ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Infecções congênitas por herpes-vírus
Congenital herpes virus infections
Andrea Lucchesi de Carvalho1; Lêni Márcia Anchieta2; Roberta Maia de Castro Romanelli3
1. Médico Pediatra. Mestre. Hospital João Paulo II, Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG). Prefeitura de Belo Horizonte (PBH). Grupo de Infectologia Pediátrica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Médica Pediatra. Doutora. Professora Adjunta I do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG. Unidade Neonatal de Cuidados Progressivos do Hospital das Clínicas da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Médica Pediatra. Doutora. Professora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG. Grupo de Infectologia Pediátrica do Hospital das Clínicas da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
Roberta Maia de Castro Romanelli
E-mail: rmcromanelli@ig.com.br
Recebido em: 13/05/2013
Aprovado em: 28/05/2014
Instituição: Grupo de Infectologia Pediátrica do Hospital das Clínicas da UFMG Belo Horizonte, MG - Brasil
Resumo
As infecções congênitas por herpes-vírus apresentam alta prevalência ou são responsáveis por alta morbimortalidade de recém-nascidos. Nesta revisão estão abordados o herpes-vírus simplex, o vírus Varicela zoster e o citomegalovírus como agentes de infecções em gestantes, feto e recém-nascidos, incluindo medidas para profilaxia da transmissão vertical e recomendações para propedêutica e terapêutica do binômio mãe e filho.
Palavras-chave: Herpes Simples; Herpes Zoster; Citomegalovírus; Transmissão Vertical de Doença Infecciosa.
INTRODUÇÃO
Durante a gravidez a gestante pode ser exposta a inúmeros agentes infecciosos (vírus, bactérias, protozoários e fungos) que, quando acometem o feto, podem ser importante causa de morbimortalidade perinatal. A criança pode ser infectada durante a vida intrauterina (infecções congênitas), durante o parto ou nas primeiras semanas de vida (infecções perinatais).1
As infecções congênitas mais frequentes são toxoplasmose, sífilis, vírus da imunodeficiência adquirida, rubéola, citomegalovírus (CMV) e vírus herpes simples (VHS). Os vírus estão frequentemente envolvidos nas infecções congênitas e o maior grupo patogênico para o homem pertence à família do vírus herpes. Pelas publicações nacionais, pode-se estimar a incidência de algumas infecções congênitas/perinatais no Brasil (infectados/nascidos vivos), como citomegalovirose (26/1000)2 e herpes simples (1/5000)1.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo de revisão em que foi realizada busca em bases de dados da literatura médica (National Library of Medicine - PubMed-MEDLINE; Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde - LILACS; Scientific Eletronic Library Online - SCIELO), além de referência de órgãos de saúde (Center for Diseases Control and Prevention e Food and Drug Administration). Os seguintes descritores foram utilizados: herpes simples; herpes zoster; varicela, citomegalovírus; transmissão vertical de doença infecciosa.
ABORDAGEM DAS PRINCIPAIS INFECÇÕES CONGÊNITAS POR HERPES-VÍRUS, HERPES SIMPLEX VÍRUS (HSV), HERPES-VÍRUS 1 E 2
Embora rara, com prevalência em torno de 1% de transmissão, a infecção congênita pelo herpes simplex leva à alta morbimortalidade do recém-nascido. As manifestações podem ser mucocutâneas, neurológicas ou disseminadas (Figura 1). As formas disseminadas ocorrem em 50% dos casos e apresentam 30% de mortalidade. Quando há acometimento do sistema nervoso, isoladamente ou em formas disseminadas, há probabilidade de anormalidades neurológicas ou sequelas em mais de 70% das crianças acometidas.3-5 A infecção pode ocorrer em forma primária, mas também em recorrências com menos frequência. A correlação com algumas cepas e a transmissão ocorre principalmente pelo tipo II, mas infecção pelo tipo I, em formas agudas, já foram relatadas. A transmissão também está relacionada à excreção viral no trato genital.5,6
