RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 25. (Suppl.4) DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20150055

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Artigo Original

Óxido nitroso a 50% em oxigênio para procedimentos dolorosos pediátricos realizados por não anestesiologistas: uma revisão sistemática da literatura

Nitrous oxide 50% in oxygen for painful pediatric procedures used by non-anestesiologists: a systematic review of the literature

Claudirene Milagres Araújo1; Benigna Maria de Oliveira2; Yerkes Pereira e Silva3

1. Enfermeira. Mestre em Ciências da Saúde e do Adolescente da Universidade Federal de Minas Gerais. Departamento de Enfermagem da Universidade José do Rosário Vellano - UNIFENAS. Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Médica Pediatra. Doutora em Medicina. Professora Associada III do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Médico Pediatra. Doutorado em Ciências da Saúde. Departamento de Anestesiologia do Hospital Lifecenter. Belo Horizonte, MG - Brasil

Endereço para correspondência

Claudirene Milagres Araújo
E-mail: claudirene_milagres@hotmail.com

Instituição: Universidade José do Rosário Vellano - UNIFENAS Belo Horizonte, MG - Brasil

Resumo

OBJETIVO: revisar trabalhos publicados relacionados à utilização do óxido nitroso a 50% em oxigênio da dor durante realização de procedimentos em crianças.
MÉTODO: revisão sistemática dos últimos 43 anos indexados nas bases de dados: MEDLINE (Pub-Med), Cochrane BVS, SciELO e LILACS.
RESULTADOS: foram identificados 399 artigos. Os motivos de exclusão de artigos potencialmente relevantes foram: não utilizar o óxido nitroso em concentração fixa a 50% em oxigênio, não ser ensaio clínico aleatório, estudo sem método específico de avaliação da dor, estudo avaliando outro método analgésico, além da mistura equimolar, associado no mesmo grupo de tratamento. Apenas dois estudos apresentaram qualidade metodológica adequada. Pesquisa avaliou a dor durante injeção intramuscular de Palivizumab, comparando mistura equimolar de óxido nitroso em oxigênio com o anestésico tópico EMLA® isolado e um terceiro grupo com as duas medidas analgésicas associadas. Neste estudo, a mistura equimolar mostrou-se eficaz na redução da dor leve a moderada durante a injeção intramuscular. Outro comparou morfina ao óxido nitroso a 50% em oxigênio durante retirada de dreno de tórax em crianças, demonstrando que a mistura equimolar, quando utilizada em um procedimento que causa dor intensa, não teve resultados superiores à morfina.
CONCLUSÃO: esta revisão mostrou insuficiência de ensaios clínicos com metodologia adequada para avaliação da eficácia da mistura de óxido nitroso em oxigênio a 50%. São necessários novos estudos, realizados em procedimentos que causam dor de diferentes intensidades, para que conclusões mais precisas sejam obtidas.

Palavras-chave: Óxido Nitroso; Analgesia; Dor; Manejo da Dor; Bem-Estar da Criança.

 

INTRODUÇÃO

A literatura médica tem mostrado que crianças e recém-nascidos apresentam resposta à dor similar ou maior que os adultos. Entretanto, as crianças continuam recebendo menor quantidade de analgésicos quando comparadas aos adultos, durante procedimentos dolorosos.1,2

As repetidas experiências dolorosas que as crianças experimentam durante procedimentos executados nas unidades de internação, pronto-atendimento e no atendimento pré-hospitalar para o diagnóstico e tratamento de doenças ainda constituem um problema mundial, apesar da diversidade de técnicas e medicamentos que podem ser utilizados no alívio ou tratamento da dor.2-4

 

REVISÃO DE LITERATURA

A convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança reconhece que a mesma é segmento vulnerável da população e que tem direito a uma atenção especial em todos os aspectos, incluindo a saúde.4 Apesar desse reconhecimento, a prevenção e o alívio adequado da dor ainda não são feitos de forma rotineira, podendo a dor perdurar ao longo da vida dessas crianças, resultando em traumas, atrasos no desenvolvimento e processos depressivos.2,5

Um processo multifatorial contribui para esse subtratamento da dor, sendo que o conhecimento inadequado dos profissionais de saúde sob a percepção da dor pela criança, o medo exagerado dos efeitos colaterais dos analgésicos e anestésicos e a falta de recursos para treinamento das equipes multiprofissionais se destacam entre as suas causas.4

