RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 21. 2

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Artigo Original

Prevalência de oligoâmnio em pacientes internadas no alto-risco de Maternidade Pública do Estado de Sergipe no período de 2004 a 2006

Oligoamnios prevalence among high-risk patients at a public maternity hospital in State of Sergipe, Brazil, 2004-2006

Julia Maria Gonçalves Dias1; Kelly Coutinho da Silva2; Silvana Patrícia Souza de Paula3

1. Professora Assistente de Ginecologia e Obstetrícia do Curso de Medicina da Universidade Federal de Sergipe. Aracaju, SE - Brasil
2. Acadêmica do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Sergipe. Aracaju, SE - Brasil
3. Acadêmica do Curso de Medicina da Universidade Federal de Sergipe. Aracaju, SE - Brasil

Endereço para correspondência

Julia Maria Gonçalves Dias
Rua: Deocleciano Ramos, 397, Suíssa
Aracaju, SE - Brasil, CEP 49050-750
Email: julia.dias@globo.com

Recebido em: 19/04/2010
Aprovado em: 16/03/2011

Instituição: Universidade Federal de Sergipe Aracaju, SE - Brasil

Resumo

O objetivo do trabalho é determinar, em relação ao oligoâmnio na Maternidade Nossa Senhora de Lourdes (MNSL), no período de 2004 a 2006, a sua prevalência, analisar algumas variáveis clínico-epidemiológicas, determinar as suas causas mais frequentes e verificar a associação com o óbito fetal. O estudo é uma análise retrospectiva descritiva do tipo corte transversal. Foram selecionados 1.006 prontuários com o diagnóstico de oligoâmnio e, destes, escolhidos 690 que se adequavam aos critérios de inclusão. Foram estudadas variáveis quanto a: idade materna, idade gestacional na admissão, número de gestações, tempo de internamento, causa do oligoâmnio, intercorrências no internamento, terminação do parto e condições de nascimento do recém-nascido e óbito fetal. A prevalência de oligoâmnio foi de 16,16% (1.006 casos), a média de idade da gestante foi de 20 anos, houve predomínio de tercigestas (40,1%) e nulíparas (43,3%) e oligoâmnio mais frequente no terceiro trimestre. O tipo de parto mais comum foi a cesárea (p<0,05), em 52,3% dos casos, e a maior causa de oligoâmnio foi a amniorrexe prematura (p< 0,0205), com 63,6% de frequência. O tempo de internamento (p<0,00) foi mais longo nas gestantes com oligoâmnio devido à amniorrexe prematura, 233 (53,1%), que permaneceram internadas durante dois a sete dias. A taxa de óbito fetal foi de 22,0%.

Palavras-chave: Oligoidrâmnio/epidemiologia; Ruptura Prematura de Membranas Fetais; Prevalência; Morte Fetal.

 

INTRODUÇÃO

O líquido amniótico (LA) desempenha importante papel no crescimento e desenvolvimento fetal. Circunda e protege o feto na cavidade amniótica, proporcionando um coxim contra os limites constritivos do útero grávido, permitindo-lhe espaço para movimento e crescimento, protegendo-o de traumatismos externos.1

A diminuição do líquido amniótico, chamada de oligoâmnio, que possui valores inferiores a 500 mL na cavidade amniótica2, implica agravos maternos e fetais.3

A incidência de oligoâmnio é estimada entre 3,9 e 5,5% das gestações, sendo na América Latina entre 0,4 e 5,5%, a depender da população.4,5

O oligoâmnio possui três etiologias fundamentais - a amniorrexe prematura ou ruptura prematura de membranas (RPM), a insuficiência placentária e a malformação geniturinária, que podem ser isoladas ou combinadas.4,6-8

