ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Antipsicóticos injetáveis típicos e atípicos de ação rápida em pacientes esquizofrênicos em uso de atípicos orais: um relato do Brasil
Typical and atypical fast-acting injectable antipsychotics in schizophrenia inpatients taking oral atypicals: a report from Brazil
Fernando Madalena Volpe1; Alessandra Cristina Machado Barata Tavares2; Ludimila Figueiredo de Souza2; Patrícia Gomes Magalhaes2; Raíza Randazzo Rocha2; Hessem Miranda Neiva3; Cristina Mariano Ruas4
1. Médico da Gerência de Ensino e Pesquisa da Fhemig, Fundaçao Hospitalar de Minas Gerais
2. Acadêmicas de Medicina do Centro Universitário de Belo Horizonte, UNIBH
3. Coordenadora do Apoio Diagnóstico e Terapêutico da Fhemig, Fundaçao Hospitalar de Minas Gerais
4. Professora Adjunta da Faculdade de Farmácia, Universidade Federal de Minas Gerais
Alessandra Cristina Machado Barata Tavares
Hospital Galba Velloso
Belo Horizonte, MG - Brasil
E-mail: alessandrambtavares@gmail.com
Resumo
INTRODUÇÃO: Combinar antipsicóticos em pacientes esquizofrênicos não é uma prática rara. Na maioria das vezes, médicos prescrevem antipsicóticos típicos e atípicos associados. Para mostrar a magnitude desse problema, uma pesquisa foi desenvolvida no Hospital público Galba Velloso na cidade de Belo Horizonte.
OBJETIVO: estimar a freqüência e a dosagem de antipsicóticos típicos e atípicos injetáveis em uma amostra de 1171 pacientes esquizofrênicos internados entre 2010 -2013, destinados a serem tratados apenas com atípicos.
METODO: Com base nas prescrições dos pacientes esquizofrênicos internados, selecionamos os 105 pacientes que utilizaram antipsicóticos atípicos com antipsicóticos convencionais.
RESULTADO: Dos pacientes selecionados, 59 utilizaram risperidona, 27 a olanzapina, 11 a clozapina, 5 a quetiapina e 3 a ziprasidona. Dezessete indivíduos receberam pelo menos uma ampola de haloperidol injetável de ação rápida após o início do antipsicótico atípico, 10 receberam olanzapina IM e nenhum recebeu clorpromazina. O Haloperidol injetável foi geralmente administrado em associação com a prometazina. Os resultados agregados indicam que a olanzapina e a ziprasidona IM foram mais eficazes do que haloperidol e a prometazina IM na redução da agitação e comportamento agressivo nas primeiras 2 horas, com menor risco de efeitos colaterais extrapiramidais de curto prazo.
CONCLUSÃO: O uso de haloperidol injetável de ação rápida para pacientes que usam exclusivamente atípicos orais foi mais frequente do que a olanzapina IM, mas não resultou em incremento na necessidade do uso de anticolinérgico.
Palavras-chave: Esquizofrenia, Antipsicóticos, Haloperidol, Olanzapine, Injeções.
INTRODUÇÃO
A decisão de usar um antipsicótico atípico para a esquizofrenia geralmente é motivada por uma história anterior de resistência ao tratamento e / ou efeitos colaterais intoleráveis aos antipsicóticos convencionais, também conhecidos como neurolépticos.1,2 Ao considerar o tratamento farmacológico para esquizofrenia em pacientes internados, o objetivo principal é mitigar a crise psicótica que determinou a internação hospitalar, mas, concomitantemente, garantir uma efetividade contínua após a alta hospitalar. Isso envolve a adesão ao tratamento, que é amplamente motivada por um perfil de segurança, que envolve a baixa incidência de efeitos colaterais aliados à percepção subjetiva do alívio dos sintomas.3 Como 40-60% dos esquizofrênicos são parcial ou totalmente não aderentes e a taxa de recaída em um ano pode ser tao alta quanto 80% em pacientes não tratados, a escolha apropriada do agente antipsicótico durante a internação pode influenciar os desfechos em longo prazo.4
Combinar antipsicóticos não é uma prática rara, apesar de não haver respaldo na literatura ou em protocolos clínicos. Na maioria das vezes, os médicos prescrevem dois ou mais antipsicóticos concomitantemente, direcionados a sintomas específicos ou tentam reduzir os efeitos colaterais diminuindo a dose de um dos antipsicóticos5. Problemas potenciais ocorrem, no entanto, quando a combinação de antipsicóticos convencionais e atípicos é motivada pela falta de opções disponíveis na farmácia hospitalar. Esse é o caso do Brasil, onde desde 2015 os dois antipsicóticos injetáveis de ação rápida (Olanzapina e Ziprasidona) disponíveis anteriormente foram retirados do mercado, eliminando a possibilidade de seu uso.
