RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 25. 4 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20150128

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Artigo de Revisão

O papel de marcadores tumorais no câncer de pulmão: revisão da literatura

The role of tumor markers in lung cancer: a literature review

Henrique Alves Pinto Silva1; Pietro Mainenti2; Artur Laizo3

1. Acadêmico do Curso de Medicina da Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC-JF). Juiz de Fora, MG - Brasil
2. Cirurgião-Dentista. Doutor em Patologia Bucal. Cirurgião no Departamento de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Centro Médico Rio Branco, Juiz de Fora - MG, Brasil. Professor da Faculdade de Medicina da Universidade Presidente Antônio Carlos, Campus Juiz de Fora. Juiz de Fora, MG - Brasil
3 Médico. Doutor em Cirurgia Geral. Professor de Prática Médica I e II e Presidente do Grupo de Estudos sobre a Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (GEDPOC) da UNIPAC-JF. Juiz de Fora, MG - Brasil.

Endereço para correspondência

Henrique Alves Pinto Silva
E-mail: henriquealvespsilva@hotmail.com

Recebido em: 15/09/2014
Aprovado em: 03/03/2015

Instituição: Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC-JF Juiz de Fora, MG - Brasil

Resumo

INTRODUÇÃO: o câncer de pulmão é uma neoplasia muito frequente no mundo e, no Brasil, até 2012, foi a primeira causa de mortalidade por câncer entre os homens e a segunda entre as mulheres. O rastreamento da doença com biomarcadores moleculares é considerado promissor na compreensão da carcinogênese, no diagnóstico precoce, na determinação prognóstica e na identificação de novos tratamentos.
OBJETIVOS: apresentar alguns dos principais marcadores tumorais do câncer de pulmão e destacar alguns fatores de crescimento e de genes diretamente a ele relacionados.
MÉTODOS: revisão bibliográfica e análise crítica de trabalhos pesquisados eletronicamente por meio do banco de dados Scielo, PubMed, livros e dissertações pertinentes ao tema abordado.
RESULTADOS: o papel dos marcadores biológicos no câncer de pulmão ainda é incerto. O antígeno carcinoembrionário é o marcador tumoral mais valioso na avaliação de carcinomas de células não pequenas. Percebe-se mais expressão da enolase neuroespecífica no carcinoma pulmonar de pequenas células. Os mitógenos que participam das neoplasias pulmonares incluem os fatores de crescimento de: hepatócito, epidérmico, endotelial vascular e o transformador beta. A amplificação da família myc de proto-oncogenes e mutações no locus K-ras, observado nas neoplasias pulmonares associadas ao tabagismo, torna os tumores mais agressivos. O gene de supressão tumoral p53 é o que mais sofre mutação no câncer de pulmão.
CONCLUSÃO: o estudo com marcadores genéticos parece ser promissor na compreensão e no estadiamento clínico e tratamento das neoplasias pulmonares.

Palavras-chave: Neoplasias Pulmonares; Neoplasias Pulmonares/epidemiologia; Neoplasias Pulmonares/diagnóstico; Neoplasias Pulmonares/terapia; Marcadores Biológicos; Marcadores Biológicos de Tumor.

 

INTRODUÇÃO

O câncer de pulmão é uma neoplasia muito frequente no mundo1-7, representando 13% dos casos de câncer.1,7 Associa-se à elevada mortalidade,3,5,7-17 sendo caracterizado por progressivo aumento de casos mundiais,10,18,19 perfazendo 6% de todas as causas de mortes anuais.20

As neoplasias pulmonares constituem expressivo problema de saúde pública em países desenvolvidos,1,11 sendo a principal causa de morte por câncer nos Estados Unidos da América e na Europa.21

No Brasil, as neoplasias pulmonares, até 2012, constituam-se na primeira causa de mortalidade por câncer entre os homens e a segunda entre as mulheres.22-25 Os maiores índices ocorreram na região Sul e Sudeste.26,27 Observou-se que, entre os homens, houve aumento modesto da taxa de mortalidade: de 10,64 para 13,07 óbitos/100.000 de 1979 para 2004;25,26,28 e, entre as mulheres, foi maior, de 3,04 para 5,37 óbitos/100.000 entre 1979 e 2004.26,28 Ocorreram 28 mil novos casos no país em 2008 e 2011.3,29

