ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Valvuloplastia externa da junção safeno-femoral
External valvuloplasty of the sapheno-femoral junction
Francisco Reis Bastos
Médico Angiologista e Cirurgião Vascular-Belo Horizonte-MG
Endereço para correspondênciaRua: Otoni, 909/411
CEP 30150-270 Belo Horizonte - MG - Brasil
Data de Submissão: 15/06/03
Data de Aprovação: 06/09/04
Resumo
A insuficiência venosa superficial atinge 10% a 20% da população ocidental. Até pouco tempo, o principal tratamento cirúrgico era a remoção das veias varicosas, inclusive da veia safena magna que constitui o principal eixo de drenagem venosa superficial. Atualmente, há uma nova possibilidade de tratamento cirúrgico: a valvuloplastia externa de junção safeno-femoral, que se caracteriza por reforço externo à parede venosa enfraquecida.
Palavras-chave: Veia safena; Varizes / Cirurgia; Perna / Irrigação sanguínea; Insuficiência venosa / Cirurgia; Implante de prótese vascular
INTRODUÇÃO
Há muitos anos, vem-se usando a extração da veia safena (stripping) e outras técnicas para o tratamento das varizes dos membros inferiores.
Essas técnicas apresentam bons resultados, mas evoluem com complicações, como lesão de linfáticos e de nervos. Atualmente, diversos conceitos novos são levados em consideração na etiologia da doença, recaindo sobre a deficiência do colágeno que compõe a parede das veias (mucopolisacáride) a principal suspeita causal da insuficiência venosa. A dilatação do suporte do anel que sustenta as válvulas venosas causa o afastamento de suas cúspides com conseqüente incompetência funcional e refluxo do sangue. Podem ocorrer, também, defeitos congênitos do tipo agenesia de válvulas, que contribuem para a insuficiência venosa. O agravamento da circulação venosa poderá ser reforçado pela vida sedentária, longos períodos na posição ereta, obesidade, constipação, gravidez, medicação hormonal e contraceptiva.
O ecodoppler venoso dos membros inferiores (EDV) é o exame "padrão ouro" na investigação e diagnóstico das varizes ou insuficiência venosa superficial (IVS). Ele contribui muito para o entendimento dos problemas de anatomia, fisiologia e fisiopatologia que promovem as doenças venosas. Cada vez mais, é possível oferecer melhor tratamento aos pacientes. Nesse sentido, algumas tentativas de restauração venosa foram feitas.
Várias técnicas têm sido usadas para tratamento da incompetência primária das válvulas. Entre elas estão as técnicas de Kistner intraluminal e extraluminal. Em 1989, Lane1 começou a usar o manchão protetor (Venocuff), tendo operado mais de 1.500 pacientes, na Austrália. Em 1994, este trabalho teve seu início, no Brasil, para a correção da insuficiência venosa primária1.
MATERIAL E MÉTODO
Entre 1994 e 2000, 130 pacientes foram selecionados, segundo critérios de Lane2 e submetidos à valvuloplastia externa. Em todos foi usada a anestesia local com lidocaína (0,5%) e adrenalina (1.200.000), e midazolam, como pré-medicação. A seguir, foi realizada a dissecação padrão na virilha com ligadura das tributárias da croça da safena magna. A prótese utilizada foi de Dacron@ com silicone, colocada ao redor da veia safena magna, na sua porção terminal. Foi suturada com fio de polipropileno número 5-0 e fixada ao coto da veia tributária mais próxima à veia femoral. Usou-se um segmento em torno de 3cm na junção safeno-femoral (JSF). As veias tributárias e perfurantes doentes foram removidas também sob anestesia local e agulhas de crochê. As incisões foram feitas segundo a técnica de Ricci3, deixando cicatrizes mínimas. Não foi utilizado anticoagulante nos períodos per e pós-operatórios. Em todos os casos, foi administrado antibiótico profilático (cefalotina).
RESULTADOS CLÍNICOS
Houve bons resultados em 70% dos pacientes com a conseqüente melhora do calibre das veias restantes, sendo que houve redução de, aproximadamente, 1/3 do diâmetro venoso. Em 40% dos casos, verificou-se ausência de refluxo na JSF. Em algumas mulheres, que ficaram grávidas após o procedimento cirúrgico, verificou-se bom comportamento das veias, sem aumento dos sintomas, mesmo na fase final da gravidez. Naqueles casos em que o refluxo permaneceu, ele ocorreu com menos intensidade, pois a safena estava reduzida em diâmetro.
