RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 28. (Suppl.5) DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20180132

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Artigo Original

Ocorrência de úlcera por pressão e perfil epidemiológico e clínico dos pacientes internados em uma unidade hospitalar da Fundação Hospitalar de Minas Gerais

Occurrence of pressure ulcer and epidemiological and clinical profile of patients hospitalized in a hospital unit of the Hospitalar de Minas Gerais Foundation

Cynthia Carolina Duarte Andrade1; Aniele Cristina Ribeiro2; Carla Alessandra Silva Carvalho3; Cristina Mariano Ruas4; Eline Lima Borges5

1. Enfermeira intensivista, doutoranda e mestre em Medicamentos e Assistência Farmacêutica pela Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Membro da Comissao Central de Protocolos Clínicos da Fundaçao Hospitalar de Minas Gerais (FHEMIG)
2. Enfermeira intensivista da FHEMIG
3. Enfermeira da FHEMIG
4. Farmacêutica doutora e mestre em Saúde Pública pela UFMG. Professora do programa de pós-graduaçao em Medicamentos e Assistência Farmacêutica e da graduaçao da Faculdade de Farmácia da UFMG. Professora e coordenadora do colegiado do curso Farmácia da UFMG
5. Enfermeira estomaterapeuta, doutora pela USP e mestre pela UFMG. Professora associada da Escola de Enfermagem da UFMG, subcoordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Cuidado e Desenvolvimento Humano e coordenadora do Curso de Especializaçao em Assistência de Enfermagem de Média e Alta Complexidade na área de Enfermagem em Estomaterapia

Endereço para correspondência

Cynthia Carolina Duarte Andrade
Fundaçao Hospitalar de Minas Gerais
MG - Brasil
E-mail: cynthiacarolinaduarteandrade@gmail.com

Resumo

INTRODUÇÃO: A evolução dos cuidados de saúde é constante, porém, apesar do caráter prevenível, a ocorrência de Lesão por Pressão (LP) permanece elevada, particularmente nos doentes hospitalizados.
OBJETIVO: Realizar uma avaliação epidemiológica dos pacientes com LP, sob a perspectiva do SUS, em uma unidade hospitalar de atendimento a pacientes crônicos da Fundação Hospitalar de Minas Gerais, no período compreendido entre janeiro de 2010 a dezembro de 2014.
MÉTODO: Foi construída uma coorte histórica e calculadas as medidas de frequência de LP. Para avaliar a existência e o grau de associação entre as variáveis foi realizada uma análise multivariada com a regressão de Poisson. O nível de significância adotado para a análise final foi 0,05.
RESULTADOS: Foram avaliados um total de 258 prontuários. A incidência e prevalência de LP foram 29,41% e 90,70%, respectivamente. As variáveis que apresentaram associação estatística significativa com o número de LP foram: cor da pele parda, idade, escore de Braden na admissão, tempo de internação e óbito durante o tempo de acompanhamento do estudo. Discussão: Os resultados desse estudo revelam que a ocorrência de LP em instituições de retaguarda de hospitais que atendem politrauma é muito elevada dada as peculiaridades desse perfil de pacientes.
CONCLUSÃO: O desenvolvimento de um programa de prevenção de LP adaptada para uma população específica (com ferimentos de politrauma), além de relevante, pode ser considerado como um avanço/subsídio necessário para gestao de LP desses pacientes.

Palavras-chave: Sistema Unico de Saúde; Ulcera por pressão; Incidência; Estudos de Coortes.

 

INTRODUÇÃO

Lesão por pressão (LP) é um dano localizado na pele e/ou tecidos moles subjacentes, geralmente sobre uma proeminência óssea ou relacionada ao uso de dispositivo médico ou a outro artefato. A lesão pode se apresentar em pele íntegra ou como úlcera aberta e pode ser dolorosa. A lesão ocorre como resultado da pressão intensa e/ ou prolongada, em combinação com o cisalhamento.1 Apesar de a pressão ser considerada como o principal fator de risco, é a interação da pressão com outros fatores que contribuem para o dano tecidual. São vários os fatores (intrínsecos e extrínsecos) que predispoem o aparecimento de LP: inatividade, imobilidade, desnutrição, hipoproteinemia, anemia, emagrecimento, obesidade, sudorese, incontinência de esfíncteres, doença vascular, edema localizado, desidratação, sedação, déficit neurológico, umidade, má oxigenação, resistência tecidual baixa, infecção, extremos de idade, condições crônicas de saúde, tabagismo, disfunção sensorial, cirurgias, internações prolongadas, doenças associadas e polifarmácia.2

Apesar do caráter prevenível das UP e da evolução constante dos cuidados de saúde, a ocorrência das LP permanece elevada, particularmente nos doentes hospitalizados. No cenário internacional a prevalência varia de 5,0 a 23,0% e a incidência de 2,7 a 7%.3,4,5,6,7 No Brasil, a prevalência e incidência variam de 10,95 a 18,8% e de 22,5 a 41,0%, respectivamente.8,9,10 Todavia, esses estudos epidemiológicos brasileiros geraram estimativas pontuais impossibilitando comparação dos dados.

