RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 15. 1

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Educação Médica

Visibilidade da ciência brasileira

The brasilian science visibility

Mário Jorge Barreto Viegas Castro1; Mário Dias Corrêa Júnior2; Carlos José Barreto Viegas Castro3

1. Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da UFMG. Coordenador do Curso de Pós-graduação em Saúde da Mulher
2. Doutorando do Curso de Pós-graduação em Saúde da Mulher
3. Mestre em Ciência da Educação. Professor da Universidade FUMEC

Endereço para correspondência

Rua Ceará 161 sala 202 - Bairro Santa Efigênia
30150-310 - Belo Horizonte - Minas Gerais
e-mail: atrafaria@hotmail.com

Data de Submissão: 24/11/04
Data de Aprovação: 18/02/05

Resumo

A produção de artigos científicos na área médica e de saúde pública no Brasil é motivo deste estudo, que tem o objetivo de reconhecer as tendências na pesquisa e identificar onde esses artigos são indexados. Os resultados mostraram que as revistas biomédicas brasileiras são indexadas nas seguintes bases de dados: SciELO Brasil (128 títulos), LILACS (264 títulos), MEDLINE (18 títulos) e ISI (16 títulos). A Universidade de São Paulo ocupa a liderança da América Latina com 80.000 citações, e recentes análises de citações mostraram que o Brasil está em 23º lugar no ranking internacional, com a produção de 1% dos artigos mais citados na ciência. O fato de cientistas estrangeiros consultarem nossos trabalhos científicos prova que nossa ciência é notória e consciente.

Palavras-chave: Bases de dados; Pesquisa biomédica/tendências; Publicações periódicas; Editoração; Bibliometria

 

INTRODUÇÃO

Entre um ser humano informado e outro carente de informação há um abismo. A falta de informação é uma nova forma de pobreza que implica sérias limitações e desigualdade de conhecimentos que geram disparidade de oportunidades1.

O advento da escrita, segundo Sócrates, é motivo de cautela, pois neste tipo de cultura podem surgir os falsos mestres; ao contrário, Platão crê que em uma cultura oral todo o esforço dedicado a recordar impede sua atenção crítica, e considera que a escritura coloca a todos em condições de raciocinar e escolher1. Quem sabe ler poderá conhecer de primeira mão, sem intermediários, como é o mundo. Quem sabe ler, escreve Platão, é livre1.

Os primeiros estudos bibliotecários, em sua essência, remontam ao início do século e consistiam em compilações manuais de publicações científicas2, embora, historicamente, se conheçam trabalhos do século III (a.C.) de Pinakes de Calímaco de Cirene, diretor da biblioteca de Alexandria, o qual fazia a catalogação e classificação por ordem de temas1.

As primeiras sociedades científicas reconhecidas são a Academia dei Lincei (1600-1630) em Roma, a Academia del Cimento (1651-1657) em Florença, e a Royal Society de Londres (1622). Destas nasceram a necessidade de comunicação e a difusão da nova ciência e metodologia, o que propiciou o intercâmbio das cartas. O crescimento e o desenvolvimento das sociedades fizeram aumentar a necessidade de comunicação, sendo as cartas, até então, a sua única forma. Os escrivãos não puderam sustentar tamanha explosão desse tipo de comunicação, o que determinou o surgimento da imprensa e a utilização da prensa. Dessa forma, surgiram os periódicos que, mais tarde, acabaram se convertendo em revistas científicas3.

O bibliotecário passou a ter uma nova missão, incomparavelmente superior a todas as outras anteriores. Ele, que até então havia se ocupado do livro como coisa, objeto material, a partir dos novos tempos, teria de atender ao livro como ser vivente, exercer política sobre o livro e fazer-se domador do livro enfurecido1.

A comunicação de um achado científico é um fato indiscutivelmente vinculado ao seu reconhecimento, êxito e aproveitamento. As publicações científicas nasceram com o propósito de divulgar o trabalho de investigadores, além de compartilhar com seus pares e comunidade os progressos alcançados pelo conhecimento científico4.

A avalanche de informações despejadas sobre a comunidade científica requer a criação de intermediários capazes de gerenciar a informação, trazendo à luz a ciência de que realmente se necessita. Dessa forma, é garantido o intercâmbio entre os gerenciadores e os usuários das informações necessárias ao solucionamento dos questionamentos científicos.

O conhecimento científico só chegará a ser verdadeiramente público, não só quando estiver potencialmente ao alcance do indivíduo, mas também quando este dispuser de um sistema eficaz de acesso à informação e procura5.

Foi com o intuito de facilitar a informação e a procura do conhecimento científico que surgiram as bases de dados. Estas são múltiplas e possuem características distintas. Existem as nacionais, as regionais, as internacionais e as temáticas. Independentemente de seu tipo de bibliografia, não são mais que uma ferramenta de localização, por meio de seus dados, da informação que organiza. Constituem uma maneira de facilitar, agilizar e simplificar a recuperação de documentos.