Infelizmente, ainda é possível encontrar na rotina de vários profissionais de saúde métodos inadequados de abordagem da dor em crianças, sendo exemplo a contenção física realizada em procedimentos comuns como punções venosas, cateterismo vesical, sondagens gástricas, punções lombares, aspirações de medula óssea, reparo de lacerações e outros, o que aumenta os sentimentos de insegurança, impotência e desamparo da criança.2,3,6

Entre as diversas medidas analgésicas que podem ser utilizadas durante os procedimentos dolorosos, vários estudos relatam a utilização do óxido nitroso a 50% em oxigênio, como uma medida analgésica eficaz na redução da dor/desconforto em procedimentos moderadamente dolorosos em crianças.2,7 Essa modalidade terapêutica, já bem-estabelecida em outros países, tornou-se recentemente também disponível no Brasil. O uso dessa mistura tem sido usado na Europa por profissionais de saúde não anestesiologistas de maneira rotineira e a literatura tem demonstrado seu perfil de segurança.2

A mistura fixa de óxido nitroso em oxigênio a 50% produz analgesia de início rápido e de curta duração, sem perda da consciência, permitindo a manutenção dos reflexos protetores à via aérea.2,6,8,9 Permite o controle da ansiedade e da dor leve a moderada em procedimentos de curta duração (15 a 30 minutos) sem, na maioria das vezes, a utilização de outros métodos analgésicos associados e necessidade de jejum para os pacientes. O mecanismo de ação mais provável é a inibição dos receptores N-metil D-aspartato (NMDA).4,10,11

A mistura equimolar desses gases é estável e pode ser utilizada em um mesmo cilindro pressurizado. Como a mistura é fixa em 50% de cada gás, não necessita de preparo pré-operatório com jejum e apresenta poucos efeitos adversos e com menos intensidade, sendo uma alternativa eficaz à anestesia geral em crianças durante a realização de procedimentos dolorosos.4,12-14 O uso da mistura de óxido nitroso a 50% em oxigênio requer a cooperação do paciente, pois é administrado por meio de uma máscara, a qual deverá ser fixada à face da criança para evitar o escape do medicamento ou, mais recentemente, com a utilização de uma válvula unidirecional inalatória que deve ser mantida junto à cavidade oral.2,4,12,13

O objetivo desta revisão sistemática é avaliar os trabalhos publicados relacionados à utilização do óxido nitroso a 50% em oxigênio na diminuição da intensidade dolorosa durante a realização de procedimentos dolorosos em crianças.

Estratégia de busca dos artigos

Foram incluídos ensaios clínicos publicados até agosto de 2014, identificados por meio de busca eletrônica realizada no período de agosto e setembro de 2014 nas seguintes bases de dados: MedLINE (PubMed), Registro de Ensaios Clínicos Controlados da Colaboração Cochrane, Scientific Electronic Library Online (Scielo) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs). Os artigos deveriam abordar o efeito analgésico da utilização da mistura equimolar de óxido nitroso em oxigênio a 50% em procedimentos fora do centro cirúrgico em pacientes pediátricos de zero a 16 anos e, ainda, que utilizassem uma escala validada para avaliar a dor durante o procedimento. Os ensaios clínicos deveriam incluir em um dos grupos o óxido nitroso a 50% em oxigênio, que poderia ser comparado com placebo ou com outra medida analgésica. Foram excluídos os estudos que associassem qualquer outra medida analgésica além da mistura equimolar de óxido nitroso em oxigênio a 50% no mesmo grupo de tratamento.

Foram usadas as seguintes palavras-chave: "50% nitrous oxide" and children, "Entonox" and children, "equimolar mixture of N2O and O2" and children, "EMONO" and children, "Nitronox" and children, "Livopan" and children, assim como seus correspondentes na língua portuguesa quando de sua pesquisa na base de dados Scielo e Lilacs. Após a pesquisa eletrônica, as referências bibliográficas dos estudos considerados relevantes foram cuidadosamente revisadas, com o objetivo de se encontrarem outros artigos não localizados na referida pesquisa que poderiam conter os critérios de inclusão.