O rastreamento das neoplasias pulmonares com biomarcadores moleculares é considerado promissor3 e importante instrumento na compreensão da carcinogênese pulmonar, no diagnóstico precoce, na determinação do prognóstico e na identificação de novos tratamentos para portadores de neoplasia pulmonar.23 Marcadores biológicos são componentes celulares, estruturais e bioquímicos, que podem definir alterações celulares e moleculares em células normais e também naquelas associadas à transformação maligna.8

Esta revisão apresenta alguns dos principais marcadores tumorais da neoplasia pulmonar, representados pelo antígeno carcinoembrionário (CEA) e pela enolase neuroespecífica (NSE). Destaca ainda a participação de alguns fatores de crescimento que agem como mitógenos no desenvolvimento e na progressão do carcinoma pulmonar e de genes diretamente relacionados à sua patogênese.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Este estudo consistiu em revisão bibliográfica realizada eletronicamente por meio do banco de dados Scielo e PubMed, resultando na obtenção de vários artigos pertinentes ao tema. Foram selecionados trabalhos da literatura médica em língua portuguesa e inglesa, publicados no período de 1998 a 2014. O resultado preliminar revelou, inicialmente, 87 trabalhos sobre o assunto.

Os descritores utilizados na presente pesquisa foram: "neoplasias pulmonares", "marcadores biológicos", "epidemiologia", "diagnóstico", "terapêutica", "lung neoplasms", "biological markers", "epidemiology", "diagnosis"; "therapeutics".

Todos os trabalhos foram lidos e avaliados. Uma vez que alguns textos divergiram do escopo deste estudo, somente 48 artigos foram considerados para se apresentarem como referencial teórico da presente pesquisa.

 

PRINCIPAIS BIOMARCADORES E SUA IMPORTÂNCIA NO CÂNCER DE PULMÃO

Embora sejam frequentemente utilizados na prática clínica,30 o papel dos marcadores biológicos no câncer de pulmão ainda é incerto.8

O dano genético ocorre em genes que afetam a homeostase de vários processos biológicos, como proliferação e crescimento celular, apoptose, angiogênese, invasão tumoral e, por conseguinte, metástase. Cerca de 380 genes estão associados ao aparecimento de várias neoplasias, o que representa mais de 1% do total de genes já descritos até o momento. Genes como p53, p14ARF, p16INK4a, RB, FHIT e RASSF1A estão relacionados ao câncer de pulmão.13

Os marcadores tumorais são, em tese, produtos tumorais que podem ser detectados antes mesmo do desenvolvimento macroscópico do tumor, permitindo, então, uma intervenção antes do processo de invasão tumoral, da angiogênese e da disseminação metastática.22 Os marcadores biológicos diagnósticos são produtos e estruturas celulares, tais como o núcleo, os microvilos e os microácinos, que podem ser medidos quantitativamente em casos associados às neoplasias e ao seu órgão de origem.8

Para Capelozzi8 e Fang et al.31, em pacientes com câncer de pulmão os marcadores biológicos diagnósticos, presentes em associação com a malignidade, não se mostraram muito úteis como recurso diagnóstico, devido à sua baixa sensibilidade e especificidade, principalmente em estágio em que a doença possa ser totalmente tratável. Entretanto, segundo Capelozzi8, podem ser usados para expressar diferentes características biológicas das neoplasias pulmonares. Fang et al.31 afirmam que a detecção e o diagnóstico precoce do câncer de pulmão são fundamentais para obter melhor sobrevida.

Wang et al.32, por sua vez, afirmam que a detecção de marcadores tumorais pode ser instrumento útil no diagnóstico, monitoramento e prognóstico de pacientes com câncer de pulmão, principalmente se os marcadores forem detectados conjuntamente, aumentando, assim, a sensibilidade diagnóstica.

O estudo da genética molecular dos tumores salienta a expectativa que pode atingir dois objetivos. Em primeiro lugar, os processos progressivos neoplásicos e suas alterações genéticas determinam o seu desenvolvimento. A observação dessas alterações permite a melhor compreensão do processo oncogênico. Segundo, as alterações genéticas presentes nos tumores podem originar, diretamente, alvos terapêuticos específicos que podem permitir o desenvolvimento e a aplicação de terapias altamente eficazes.7

Os marcadores biológicos diagnósticos séricos mais estudados em pacientes com neoplasia de pulmão são: antígeno carcinoembrionário (CEA), antígeno polipeptídeo tecidual (TPA), antígeno do carcinoma de células escamosas (SCC-Ag), cromogranina A (Chr A), enolase neurônio-específica (NSE), fragmentos de citoqueratina avaliados no sangue por meio dos anticorpos monoclonais KS19-1 e BM19-21 (CYFRA21.1), molécula de adesão celular neural (NCAM), creatina fosfoquinase - BB (CPK-BB) e receptor de interleucina solúvel-2 (sIL-2R)8.