Via de parto
O parto cesáreo é indicado para pacientes com manifestações clínicas e ativas ou pródromos no momento do parto, embora não elimine completamente o risco de transmissão, e deve ser realizado, preferencialmente, de forma eletiva se há ruptura de membranas em menos de quatro horas.5,7-9 Há autores que recomendam a realização da cesárea se a infecção primária ocorreu nas últimas quatro a seis semanas de gestação, devido à replicação viral e produção de anticorpos insuficiente para proteção do recém-nascido.10
Diagnóstico
Toda gestante ou parturiente deve ser investigada quanto à história de doença prévia e deve ser realizado exame físico para detecção de lesões ativas.5,9 Atualmente, o Center for Diseases Control and Prevention11 recomenda a sorologia em pacientes sintomáticas, embora não seja recomendada pelas diretrizes brasileiras. A história e orientações são determinantes para conduta e prevenção e alguns autores orientam à realização de testes sorológicos para triagem e testes virológicos e moleculares para o diagnóstico6. Gestantes com diagnóstico do primeiro episódio no primeiro trimestre de gestação podem ser seguidas com culturas, testes moleculares ou pesquisa de antígenos, com o objetivo de identificar replicação viral para contribuir na decisão sobre a via de parto10. A sorologia para HSV 1 e 2 também pode ser solicitada para a parturiente se disponível na maternidade.12
Apesar da cultura viral ser o método de mais sensibilidade, a reação em cadeia de polimerase (PCR) é a técnica indicada para o diagnóstico em espécimes do recém-nascido, especialmente em liquor e também em sangue. Material de superfície como conjuntiva, mucosa oral, nasofaringe e reto, além de lesões cutâneas, também pode ser obtido.11,12 O recém-nascido exposto deve ser observado por sete a 14 dias, que se refere ao período de incubação do vírus. A conduta diagnóstica para o recém-nascido pode ser estratificada de acordo com a sintomatologia e resultado da propedêutica, apresentada na Tabela 1.3,5,9,12-14
Tratamento
Gestante
O primeiro episódio de infecção em gestante deve ser tratado especialmente no terceiro trimestre de gestação e quando há evolução para parto vaginal, devido a elevadas taxas de transmissão vertical, em torno de 50%.5,10,12 Os esquemas terapêuticos e de profilaxia citados na literatura4,10-14 encontram-se na Tabela 2.
Embora não sejam drogas de escolha para a gestação, a experiência não tem demonstrado eventos adversos fetais ou neonatais, sendo que a maior experiência é com aciclovir. No entanto, durante a amamentação, apenas o aciclovir e o valaciclovir são descritos como seguros. Pacientes com herpes disseminado devem utilizar medicação endovenosa ou pode ser utilizada terapia endovenosa (10 mg/kg/dose de 8/8 horas) por dois a sete dias, com manutenção de tratamento oral até completar 10 dias. Os episódios de recorrência também podem ser tratados com esquemas de cinco dias.5,7,9
Há relato de utilização de profilaxia com aciclovir após 36 semanas para gestantes com manifestações recorrentes. No entanto, o efeito da profilaxia reduz de forma significativa a recorrência das lesões e a eliminação viral, embora a eficácia da redução da transmissão vertical para o recém-nascido ainda não esteja esclarecida7,10,15. Casos de ruptura prematura de membranas e conduta expectante com uso de aciclovir também já foram descritos.5
Recém-nascido
O tratamento do recém-nascido deve ser realizado com aciclovir, de acordo com a forma de manifestação clínica. Além disso, pacientes que apresentem pesquisa de PCR viral positiva também devem ser tratados devido à rápida progressão e à gravidade da doença. A dose e o tempo são definidos de acordo com o forma clínica da infecção e a história de recorrências4,6,11-13 e as recomendações encontram-se na Tabela 3.
