ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Cirurgia sem perdas das próteses penianas
Zero loss surgery of penile prosthesis
Otto Henrique Tôrres Chaves
Professor Adjunto do Departamento de Cirurgia - Disciplina de Urologia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais; Chefe do Serviço e Regente da Pós-graduação em Urologia do Hospital Universitário São José; Mestre em Medicina - Faculdade de Medicina, UFMG; Doutorando em Medicina - Faculdade de Medicina, UFMG
Endereço para correspondênciaOtto Henrique Tôrres Chaves
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E-mail: otto@uai.com.br
Data de Submissão: 28/02/2003
Data de Aprovação: 07/05/2003
Resumo
OBJETIVO: Analisar cinqüenta e três pacientes com impotência sexual, tratados cirurgicamente com o implante de prótese peniana.
MÉTODO E CASUÍSTICA: estudo retrospectivo da experiência pessoal com o implante de prótese peniana. Vinte e oito pacientes tiveram como etiologia uma disfunção vascular peniana; 17, diabetes mellitus; quatro, pós-prostatectomia radical retropúbica em decorrência de câncer de próstata; dois, doença de peyronie, um paraplégico e outro devido a câncer de próstata com bloqueio androgênico. Em 16 pacientes, o implante foi realizado simultaneamente com outras operações. Foi seguido um protocolo rigoroso com 14 medidas antissépticas preventivas e antibióticoprevenção adequada, tendo como objetivo impedir infecção pós-operatória e conseqüente perda do implante peniano. A incisão foi penoescrotal, com os pacientes internando-se no dia da operação e com alta hospitalar na manhã do segundo dia de pós-operatório.
RRESULTADOS: Não houve perda de nenhum implante e as complicações ocorridas não comprometeram o pós-operatório nem o resultado estético e funcional. O grau de satisfação obtido pelos pacientes foi de 96,2%.
CONCLUSÃO: As medidas adotadas são de grande eficácia, não havendo perda do implante e ótimo resultado funcional e estético.
Palavras-chave: Implante peniano; Efeitos adversos; impotência/Cirurgia; Cuidados intra-operatórios; Cuidados pós-operatórios; Antibioticoprofilaxia
INTRODUÇÃO
O conceito de colocação de prótese para tratamento da impotência sexual tem várias décadas1. A partir da década de setenta, com a introdução das próteses semi-rígidas por Small et al.2 e as próteses infláveis por Scott et al.3, iniciou-se a era moderna desta cirurgia. Todas as próteses penianas, desde então, evoluíram e têm em comum o fato de serem um par de dispositivos, que ocupam totalmente os corpos cavernosos, podendo ou não ter componentes fora deles, tais como bombas e reservatórios.
Apesar de o implante da prótese não restaurar ereções normais, as mesmas dotam o pênis de uma rigidez axial longitudinal que permite um bom suporte, permitindo restabelecer a condições essenciais para um coito satisfatório, tornando este procedimento cirúrgico o padrão-ouro, quando comparado com outras formas de tratamento4.
Nos dez últimos anos, com uma fantástica evolução no estudo dos pacientes impotentes, houve um aumento muito grande no uso da prótese peniana. Desses pacientes, 10% escolhem a prótese para tratamento, sendo a infecção uma complicação desastrosa após a operação, pois torna necessária a retirada daquela, com a subseqüente dificuldade ou até impossibilidade de novo reimplante, devido à fibrose e ao encurtamento peniano5. A incidência de infecção está entre 1% e 17%, sendo que a infecção urinária, a infecção em outro local do corpo e a disseminação tardia são conhecidos fatores de alto risco6,7. Uma cuidadosa prevenção anti-séptica e antimicrobiana conseguiram reduzir a perda de implante8.
O objetivo deste estudo foi analisar, retrospectivamente, 53 pacientes portadores de disfunção erétil, submetidos a implante de prótese peniana, dentro de um protocolo único e original de medidas anti-sépticas de infecção e de técnica operatória até então não mencionadas em conjunto, para evitar a perda do implante e avaliá-los quanto ao tempo operatório, a manipulação intra-operatória da prótese, as complicações e o resultado funcional e estético.