A RPM ocorre depois da 20ª semana devido à infecção ascendente de bactérias do trato genital feminino e pela diminuição do líquido amniótico, que possui componentes bacteriostáticos.9 Os microrganismos dessa flora degradam a membrana amniótica a partir da ação de enzimas colagenases, elastases e proteases bacterianas. É associado o envolvimento de Neisseria gonorrhae e Streptococos do grupo B à amniorrexe prematura, causadores de vulvovaginite e infecção urinária assintomática10, respectivamente. Essa patogênese pode resultar em complicações infecciosas, acarretando corrimento vaginal e corioamnionite.11 A amniorrexe prematura é a principal causa de oligoâmnio no Brasil, atingindo média de 10% das gestações.3

A insuficiência placentária é geralmente proveniente do envelhecimento inerente à placenta com o avanço da idade gestacional.2,5 A pré-eclâmpsia ou a hipertensão arterial sistêmica crônica prejudicam o fluxo sanguíneo materno-fetal, o que repercute em hipóxia no concepto, determinando sofrimento fetal e retardo do crescimento intrauterino (RCIU).2,5,11,12

A malformação geniturinária origina-se de agenesia renal ou de rins policísticos, com consequente hidronefrose, o que torna a produção urinária ausente ou deficiente, provocando oligoâmnio com incidência de 1% das gestações.7,8

O diagnóstico de oligoâmnio pode ser dado clinicamente com base na medida do fundo uterino, que se encontra inferior ao esperado para a idade gestacional, e a partir de medidas ultrassonográficas, como o índice de líquido amniótico (ILA) ou critério de Phelan et al.13, no qual se executa a soma dos quatro bolsões amnióticos determinada pela divisão imaginária do útero em quatro quadrantes, em que a linha nigra é longitudinal e a cicatriz umbilical é perpendicular. Quando o ILA é menor que 5 cm, está diagnosticado o oligoâmnio. A classificação de Phelan et al.13 considera oligoâmnio quando o ILA é menor ou igual a 5 cm, enquanto que o oligoâmnio grave acontece quando esses valores são menores que 3 cm.13

Outras repercussões que o oligoâmnio acarreta são o parto cesáreo, pela limitação dos movimentos fetais, o que aumenta a possibilidade das apresentações distócicas; malformação fetal, devido à perda do efeito protetor do líquido amniótico proveniente da sua diminuição, que permite a compressão do feto pela parede uterina; além de baixo índice de Apgar, sofrimento fetal, prematuridade, baixo peso ao nascer, sepse, óbito fetal e materno, oriundos da causa-base determinante, por isso predispõe à gestação de alto risco.3,4,8,14

Este trabalho teve como objetivo determinar a prevalência de pacientes internadas com oligoâmnio na enfermaria de alto risco da Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006, além de determinar a frequência das causas dessa doença e associá-las à análise das seguintes variáveis: idade, paridade, idade gestacional na admissão, causa do oligoâmnio, tempo de internamento, intercorrências durante internamento, terminação do parto, condições de nascimento do recém-nascido e presença ou ausência de óbito fetal.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Foi realizado estudo descritivo do tipo corte transversal retrospectivo a partir de dados coletados provenientes de 1.006 prontuários de pacientes atendidas com diagnóstico de oligoâmnio, internadas na enfermaria de alto-risco da extinta Maternidade Hildete Falcão Baptista (MHFB), atualmente denominada Maternidade Nossa Senhora de Lourdes (MNSL). A pesquisa foi feita no período de janeiro de 2004 a dezembro de 2006, com mudanças apenas no espaço físico e da razão social, porém com permanência do mesmo corpo clínico e protocolos. Destes, 316 prontuários foram excluídos por conterem informações e dados incompletos.

A Maternidade Hildete Falcão Baptista, até 03 de dezembro de 2007, foi referência de alto risco no estado de Sergipe, situada na cidade de Aracaju, possuindo 58 leitos para clínica obstétrica, dois leitos para clínica médica e seis para cirurgia geral. Todavia, durante o período estudado, todos esses leitos foram utilizados para a obstetrícia. Até essa data, esse estabelecimento permaneceu conveniado com a Universidade Federal de Sergipe para funcionamento da residência médica em ginecologia e obstetrícia com treinamento na parte obstétrica, sendo o treinamento em ginecologia realizado em outros hospitais da rede pública do estado e no setor ambulatorial. Atualmente essa maternidade está desativada para reforma, apenas com o banco de leite funcionando nas suas instalações. As demais atividades, inclusive a residência médica, foram transferidas para a Maternidade Nossa Senhora de Lourdes.

