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ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Espirometria em pré-escolares asmáticos: avaliação da taxa de sucesso
Spirometry in preschools with asthma: evaluate the success rate
Guilherme Rache Gaspar1; Isabella Maria de Freitas Faria2; Fabíola Vieira Duarte Baptista3; Larissa Germano Rêgo3; Nara Sulmonett4; Laura Maria de Lima Belizário Facury Lasmar5
1. Médico Pediatra Pneumologista. Mestrando em Ciências da Saúde da Criança e do Adolescente do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Acadêmica do Curso de Medicina da Faculdade de Medicina da UFMG, bolsista de Iniciação Científica pelo programa Jovens Talentos para a Ciência CAPES/CNPq. Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Acadêmica do Curso de Medicina da Faculdade de Medicina da UFMG, atuantes em Iniciação Cientifica. Belo Horizonte, MG - Brasil
4. Médica Pneumologista. Chefe do Laboratório de Função Pulmonar do Hospital das Clínicas da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
5. Médica Pediatra. Doutora em Pediatria. Professora Associada do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
Isabella Maria de Freitas Faria
E-mail: bellinhamariah@ufmg.br
Instituição: Faculdade de Medicina da UFMG Belo Horizonte-MG - Brasil
Resumo
INTRODUÇÃO: a asma pode iniciar-se na idade pré-escolar e sua morbidade é elevada. Atualmente, o diagnóstico é centrado apenas no exame clínico, mas a espirometria é um método objetivo realizado rotineiramente em países desenvolvidos. No Brasil, ela é subutilizada e há poucos trabalhos acerca desse tema na literatura nacional.
OBJETIVOS: avaliar a taxa de sucesso da espirometria em pré-escolares asmáticos.
METODOLOGIA: foi realizado estudo transversal no Laboratório de Função Pulmonar do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais entre o período de 2009 e 2013. Foram coletados dados de 238 espirometrias de pré-escolares e destas foram triadas 64 crianças de três a seis anos, com diagnóstico médico de asma, excluindo-se, assim, os testes de pacientes com outros diagnósticos. As espirometrias foram realizadas com base nos critérios de reprodutibilidade e aceitabilidade preconizados pela American Thoracic Society (ATS). Os critérios de aceitabilidade foram: ausência de artefatos nas curvas, início satisfatório da inspiração, inspiração máxima antes do início do teste, evidência de esforço máximo, expiração sem hesitação e término adequado (platô no último segundo da curva expiratória forçada). Em todas as curvas o volume de retroextrapolação foi inferior a 5% da CVF. As curvas foram altamente reprodutíveis, com volumes pulmonares não variando mais de 5%. O paciente realizou quantas tentativas fossem necessárias. A taxa de sucesso foi calculada pelo número de espirometrias aceitáveis e reprodutíveis sobre o número de espirometrias não aceitáveis.
RESULTADOS: foram avaliadas 64 crianças com diagnóstico de asma, 33 de sexo masculino e 31 de sexo feminino. A taxa de sucesso da espirometria foi de 64% (IC 95%, 51,0-75,4). A taxa de sucesso estratificada por idade foi de 60 e 56%, respectivamente, para as idades de três e quatro anos; e 85 e 82%, respectivamente, para as idades de cinco e seis anos.
DISCUSSÃO: a taxa de sucesso do estudo foi elevada e aumentou com a idade, o que reforça que a espirometria é um método não invasivo que poderia ser normatizado nos laboratórios de função pulmonar e contribuiria para o adequado diagnóstico e manejo terapêutico da asma em pré-escolares.
CONCLUSÃO: a maioria das crianças conseguiu realizar a espirometria. Deve-se ter em vista que foi a primeira vez que as crianças realizaram o teste da espirometria, o que revela a viabilidade de aumentar essa taxa adaptando o laboratório às condições preconizadas pela ATS.
Palavras-chave: Espirometria; Asma; Pré-escolar; Estudos de Viabilidade; Criança.
INTRODUÇÃO
A asma é a doença pulmonar crônica mais prevalente na infância, podendo iniciar na idade pré-escolar.1 O diagnóstico é baseado em parâmetros clínicos funcionais.2 A espirometria mede a mudança de volumes e fluxos pulmonares durante manobras de expiração forçada. Sua realização depende da cooperação do paciente. Cada manobra realizada passa por rigorosos critérios de qualidade.3 Apesar de já normatizada para crianças em idade pré-escolar,4 a espirometria é subutilizada nessa faixa etária, sobretudo no Brasil, apesar de sua relevante aplicabilidade. A taxa de sucesso desse teste tem ampla variação na literatura nacional e internacional - de 42 a 92%.5-14 No Brasil, são escassos os estudos que calculam essa taxa e estes não incluem apenas pacientes asmáticos.15,16
OBJETIVO
Avaliar a taxa de sucesso da espirometria em pré-escolares asmáticos.