CASUÍSTICA E MÉTODO
O presente estudo refere-se à experiência pessoal com o implante de prótese peniana em cinqüenta e três pacientes, sendo duas infláveis de dois volumes, cujos protocolos puderam ser analisados, retrospectivamente, usando-se um roteiro único, com medidas até então não preconizadas em conjunto, com o objetivo de evitar a perda do implante.
Vinte e oito (52,8%) pacientes apresentaram como etiologia disfunção vascular peniana, com idade média de 61,9 anos; dezessete (32,1%) pacientes, com idade média de 58,6 anos, apresentaram diabetes como etiologia, sendo cinco insulino-dependentes e doze não-insulinos-dependentes; quatro (7,5%) pacientes, câncer de próstata, submetidos a prostatectomia radical retropúbica e idade média de 65,5 anos; dois (3,8%) pacientes, doença de Peyronie e curvatura incapacitante, com idade média de 58 anos; um (1,9%) paciente com paraplegia por trauma medular, com idade de 21 anos, e um (1,9%) paciente com 70 anos, com câncer de próstata sob bloqueio androgênico. A idade média de todos foi de 60,3 anos (Tabela 1).
Todos os cinqüenta e três pacientes foram submetidos a anamnese cuidadosa e avaliação sexológica, evidenciando-se disfunção erétil com impossibilidade de penetração que se confirmou, em seguida, com dois testes de ereção fármaco-induzida (TEFI), com 75mg de papaverina e, em outro dia, com 10mg de prostaglandina E1. Todos apresentaram ereções parciais, insuficientes para penetração, e uma avaliação pressórica dos corpos cavernosos e sua dinâmica com a cavernosometria, por gravidade, mostrou pressão intracavernosa (PIC) muito abaixo de 110cm3 de água, necessária para uma ereção normal. Os 17 (32,1%) pacientes diabéticos foram avaliados também com eletromiografia e potencial evocado genitocerebral (Tabela 2).
A operação de implante de prótese peniana foi realizada, simultaneamente, em 16 pacientes (30,2%), sendo a ressecção endoscópica da próstata a operação mais freqüente. Entre esses 16 pacientes, em dez (62,6%) ocorreu a ressecção endoscópica da próstata, pelo fato de existirem, nesses casos, sintomas miccionais obstrutivos muito importantes, já com indicação para cirurgia do aumento prostático, freqüente na faixa etária dos casos estudados (Tabela 3).
O método operatório foi padronizado e aplicado desde junho de 1989, em todos os pacientes da nossa casuística. Todos os pacientes internaram-se no dia da operação, submetendo-se a depilação na sala cirúrgica.
A anestesia foi peridural e os pacientes ficaram em decúbito dorsal, com a monitorização cardíaca e da saturação do oxigênio (oximetria de pulso). A antibioticoprevenção constou do uso de cefalotina 1,0g., sulfato de amicacina 500mg, e fosfato de clindamicina 600mg, no ato anestésico.
A anti-sepsia foi feita durante dez minutos, com degermante iodado, aplicando-se após o iodado tópico. Não se permitiu nenhuma circulação da sala cirúrgica para o restante do bloco e vice-versa, a partir desse momento até o final do procedimento cirúrgico.
A incisão da pele foi penoescrotal, por planos, até os corpos cavernosos. Foi feita incisão ventral sobre os mesmos, numa extensão de três centímetros na parte correspondente ao terço medial do corpo cavernoso até a exposição do seu tecido. Procedeu-se, então, à dilatação dos corpos cavernosos, usando-se velas de Hegar de número sete até o número 12 ou 14, cuidadosa e progressivamente, no sentido proximal e distal.
Após essa dilatação irrigaram-se os corpos cavernosos, utilizando-se uma seringa de 20cm3, com uma solução de 250ml de soro fisiológico 0,9% à temperatura ambiente, no qual dissolveu-se o conteúdo de uma ampola de rifamida (rifocina®) de 500mg e uma ampola de gentamicina de 80mg (garamicina®). Em seguida, foi feita a medida em comprimento dos corpos cavernosos, utilizando-se um medidor de centímetros, adequado para tal. A importância desta medida se prende ao fato de que ela permitiu selecionar o tamanho e o calibre adequado da prótese, evitando manipulações repetidas da mesma, dentro do corpo cavernoso, na procura de ajustamento. Após esta medida, a embalagem que contém a prótese foi aberta pela enfermeira e, após a colocação de outro par de luvas, ela foi retirada pelo cirurgião, não havendo manipulação da prótese por mais ninguém. Sem tocar em nenhum local ou tecido, a prótese foi colocada dentro do corpo cavernoso, primeiro na porção proximal e, em seguida, na porção pendular do pênis por flexão, numa única manipulação. Essa manobra é importante para o êxito da cirurgia, assim como o fato de a prótese estar com a medida exata do corpo cavernoso.