Na pesquisa eletrônica realizada entre maio de 2008 e maio de 2009, foram empregadas as seguintes palavras-chave: oligoâmnio, amniorrexe prematura, ruptura prematura de placenta, insuficiência placentária, corioamnionite e óbito fetal, assim como oligohydramnios, amniorrhexis, premature rupture of membranes, amniotic fluid index, placental insuffiency e fetal death.

Foram selecionadas 37 referências sobre o assunto. Os critérios de seleção para a inclusão no trabalho foram baseados no ano de publicação dos autores; nas definições sobre o tema revisadas na introdução; e na predominância dos achados encontrados no estudo, mencionados na discussão. Foram excluídas 12 referências, aquelas cujo ano de publicação era mais antigo e as que se repetiram em mais de duas ocasiões. Foram priorizadas as referências da discussão, enquanto que as da introdução foram as mesmas em que o tema foi abordado, adicionando-se trabalhos mais recentes sobre o assunto.

O oligoâmnio diagnosticado baseou-se no critério ultrassonográfico de Phelan et al.13, feito pela medida da soma dos maiores bolsões nos quatro quadrantes ou índice de líquido amniótico (ILA), atrelado ou não ao quadro clínico. De acordo com as medidas da soma ao ultrassom, o oligoâmnio foi classificado segundo esse critério, havendo oligoâmnio quando o ILA é inferior a 5 cm. Os achados de insuficiência placentária associada à diminuição do ILA foram correlacionados com crescimento intrauterino restrito (CIUR), pré-eclâmpsia e sofrimento fetal, sendo propostos para análise. As demais foram analisadas como outras intercorrências. O achado de mais de uma intercorrência também foi analisado, sendo descritas como associações.

Na ruptura prematura de membranas, as intercorrências mais encontradas foram corioamnionite, infecção urinária e corrimento vaginal, sendo analisadas no estudo. As demais intercorrências foram analisadas como "outras". Aquelas associadas entre si também foram propostas para análise.

As malformações geniturinárias tiveram como diagnóstico essencial o ultrassom, evidenciando a existência de rins policísticos, hidronefrose ou agenesia renal.

A idade foi expressa como variável numérica em anos completos, categorizadas em quatro grupos: 10-19 anos, 20-29 anos e 30-39 anos e 40-49 anos. A gesta é a variável numérica referente ao número de gestações, categorizadas em três grupos: 1-gesta 1, 2- gesta 2 e 3-gesta 3 ou mais. A variável foi estabelecida como numérica quanto ao número de partos, categorizada em três grupos: 1- 0 partos, 2- 1-2 partos e 3- 3 ou mais partos. A idade gestacional na ocasião do atendimento é uma variável numérica calculada pela ultrassonografia e/ou data da última menstruação, expressa em semanas completas, sendo categorizada em três grupos: a) 1º trimestre (013) semanas; b) 2º trimestre (14-28) semanas; c) 3º trimestre (>28) semanas. A terminação da gravidez é uma variável nominal referente a aborto ou à via de parto utilizada, categorizada em quatro grupos: a) abortamento; b) parto normal; c) parto cesáreo; d) parto normal a fórceps. O tempo de internamento foi uma variável numérica referente ao tempo decorrido entre a admissão e a alta hospitalar, categorizado em: a) dias (2-7 dias); b) semanas (8-59 dias); c) meses (>60 meses). Todas as intercorrências são variáveis nominais categorizadas em quatro grupos. As categorias da amniorrexe prematura são: a) corrimento genital; b) ITU; c) corioamnionite; d) outros. As da insuficiência placentária são: 1-pré-eclâmpsia, 2-sofrimento fetal, 3-CIUR, e 4-outros. E as de malformação, são: a) hidronefrose; b) agenesia renal; c) rins policísticos; d) outros. A partir desses dados, as causas de oligoâmnio foram definidas e catalogadas em três grupos: a) insuficiência placentária; b) amniorrexe prematura; c) malformações geniturinárias; d) outros.