Antígeno Carcinoembrionário (CEA)

O CEA é uma glicoproteína originalmente relacionada ao adenocarcinoma de cólon e reto. Produzido pelas células do epitélio glandular secretor de mucina do feto, o CEA pode ter níveis elevados nos carcinomas de diferenciação glandular, sendo dos primeiros marcadores tumorais relacionados às neoplasias pulmonares.17,22 Pode estar presente em baixos níveis em tecidos não neoplásicos e não fetais.22 É o biomarcador mais estudado no câncer de pulmão31.

Embora seja uma molécula de adesão celular, a expressão aumentada de CEA promove, além de inibição da apoptose, a má-adesão das células tumorais, o que favorece o processo metastático. Assim, seus níveis elevados podem refletir o crescimento do tumor, a recorrência e o aparecimento de metástases, tendo importante papel, portanto, na avaliação prognóstica da doença.17

A maioria dos tabagistas também apresenta o CEA sanguíneo elevado, sem que haja malignidade reconhecida, pulmonar ou não. Tal fato parece decorrer da agressão direta dos constituintes do cigarro sobre o epitélio respiratório, levando à liberação do antígeno para a circulação.22 Entretanto, o CEA é o marcador tumoral mais valioso na avaliação de carcinomas de células não pequenas.8,17,22 A maioria dos adenocarcinomas de pulmão apresenta esse antígeno elevado.17,22,31

Wang et al.32 afirmaram que os níveis séricos de CEA em pacientes com neoplasia pulmonar são significativamente maiores do que naqueles com doença benigna e controle saudáveis, indicando que o CEA pode ser utilizado para o diagnóstico precoce do câncer de pulmão.

Yang et al.17 demonstraram que a expressão do CEA está relacionada diretamente à expressão do receptor para o fator de crescimento epidérmico (EGFR), um receptor transmembrana presente na superfície celular e que se superexpressa em pacientes com carcinoma de células não pequenas. Assim, à medida que as mutações no EGFR ocorrem, os níveis de expressão do CEA aumentam.17

Vários tratamentos têm sido desenvolvidos com base na inativação desse grupo de receptores22 e pacientes com carcinoma de células não pequenas, portadores de mutação no EGFR, são adequados para esse tipo de abordagem.17 Assim, tal terapêutica proposta22, combinada com os níveis de CEA no soro dos pacientes, podem auxiliar na avaliação prognóstica e na eficácia clínica do tratamento do carcinoma pulmonar de células não pequenas, visto que os pacientes, que possuem níveis séricos elevados de CEA, podem beneficiar-se com a terapêutica baseada na inativação do EGFR.17

Enolase neuroespecífica (NSE)

A NSE é uma enzima catalisadora da via glicolítica anaeróbica22,33 e se encontra distribuída em todos os tecidos dos mamíferos.22 Níveis elevados de NSE são observados em tumores como glucagonoma, carcinoma de intestino e carcinoma medular da tireoide, todos de origem neuroendócrina. Observa-se o seu aumento também no carcinoma pulmonar de pequenas células.22

A diferenciação neuroendócrina do carcinoma pulmonar de pequenas células é considerada uma característica importante dessa doença e pode explicar sua alta sensibilidade para a radioterapia e quimioterapia. A NSE é geralmente aceita como marcador no diagnóstico e na monitorização terapêutica desse tipo histológico de câncer de pulmão. Além disso, é visto que os níveis elevados desse marcador têm valor prognóstico desfavorável.33

Pacheco et al.22 mostraram que a NSE é útil no diagnóstico dos tumores neuroendócrinos, mas também comprovações posteriores detectaram sua presença em tecidos não neuroendócrinos.