Alguns autores indicam o início do tratamento empírico de recém-nascidos por parto vaginal de mãe com primoinfeccão, especialmente prematuros e se houver ruptura de membranas acima de quatro a seis horas, independentemente de sintomas. Se a pesquisa de PCR viral for negativa, pode-se suspender o medicamento.11,12
White et al.14 referiram, ainda, a persistência de PCR para HSV positiva em liquor após 21 dias de tratamento e necessidade de continuidade. Há, portanto, recomendação de repetição do PCR em liquor em casos de acometimento do sistema nervoso central após 21 dias de tratamento e suspensão do aciclovir apenas quando negativo.12
A literatura registra poucos casos em que há recorrência de lesões após suspensão do tratamento9,10,16. Terapia supressora com aciclovir (300 mg/m2/dia de 8/8h) pode ser utilizada; é recomendada após primeiro episódio de recorrência e deve ser mantida por períodos de seis meses a um ano, pois há evidência de melhor evolução neurológica.4
Aleitamento
A mulher com lesões herpéticas durante o período de aleitamento deve seguir precauções-padrão com higienização das mãos e cobertura das lesões até que estejam em fase de crosta e o aleitamento não esteja contraindicado. Se as lesões forem na mama, o recém-nascido não deve amamentar até a resolução das lesões, mas o aleitamento deve ser mantido em mama não afetada.11
VARICELLA ZOSTER VIRUS (VZV) - HERPES-VÍRUS 3
Durante a gestação, o feto pode ser infectado pelo Varicella zoster virus (VZV) por transmissão transplacentária, mas o recém-nascido também pode ser acometido pelo contato com lesões vesiculares ou secreções respiratórias maternas.17
A infecção fetal ocorre, geralmente, durante infecção primária, ou seja, varicela. A viremia em reativação como o zoster é rara e está relacionada a pacientes com imunossupressão.17-19 A maioria das infecções não apresenta manifestações, mas pode ocorrer infecção fetal, com zoster na infância.20
O primeiro relato de lesões fetais pelo varicela zoster ocorreu em 1947, chamada síndrome de varicela congênita (SVC).21 Posteriormente, outras publicações revelaram que o risco de acometimento fetal está relacionado à menor idade gestacional, ocorrendo principalmente em oito a 20 semanas de idade gestacional, mas há raros que descrevem casos de até 30 semanas.19,22-25 A prevalência da doença fetal é baixa, sendo inferior a 1% nos dois primeiros trimestres, quando é mais frequente.20
Embora o acometimento fetal seja raro, as lesões são graves, com reativações que levam retração em dermátomos acometidos, injúria do aparelho locomotor e do sistema nervoso central, além alta mortalidade.17,18 A baixa resposta imune pode favorecer a disseminação e lesões nos tecidos acometidos.20
Além da transmissão intrauterina que pode levar à SVC, pode ocorrer transmissão no periparto, chamada varicela congênita ou perinatal. Isso ocorre quando a mãe exibe lesões entre cinco dias antes e dois dias após o parto e o recém-nascido manifesta alto risco de evoluir com doença grave, pois não há produção e passagem de anticorpos para o feto.19,20,26
Diagnóstico
A varicela é uma doença exantemática papulovesicular, de evolução típica e permite o diagnóstico clínico. No entanto, pode haver necessidade de esclarecimento por sorologia (IgM por ELISA ou titulação por FAMA). Pesquisa do vírus por PCR DNA ou anticorpos monoclonais pode ser realizada em secreção de lesões e outros materiais.20,27
Profilaxia e tratamento
A profilaxia com imunoglobulina11,17,20,28 após exposição ou tratamento caso a gestante evolua com manifestações clínicas16,19,26 está indicada pelo risco de doença grave e pneumonia pelo vírus, que aumenta 25 vezes, e a mortalidade alcança taxas de 20 a 45%. Não se tem comprovação do beneficio quanto à prevenção da infecção e/ou doença fetal. No caso dos recém-nascidos, a profilaxia está indicada se a mãe apresentou doença próxima do parto (cinco dias antes e dois dias após), com o objetivo de reduzir risco de doença grave. Além disso, recém-nascidos prematuros menores de 28 semanas, independentemente da história materna, e acima de 28 semanas, sem história materna de varicela prévia, devem receber imunoglobulina se forem expostos10,27,28. O aciclovir deve ser indicado para aqueles recém-nascidos que, apesar da indicação de imunoglobulina, evoluíram com doença, pois há probabilidade de doença neonatal grave27. A conduta com a gestante e o recém-nascido expostos ao Varicella zoster ou que tenham evoluído com doença clínica está apresentada na Tabela 4.
