RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 27 e-1899 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20170088

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Relato de Caso

Lipoma colônico invaginado

Colonic invaginated lipoma

Joao Paulo Luvizotto Alcântara de Pádua1; Augusto Castelli von Atzingen2; Rogério Mendes Grande3; Henrique de Brito Pires Cabeças4

1. Graduando em Medicina pela Universidade do Vale do Sapucaí (UNIVAS) (Graduando em Medicina)
2. Doutorado em Radiologia Clínica pela Universidade Federal de Sao Paulo-UNIFESP. Mestrado em Bioética pela Universidade do Vale do Sapucaí - UNIVAS/MG. (Médico Radiologista. Professor Auxiliar na Disciplina de Radiologia e Diagnóstico por Imagem na UNIVAS/MG, e Professor de Pós- Graduaçao no Mestrado de Bioética da UNIVAS)
3. Doutorando pela Fundaçao Antônio Prudente - AC Camargo Cancer Center (2013) e Mestrado em Patologia pela Universidade Federal de Sao Paulo - UNIFESPEPM (2007). (Médico Anatomopatologista do Hospital das Clínicas Samuel Libânio (HCSL) da UNIVAS. Professor Auxiliar de Ensino na Faculdade de Ciências da Saúde da UNIVAS)
4. Graduando em medicina pela UNIVAS, Pouso Alegre, MG. (Graduando em Medicina)

Endereço para correspondência

Joao Paulo Luvizotto Alcântara de Pádua
E-mail: jplap1993@gmail.com

Recebido em: 07/06/2017
Aprovado em: 23/11/2017

Instituiçao: Universidade do Vale do Sapucaí, Campus Central.

Resumo

O lipoma colônico, apesar de raro, é o segundo tumor benigno mais frequente do intestino grosso. Na maioria das vezes é pequeno e assintomático. Quando sintomáticos, são maiores que 2 cm, e apresentam-se com dor abdominal, sangue nas fezes e alteração dos hábitos intestinais. O objetivo deste trabalho é relatar um caso de lipoma colônico, além de dissertar a respeito da sintomatologia, diagnóstico e formas de apresentação e tratamento do mesmo.

Palavras-chave: Lipoma; Neoplasias do Colo; Colo.

 

INTRODUÇÃO

Os lipomas colônicos são tumores benignos não epiteliais, localizados normalmente na submucosa e em raros casos na subserosa do intestino grosso, podendo em algumas circunstâncias afetar todo o trato gastrointestinal. Possuem baixa incidência, com variação de 0,2% a 4%, de acordo com a literatura. Representam a segunda neoplasia benigna mais frequente no cólon, excluindo-se os pólipos.

São, normalmente, assintomáticos; no entanto, quando seu tamanho ultrapassa 2 a 3 cm pode gerar sintomas como dor abdominal, presença de sangue nas fezes e alteração do hábito intestinal. Tumores "gigantes" podem provocar obstrução intestinal com intussuscepção de cólon, e em alguns casos é relatada a eliminação espontânea do tumor.1-6

O diagnóstico clínico é difícil e depende do tamanho e localização do tumor. Exames de imagem como tomografia, ressonância magnética e/ou ultrassom auxiliam no diagnóstico.7

 

RELATO DO CASO

L.A.D., 53 anos, masculino, relata cólica abdominal em flanco esquerdo e fossa ilíaca esquerda há 15 dias, que evolui para tenacidade abdominal com posterior diarreia, apresentando fezes líquidas com muco e raias de sangue, bem como presença de flatulências; nega febre. Fazia uso de Albendazol 400mg havia 5 dias; Cloridrato de Ciprofloxacina de 500mg 2 vezes ao dia, e Nitazoxanida como tratamento empírico de enteroinfecções e verminoses.

Ao exame clínico, BEG, afebril, anictérico, acianótico, eupneico. Ao exame físico, abdome endurecido em quadrante inferior esquerdo (QIE), sem abaulamentos ou retrações, com dor tipo hiperalgesia aguda à palpação profunda, do tipo pontada em fossa ilíaca esquerda (FIE), sem irradiação, tendo por fator atenuante a compressão da fossa ilíaca esquerda. Inspeção normal, toque normal e anuscopia normal.