Nas próteses infláveis de dois volumes usadas, o procedimento foi semelhante, acrescido da colocação da bomba reservatório no escroto, após dissecção de um espaço entre os testículos, suficiente para contê-la.
Procedeu-se, então, ao fechamento da túnica albugínea com sutura contínua, usando-se um fio de monofilamento absorvível 3-0; do subcutâneo, com fio absorvível 3-0, e da pele, com pontos separados de náilon 4-0. Nos casos de próteses infláveis, acrescentou-se o fechamento com fio absorvível 3-0, do espaço escrotal de modo a não permitir a migração da bomba reservatório. Não foi feita drenagem subcutânea em nenhum caso. Usou-se curativo de moderada compressão, com uma atadura de crepon mantida por quarenta e oito horas, e colocou-se um cateter de Foley nº 18, mantido por 12 horas.
Dos pacientes operados, 43 (81,1%) ficaram internados por dois dias, e dez pacientes (18,9%) submetidos, concomitantemente, a ressecção endoscópica de próstata ficaram internados por três dias.
A antibioticoterapia preventiva iniciada no transoperatório foi mantida na mesma dosagem por 48 horas. Após esse período, foi recomendado o uso de fluorquinolona, por via oral, durante mais cinco dias.
Os pontos da pele foram retirados no sétimo dia e o pênis foi mantido elevado, junto ao abdômen, através de uma faixa, até o décimo quinto dia. A partir de então, iniciou-se, intermitentemente, o exercício de dobrá-lo sobre o escroto, até o trigésimo dia e, desde então, ficou mantido nesta última posição, liberando-se a atividade sexual. Nas infláveis foi mantido o reservatório cheio e as próteses vazias, para criar um espaço suficiente para conter o primeiro, até o décimo quinto dia. A partir de então, iniciou-se o exercício de enchimento e esvaziamento das próteses, liberando, após o trigésimo dia, as atividades sexuais.
Foram feitas observações, mensalmente, até o terceiro mês. Foram diagnosticadas complicações de menor gravidade, no pós-operatório imediato, conforme Tabela 6, o que não comprometeu a evolução dos casos.
Não houve necessidade de reoperações.
A avaliação final do resultado cirúrgico foi feita pelo paciente e pelo cirurgião quanto ao aspecto funcional e estético.
RESULTADOS
A análise da experiência obtida na atual casuística foi dividida em três partes.
Na primeira parte, estudamos a aplicabilidade de uma prótese do mesmo tipo e origem. Foi observado que a rotina de medir previamente o comprimento e o calibre dos corpos cavernosos, após a corporotomia e dilatação dos mesmos, permitiu uma grande facilitação na escolha da prótese a ser implantada, em virtude de as próteses possuírem tamanhos e calibres preestabelecidos. Ocorreu apenas uma manipulação da prótese dentro dos corpos cavernosos em quarenta e dois casos (79,2%), duas manipulações em dez casos (18,9%) e três manipulações em um caso (1,9%) (Tabela 4). Isso resultou em uma importante diminuição do tempo operatório, que foi menor do que 30 minutos em 25 casos (47,2%), de 30 a 45 minutos em 26 casos (49,0%) e acima de 45 minutos em dois casos (3,8%), diminuindo assim, significativamente, o trauma e a oportunidade de contaminação (Tabela 5).
Na segunda parte, estudamos as complicações, que foram gerais ou relacionadas à prótese.
Nas gerais, observamos complicações menores, que não comprometeram o pós-operatório e foram as seguintes: diarréia: em um caso (1,9%); meatite após uso do cateter de Foley em ressecção associada de próstata: em um caso (1,9%); retenção urinária: em dois casos (3,8%); retenção urinária e meatite: em um caso (1,9%); deiscência de um ponto da sutura da pele em diabéticos: em três casos (5,7%); deiscência com edema peniano: em um caso (1,9%); edema discreto peniano: em seis casos (11,3%); dor discreta, com necessidade de uso de analgésicos: em dois casos (3,8%); dor discreta com edema peniano: em dois casos (3,8%) (Tabela 6).