Considera-se que a imunoglobulina específica seja eficaz para o recém-nascido de mães com doença manifestada cinco dias antes a dois dias após o parto, mas devem ser levadas em consideração precauções de contato e respiratórias até que as lesões estejam em fase de crosta, o que ocorre entre cinco e sete dias de evolução da doença.20,27
Se no momento da alta for identificado irmão ou contatante domiciliar com a doença, deve-se considerar a evolução para fase de crosta das lesões, mas devem-se avaliar a história materna e o uso de profilaxia. Se a mãe tem história prévia ou sorologia positiva, deve-se liberá-la para casa com o recém-nascido. Se a mãe não apresentar história prévia e tiver sorologia negativa, pode ser administrada imunoglobulina para mãe e recém-nascido antes da alta.27
Nenhuma conduta está definida para a varicela neonatal adquirida após o parto, ou seja, com exposição pós-natal e que a doença se manifeste após o 10º dia de vida. Nesses casos, geralmente, a evolução é mais benigna, especialmente se a mãe tem história prévia com possibilidade de transferência de anticorpos.27
Aleitamento
O aleitamento não deve ser permitido para mulheres com lesões ativas, para evitar contato e transmissão do VZV ao seu recém-nascido. No entanto, o leite materno deve ser ordenhado e oferecido à criança. Além disso, a mãe com indicação deve receber imunoglobulina específica. A vacinação de puérperas como profilaxia após contato também pode ser considerada.11,27
CITOMEGALOVIRUS (CMV) - HERPES-VÍRUS 4
O citomegalovírus (CMV) é o agente mais frequente de infecção congênita no homem, ocorrendo em 0,2-2,2% de todos os nascidos vivos.29 Sua prevalência, na população geral, aumenta com a idade, sendo influenciada pela localização geográfica, fatores culturais e socioeconômicos. Nos países em desenvolvimento, 80% da população adquirem a doença até os três anos e praticamente todos já foram infectados na fase adulta, enquanto nos países desenvolvidos essa taxa é de 40-60%.30
O CMV é um vírus DNA, da família Herpesviridae, caracterizado pela capacidade de manter-se replicando por longos períodos ou manter-se em latência. É excretado em diversos sítios (sangue, urina, leite, saliva, sêmen, secreção cérvix uterino e outros), possibilitando diversas formas de transmissão. Fômites também podem ter papel na transmissão, pois tem sido demonstrado que o CMV mantém infectividade por horas em superfícies plásticas. A transmissão vertical ocorre por via transplacentária (infecção congênita), pelo canal de parto ou através do leite materno (infecção perinatal). A transmissão horizontal é resultado do contato com secreções contendo o vírus, geralmente saliva ou urina, sendo a via sexual também possível entre jovens e adultos sexualmente ativos. A infecção pode ainda ser transmitida iatrogenicamente por transfusão sanguínea ou transplante de órgãos. A excreção viral é prolongada; aproximadamente metade dos infectados por transmissão congênita apresenta virúria por seis anos.29
Ao contrário da rubéola e toxoplasmose, a citomegalovirose congênita pode ocorrer tanto após a infecção primária materna quanto após recorrência da infecção (reativação ou reinfecção). Existe expressivo número de cepas do CMV, semelhantes entre si, de modo que a primoinfecção pode fornecer imunidade parcial contra as outras cepas, proporcionando menos transmissão intrauterina e baixo risco de infecção fetal grave no caso de reinfecção31.A maioria das crianças acometidas é assintomática e 10 a 15% apresentam sequelas em longo prazo.32 O fluxograma da Figura 2, adaptado de Raynor33, esquematiza as possíveis evoluções clínicas da doença.
Manifestações clínicas
As manifestações clínicas podem ser agudas (forma sintomática) ou tardias (sequelas). Metade dos neonatos sintomáticos apresenta as formas mais graves, conhecidas como "doença da inclusão citomegálica" (Figura 3A), caracterizada por icterícia, hepatoesplenomegalia, petéquias, microcefalia, coriorretinite e calcificações cerebrais (Figuras 3B e 3C). Outros achados incluem prematuridade, crescimento intrauterino restrito, aumento das transaminases, trombocitopenia, hiperproteinorraquia e evidências de hemólise. Os demais neonatos possuem esses sintomas isoladamente ou em várias combinações. As principais sequelas encontradas são as neurológicas e as auditivas, ocorrendo mesmo em crianças assintomáticas ao nascimento.30-32
O CMV é a causa mais comum de perda auditiva neurossensorial não hereditária em crianças.33-36 Estudo com 190 crianças sintomáticas demonstrou que petéquias e crescimento intrauterino restrito são fatores de risco independentes para perda auditiva e que o envolvimento do sistema nervoso central ao nascimento não prediz perda auditiva.34
Noyola et al.35 concluíram, em estudo com 41 crianças sintomáticas, que microcefalia ao nascimento é o preditor mais específico de déficit cognitivo em crianças sintomáticas e que a combinação de tomografia computadorizada de crânio (TC) e perímetro cefálico normais implicam bom prognóstico cognitivo.