Seleção dos estudos

Dois autores do presente estudo (CMA e YPS) avaliaram independentemente os resumos identificados. Os estudos potencialmente relevantes foram obtidos na íntegra. A seguir, os mesmos dois revisores, também de forma independente, decidiram quais deles preenchiam os critérios de inclusão e exclusão previamente estabelecidos. Os casos discordantes foram discutidos em uma reunião conjunta, chegando-se a consenso.

Os principais motivos de exclusão de artigos potencialmente relevantes foram: não utilizar o óxido nitroso em concentração fixa a 50% em oxigênio, ensaio clínico não ser aleatório, estudo não possuir método específico de avaliação da dor e sim do comportamento da criança, estudo apresentar outro método analgésico, além da mistura equimolar, associada no mesmo grupo de tratamento.

Depois de aplicados os critérios de exclusão mencionados, a qualidade do método dos estudos foi avaliada pelos mesmos dois revisores, sendo realizada uma nova exclusão de estudos que não preenchessem os critérios estabelecidos como de boa qualidade metodológica.

Avaliação da qualidade dos estudos

A avaliação da qualidade dos estudos também foi realizada por dois revisores (CMA e YPS) de forma independente e os desacordos também foram resolvidos por consenso. A concordância entre os escores assinalados pelos revisores foi avaliada por meio do coeficiente de correlação intraclasse (ICC). O resultado foi classificado de acordo com a escala de concordância entre métodos de avaliação proposta por Shrout.15 Essa escala consiste em cinco categorias: virtualmente sem concordância (<0,1), concordância fraca (0,11-0,40), concordância razoável (0,41-0,60), concordância moderada (0,61-0,80) e concordância substancial (0,81-1,0).15 Os cálculos estatísticos foram realizados utilizando-se o Statistical Package for Social Sciences (SPSS), V.17.0, 2006 (SPSS, Chicago, EUA).

Foram incluídos nesta revisão apenas estudos qualificados como A ou B, segundo os critérios de avaliação do sigilo da alocação do Manual de Colaboração Cochrane.16 De acordo com esse manual, um estudo é classificado como A quando é aleatório e em sua metodologia está relatado adequadamente o processo de alocação; é classificado como B quando o processo de alocação não está descrito, mas o autor menciona no texto que o estudo é aleatório; é classificado na categoria C quando o processo de alocação está descrito, porém apresenta erros de alocação; e finalmente é classificado como D quando os estudos não são aleatórios.

Para avaliar a qualidade do método de estudos potencialmente elegíveis para esta revisão, discriminados na Tabela 1, foi utilizada a escala descrita em 1996 por Jadad et al.,17 "Instrumento de Medida de viés em estudos que reportam dor", em que três respostas devem ser dadas para a metodologia do trabalho:

 

 

o estudo foi descrito como randomizado (isso inclui o uso de palavras como randomizado, randomização, aleatório)?
o estudo é descrito como duplo-cego?
houve descrição das perdas de acompanhamento ou desistências?

A partir de então os itens são quantificados. Cada critério pode receber uma nota de um ponto quando a resposta for positiva (sim) e zero ponto quando a resposta for negativa (não). Não existem notas intermediárias.

Desse modo:

dar um ponto (+1 ponto) adicional se, para a questão de número um, o método de geração da sequência de randomização estiver descrito e estiver apropriado (tabela de números aleatórios, geração computadorizada, etc.);
dar um ponto (+1 ponto) adicional se, para a questão de número dois, o método de cegamento estiver descrito e for apropriado;
subtrair um ponto (-1 ponto) se, para a questão de número um, o método de geração da sequência de randomização estiver descrito e for inapropriado (erro metodológico);
subtrair ainda um ponto (-1 ponto) se, para a questão de número dois, o estudo for descrito como duplo-cego, mas o método de cegamento for inadequado.

Um estudo que relata um ensaio clínico pode, dessa maneira, receber uma nota que varia de zero a cinco.

Estudos com três pontos ou mais são considerados de alta qualidade e aqueles com dois pontos ou menos, de baixa qualidade.(17)

O fluxograma da seleção de artigos para esta revisão sistemática está representado na Figura 1.

 


Figura 1 - Fluxograma da seleção de artigos para a revisão sistemática.

