;56:271-81.

13. Hallberg L, Rossander-Hulten L, Brune M, Gleerup A. Bioavailability in man of iron in human milk and cow's milk in relation to their calcium contents. Pediatr Res. 1992;31:5247.

14. World Health Organization. Complementary feeding of young children in developing countries: a review of current scientific knowledge. Geneva: WHO; 1998.

15. Martins S, Logan S, Gilbert R. Iron therapy for improvingpsychomotor development and cognitive function in children under the age of three with iron deficiency anaemia. TheCochrane Database of Systematic Reviews. 2001;(2) Art. No.: CD000117. [Acesso em 10 set. 2007] Disponível em: http://www.mrw.interscience.wiley.com/cochrane/clsysrev/articles/CD000117/frame.html

16. Bruner A, Joffe A, Duggan AK, Casella JF, Brandt J. Randomised study of cognitive effects of iron supplementation in non-anemic iron-deficient adolescent girls. Lancet. 1996;348:992-6.

17. Levin HM, Pollitt E, Galloway R, Mcguire J. Health sector priorities review: micronutrient deficiency disorders. Washington (DC): Oxford University; 1991.

18. Scholl TO, Hediger ML. Anemia and iron-deficiency anemia: compilation of data on pregnancy outcome. Am J Clin Nutr. 1994; 59(Suppl):492-501.

19. Assis AM, Santos LM, Martins MC, Araújo MP, Amorim DQ, Morris SS, et al. Distribuição da anemia em pré-escolares do semi-árido da Bahia. Cad Saúde Pública. 1997;13:237-44.

20. Oliveira RS, Diniz AS, Benigna MJ, Miranda-Silva SM, Lola MM, Gonçalves MC, et al. Magnitude, distribuição espacial e tendência da anemia em pré-escolares da Paraíba. Rev Saúde Publica. 2002;36:26-32.

21. Prefeitura Municipal de Belo Horizonte.gov [homepage na internet]. Belo Horizonte: PBH.GOV c1995 [atualizada em 19 de setembro de 2001, Acesso em 10 set. 2007]. Disponível em http://www.pbh.gov.br/anuario estatisticodebelohorizonte2000

22. EPI-INFO 6.04a: A word processing database and statistics program for public health on IBM-compatible microcomputers [programa de computador]. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention/World Health Organization; 1996.

23. Microsoft Office Excel [programa de computador]. Versão 11.0 - Office 2003. Califórnia. Estados Unidos: Microsoft Corporation; 2003.

24. Demayer EM. Preventing and controling iron deficiency anaemia trough primary care. 1989. Ginebra: OMS; 1989.

25. Vieira ACF, Diniz AlS, Cabral PC, Oliveira RS, Lóla MMF, Silva SMM et al. Avaliação do estado nutricional de ferro e anemia em crianças menores de 5 anos de creches públicas. J. Pediatr. (Rio J.) 2007;83(4):370-6.

26. Assunção MCF, Santos IS, Barros AJD, Gigante DP, Victora CG. Efeito da fortificação de farinhas com ferro sobre anemia em pré-escolares, Pelotas, RS. Rev. Saúde Pública. 2007;41(4):539-48.

27. Almeida APC, Zandonade E, Abrantes MM, Lamounier JA. Deficiência de ferro e anemia em crianças de Vitória, ES. Pediatria(São Paulo) 2004;23(3):140-50.

28. Taylor PG, Martinez TC, Mendez CH, Bosch V, Leets I, Tropper E, et al. The relationship between iron-deficiency and anemia in Venezuelan children. Am J Clin Nutr. 1993;58:215-8.