Wang et al.32 compartilham da mesma ideia, salientando que os níveis séricos de NSE em pacientes com neoplasia pulmonar são significativamente mais altos do que naqueles com doença pulmonar benigna, sugerindo que essa enzima é importante no diagnóstico do câncer de pulmão, em especial do carcinoma pulmonar de pequenas células. Para melhorar a sensibilidade e a especificidade diagnóstica, a combinação de biomarcadores é estratégia interessante.

Wójcik et al.33 demonstraram que outro marcador, o peptídio liberador de gastrina (GRP), associado à NSE, é mais fidedigno na avaliação prognóstica e de recidivas em pacientes com carcinoma pulmonar de pequenas células.

Hormônios peptídeos mitógenos (fatores de crescimento)

As células neoplásicas e não neoplásicas do pulmão comumente produzem hormônios peptídeos que podem ter função de mitógenos.8 Estes incluem os fatores de crescimento: de hepatócito (HGF),23,31 epidérmico (EGF),8,17,22 endotelial vascular (VEGF)16,23,34 e transformador beta (TGF-β).23,35 As células pulmonares neoplásicas têm receptores para esses fatores, de forma que esses peptídeos podem funcionar como fatores de crescimento autócrino e parácrino nas células cancerosas e nas células normais.8,23

O HGF é uma tirosina-cinase de membrana celular23, produzida principalmente por células mesenquimatosas31 e considerada um mediador de angiogênese, da motilidade celular e da invasão tumoral, além de estimular o crescimento de células epiteliais.23,31 O seu receptor (c-Met), um produto proto-oncogênico, é o mediador dessas funções e, frequentemente, se sobre-expressa no carcinoma pulmonar de células não pequenas. Pode ser útil como marcador diagnóstico e preditor prognóstico em tumores pulmonares avançados.31

Fang et al.31 relataram que o HGF não é sensível em fases iniciais do carcinoma pulmonar de células não pequenas, sendo significativamente maior na fase III e IV em pacientes com carcinoma escamoso, entretanto, não conseguiram correlacionar esse aumento com a sobrevida, mas consideram que o nível plasmático do HGF também está elevado em doenças inflamatórias, como na doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).

O gene para uma subfamília do EGF encontra-se super-expresso em carcinomas de pulmão de células não pequenas.17,22 Seu receptor (EGFR), do tipo tirosina-cinase17, regula um via de sinalização autócrino que contribui para grande número de processos importantes para o desenvolvimento neoplásico, incluindo a proliferação celular, a apoptose, a angiogênese e a disseminação metastática.22 A taxa de mutação do EGFR nos pacientes com carcinoma pulmonar é mais frequente em mulheres, não tabagistas e do tipo adenocarcinoma.17 Vários tratamentos têm sido desenvolvidos com base na inativação desse grupo de receptores, como os fármacos Iressa e OSI-7734, inibidores reversíveis da tirosina-cinase do EGFR, e ativos por via oral. Outras possibilidades incluem os anticorpos monoclonais, em fase de testes, que poderiam se ligar ao EGFR, bloqueando sua autofosforilação e inibindo a angiogênese em células tumorais de ratos.22 Observa-se correlação positiva entre os níveis séricos de CEA e a taxa de mutação do EGFR.17

O VEGF pode ser produzido por células malignas e aumenta em decorrência do estímulo do fator tecidual e retroalimentando o sistema. Também atua nas células endoteliais de permeio, permitindo a neovascularização do tumor.16,23,34 É expresso, principalmente, nas neoplasias pulmonares metastáticas e seu aumento relaciona-se à resistência à quimioterapia.23

Zhang el al.34 conseguiram correlacionar os níveis de VEGF, um importante fator angiogênico, com os de endostatina, um fator antiangiogênico, em pacientes com derrame pleural devido à tuberculose e outros com derrame pleural maligno associado à neoplasia pulmonar. O VEGF tem sido implicado como uma citocina fundamental na formação do derrame pleural maligno, visto que seus níveis elevados favorecem a permeabilidade vascular, a migração celular e a angiogênese. Zhang et al.34 afirmaram que os níveis plasmáticos de VEGF e de endostatina, em pacientes com derrame pleural maligno, são significativamente mais elevados do que naqueles com derrame de etiologia benigna. Referem-se, ainda, a quão mais elevados os níveis, mais ominoso é o prognóstico, salientando a importância no acompanhamento prognóstico que esses marcadores possuem.