 

RESULTADOS

Foram recuperados pela estratégia de busca 399 artigos. Destes, 147 foram excluídos, pois se repetiam pela utilização dos diferentes descritores e estavam presentes em mais de uma base de dados. Pela avaliação inicial do título e do resumo, 239 artigos foram excluídos dos 252 restantes, seguindo os seguintes critérios de exclusão:

uso do óxido nitroso na concentração em oxigênio diferente de 50%;
associação de outra medida analgésica no mesmo grupo de comparação da mistura equimolar de óxido nitroso em oxigênio a 50%;
avaliação do comportamento e não da dor da criança;
procedimentos realizados dentro do centro cirúrgico com o uso de sistema anestésico para oferecer a mistura de gases;
revisões de literatura.

Foi então classificado como potencialmente relevante o total de 13 artigos.6,10,12,14,18-26

Após a leitura integral dos artigos e aplicação dos critérios de avaliação do sigilo de alocação do Manual de Colaboração Cochrane, três estudos restaram.16

Assim, nesses três estudos foi aplicada a avaliação de qualidade do método,17 conforme descrito na Tabela 1.

A pontuação da qualidade do método dos estudos selecionados variou de dois a cinco. Assim, dos três estudos selecionados um foi excluído por apresentar pontuação inferior a três, sendo considerado de baixa qualidade.17

O resultado da comparação entre os escores assinalados para os estudos pelos dois avaliadores (ICC=0,98, IC95%:0,76;0,99) indica nível elevado de concordância (concordância substancial) na escala de qualificação utilizada.15

A produção de ensaios clínicos randomizados com descrição detalhada utilizando o óxido nitroso em oxigênio a 50% como única medida analgésica é escassa. A busca resultou em apenas dois estudos randomizados,6,20 considerados de qualidade adequada. Eles foram publicados na língua inglesa entre os anos de 2006 e 2008.

Comentários sobre os resultados dos estudos selecionados:

Bruce et al.20 (2006): em estudo-piloto prospectivo, randomizado e duplamente encoberto foram incluídas 14 crianças, com oito semanas a sete anos de vida. A dor foi avaliada com base na escala Children's Hospital of Eastern Ontario Pain Scale (CHEOPS) antes, durante e após a remoção de dreno de tórax. Um grupo de pacientes (n=8) foi randomizado para receber morfina (0,1 mg/kg - máximo de 10 mg) e ar (placebo da mistura equimolar) e outro grupo (n=6) foi randomizado para receber a mistura equimolar (oxigênio e óxido nitroso a 50%) e solução salina (placebo da morfina). A medicação venosa foi realizada 15 minutos antes do início da terapia com o gás. Como desfecho secundário, foi avaliada, por uma enfermeira, a ansiedade da criança por meio de uma escala visual analógica (100 mm) e analisadas as variáveis: pressão arterial, frequência cardíaca, saturação de O2 (SpO2) e efeitos adversos. Os resultados demonstraram que não houve diferenças na pontuação de dor entre os dois grupos antes (p=0,751), durante (p=0,946) ou após a remoção do dreno torácico (p=0,529). A intensidade da dor dobrou em ambos os grupos durante o procedimento, quando comparada com valores prévios (p=0,003). Não houve diferenças nos escores de ansiedade entre os dois grupos antes (p=0,467) ou durante (p=0,267) o procedimento. Entretanto, no grupo que utilizou morfina, os níveis de ansiedade aumentaram significativamente durante o procedimento (p=0,027). Crianças de ambos os grupos apresentaram sedação leve a moderada e não houve diferença estatística entre os dois grupos. Os níveis de SpO2 foram inferiores (p=0,066) no grupo morfina, após a realização do procedimento. Todos os outros sinais vitais de ambos os grupos permaneceram dentro dos limites normais, não sendo observado algum efeito adverso. Os autores concluíram que não houve diferença nos escores de dor, quando comparados os dois grupos, e que crianças que receberam tanto morfina quanto a mistura equimolar sentiram dor moderada a intensa durante a remoção do dreno de tórax. Os autores ressaltaram que a principal limitação do estudo referia-se ao pequeno tamanho da amostra envolvida.
Carbajal et al.6 (2008): os autores realizaram estudo prospectivo, randomizado e duplamente encoberto com o objetivo de comparar a eficácia do creme Eutectic Mixture of Local Anesthetics (EMLA®) com a do óxido nitroso a 50% em oxigênio, utilizado de forma isolada ou associado ao EMLA®, para alívio da dor ocasionada por injeções de Palivizumab (PV). O PV é aplicado por via intramuscular e as injeções são consideradas muito dolorosas. Foram avaliados 55 lactentes, com dois a 12 meses de vida. Cada lactente recebeu três tipos de intervenção, em três momentos diferentes, com intervalo de um mês entre os procedimentos: grupo 1 - EMLA® creme + ar (placebo da mistura equimolar); grupo 2 - óxido nitroso a 50% + placebo do creme; grupo 3 - EMLA® creme + óxido nitroso a 50%. Para avaliação da dor, foi solicitado aos pais e aplicadores que utilizassem a Escala Visual Analógico (EVA) ao término do procedimento. Especialistas treinados analisaram videotapes e avaliaram a dor, com uso da escala Modified Behavioral Pain Scale (MBPS), em dois períodos: a) durante a injeção do PV e retirada da agulha; b) na recuperação (30 segundos após a retirada da agulha). Também foram analisados efeitos adversos (reações cutâneas, vômitos, agitação e nível de consciência). Os resultados demonstraram, quando utilizada a escala MBPS, que ocorreu significativa redução da dor quando comparados os grupos EMLA® versus óxido nitroso a 50% (p=0,024), óxido nitroso a 50% versus EMLA® + óxido nitroso a 50% (p=0,013) e EMLA® versus óxido nitroso a 50% + EMLA® (p=0,001). Os autores concluíram que a combinação de óxido nitroso a 50% com o EMLA® foi mais eficaz na redução da dor que o uso isolado de cada um. A avaliação feita pelos pais por meio da EVA foi realizada em apenas 50 crianças, sendo encontrada significância estatística na redução da dor apenas no grupo EMLA® versus óxido nitroso a 50% + EMLA® (p=0,08). Essa análise foi bastante comprometida devido ao elevado número de perdas. Os efeitos adversos observados foram leves. Uma criança do grupo EMLA® + óxido nitroso a 50% apresentou um episódio de vômito e foram identificados casos de eritema transitório no local da aplicação da pomada.