A comunidade médica científica brasileira dispõe da rede SciELO (Scientific Eletronic Library On Line), que é um modelo para a publicação eletrônica cooperativada de periódicos científicos na Internet. Essa rede foi especialmente concebida para responder às necessidades de comunicação científica nos países em desenvolvimento, particularmente da América Latina e do Caribe. O SciELO Brasil assegura a visibilidade e o acesso universal à literatura científica de nossas comunidades, contribuindo para o resgate das "ciências perdidas", ou seja, a ciência rejeitada por bancos de dados internacionais que não demonstram interesse em divulgar publicações regionais, que são merecedoras de apreço6.

O SciELO Brasil indexa 128 de cerca de 500 periódicos brasileiros selecionados pelo comitê consultivo do SciELO7. Para uma revista brasileira ser indexada a esse banco de dados, ela tem de passar pelos critérios de avaliação do SciELO Brasil. Os critérios são importados, em parte, das bases de dados internacionais, porém são mais adequados e menos discriminatórios à realidade brasileira, inclusive pela presença de avaliação continuada de um comitê consultivo inteligente. Dessa forma o SciELO inclui revistas de boa qualidade científica e com importância médico-social, entre as quais destacamos, na área da saúde da mulher, a Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia e a Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil.

A indexação de um periódico na base SciELO Brasil é reconhecimento de mérito, aval à boa qualidade de seus artigos e autores. As publicações ficam acessíveis, com maior "visibilidade" pela divulgação, recebendo validação científica e credibilidade, o que constitui um privilégio6.

Devido à conscientização dos corpos editoriais das revistas à necessidade de maior divulgação, a procura pela indexação no SciELO tem sido enorme nos últimos anos. Em 2001, de um total de 102 periódicos analisados pelo Comitê Consultivo SciELO Brasil, foram selecionados 32 novos títulos; em 2002, de um total de 45, foram aprovados dez; em 2003, de 44, somente entraram 15 e, na última reunião realizada em 29 de junho de 2004, de 39, foram incluídos apenas nove8. Um dos méritos do SciELO é, além de filtrar a informação, fazer aflorar a chamada "ciência escondida", que, ao contrário do que muitos pensam, não está sendo publicada em revistas de segunda categoria. A veracidade dessa afirmação pode ser comprovada pelo número de acessos a essa base de dados, a qual foi consultada, somente no mês de agosto de 2004, um total de 989.757 vezes. Os países que mais visitaram essa base de dados foram, em primeiro lugar, o Brasil, seguido dos Estados Unidos da América, da Alemanha, do México, de Portugal, da Argentina e da Holanda. Nota-se, por esses números, que excelentes artigos não aceitos em revistas internacionais, por serem de interesse dito "local", passam, dessa forma, a ter divulgação internacional.

Outra base de dados de extrema relevância é a LILACS (Literatura Latino Americana e do Caribe), que compreende toda a literatura relativa às ciências da saúde, produzida por autores latino-americanos e caribenhos, sendo publicada nos países da mesma região desde 1982. A LILACS é coordenada pela BIREME, com apoio da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde) e da OMS (Organização Mundial de Saúde). Para esta base contribuem as bibliotecas de redes ou sistemas de informação nacional, os centros de documentação das representações, centros regionais especializados e a biblioteca da Organização Pan-Americana de Saúde. Em cada país há um centro coordenador da base de dados LILACS, que coordena as atividades dos centros cooperantes nacionais. Desde 1992, cada país tem o seu comitê responsável pela seleção dos periódicos nacionais a serem incorporadas à LILACS. As características a serem avaliadas na seleção são: conteúdo, revisão por pares, comitê editorial, regularidade da publicação, periodicidade, tempo de existência, normalização, apresentação gráfica, entre outros.

O número de revistas indexadas na LILACS, disponíveis em texto eletrônico, é de aproximadamente 664, sendo que, desse total, o Brasil contribui, em primeiro lugar, com 264, seguido da Argentina com 103, Chile 58, Colômbia 53, Venezuela 44, México 41, Cuba 30, Costa Rica 12, Bolívia dez. Os outros países não têm contribuição expressiva9.

O número de registros que compõem a base de dados é de 345.815, sendo que no período de janeiro de 1999 a junho de 2004, a contribuição média anual do Brasil foi de 10.748, o que representa 47,8% da contribuição total anual. No corrente ano, a contribuição do Brasil está em 62,3%, ou seja, é o país que mais colabora com a base de dados LILACS.

Dentro dessa mesma base, analisando a distribuição da produção científica brasileira por subtemas na área de saúde, tem-se em primeiro lugar a medicina clínica com 66,9%, seguida pela medicina básica com 14,9%, a medicina social com 14,4% e, por último, outras áreas relacionadas à saúde com 9%. Nos últimos anos, de 1999 a 2002, observou-se um aumento das publicações na área básica em detrimento da área clínica.