As condições de nascimento do recém-nascido (RN) foram categorizadas de forma numérica como índice de Apgar no 1º e 5º minutos e de forma binária como presença ou ausência de óbito fetal. O Apgar no 1º e 5º minutos foi categorizado em quatro grupos: a) de zero a dois (0-2); b) de três a cinco (3-5); c) de cinco a sete (5-7); d) de oito a dez (8-10).

As variáveis idade, tempo de internamento e condições de nascimento do recém-nascido foram relacionadas com as causas de oligoâmnio no estudo, enquanto que a variável óbito fetal foi relacionada com a idade em cada uma das etiologias.

Os dados selecionados foram submetidos à análise estatística, sendo suas frequências comparadas com o limite de significância de 5% (p<0,05) e intervalo de confiança de 95% no programa Epi-Info, versão 2007.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de Sergipe.

 

RESULTADOS

A MHFB/MNSL, referência estadual em gestação de alto-risco do estado de Sergipe, apresentou atendimento nos anos de 2004, 2005 e 2006 de 6.222. O total de gestantes corresponde ao somatório de gestantes internadas que evoluíram para parto normal ou cesáreo. O total de pacientes diagnosticadas com oligoâmnio nesse período foi de 1.006, notando prevalência de 16,16%.

A idade das gestantes variou entre 13 e 47 anos, com média de 20 anos, com acometimento predominante em tercigestas (40,1%) e nulíparas (43,3%) e oligoâmnio mais frequente no terceiro trimestre. Na Tabela 1 encontra-se a forma de parto mais comum, que foi a cesárea em 52,3% dos casos (p<0,05), enquanto que na Tabela 2 está exibida a maior causa de oligoâmnio evidenciada, a amniorrexe prematura, com 63,6% de frequência (p<0,05).

 

 

 

 

Em relação à faixa etária das gestantes por etiologia (p=0,0205), das 439 provocadas pela amniorrexe prematura, 87 (19,8%) apresentavam idades entre 10 e 19 anos, 233 (53,1%) entre 20 e 29 anos, 112 (25,5%) entre 30 e 39 anos e sete (1,6%) entre 40 e 49 anos. E das 239 pacientes com insuficiência placentária, 36 (15,1%) tinham entre 10 e 19 anos, 117 (49,0%) entre 20 e 29 anos, 72 (30,1%) entre 30 e 39 anos e 14 (5,9%) entre 40 e 49 anos. Na malformação fetal, quatro (33,3%) das 12 pacientes acometidas por essa causa estavam compreendidas entre 10 e 19 anos e cinco (41,7%) entre 20 e 29 anos.

Quanto ao tempo de internamento (p<0,00), entre as pacientes, 439 pacientes com oligoâmnio devido à amniorrexe prematura, 233 (53,1%) permaneceram internadas durante dois a sete dias, 205 (46,7%) entre oito e 59 dias e um caso (0,2%) acima de 60 dias. Na insuficiência placentária, do total de 239 grávidas diagnosticadas, 177 (74,1%) foram internadas no período de dois a sete dias e 62 (25,9%) entre oito e 59 dias. Das 12 hospitalizadas por malformação fetal, 10 (83,3%) internaram-se entre dois e sete dias e duas (16,7%) entre oito e 59 dias.

Avaliando as condições de nascimento do recém-nascido pelo índice de Apgar no 1º minuto (Tabela 3), em 175 daquelas com amniorrexe prematura (39,9%) e em 104 (43,5%) com insuficiência placentária, foi constatado Apgar no 1º minuto entre 5 e 7. Na malformação fetal, seis casos (50,0%) apresentaram índice de Apgar entre zero e dois (p<0,0251).