 

DISCUSSÃO

O efeito analgésico do óxido nitroso a 50% em oxigênio tem sido estudado como recurso terapêutico relevante no controle da dor durante procedimentos que geram dor leve a moderada. Esta revisão sistemática mostra a falta de ensaios clínicos com qualidade adequada para que sejam obtidas conclusões seguras sobre seu uso em procedimentos específicos.

A fim de se tentar tornar claro o efeito terapêutico individual da mistura equimolar e evitar possíveis vieses de avaliação, a metodologia utilizada nesta revisão não permitiu a inclusão de pesquisas nas quais mais de uma medida terapêutica estivesse envolvida juntamente com a referida mistura, o que resultou em menor número de estudos para análise.

Os estudos avaliados nesta revisão mostraram resultados divergentes, uma vez que em um deles a mistura não foi adequada para o alívio da dor no procedimento avaliado (retirada de dreno de tórax), mesmo mostrando, aparentemente, a mesma potência e eficácia da morfina. Por outro lado, a mistura mostrou-se eficaz para diminuir os escores de dor de maneira significativa, quando o procedimento avaliado foi uma injeção intramuscular especialmente dolorosa. Possivelmente o óxido nitroso a 50% em oxigênio não tem boa ação analgésica quando utilizado em procedimentos que causam dor intensa como, por exemplo, retirada de dreno de tórax, sendo mais eficaz na redução da dor leve a moderada.

 

CONCLUSÃO

Apesar de não ser o objetivo principal desta revisão, notou-se que os efeitos colaterais da utilização da mistura equimolar de óxido nitroso a 50% em oxigênio foram mínimos e, além disso, a sedação foi considerada leve a moderada e os sinais vitais dos pacientes não sofreram alterações, sugerindo que a mistura é segura.

Novos estudos multicêntricos realizados em procedimentos que causam dor leve a moderada com metodologia adequada devem ser estimulados para que conclusões mais precisas sejam obtidas até que a mistura de óxido nitroso em oxigênio a 50% possa ser recomendada de maneira rotineira na prática clínica.

 

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