DISCUSSÃO
Em mãos experientes, o diagnóstico de IVS é muito mais preciso e eficiente devido ao uso do mapa venoso EDV. As técnicas tornaram-se mais apuradas, permitindo um tratamento mais seletivo. As deficiências podem ser corrigidas em vários pontos da rede venosa e preserva-se o tronco da safena. É o chamado patrimônio venoso. No futuro, esta safena poderá ser utilizada para pontes coronárias e até para salvamento de membros inferiores por meio de pontes para as artérias dos membros inferiores. Outra vantagem é a possibilidade de adequar a técnica cirúrgica às especificidades de cada caso. É o chamado tratamento "à la carte". A incompetência valvular primária é freqüente causa de IVS e 40% dos pacientes com trombose venosa profunda desenvolvem incompetência de JSF. Lane2, Jessup4 e Corcos & Zamboni5 demonstraram um modelo de reforço venoso com Dacron-siliconizado em banda ao redor e reforçando a parede venosa. Resultado similar foi obtido por Schanzer6 com o uso do PTFE (prótese vascular, derivada do petróleo). Vedensky7 também utilizou espirais de polipropileno envolvendo segmentos venosos incompetentes, tanto em veias superficiais quanto em veias profundas. Camilli8, mais recentemente, usou vários desses procedimentos em 113 casos operados.
O uso do Venocuff (prótese de Dacron com silicone) para a reconstrução venosa superficial e restauração da competência da JSF é importante inovação para casos selecionados e permite substituir a remoção de safena (stripping). Esta técnica (valvuloplastia externa) parece ser melhor que a ligadura alta da safena. Além disso, evita a neogênese de veias que representa uma forma de recidiva de varizes, quando a safena é seccionada e a fossa oval permanece aberta, como se usava em tempos antigos. É interessante ressaltar que as técnicas de reconstrução venosa também apresentam menor morbidade e menor índice de lesão de vasos linfáticos e nervos periféricos.
É possível restabelecer a competência da JSF por meio de procedimento executado sob anestesia local. Trata-se de técnica simples e que não invade o lume das veias. Anticoagulantes não são necessários.
CONCLUSÃO
A valvuloplastia externa da veia safena magna apresenta vantagens e representa novidade no arsenal terapêutico do cirurgião vascular. Como tal, deparará com a resistência ao novo. Entretanto, com o auxílio do EDV, o diagnóstico será cada vez mais pontual e o tratamento deverá utilizar várias técnicas cirúrgicas que se complementarão. À medida que novos estudos surgirem, as indicações cirúrgicas serão definidas de maneira mais eficiente. Assim também será na escolha de material para a reconstrução venosa. Também saberemos onde será melhor remover uma veia e onde será melhor reconstruí-la.
Os resultados atuais são animadores e parecem indicar um lugar para a valvuloplastia externa da safena.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1- Bastos FR. Valvuloplastia externa da junção safeno-femoral. In: Anais do XXXII Congresso Brasileiro de Angiologia e Cirurgia Vascular. 1997. p.94-5.
2- Lane R. Vascular surgical techniques. In: Greenhalgh RM, editor. Philadelphia: W.B Saunders; 1989.
3- Ricci SG. Office varicose surgery under local anesthesia. Phlebology Rev Dermatol Furge Oncol 1992;18:55-8.
4- Jessup G, Lane RJ. Repair of incompetent venous valves: a new technique. J Vasc Surg 1988;8:569-75.
5- Corcos L, Zamboni P. External valvuloplasty of the sapheno- femoral junction. Phlebologie 1989;89:1025-7.
6- Schanzer H. Treatment of primary valvulal incompetence by external splinting. In: Proceedings of the XXII Society, 1989. p.75-83.
7- Vedensky AN. Vein surgery. Leningrad: Kuibusheva; 1968.
8- Camilli S. Le manchonnage periveineux de la terminaison sapheno-fémoral. Phlebology 2002;343-9.
Copyright 2023 Revista Médica de Minas Gerais
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License