Não observamos nenhuma complicação relacionada à prótese. Não houve perda do implante por infecção, erosão ou qualquer acidente.
Todos os pacientes incluídos no estudo já ultrapassaram três meses, superando o período para perda do implante.
O tempo decorrido desde o início deste protocolo foi de sete anos, com dois casos (3,8%) operados no início deste período, acima de cinco e até seis anos, dez casos (18,9%); acima de quatro e até cinco anos, onze casos (20,7%); acima de três e até quatro anos, dez casos (18,9%); acima de dois e até três anos, três casos (5,6%); acima de um ano e até dois anos, dez casos (18,9%); e menos de um ano, sete casos (13,2%) (Tabela 7).
Ressaltamos que 33 casos (62,3%) têm acima de três anos decorridos do ato operatório e 36 casos (67,9%) acima de dois anos.
Na terceira parte, foi analisado o resultado estético e funcional. Esta análise foi realizada ao final do terceiro mês, para permitir decorrer o tempo necessário para as devidas adaptações ao manuseio e uso da prótese.
Com relação à estética, houve satisfação por parte da maioria dos pacientes (51 em 53 ou 96,2%). Nos dois pacientes (3,7%) restantes, houve queixa de discreta diminuição do tamanho e calibre do pênis, devido à fibrose existente nos corpos cavernosos, seqüela de doença de Peyronie. Nesses casos, não foi possível a colocação de uma prótese que restaurasse a dimensão original do pênis, anterior a doença, mas conseguiu-se o restabelecimento funcional e estético do mesmo, comprometido pela curvatura incapacitante.
No tocante ao resultado funcional, houve manifestação de todos os pacientes como capazes para o coito. Viram-se, então, aptos para manter uma relação sexual, após penetração normal, restabelecendo sua condição física e psicológica de parceiro sexual.
DISCUSSÃO
Uma complicação infecciosa ou uma erosão por supra-dimensionamento no implante de prótese peniana constituem situação desastrosa, sendo as principais causas de falha cirúrgica, variando de menos de 1% a 17%.
A aderência de bactérias às próteses e biomateriais foi descrita primeiramente entre os dispositivos vasculares e ortopédicos. Aquela aderência é decorrente da habilidade desses organismos de produzirem uma matriz extracelular, composta por polissacarídeos, que serve como uma estrutura que estabiliza a colônia bacteriana, servindo como nutriente e criando uma barreira que impede a ação das defesas orgânicas e antibióticos9-11. A prótese peniana provou não ser uma exceção12.
A prevenção do processo infeccioso é, sem dúvida, a medida mais importante numa operação com uso de prótese e cada autor adota medidas diferentes para essa prevenção13-18. Não foram encontradas juntas todas as medidas preventivas propostas pelos autores, em um mesmo protocolo, como foi desenvolvido dentro do objetivo principal deste trabalho. Lynch et al. (1994)8 propuseram protocolo com oito medidas anti-sépticas preventivas, reduzindo a perda do implante de 12,2% para 1,6% (p<0,05). Na antibioticoprevenção, foram encontradas as seguintes variações: Carson19 e Chodak20 propuseram administrar antibiótico num esquema que permita haver um nível sangüíneo adequado no momento do implante da prótese e que, potencialmente, é o momento da contaminação, sendo mantido por 36 horas a 72 horas no pós-operatório, permitindo passar o período da colonização bacteriana. Small et al.2 usaram tobramicina e dociclina parenteral, por quarenta e oito horas, irrigando a prótese no transoperatório com polimicina. Narayan & Lange21 usaram aminoglicosídeo, iniciando-o doze horas antes da cirurgia. Furlow22 propôs cefalosporina ou ampicilina oral. Thomalla et al.23 usaram aminoglicosídeo associado à tetraciclina, irrigando com cefalotina ou canamicina/bacitracina, numa série de cento e setenta e três pacientes. Scott16 usou cefalosporina de primeira geração, bem como penicilina, penicilinase-resistente. Mulcahy24 usou fluorquinolona, Stanisic et al.25 usaram cefalosporina e gentamicina e irrigaram a prótese e os corpos cavernosos com uma solução salina contendo gentamicina. Lynch et al.18 usaram cefuroxima e metronidazol por 48 horas e irrigaram as próteses com gentamicina.