 

 

Por outro lado, no 5º minuto (p<0,0008) verificou-se que no oligoâmnio provocado pela amniorrexe prematura, 78 (17,8%) recém-nascidos manifestaram índice de Apgar no 5º minuto entre zero e dois, oito (1,8%) entre três e cinco, 44 (10,0%) e 309 (70,4%) entre oito e 10. Na insuficiência placentária, 32 casos (13,4%) tiveram essa escala entre zero e dois, dois (0,8%) entre três e cinco, 13 (5,4%) entre cinco e sete e 192 (80,3%) entre oito e 10. Por fim, na malformação foram seis (50,0%) casos com índice de Apgar no 5º minuto entre zero e dois, um (8,3%) entre três e cinco, zero (0,0%) entre cinco e sete e cinco (41,7%) entre oito e 10.

No aspecto das intercorrências, as da amniorrexe tiveram a seguinte distribuição: 15,9% de infecção urinária, 12% de corrimento genital, 4,3% de corioamnionite e 67,7% de outros. Na insuficiência placentária, foram encontrados 17,8% de CIUR, 12,2% de pré-eclâmpsia, 9,3% de sofrimento fetal e 60,7% de outras intercorrências. Na malformação fetal, as intercorrências se dividiram em 1,3% de agenesia renal, 0,3% de rins policísticos e 98,4% de outros.

Houve significância de óbito fetal associado às três causas de oligoâmnio, quando avaliados de acordo com a faixa etária da gestante. Notou-se a existência de associação entre as intercorrências de cada causa com o óbito fetal. Entre 20 e 29 anos, foram quatro mortes (12,9%) dos 31 casos de associações entre as intercorrências da amniorrexe prematura (Tabela 4), sete (8,2%) do total de 85 casos da insuficiência placentária (Tabela 5) e apenas uma morte fetal por malformação.

 

 

 

 

Houve apenas uma morte materna no percurso desta pesquisa, desencadeada por amniorrexe prematura, o que resultou em sepse materna e óbito fetal.

 

DISCUSSÃO

A idade média de 20 anos das pacientes com oligoâmnio na MHFB/MNSL correspondeu àquela verificada por Pierre et al.3, na Maternidade-Escola Assis Chateaubriand Universidade Federal do Ceará (MEAC-UFC), de que a amniorrexe prematura até a 26ª semana variou entre 14 e 42 anos, com média de 27 anos. Borna et al.14 constataram no Vali-e-Asr Hospital (VAH), no Teerã, idade materna média de 25 anos na ruptura prematura de membranas pré-termo com oligoâmnio, quando acontece entre 20 e 37 semanas. Pôde-se observar que a mais alta porcentagem da idade gestacional na admissão recaiu no 3º trimestre (>28 semanas), observada no mesmo contexto por Borna et al.14, que idade gestacional admissional média de 31 semanas, e por Rodriguez et al.15, que estudaram no Hospital Docente Gineco-obstétrico Julio Afonso Medina (HDGJAM), localizado em Matanzas, Cuba, o diagnóstico ultrassonográfico de oligoâmnio e sua relação com alguns fatores de gravidez e parto, cuja idade gestacional esteve entre 37 e 42 semanas.

A amniorrexe prematura foi a principal etiologia de oligoâmnio na MHFB/MNSL, obtendo frequência de 63,6%, concordando com o estudo realizado por Santos et al.16, realizado em maternidade pública do Ceará em 2006, que objetivava caracterizar a prematuridade dos RNs em decorrência da amniorrrexe prematura, encontrando nas mães taxa de 35,1% de RPM antes da 37ª semana. Em contrapartida, houve taxa de 16,2% de pré-eclâmpsia, enquanto que Madi et al.4, avaliando os resultados perinatais no oligoâmnio sem rotura das membranas amnióticas, obtiveram 29,6% de sofrimento fetal versus 17,6% de malformação congênita com predomínio do sistema geniturinário. Assim, negam a predominância de malformação urinária citada por Pauer et al.17 em sua publicação sobre a incidência de malformação em gestações complicadas com oligoâmnio e polidrâmnio, em Gopettingen, na Alemanha em 2003. A etiologia do oligoâmnio é variável com a idade gestacional. No início da gestação ele pode ser proveniente de malformação geniturinária ou amniorrexe prematura18 e, posteriormente, de insuficiência placentária ou rotura das membranas.1

