ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Caso 15
Case 15
Victor Bilman1; Renata Marcos Bedran2; Renato Gomes Campanati1; Thais Salles Araújo1; Júlio Guerra Dominguesi1; Hercules Hermes Riani Martins Silva1
1. Acadêmico(a) do Curso de Medicina na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Médica. Pneumologista Pediátrica. Mestre. Preceptora da Residência de Pneumologia Pediátrica, Membro da equipe de Fibrose Cística, Coordenadora do Pronto-Atendimento Pediátrico e Plantonista do Pronto-Atendimento do Hospital das Clínicas da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
Victor Bilman.
E-mail: vbilman@gmail.com
Recebido em: 10/04/2014
Aprovado em: 15/08/2014
Instituição: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais Belo Horizonte, MG - Brasil
CASO
Paciente do sexo feminino, oito anos, comparece ao PA do HC-UFMG com quadro de febre, tosse produtiva, vômitos e dispneia com sete dias de evolução. Ao exame físico, apresentava baqueteamento digital, esforço respiratório, SatO2 de 67% em ar ambiente, crepitações bilaterais e difusas. Paciente em acompanhamento no ambulatório de pneumologia pediátrica, com culturas prévias de secreção de orofaringe positivas para Staphylococus aureus sensível à oxacilina (OSSA), Burkholderia cepacea e Stenotrophomonas maltophilia.
Com base na história clínica e nas imagens, o diagnóstico mais provável é:
a. discinesia ciliar primária;
b. bronquiolite viral aguda;
c. fibrose cística com exacerbação pulmonar;
d. bronquiolite obliterante.
ANÁLISE DA IMAGEM
DIAGNÓSTICO
Em pacientes com fibrose cística (FC), a exacerbação pulmonar pode se manifestar com tosse, aumento de expectoração, mudança da cor da secreção, redução do peso, hiporexia e febre. Podem ser auscultados sibilos, crepitações e roncos difusos.
Na discinesia ciliar primária, o paciente apresenta história de infecções de repetição do trato respiratório, otite média, bronquite e rinossinusite, devido à alteração genética no transporte mucociliar. A síndrome de Kartagener é a manifestação genética clássica da doença.
A bronquiolite viral aguda (BVA) é uma infecção de etiologia viral, prevalente até os dois anos de vida, manifestando-se predominantemente em lactentes com idade inferior a seis meses. Há acometimento inicialmente de via aérea superior, progredindo para a via aérea inferior em poucos dias. O diagnóstico é clínico e a infecção é autolimitada. Por se tratar de um quadro viral, a BVA pode recidivar.
A bronquiolite obliterante é uma síndrome de obstrução crônica do fluxo aéreo associada à lesão inflamatória das pequenas vias aéreas. Em crianças, na maioria das vezes, é precedida por infecção de vias aéreas inferiores, principalmente por adenovírus, e cursa com febre, tosse, sibilos e taquipneia.
DISCUSSÃO DO CASO
A FC é doença autossômica recessiva crônica e progressiva que acomete as glândulas exócrinas de múltiplos órgaos. A tríade de características clínicas consiste em infecções pulmonares de repetição, insuficiência pancreática e déficit de crescimento. Não há cura para a doença, mas medidas de suporte são necessárias para retardar a evolução do dano pulmonar.
O teste padrao-ouro para diagnosticar pacientes com FC é o teste do suor. Níveis de cloro superiores a 60 milimoles por litro, em duas dosagens, associados a quadro clínico característico indicam que a pessoa é portadora da doença. Após o diagnóstico, é iniciado o acompanhamento ambulatorial multidisciplinar com pneumologista, gastroenterologista, enfermeiro, nutricionista e fisioterapeuta.
O acometimento pulmonar é o grande responsável pela morbidade. Assim, em toda consulta é realizada a análise de cultura de via aérea com aspirado traqueal, swab de orofaringe ou escarro desses pacientes, visando à identificação de bactérias potencialmente patogênicas, como Pseudomonas aeruginosa (PA), Staphylococcus aureus sensível ou resistente à oxacilina (OSSA e ORSA, respectivamente), Haemophilus influenzae (HI) e complexo Burkholderia cepacia (BCC). A identificação e o tratamento precoces de infecções pulmonares são essenciais para retardar a evolução da doença para bronquiectasia e perda da função pulmonar.
A lesão pulmonar inicial é caracterizada pela dilatação e hipertrofia das glândulas mucosas, seguidas pelo surgimento de metaplasia, de rolhas de muco nas vias aéreas periféricas, alterações ciliares secundárias e infiltrado linfocitário na submucosa. Há evolução para bronquiectasias, com ciclos repetidos de obstrução e infecção. A insuficiência exócrina pancreática caracteriza-se por diarreia crônica, evacuações de fezes volumosas, brilhantes, gordurosas e fétidas. A esterilidade e o baqueteamento digital são outras manifestações clínicas da doença.
A sobrevida vem aumentando ao longo dos anos. Com o diagnóstico precoce pela triagem neonatal, estima-se que a expectativa de vida, que era em média de 35 anos, possa chegar a 50 anos.
ASPECTOS RELEVANTES
a FC é doença autossômica recessiva grave que acomete as glândulas exócrinas de múltiplos órgaos (principalmente pulmoes e pâncreas);
as manifestações clínicas mais comuns são tosse crônica persistente, diarreia crônica e desnutrição;
o diagnóstico é feito pela história clínica e teste do suor positivo;
ainda não existe cura para a fibrose cística;
é importante, durante o acompanhamento ambulatorial, tomar medidas suportivas para retardar a progressão da doença.
REFERENCIAS
1. Bedran R. Avaliação da colonização pulmonar e do estado nutricional em crianças e adolescentes com fibrose cística, antes e após a triagem neonatal [dissertação]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2012.
2. Reis JCF, Damaceno N. Fibrose cística. J Pediatr. 1998;74(1):76-94.
3. Katkin JP. Cystic fibrosis: Clinical manifestations and diagnosis. In: Basow DS, editor. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate; 2014. [Citado em 2014 Feb18]. Disponível em: http://www.uptodate.com/contents/cystic-fibrosis-clinical-manifestations-and-diagnosis
4. Cystic Fibrosis Foundation Patient Registry. Annual data report, 2011. [Citado em 2013 out 13]. Disponível em: http://www.cff.org/UploadedFiles/research/ClinicalResearch/2011-Patient-Registry.pdf
5. Martins M, Neves N, Estanqueiro P, Salgado M. Hipocratismo digital: quando os dedos denunciam. Saúde Infantil. 2009;31(1):18-22.
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