O objetivo foi estimar a frequência e a dosagem de antipsicóticos típicos e atípicos injetáveis naquela subamostra de pacientes internados, destinados a serem tratados apenas com atípicos. Além disso, investigamos se houve diferenças no uso total de anticolinérgicos durante as internações (após o início dos atípicos orais) entre aqueles que receberam injeções de haloperidol e aqueles que não receberam.
MATERIAL E MÉTODO
Trata-se de um estudo descritivo, com prescrições médicas de um hospital psiquiátrico público (Hospital Galba Velloso) em Belo Horizonte, relativas ao período de 2010 a 2013.
Foram incluídas as prescrições de pacientes com: i. tempo de internação superior a 24 horas; ii. com diagnóstico de esquizofrenia (F20.0); e iii. que receberam alta com prescrição de antipsicóticos atípicos, sem combinação com antipsicóticos convencionais disponíveis gratuitamente para o uso no sistema público de saúde.
O fato da prescrição à alta incluir apenas antipsicóticos atípicos foi considerado como um indicativo da intenção do médico prescritor de não utilizar antipsicóticos convencionais nesse subgrupo de pacientes.
Análise dos dados
Foram conduzidas análises descritivas de frequências de uso de cada medicamento, bem como de a quantidade mediana e a amplitude das doses administradas. O teste de Kruskall-Wallis foi utilizado para comparar as doses medianas totais prescritas de anticolinérgicos entre aqueles que receberam haloperidol ou olanzapina injetável, e também para comparar a dose mediana total de haloperidol injetável de acordo com a especialidade farmacêutica do antipsicótico atípico oral prescrito.
Aspectos éticos
Este trabalho é um dos resultados parciais da pesquisa "AVALIAÇÃO FARMACOECONOMICA E FARMACOEPIDEMIOLOGICA DE NEUROLÉPTICOS ATIPICOS NO SISTEMA UNICO DE SAUDE" aprovada pelo CEP-FHEMIG (Parecer 491.925; Parecer Técnico da GEP 031/2012).
Recebeu financiamento do CNPq (456373/2014-4) e da FAPEMIG (APQ-03616-13).
RESULTADO
No período de 2010 a 2013, 1.171 pacientes esquizofrênicos foram internados no hospital. Destes, 105 pacientes (9,0%) receberam alta com antipsicóticos atípicos, sem combinação com antipsicóticos convencionais.
A distribuição desses casos por especialidade farmacêutica foi a seguinte: risperidona (n = 59; 56,2%), olanzapina (n = 27; 25,7%), clozapina (n = 11; 10,5%), quetiapina (n = 5; 4,7%) ou ziprasidona (n = 3; 2,9%).
Observou-se que 17 indivíduos (16,1%) receberam pelo menos uma ampola de haloperidol injetável de ação rápida após o início do antipsicótico atípico (n=17) e, 10 (9,5%) receberam olanzapina IM (n=10). Nenhum paciente recebeu prescrição de clorpromazina injetável.
Quando o haloperidol injetável foi utilizado, a mediana do número total de ampolas administradas até a alta foi de 1 (5,0 mg), variando de 1 a 6 (5,0-30,0 mg). O Haloperidol injetável foi geralmente administrado em associação com a prometazina.
Para a olanzapina IM, a mediana do número total de ampolas foi de 3 (30,0 mg; amplitude de 5,0-120,0 mg).
O biperideno oral foi usado em 38 pacientes (36,2%), e a mediana da dose total foi de 18,0 mg (2,0-280,0 mg). Não foram encontradas diferenças na mediana das doses totais de biperideno entre aqueles que receberam haloperidol, olanzapina ou qualquer outro injetável (p = 0,489), e nenhuma diferença nas doses totais de haloperidol injetável, de acordo com a especialidade farmacêutica dos atípicos orais prescritos (p = 0.788)
DISCUSSÃO
Apesar de estar disponível para prescrição nesse hospital público no período do estudo, supreendentemente a preferência da prescrição de antipsicótico injetável de ação rápida não recaiu sobre a olanzapina, mesmo em se tratando de pacientes cuja prescrição oral era exclusivamente de atípicos.