As bactérias Gram-positivas, das quais os Staphylococcus (50%), principalmente epidermidis (39%), possivelmente devido à produção da matriz extracelular, são os organismos mais freqüentemente identificados nas infecções periprotéticas23,26. Outras bactérias Gram-negativas como Proteus, Pseudomonas, Corynebacterium, Escherichia coli, Serratia e Enterobacter, entre outras, algumas também capazes de produzir uma matriz, são identificadas em menor número de casos e, com freqüência, em infecção urinária em paraplégicos e diabéticos28. Estes dados mostram que a prevenção com antibióticos deve não só ser efetiva contra essas bactérias, como também deveriam os mesmos ser escolhidos de acordo com a sua concentração no nível do tecido cavernoso, informação infelizmente disponível em número reduzido de estudos com antibióticos. Estudo conduzido por Walter et al. (1992)28, com vancomicina, gentamicina e aztreonam, mostrou que o primeiro antibiótico apresenta nos corpos cavernosos uma concentração inibitória acima da mínima legal, para Staphylococcus epidermidis e aureus, e os dois outros atingem esta concentração em 90% e 75% dos pacientes para Pseudomonas, respectivamente. Outros estudos, com maior número de pacientes e uma variedade de outros antibióticos, devem ser realizados, para se chegar à conclusão de qual seria a prevenção ótima, no implante de prótese.
Em todos os pacientes (100%) do presente estudo, foi usada associação de cefalotina, sulfato de amicacina e fosfato de clindamicina, por via endovenosa, durante 48 horas, irrigando-se as próteses e os corpos cavernosos, no transoperatório, com solução salina de gentamicina mais rifamida, visto que os autores consultados não conseguiram combater as infecções em 100% dos pacientes operados por eles. Por mais cinco dias, após a alta, foi administrada fluorquinolona, por via oral, de acordo com vários autores, não existindo, entretanto, dados que comprovem o valor desta prevenção oral13,15,18.
O que motivou a adotação desse esquema foi o fato desta associação, cobrir maior número de bactérias.
Como se trata de experiência clínica esta é, portanto, biológica e imprevisível ao longo do tempo, mas até então, foi obtido resultado favorável em todos os pacientes tratados.
Não existe consenso entre os autores de qual é a melhor via de acesso para implantar a prótese peniana, sendo usadas as incisões perineal, penoescrotal, peniana e infraúbica29-32. A incisão usada em todos os 53 (100%) pacientes desta série foi a penoescrotal. Ela permite abordar medialmente os corpos carvernosos, fazer sua dilatação e sua medição, sob visão direta, facilitando a inserção da prótese e permitindo uma cicatriz imperceptível na rafe.
No atual estudo, o tempo médio de operação foi de 38,5 minutos, sendo que, em 47,1% das vezes, foi menos de 30. Na literatura, não há descrição e preocupação com este tempo, contudo, acredita-se ser importante, devendo ser o menor possível, em função de medidas preventivas. O período de internação, em 83% dos pacientes desta série, foi de 48 horas, com os mesmos internando-se duas horas antes da operação, evitando-se assim, a mudança da flora normal, Gram-positiva da pele sensível a antibióticos, pela flora hospitalar resistente aos mesmos. A maioria dos autores mantem uma internação de vinte e quatro a quarenta e oito horas, e raramente, em casos selecionados, em regime ambulatorial4,33.
Na presente série, não houve perda de implantes e as complicações ocorridas foram menores, não comprometendo o ato operatório ou o pós-operatório. Dor e edema em conseqüência do trauma cirúrgico foram as complicações mais freqüentes.
Na literatura, não há relato semelhante e as complicações menores, já que não comprometeram os resultados, não são relacionadas em nenhum trabalho. Entretanto, relacionam-se complicações graves, provocando a perda do implante, tais como necrose da glande e do corpo cavernoso, fístula uretral e sepse17,34.