Foi sugerido pelo serviço isquemia, doença diverticular e neoplasia como diagnóstico diferencial devido às características da dor do paciente. A conduta que se seguiu foi a realização de uma tomografia abdominal total para possivelmente confirmar o diagnóstico, a qual apresentou um laudo de imagem sugestiva de lipoma colônico.

Realizou-se ainda uma colonoscopia sob sedação com visualização de lesão sugestiva de lipoma invaginado no reto superior, e pedículo e mucosa sem sinais de alteração vascular. Junto à lesão, encontrou-se pequeno orifício na mucosa, sugestivo de fístula, a qual tinha por sintomas dor constante, localizada na regiao perianal, com fator de piora ao sentar e defecar, sem fator de melhora; além disso, havia hiperemia perianal e presença de pus (Figuras 1 e 2).

 


Figura 1. Corte axial de Tomografia Computadorizada com contraste evidenciando formação expansiva com densidade de gordura medindo 6,9 x 4,9cm na fossa ilíaca esquerda no interior do cólon descendente.

 

 


Figura 2. Corte coronal de Tomografia Computadorizada com contraste evidenciando formação expansiva com densidade de gordura medindo 5,4 x 4,8cm na fossa ilíaca esquerda no interior do cólon descendente.

 

O material ressecado por laparotomia foi enviado para estudo anatomopatológico, que evidenciou estrutura nodular, lobulada, macia, de tonalidade pardo-amarelada com porções pardacentas e as seguintes dimensões: 7,0 x 5,0 x 4,5 cm (Figura 3).

 


Figura 3. Descrição Macroscópica Lipoma Colônico - Estrutura nodular, de dimensões 7,0 x 5,0 x 4,5cm, tonalidade pardo clara; aos cortes é macia, pardo-amarelada e homogênea.

 

Os cortes histológicos mostraram tratar-se de neoplasia mesenquimal benigna constituída por adipócitos maduros entremeados por delicados septos fibrosos e vasos sanguíneos, localizada da submucosa (Figuras 4 e 5).

 


Figura 4. Lipoma Colônico - Neoplasia benigna constituída por adipócitos maduros sem atipias nucleares, entremeados por delicados vasos sanguíneos.

 

 


Figura 5. Lipoma Colônico - Proliferação de adipócitos maduros na submucosa.

 

Com a confirmação de lipoma colônico, foi realizada uma colostomia concomitante à laparotomia, e o paciente teve alta em bom estado geral.

 

DISCUSSÃO

Os lipomas são estruturas neoplásicas benignas da gordura amarela ou comum, raramente delimitados por cápsula fibrosa. Sua distribuição mais comum é no cólon ascendente, porém também possível de ser encontrado no ceco, cólon transverso e cólon descendente. São, em sua maioria, submucosos e geralmente únicos.

Ivekovic et al.8 analisaram 5563 endoscopias, nas quais em apenas 11 foi identificado lipoma colônico (0,02%); destes, 6 eram homens (55%) com idade média de 68 anos. A colonoscopia foi indicada para esses pacientes por alteração nos hábitos intestinais de 7 deles (64%), carcinoma colorretal em 3 (27%), e hemorragia gastrointestinal em 1 paciente (9%). As lesões foram encontradas na flexura hepática em 4 pacientes (36%), no ceco ou cólon ascendente também em 4 pacientes (36%), sigmoide de 2 pacientes (18%) e no cólon transverso de 1 paciente (9%).

Os sintomas estao relacionados ao seu tamanho. Lipomas de até 2 cm de diâmetro são assintomáticos e os maiores podem produzir sintomas como dor abdominal, fezes sanguinolentas, alteração do hábito intestinal e perda de peso. Podem ainda apresentar complicações que incluem sangramento e obstrução intestinal, e mais comumente a intussuscepção.9-12

O diagnóstico de lipoma colônico é estabelecido pela associação de exame clínico, proctológico, colonoscópico e exames de imagem (ultrassom e tomografia de abdômen), com posterior confirmação pelo estudo histopatológico do espécime cirúrgico.