Com tudo isto, reafirma-se a missão da BIREME, coordenadora da LILACS, na contribuição ao desenvolvimento da saúde, fortalecendo e ampliando o fluxo de informação em ciências da saúde na América Latina e no Caribe.

Uma das maiores bases de dados internacionais que cobre os campos da medicina, enfermagem, odontologia, veterinária e ciências pré-clínicas é a MEDLINE. Essa base contém resumos de mais de 4800 periódicos biomédicos publicados nos Estados Unidos da América e de mais 70 países.

Para um periódico ser indexado na MEDLINE, além dos requisitos exigidos pela base de dados, faz-se necessário que seu corpo editorial tenha, pelo menos, três membros que sejam grandes pesquisadores ligados aos maiores institutos de pesquisa em saúde como o NIH (National Institut of Health), nos Estados Unidos ou em outro país. Nessa base de dados o corpo editorial brasileiro indexa, precisamente, 18 periódicos.

Provavelmente, o maior banco de dados internacional seja o ISI database (Internacional Science Information), que compila 8700 periódicos. Essa base usa política de extrema seletividade, pois acredita que, além se ser impraticável economicamente cobrir toda a literatura científica, os resultados consistentes da literatura estão em número relativamente pequeno de periódicos. O corpo editorial do ISI revê aproximadamente 2.000 novos jornais anualmente, selecionando apenas 10% a 12% destes, enquanto que os já indexados estão constantemente sob revisão para controle de qualidade e relevância.

Os critérios de seleção, para inclusão nessa base, são semelhantes aos de outras internacionais, com uma peculiaridade: o de análise de citações, ou seja, leva em conta o número de vezes que os artigos daquele periódico (candidato a indexação) são citados por outras revistas. Essa análise é como se fosse o "padrão ouro" do ISI.

Os editores brasileiros contam com 16 títulos de periódicos no ISI, exibindo um fator de impacto que varia de 0,027 a 0,6710.

Dados estatísticos dessa base demonstram, que em uma compilação de 1992 a junho de 2003, os estudos científicos produzidos pela Universidade de São Paulo estão em primeiro lugar dentro da América Latina, contando com 80.000 citações, seguidos da Universidade Autônoma do México com 68.000; após vem a Universidade de Buenos Aires com 40.000; em quarto lugar, a Universidade Estadual de Campinas com 30.000 e, em quinto lugar, a Universidade Federal do Rio de Janeiro, com 22.000 citações11.

Embora o Brasil apresente situação de destaque na América Latina, no ranking mundial ocupa a 23ª posição em relação ao número de artigos que foram mais citados. Fazendo uma análise da produção científica brasileira nos últimos anos, observa-se aumento expressivo no número de artigos publicados: de 1993 a 1997 (100 artigos) e de 1997 a 2001 (188 artigos), o que corresponde a 0,2% e 0,5% da produção mundial, respectivamente.

A consulta e as citações de nossos manuscritos por cientistas de outros países é o maior aval de reconhecimento, credibilidade e seriedade da pesquisa brasileira.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1- Perez M, Nuria E. La Bibliografia, bibliometria y las ciências afines. ACIMED. 2002;10:1-2.

2- Bordons M, Zulueta M A. Evaluación de la actividad científica a través de indicadores bibliométricos. Rer Esp Cardiol. 1999;52:790-800.

3- Sabattini M. Evolución histórica de las publicaciones científicas: de la republique des lettres hasta la World Wide Web. Salamanca: Universidade de Salamanca 1999 [Citado em ago. 2004]. Disponível em: http://www.webpraxis.com/msabba/artigos/acad003_evolution.htm.

4- Ibarra G. Las publicaciones científicas en Argentina: um futuro incierto [Citado em ago. 2004]. Disponível em: http://fcen.uba.ar/publicac/revexact/exacta16/actual.htm.

5- Cazau P. Las publicaciones científicas en Internet [Citado em ago. 2004]. Disponível em: http://www.galeon.com/pcazau/artepi_publ.htm.

6- Bicas EAH, Rother ET, Braga MER. Fatores de impacto, outros índices bibliométricos e desempenhos acadêmicos. Arq Bras Oftalmol 2002;65:151-2.

7- Scielo Brasil. Coleção de biblioteca. [Citado em ago. 2004]. Disponível em: www.scielo.br/scielo.php/script_sci_alphabetic/lng_pt/nrm_iso.

8- Scielo Brasil. Seleção de periódicos. [Citado em ago. 2004]. Disponível em: http://www.scielo.br/avaliacao/20031218_pt.htm.

9- LILACS. Sistema de base de dados / julho de 2004. [Citado em ago. 2004]. Disponível em: http://www.bireme.br/abd/P/lista_geral.htm.

10- Vilhena V, Crestana MF. Produção científica: critérios de avaliação de impacto. Rev Assoc Med Bras. 2002;48:20-21.

11- ISI. Latin American Institution Rankings. 1992-junho 2003. [Citado em ago. 2004]. Disponível em: http://www.isinet.com/regions/latinamerica/img/span/latin-chart-1.gif.