Por último, o TGF-β é uma citocina inflamatória que regula a proliferação celular, a diferenciação e a produção de matriz extracelular35. No pulmão, pode-se ligar às integrinas expressas pelas células tumorais. Ela pode atuar inibindo as fases G1 e S do ciclo celular, além de induzir a produção da p21, proteína que inibe a replicação do DNA quando há expressão aumentada da p53, e aumentar a expressão gênica da c-myc.23 Afeta, ainda, a angiogênese tumoral, desempenhando importante papel na progressão do carcinoma de células não pequenas, atuando como preditor independente de sobrevida no adenocarcinoma23,35. Tais ações estão intimamente relacionadas à progressão, à agressividade neoplásica e ao mau prognóstico na doença.8,22,23,35

Huang et al.35 relataram que os níveis da isoforma TGF-β1 em carcinoma de pulmão de células não pequenas é significativamente maior do que nos tecidos pulmonares normais. Embora o mecanismo ainda não seja muito evidente, aventa-se a ideia de que sua expressão elevada se deva à diminuição de seus receptores. Além disso, a expressão dessa proteína está relacionada35 à fase do TNM em que se encontra o tumor. Quanto maior a expressão de TGF-β1, mais avançada está a doença. Existem dois fatores que influenciam no prognóstico do carcinoma pulmonar de não pequenas células: os níveis de TGF-β1 e a metástase linfonodal.35 A taxa de sobrevivência de cinco anos em pacientes com baixa expressão de TGF-β1 é maior do que se a sua expressão está aumentada; e o prognóstico dos pacientes com metástase ganglionar é menor do que naqueles sem metástase linfática.

 

DISCUSSÃO

Vários são os fatores de risco para o câncer de pulmão: asbesto, radônio, exposição ocupacional e fatores genéticos1,10,23; entretanto, o mais importante é o tabagismo1,5,9,10,12,17,23,24,36-39, responsável por 85 a 90% dos casos1,4,10,27 e de 70 a 92% das suas mortes12,14. Os outros 10 a 15% dos casos estão relacionados à exposição ocupacional,1,4,10 sendo a sílica a mais comum.4,10 Asai et al.40 relataram que bolhas gigantes infecciosas também estão associadas à doença, principalmente em relação ao carcinoma de grandes células, que surge mais comumente na parede de tais bolhas.

Acredita-se que a redução do tabagismo levaria à prevenção de 71% dos casos de câncer de pulmão.41 Seixas et al.42 demonstraram que a atividade física, além de meio para evitar a ocorrência da doença, também apresenta impactos positivos no tratamento oncológico.

Histologicamente, as neoplasias pulmonares são divididas em quatros tipos: carcinoma escamoso, adenocarcinoma, carcinoma de pequenas células e carcinoma de grandes células.8-10,12,23,43 O tabagismo está implicado na etiopatogênese de todos os tipos histológicos,12 mas a sua influência é mais marcante em relação ao carcinoma escamoso, ao carcinoma de pequenas células (menos frequente e de pior prognóstico44) e ao adenocarcinoma.10,23

O sistema de estadiamento tumor-nódulo-metastase (TNM) auxilia na seleção do melhor tratamento das neoplasias pulmonares caso a caso.45 O principal objetivo é estabelecer um modo de determinar a extensão anatômica das neoplasias, permitindo uniformização do tratamento e a comparação dos resultados e a previsibilidade do prognóstico em cada caso.46

O parâmetro T, do sistema TNM, é importante quando se pensa em ressecção cirúrgica, uma vez que formas T1, T2 e T3 são ressecáveis e não o é o T4. O acometimento linfático (parâmetro N) é considerado o divisor de águas entre o tratamento cirúrgico ou não cirúrgico nos portadores de doença exclusivamente intratorácica, pois o comprometimento do linfonodo-sentinela influi muito no prognóstico e no tratamento das neoplasias pulmonares. O parâmetro M evita a intervenção cirúrgica desnecessária se já houve acometimento metastático, exceção feita nos casos raros de metástase única. Por isso, a pesquisa de metástases extratorácicas é muito importante.46

A terapia tradicional para a neoplasia pulmonar é composta de cirurgia, radioterapia e quimioterapia. 17,35 Esse tratamento, quando o tumor ainda se encontra localizado, sem disseminação extrapleural, é cirúrgico.9,47 Já para os casos de tumores Tuirressecáveis, como os classificados no parâmetro T4 do sistema TMN14, o indicado é a combinação de radio e quimioterapia.48