No grupo das tercigestas houve alta frequência de oligoâmnio, concordando com o estudo que Machado realizou em Campinas durante no ano de 2001, no qual a média de gestações no oligoâmnio foi de 2,6.19

O achado mais frequente de oligoâmnio em nulíparas na MHFB/MNSL está enquadrado no artigo publicado por Rocha et al.20, que avaliaram a morbidade materna e morbimortalidade perinatal associadas à amniorrexe prematura na Maternidade-Escola da Universidade Federal de Alagoas (ME-UFAL) em 2002. Porém, as multíparas foram mais encontradas por Pierre et al.3 em seu trabalho com as repercussões maternas e perinatais da RPM até a 26ª semana na MEAC-UFC e por Borna et al.14, na VAH.

Entre as intercorrências, a mais alta frequência de infecção urinária entre as pacientes com amniorrexe prematura foi corroborada com achados da literatura, que reforçam a predominância de infecção urinária no terceiro trimestre da gestação, especialmente causada pelo estreptococos do grupo B de Lancerfield, patógeno da flora genital responsável por bacteriúria assintomática, com progressão para corioamnionite, sepse e óbito neonatais.10

Na insuficiência placentária, o CIUR foi a intercorrência mais frequente, demonstrado também por Coelho et al.21, explicado por ser a primeira manifestação antes do sofrimento fetal, devido à diminuição do fluxo sanguíneo da placenta para o feto. A hipóxia fetal ocasionada provoca redistribuição sanguínea, que se direciona para os órgãos nobres - coração e cérebro. Assim, as demais partes do organismo tornam-se carentes desse aporte.22 Os pulmões e os rins, importantes fontes de líquido amniótico, diminuem sua liberação e o crescimento fetal também é comprometido pela hipóxia aos tecidos fetais, originando o CIUR2,5, definido como peso fetal abaixo do percentil 10 para a idade gestacional7, induzindo o sofrimento fetal crônico por hipóxia crônica.5

A malformação geniturinária associou-se principalmente com a agenesia renal. Essa evidência concorda com Leite et al.18 que a encontrou mais frequentemente no início da gestação16. Essa evidência discorda do fato de que a malformação geniturinária é mais importante no final da gestação devido à expressiva colaboração da urina fetal nesse período.4

A cesárea predominou como forma de terminação do parto, assim como em outros trabalhos obstétricos, como Rodriguez et al.15, Voxman et al.23, Madi et al.4 e Borna et al.14, sendo uma constante em 52,3%. Embora a vigência de amniorrexe prematura preconize a indução do parto pela via vaginal, exceto quando há complicações na RPM22 ou, ainda, na presença de insuficiência placentária, sofrimento fetal, CIUR ou pré-eclâmpsia4, na qual a cesárea foi mais indicada. Em estudo realizado por Rodriguez et al.15, identificaram-se 66,7% de partos cesáreos avaliados no oligoâmnio de causas placentárias. Foi pesquisado por Voxman et al.23 no Women's and Children's Hospital, Califórnia, Estados Unidos, se o baixo ILA é prognóstico de efeitos adversos perinatais. E evidenciou-se que o ILA abaixo de cinco tende à cesárea devido ao sofrimento fetal, com prevalência de 47% no oligoâmnio em comparação a 20% no ILA superior a cinco. Madi et al.4, avaliando os resultados perinatais do oligoâmnio sem RPM no Hospital Geral de Caxias do Sul (HGCS), no Rio Grande do Sul, depararam com taxa de 70,6% de cesáreas. Borna et al.14 demonstraram larga frequência de partos cesáreos (23%X2,8%) no oligoâmnio em relação ao ILA normal. Pierre et al.3, no seu trabalho na ME-AC na UFC, em 2003, contabilizaram 75,8% de partos espontâneos. Outros pesquisadores, como Santos et al.16, investigaram a prematuridade entre RNs de mães com ruptura prematura de membrana em maternidade pública de Fortaleza em 2006, onde 51,3% evoluíram para o parto normal.