Diagnóstico
Pré-natal
A pesquisa do CMV não faz parte do screening sorológico realizado no pré-natal de muitos países, incluindo o Brasil. O vírus está amplamente distribuído no ambiente e a maioria das primoinfecções ocorrem ainda na infância, com baixa morbidade fetal e ausência de terapia efetiva para a gestante. Embora não seja recomendado em ações de saúde pública, o screening para CMV na gravidez tem sido sugerido por alguns autores37,38, como mostra a Tabela 5.
Pós-natal
O diagnóstico do recém-nascido deve ser realizado o mais precocemente possível, preferivelmente antes de duas a quatro semanas. Após três semanas de vida, é difícil diferenciar infecção intrauterina de perinatal, a menos que manifestações como coriorretinite e ventriculite estejam presentes.11 Os exames propostos para definição etiológica da infecção estão apresentados na Tabela 6.
Além da propedêutica para confirmação do diagnóstico, a investigação de acometimento de orgãos-alvo deve ser realizada, incluindo hemograma, função hepática, ultrassonografia transfontanelar (se necessário, tomografia computadorizada de crânio), fundoscopia e audiometria. Os RNs com confirmação do diagnóstico e evidência de acometimento desses orgãos devem ser submetidos a exame de liquor (com rotina e pesquisa de PCR para CMV no liquor para avaliar acometimento de sistema nervoso central). A decisão terapêutica deve considerar o acometimento desses orgãos.11,29-32
Tratamento
Atualmente, o tratamento da infecção congênita pelo CMV tem sido indicado para crianças sintomáticas identificadas no primeiro mês de vida. O antiviral utilizado é o ganciclovir, um análogo da guanosina com estrutura similar ao aciclovir, porém com ação 30 vezes mais ampla que este contra o CMV. Vários trabalhos têm sido realizados, porém, doses e tempo de tratamento ainda continuam em investigação.11 Alguns estudos revelaram benefício do tratamento devido à parada de progressão da perda auditiva.39-41 Sabe-se que o ganciclovir diminui ou impede a multiplicação viral e inibe sua disseminação, entretanto, após descontinuação da terapia há reinício da replicação viral, por isso o tratamento de manutenção tem sido questionado com valganciclovir.39
Em geral, o ganciclovir é bem tolerado, eventualmente apresentando náusea, vômito e cefaleia com a administração. O principal efeito adverso é a mielotoxicidade, necessitando de monitorização com hemograma, íons, função renal e hepática em dias alternados durante a indução e semanalmente na manutenção.41 A Tabela 7 apresenta os critérios de inclusão e exclusão de tratamento, além de recomendações orientações para administração da droga e controle laboratorial do tratamento.11,32,36,40,-42
Ressalta-se que estudos têm sido conduzidos com uso de imunoglobulina hiperimune específica em gestantes infectadas e avaliação do acometimento e sintomatologia do feto e recém-nascido.44-46
Aleitamento
O aleitamento materno é permitido. Embora exista a preocupação em transmissão do CMV pelo leite materno para prematuros abaixo de 32 semanas ou menores de 1.500 g, são poucos os casos relatados de recém-nascidos com aquisição perinatal do vírus que evoluíram com doença sintomática aguda (com manifestações de disseminação, ressaltando-se plaquetopenia, neutropenia, acometimento hepático e pulmonar), aparentemente sem sequelas. Assim, a suspensão do leite materno não deve ser uma rotina, devido aos benefícios do aleitamento, mas é uma conduta a ser considerada em casos de doença aguda materna confirmada e se o recém-nascido apresentar alto risco de doença. O leite materno pasteurizado pode ser utilizado nesses casos.11,27
CONCLUSÃO
Ressalta-se a importância da prevenção e do diagnóstico precoce das infecções por herpes-vírus na gestante e do recém-nascido para permitir investigação de órgãos-alvo acometidos e tratamento específico quando indicado. A utilização de reação em cadeia de polimerase para esses vírus tem sido amplamente utilizada em diversos espécimes clínicos, com alta sensibilidade e especificidade e devem ser incluídas na investigação diagnóstica.
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