Para o entendimento das neoplasias pulmonares, uma possibilidade seria estudar os genes de supressão tumoral e oncogenes que participam na carcinogênese pulmonar,7,8,13,22,23 haja vista que as células neoplásicas do pulmão acumulam uma série de alterações genéticas que ativam proto-oncogenes em oncogenes e uma série de outras alterações que parecem inativar ou alterar informações dos genes de supressão tumoral.8

A família myc de proto-oncogenes inclui proteínas nucleares que são capazes de se ligar ao DNA e atuar na regulação da transcrição.23 A amplificação dessa família de genes, principalmente no carcinoma pulmonar de pequenas células, está associada ao decurso mais agressivo da doença8,23 e pior resposta à quimioterapia.23

Genes mutados da família ras são os oncogenes mais comuns encontrados nas neoplasias malignas humanas e o significado clínico de mutações nessa família em neoplasia pulmonar ainda é objeto de estudo. 22 Mutações no locus K-ras, observado nas neoplasias pulmonares associadas ao tabagismo,8,23 tornam os tumores mais agressivos22 e têm sido ligadas a menos sobrevida.8,22

O gene de supressão tumoral p53 leva à parada do ciclo celular na fase de transcrição de G1 para S, permitindo à célula reparar a integridade de seu genoma. Quando os danos no DNA são irreversíveis, ele induz a apoptose.22,23 É o gene que mais comumente sofre mutação no câncer de pulmão,7,22,23 sendo detectado em mais de 70% dos casos de carcinoma de células escamosas e em mais 90% no carcinoma de pequenas células22, apresentando indícios de que essas mutações têm valor prognóstico.7 Anticorpos antip53 têm sido encontrados em pacientes com neoplasia pulmonar e tais anticorpos podem anteceder o desenvolvimento clínico da neoplasia.22

São poucos os estudos brasileiros sobre o papel dos marcadores biológicos séricos em pacientes com neoplasia pulmonar8, sendo observado que o CEA é o marcador mais frequentemente aumentado8,31,32 e, inclusive, pode se beneficiar com o tratamento baseado na inativação do EGFR.17

A dosagem sérica da NSE provou ser valioso e promissor instrumento no auxílio diagnóstico do carcinoma de pulmão de pequenas células, com sensibilidade média global de 77,5% e especificidade de 90%, sendo mais sensível e específico quanto mais avançada está a doença.22 Sua associação com o GRP parece melhorar a sensibilidade diagnóstica e prognóstica.33

Sabe-se que estímulos de crescimento autócrino e parácrino estão presentes na neoplasia pulmonar, devido à expressão de fatores de crescimento e receptores pelas células malignas e pelas células normais adjacentes a elas. 8,23 Vários estudos tentaram correlacionar o aumento nos níveis séricos de alguns fatores de crescimento com o desenvolvimento neoplásico no pulmão e a sobrevida nesses pacientes.8,16,17,22,23,31,34,35 Alguns até aventaram propostas terapêuticas baseadas na inativação de receptores, como o EGFR17, ou na supressão de fatores de crescimento, como o TGF-β1.35 Entretanto, é vista a necessidade de mais estudos nessa área, principalmente relacionados à elaboração de novas estratégias diagnósticas e terapêuticas.8,17,22,34,35

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo dos marcadores tumorais aprimorou muito os conhecimentos sobre o aparecimento e a progressão do processo oncogênico pulmonar. Podem ser importantes não somente nas bases fisiopatológicas da doença, mas também na classificação clínica, no estadiamento e até mesmo no desenvolvimento de novas opções terapêuticas.

O estudo com marcadores genéticos parece ser promissor tanto na compreensão quanto no estadiamento clínico e tratamento das neoplasias pulmonares, haja vista que os marcadores celulares extranucleares ainda não conseguiram atingir os objetivos propostos, ou seja, detecção precoce e precisa do tumor. Os marcadores genéticos, por sua vez, caracterizam melhor a neoplasia pulmonar, devido à sua peculiaridade e, sobretudo, pela alteração ocasionada por meio da mutação genética. Estudos mais aprofundados nessa área poderão ser de grande avanço para o tratamento das neoplasias de maneira geral, inclusive pulmonar, responsável ainda por elevado número de óbitos no mundo.

 

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