O tratamento depende da localização, sintomas e tamanho do lipoma. Lesões menores que 2 cm são tratadas por ressecção endoscópica, aliada à ultrassonografia endoscópica para reduzir os riscos de perfuração; atualmente, já existem relatos de ressecção de lipoma colônico gigante por endoscopia pela técnica "loop-and-let-go", como relatado por Ivekovic et al.8 O tratamento cirúrgico é recomendado para lesões maiores que 2 cm, sendo mais comumente realizada a excisão da lesão, a colectomia parcial e a hemicolectomia.13

 

CONCLUSÃO

Devido aos sintomas de dor, alteração do hábito intestinal e hemorragia gastrointestinal, o paciente procurou o serviço, o qual, por meio da anamnese, exame clínico e exames complementares, sugeriu a hipótese de lipoma colônico, sendo diagnosticado como parido no reto superior pela colonoscopia. É ponderoso observar a dimensão do presente tumor (7,0 x 5,0 x 4,5 cm), o que poderia ser a causa da dor abdominal apresentada pelo paciente, concomitante à intussuscepção; porém, por ser uma dor aguda acredita-se a dor ser mais decorrente da intussuscepção, partindo do princípio de que a evolução dos lipomas é crônica.

O tratamento de escolha foi o cirúrgico devido ao tamanho do tumor, o qual gerou manifestações clínicas que necessitavam de intervenção rápida, devido às possíveis complicações.

No presente relato, podemos constatar que os dados encontrados são coerentes com a literatura consultada; constatando a notoriedade e raridade do presente caso, bem como a complexidade de seu diagnóstico.

 

REFERENCIAS

1. Aytaç B, Yerci Ö, Gürel S, Ferik Z. Colonic Lipomas Mimicking Colon Cancer. Turk J Pathol. 2010;26(3):196-9.

2. Zhang X, Ouyang J, Kim YD. Large ulcerated cecal lipoma mimicking malignancy. World J Gastrointest Oncol. 2010;2(7):304-6.

3. Nallamothu G, Adler DG. Large colonic lipomas. Gastroenterol Hepatol (N Y). 2011;7(7):490-2.

4. Ghidirim G, Mishin I, Gutsu E, Gagauz I, Danch A, Russu S. Giant submucosal lipoma of the cecum: report of a case and review of literature. Rom J Gastroenterol. 2005;14(4):393-6.

5. Jiang L, Jiang LS, Li FY, Ye H, Li N, Cheng NS, et al. Giant submucosal lipoma located in the descending colon: a case report and review of the literature. World J Gastroenterol. 2007;13(42):5664-7.

6. Ryan J, Martin JE, Pollock DJ. Fatty tumours of the large intestine: a clinicopathological review of 13 cases. Br J Surg. 1989;76(8):793-6.

7. Pereira JM, Sirlin CB, Pinto PS, Casola G. CT and MR imaging of extra-hepatic fatty masses of the abdomen and pelvis: techniques, diagnosis, differential diagnosis, and pitfalls. RadioGraphics. 2005;25(1):69-85.

8. Ivekovic H, Rustemovic N, Brkic T, Ostojic R, Monkemuller K. Endoscopic ligation ("Loop-And-Let-Go") is effective treatment for large colonic lipomas: a prospective validation study. BMC Gastroenterol. 2014;14:122.

9. Bromberg SH, Zampieri JC, Cavalcanti LAF, Waisberg J, Barreto E, De Godoy AC. Lipomas colorretais: correlação anatomoclínica de 29 casos. Rev Assoc Med Bras 1997;43(4):319-25.

10. Rogers SO Jr, Lee MC, Ashley SW. Giant colonic lipoma as lead point for intermittent colo-colonic intussusception. Surgery. 2002;131(6):687-8.

11. Cruz GMG, Oliveira AT, Rodrigues JVL. Lipomas colorretais: apresentação de 15 casos pessoais e revisão da literatura. Rev Bras Coloproct. 1997;17(1):32-43

12. Garcea D, Lucci E, Lattuneddu A. Occlusion par invagination sur un lipome colique. J Chir. 2002;139(6):351-2.

13. Paskauskas S, Latkauskas T, Valeikaite G, Parseliunas A, Svagzdys S, Saladzinskas Z, et al. Colonic intussusception caused by colonic lipoma: a case report. Medicina (Kaunas). 2010;46(7):477-81.