Existe grande controvérsia na literatura com relação aos fatores de risco para infeção da prótese peniana, havendo evidências de que este risco é significativamente maior quando o tempo de operação é longo, nas reoperações e em pacientes paraplégicos35. Nos diabéticos, a literatura mostra taxa muito variável de infecção, possivelmente devido a diferenças no controle metabólico desses pacientes, mas vários estudos mostram não haver diferença significante da taxa de infecção desses pacientes em relação aos não-diabéticos6,23,36,37.
A maioria das infecções ocorre nos primeiros três meses após a cirurgia e os 53 (100%) pacientes, da presente série, já ultrapassaram este período. Contudo, Carson & Roberson (1988)7 e Kabalin & Kessler (1988)5 relataram casos de contaminação hematogênica tardia da prótese, inclusive em pacientes com bacteriemia após manipulação dentária38.
É também muito variável na literatura o grau de satisfação com o resultado cirúrgico, havendo seis artigos que abordam este aspecto (Fallon & Ghanen, 199039; Gertenberger et al., 197940; Goldstein et al., 199341; Krauss et al., 198942; McLaren & Barret, 199243 e Pedersen et al., 198844). Sob a visão do paciente, encontramos uma variação destas satisfações de 56% a 85,1% e da parceria, de 60% a 80% após o implante peniano, sendo que a maioria dos autores refere-se a prótese inflável. É relevante o relato de Krauss et al. (1989)42 que, numa análise de satisfação com a prótese maleável, encontrou resposta positiva em 75% dos pacientes e em 54,5% das parceiras, mas, surpreendentemente, 92% dos mesmos repetiriam a operação, com 90% de aprovação das parcerias. Benson et al., (1985)45, numa avaliação da prótese de Jonas, também maleável, encontraram 87% de aprovação. Na presente série, também com prótese maleável, encontramos 96,2% de satisfação do ponto de vista funcional. Esse resultado foi creditado a uma seleção adequada dos pacientes, informados antecipadamente dos benefícios e das limitações da prótese. Isso foi realizado por meio de uma entrevista, usando-se fotos ilustrativas, uma prótese como modelo para o paciente manusear, e um vídeo. Este último mostrava um paciente com a prótese ajustada para a relação sexual, e após, em repouso, com e sem roupa. Esse procedimento permite aos pacientes terem uma idéia bastante real do resultado cirúrgico; diminuindo a expectativa, às vezes errônea, principalmente com relação ao calibre e tamanho do pênis, bem como ao seu aspecto estético.
A análise desses dados, comparados com a literatura, mostram que o pré-operatório com adequada seleção e orientação dos pacientes e um rigoroso e completo esquema de medidas anti-sépticas, aliadas a um transoperatório bem planejado e cuidadoso, pode levar a resultados melhores que os da literatura, atingindo o objetivo de ausência de perdas de implante, com o grau de satisfação quase completo por parte dos pacientes. Todavia, mais pesquisas serão necessárias para que se estabeleça um esquema ótimo de antibioticoprevenção e se determine quais medidas anti-sépticas são realmente importantes, e quais são dispensáveis para este fim.
CONCLUSÃO
Após análise da experiência clínico-cirúrgica com o implante de próteses penianas maleáveis com pontas moles e infláveis, para tratar da disfunção erétil, concluiu-se que:
a adequada seleção e orientação dos pacientes, com um pré-operatório cuidadoso, são importantes para que os mesmos tenham uma expectativa adequada do resultado funcional e estético da operação, obtendo um alto grau de satisfação, com um trans e pós-operatório sem intercorrências; a padronização técnica possibilita um tempo operatório curto e mínima manipulação dos corpos cavernosos, diminuindo a chance de contaminação do implante; medidas anti-sépticas rigorosas, com adequada antibioticoprevenção, foram absolutamente necessárias para não haver contaminação das próteses, impedindo a colonização bacteriana que levaria à perda dos implantes; a permanência hospitalar curta evitou a mudança da flora do paciente e infecção por bactérias resistente à antibioticoprevenção executada; a padronização dos métodos anti-sépticos e da técnica operatória favoreceu a obtenção de casuística, até então sem infecção, erosão da albugínea e perda de implante.
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Artigo elaborado a partir da dissertação de Mestrado realizada no Programa de Pós-graduação em Cirurgia da Faculdade de Medicina da UFMG.
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