O tempo de internamento de oligoâmnio foi mais longo no intervalo de dois a sete dias, período semelhante notado por Macedo et al.7 na malformação geniturinária unilateral.8 Nas demais causas não há descrição desse tempo.

O índice de Apgar do RN no 1º minuto atingiu valores predominantes entre cinco e sete na amniorrexe prematura e na insuficiência placentária, enquanto que a malformação geniturinária alcançou índice entre zero e 2. Índice de Apgar no 1º minuto abaixo de sete em todas essas causas foi encontrado também por Rocha et al.20 na amniorrexe prematura, Queiroz et al. 6 na insuficiência placentária e Macedo et al.7 na malformação geniturinária. O índice Apgar no 5º minuto, por sua vez, permaneceu entre oito e 10 na maioria dos RNs oriundos de gestações com amniorrexe prematura, insuficiência placentária e malformação geniturinária, índices semelhantes aos de Rodriguez et al.15 O índice de Apgar abaixo de sete indica que o recém-nascido foi acometido por hipóxia e, no caso da amniorrexe prematura, a infecção ascendente atinge as vilosidades coriônicas, provocando edema e dificultando o fluxo sanguíneo entre placenta e feto.24 Quando abaixo de sete após o 5º minuto, o índice de Apgar indica que houve redução crônica do fornecimento de oxigênio para o feto, o que resulta na queda do fluxo sanguíneo pulmonar, enfraquecendo os movimentos fetais, o que leva à acidose com consequente asfixia.5

O óbito fetal foi uma ocorrência que esteve presente nas três causas de oligoâmnio, sendo avaliado de acordo com a faixa etária da gestante. A taxa de óbito fetal no oligoâmnio foi de 22,0% e na faixa etária predominante, entre 20 e 29 anos, alcançou o índice de 11,2%, diferentemente do valor de 86,2% de Pierre et al.3 na RPM até a 26ª semana e 1,96% de Madi et al.4 no oligoâmnio sem ruptura das membranas amnióticas. Em outra publicação, de Pauer et al.17, salientou-se índice de 19% de óbitos fetais intraúteros no oligoâmnio, sendo que nestes casos o oligoâmnio é predominantemente associado à malformação do trato urinário. Porém, outro estudo feito em Santiago do Chile, em 2005, por Ovalle et al.25, avaliou o efeito da invasão microbiológica na cavidade amniótica na ruptura prematura de membranas pré-termo, encontrando taxa de óbito fetal em caso de Streptococos agalactie no líquido amniótico de 46%.

A única morte materna apresentada aproximou-se da taxa de mortalidade averiguada por outros pesquisadores3, em geral, sendo nula.

 

CONCLUSÃO

A taxa de prevalência de oligoâmnio em Sergipe encontra-se elevada e sua principal causa provém da amniorrexe prematura provocada pela infecção urinária, evoluindo para o parto prematuro ocasionalmente e óbito fetal. Todavia, essas taxas de mortalidade estão dentro dos valores publicados na literatura. A cesárea continua preponderante, com rápida resolubilidade, dentro de dois a sete dias. Embora o índice de Apgar no 1º minuto seja mais significativo entre zero e dois, houve expressiva assistência neonatal, explicada pelo Apgar no 5º minuto entre oito e 10. O estudo em questão foi importante para determinar as principais causas de oligoâmnio no estado de Sergipe, a partir da análise comparativa com outras variáveis, a fim de averiguar a associação de outros fatores com essa doença.

 

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