A escolha pelo uso do antipsicótico atípico, ao invés do convencional, pode se dar tanto por falta de resposta (resistência), quanto pelos efeitos adversos intoleráveis que alguns pacientes apresentam.1 Neste segundo caso é que se encontram os maiores riscos: o uso de antipsicóticos, especialmente os convencionais, pode conduzir a efeitos colaterais extrapiramidais graves em pacientes com maior sensibilidade.6 Através do bloqueio não-seletivo dos receptores dopaminérgicos no sistema nigroestriatal, efeitos como distonias agudas, acatisia e parkinsonismo, podem causar grande desconforto aos pacientes. Estes efeitos adversos, no contexto da linha de cuidado de pacientes de difícil manejo, podem minar a confiança dos pacientes e dificultar a adesão ao tratamento ambulatorial de continuação.2,7
Nesse contexto, a utilização de haloperidol injetável de ação rápida em pacientes destinados a utilizar atípicos poderia ser particularmente arriscada. Um indicativo da ocorrência desses efeitos adversos seria a necessidade de utilizar anticolinérgicos (como o biperideno) para atenuá-los. Mas, interessantemente, nesta amostra os casos que receberam haloperidol injetável não receberam doses maiores de anticolinérgicos do que aqueles que receberam olanzapina injetável.
Resultados agrupados de outros estudos indicam que tanto a olanzapina como a ziprasidona IM foram mais eficazes que o haloperidol + prometazina na redução da agitação e comportamento agressivo nas primeiras 2 horas, com um risco menor de efeitos colaterais extrapiramidais de curto prazo.8 No entanto, as evidências disponíveis derivam de amostras não selecionadas de pacientes agitados - nenhum estudo abordou a eficácia ou a incidência de sintomas extrapiramidais em uma amostra particular de indivíduos esquizofrênicos que não respondem ou são intolerantes a antipsicóticos típicos.
CONCLUSÃO
Nossos resultados mostram que em um hospital público psiquiátrico brasileiro, o uso de haloperidol injetável de ação rápida para pacientes em uso exclusivamente de atípicos orais foi mais frequente que a olanzapina IM, mas não resultou em um incremento na necessidade de uso de anticolinérgicos.
No entanto, considerando os riscos potenciais em pacientes específicos, a retirada dos atípicos injetáveis de ação rápida do mercado reduziu o arsenal terapêutico disponível para os casos de alta probabilidade de desenvolvimento de efeitos extrapiramidais graves.
REFERENCIAS
1. Hugenholtz GW, Heerdink ER, Meijer WE, Stolker JJ, Egberts AC, Nolen WA. Reasons for switching between antipsychotics in daily clinical practice. Pharmacopsychiatry. 2005; 38:122-4.
2. Masand PS. A review of pharmacologic strategies for switching to atypical antipsychotics. Prim Care Companion J Clin Psychiatry. 2005; 7:121-9.
3. Liu-Seifert H, Adams DH, Kinon BJ. Discontinuation of treatment of schizophrenic patients is driven by poor symptom response: a pooled post-hoc analysis of four atypical antipsychotic drugs. BMC Med. 2005; 3:21.
4. Singh SM, Haddad PM, Husain N, Heaney F, Tomenson B, Chaudhry IB. Cross-sectional comparison of first-generation antipsychotic long-acting injections vs risperidone long-acting injection: patient-rated attitudes, satisfaction and tolerability. Ther Adv Psychopharm. 2016; 162:71.
5. Volpe FM, Santos AS, Rodrigues LS, Rocha RR, de Magalhaes PG, Ruas CM. Current inpatient prescription practices for the treatment of schizophrenia in public hospitals of Minas Gerais, Brazil. Rev Bras Psiquiatr 2017; 39(2):190-2.
6. Marder S, Stroup ST. Pharmacotherapy for schizophrenia: side effect management. UpToDate; 2016.
7. Oliveira IR. Antipsicóticos atípicos: farmacologia e uso clínico. Rev Bras Psiquiatr 2000; 22:38-40.
8. Lima FB, Cunha RS, Costa LM, Santos-Jesus R, Sena EP, Miranda-Scippa A, Ribeiro MG, Oliveira IR. Meta-analysis for evaluate the efficacy and safety of olanzpine compared to haloperidol in the treatment of schizophenia: preliminary findings. J Bras Psiquiatr. 1999; 48(4):169-75.
9. Duggan L, Fenton M, Rathbone J, Dardennes R, El- Dosoky A, Indran S. Olanzapine for schizophrenia. Cochrane Database Syst Rev; 2005.
10. Huf G, Alexander J, Gandhi P, Allen MH. Haloperidol plus promethazine for psychosis-induced aggression. Cochrane Database Syst Rev. 2016; 11.
Copyright 2025 Revista Médica de Minas Gerais
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License