METODOLOGIA
Foi realizado estudo transversal, no Laboratório de Função Pulmonar do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, entre o período de fevereiro de 2009 e outubro de 2013. Foram incluídas 64 espirometrias da base de dados do laboratório, de crianças com idade entre três e seis anos de idade, com diagnóstico médico de asma. Foram excluídas 174 com outros diagnósticos (fibrose cística, doenças neuromusculares, doenças hematológicas, bronquiolite obliterante pós-infecciosa e displasia broncopulmonar).
As espirometrias foram realizadas com base nos critérios preconizados pela American Thoracic Society (ATS)4. Os pacientes foram orientados a suspender broncodilatadores e corticoides inalatórios no dia anterior ao exame. Os critérios de aceitabilidade foram: ausência de artefatos nas curvas, início satisfatório da inspiração, inspiração máxima antes do início do teste, evidência de esforço máximo, expiração sem hesitação e término adequado (platô no último segundo da curva expiratória forçada). O paciente realizou quantas tentativas foram necessárias para a execução correta do teste.
No dia do exame, foram registrados o peso e a altura e aplicado aos responsáveis questionário clínico sobre sintomas respiratórios. Os exames foram realizados por técnico em função pulmonar certificado pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Foi utilizado espirômetro KoKo PFT Spirometer (Koko® Spirometer, PDS Instrumentation, Louisville, CO, EUA) com calibração diária realizada antes dos exames. Foram utilizados programas gráficos lúdicos de incentivo Koko PFT Software (nSpire Health, Inc, EUA). Foram calculados, de acordo com a distribuição dos dados, a média com seu respectivo desvio-padrão e/ou mediana e intervalo interquartil para descrever as frequências das variáveis descritivas. A taxa de sucesso foi calculada pelo número de espirometrias aceitáveis e reprodutíveis sobre o número total de espirometrias (não aceitáveis e aceitáveis). O projeto de pesquisa intitulado "Espirometria em pré-escolares asmáticos" foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (COEP). Projeto CAAE - 39704414.8.0000.5149.
RESULTADOS
Foram avaliadas 64 crianças com diagnóstico de asma, 33 de sexo masculino e 31 de sexo feminino. A taxa de sucesso estratificada por idade foi de 60 e 56%, respectivamente, para as idades de três e quatro anos; e 85 e 82%, respectivamente, para as idades de cinco e seis anos. A mediana de idade foi de cinco anos e não houve diferenças quanto ao gênero. Em todas as curvas o volume de retroextrapolação foi menor que 5% da CVF. As curvas foram altamente reprodutíveis, com volumes pulmonares não variando mais de 5%. A Tabela 1 traz a distribuição dos dados demográficos e antropométricos dos pacientes e tabela 2 a taxa de sucesso estratificada por idade (n = 64).
DISCUSSÃO
A taxa de sucesso do presente estudo em amostra de pré-escolares asmáticos foi de 64% e seu intervalo de confiança de 51 a 75% é consistente com os encontrados em outros estudos com pré-escolares. Dessa forma, Zapletal et al.7 encontraram 62%, Rivera et al.14 acusaram 64% e Vilozni et al. 8 apuraram 1% entre pacientes assintomáticos. Outros autores encontraram taxas mais elevadas que as encontradas nesta pesquisa.5,6,9-12 Por exemplo, entre pacientes assintomáticos e asmáticos, essa taxa foi de 92% em trabalho internacional6 e de 82% em trabalho brasileiro com população de 96% de asmáticos.15 A nossa taxa de sucesso foi surpreendente, uma vez que o laboratório de função pulmonar não se encontra ainda adaptado para a realização de função pulmonar em pré-escolares. Assim, este estudo terá aplicabilidade na medida que serão implementadas as recomendações da ATS/ERS,4 garantindo ambiente específico para estimular e aumentar a interação dos pré-escolares, o que é viável já que o laboratório possui excelente infraestrutura e profissionais capacitados.
A presente investigação apresenta limitações, sendo uma delas o reduzido numero de crianças com três anos. Nessa faixa etária de risco para insucesso, quatro realizaram manobras adequadas e duas obtiveram manobras reprodutíveis e aceitáveis. Mas isso não invalida a taxa de sucesso da amostra como um todo. As taxas de sucesso são descritas como menores em faixas etárias inferiores a três anos.17 Isso ocorreu também em nosso estudo. Mais autores referem que se essas crianças forem bem treinadas podem se submeter, de forma satisfatória, a espirometria.6,9 À medida que a realização da espirometria em pré-escolares se consolidar, mais pacientes nessa faixa etária de três e quatro anos serão encaminhados ao laboratório e, partir daí, o treinamento será determinante, com mais tentativas para melhor performance dos pacientes.
A evolução dos espirômetros, com incentivos gráficos lúdicos,18 e a incorporação de volumes mais adaptados às crianças mais jovens, como o volume expiratório de 0,5 e 0,75 segundos (VEF0,5 e VEF0,75)4 como opções ao volume expiratório de 1º segundo (VEF1) foram importantes para aumentar as taxas de sucesso da espirometria nessa faixa etária.
CONCLUSÃO
A espirometria é um teste não invasivo, de baixo custo e a maioria dos pré-escolares consegue realizá-la. Sua incorporação na prática clinica poderá contribuir no diagnóstico e manejo da asma nos pré-escolares.
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