A prevenção, se comparada com a gestao do tratamento, é o caminho mais preciso para se atingir a qualidade dos cuidados, pois aumenta a qualidade de vida e reduz sofrimento aos pacientes e custos para os sistemas de saúde.11 A rápida identificação de pacientes em risco para o desenvolvimento de LP permite a adoção imediata de medidas preventivas. Por isso, logo na admissão de todos os pacientes, através da inspeção da pele, devem ser identificadas as LP quando existentes e aplicada uma escala preditiva de risco para o desenvolvimento de LP.12 A Escala de Braden é a ferramenta mais utilizada para predizer o risco que o paciente tem de desenvolver LP. Ela auxilia o enfermeiro na avaliação clínica e na detecção de fatores de risco em evidência. A partir disso, é possível planejar estratégias efetivas e individualizadas de prevenção.13

LP não é uma temática recente no cenário de pesquisas, sabe-se que está associada com o aumento do tempo de internação e da carga de trabalho para enfermagem, maior morbi-mortalidade dos pacientes internados e aumento de custos para os sistemas de saúde. Apesar disso, no Brasil, os estudos epidemiológicos sobre LP ainda são escassos. O objetivo deste trabalho foi realizar uma avaliação epidemiológica dos pacientes com LP, sob a perspectiva do SUS, em uma unidade hospitalar de atendimento a pacientes crônicos da FHEMIG, no período compreendido entre janeiro de 2010 a dezembro de 2014.

 

METODOLOGIA

Trata-se de uma coorte histórica desenvolvida em uma unidade da rede FHEMIG que é retaguarda do Hospital Joao XXIII para casos crônicos, neurológicos e ortopédicos que necessitem de internações de longa permanência. Foram incluídos no estudo: i. pacientes adultos, com idade igual ou superior a 18 anos; ii. que estavam expostos ao risco de adquirir LP, conforme escore da Escala de Braden, e/ou que já apresentavam LP; período de internação de, no mínimo, vinte e quatro horas. Os dados foram coletados no período junho a dezembro de 2014 dos prontuários e documentos dos pacientes que estiveram internados de 2010 a 2014. Para a coleta de dados, foi utilizado um formulário construído a partir das informações disponíveis em prontuários (dados demográficos e clínicos). Este formulário foi previamente testado no local onde a pesquisa foi realizada a partir da análise de cinco prontuários. Esse teste permitiu realizar adequações e favorecer a coleta.

Para o cálculo da incidência de casos novos de LP desenvolvidas no período compreendido entre janeiro de 2010 e dezembro de 2014 na população de risco foi utilizada a seguinte fórmula: Incidência = nº total de pessoas que desenvolveram LP/ total acumulado da população sob risco de adquirir LP

Para o cálculo da prevalência de LP no período compreendido entre janeiro de 2010 e dezembro de 2014 foi utilizada a seguinte fórmula: Prevalência = nº total de pessoas com LP durante o período do estudo/ total acumulado da população sob risco de adquirir LP.

A análise estatística contou com uma variável dependente (número de LP na admissão hospitalar), variáveis independentes categóricas (Sexo -feminino/masculino; Cor da pele - branca/parda/preta; Escore de Braden na admissão hospitalar - baixo/moderado/alto; e óbito - sim/não) e variáveis independentes contínuas (idade - anos; e tempo de internação - dias).

As variáveis contínuas foram descritas em suas medidas de tendência central (média, mediana) e de dispersão (desvio padrao) e variáveis categóricas foram descritas em números absolutos e porcentagens. Para avaliar a existência e o grau de associação entre as variáveis dependentes e independentes foi realizada uma análise multivariada, utilizando o modelo de regressão de Poisson, uma vez que as variáveis respostas são contagens (Número de LP na admissão hospitalar). O nível de significância adotado para as análises foi de 0,20, com exceção do modelo final para o qual foi adotado o nível de significância de 0,05. Para análise estatística a variável cor da pele foi inclusa como variável Dummy, tendo como referência a cor branca por ser considerada como fator de risco para LP na literatura. Para evitar multicolinearidade foi necessário excluir uma das categorias de cada variável, dado que esta categoria será combinada com as demais. No caso da variável cor da pele foi excluída a categoria cor branca. A variável tempo de internação foi dicotomizada pela mediana (108 dias) sendo o tempo de internação maior que 108 dias considerado como risco. A variável Escore de Braden na admissão foi categorizada em baixo, moderado e alto e o escore baixo foi considerado como referência. Vale lembrar para este caso que, na literatura, o escore alto atribui maior risco de o paciente desenvolver LP. Conforme a avaliação registrada nos prontuários no período de 2010 a 2013, para pontuações das subescalas de Braden maior que 16 o risco baixo; entre 11 e 16, risco moderado e menores ou igual a 11 foi considerado como sendo risco alto. A partir de 2014, a escala de Braden passou a ser registrada em prontuários considerando como sendo sem risco as pontuações de 19 a 23; baixo risco de 15 a 18; risco moderado de 13 a 14; alto risco de 10 a 12 e altíssimo risco maior ou igual 9.

O critério adotado para escolha do modelo foi o Critério de Informação de Akaiake (AIC) é uma medida do grau de informação que se perde ao adotar um determinado modelo. Esse índice é utilizado como um parâmetro de avaliação da adequação dos modelos, tornando possível verificar ao mesmo tempo qualidade da informação e qualidade da ligação entre as variáveis com o número de variáveis que é utilizada. Quanto menor esse índice mais adequado está o modelo aos dados. Para auxiliar a análise estatística dos dados foram utilizados os softwares Microsoft Excel e Software R.

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e à Gerência de Ensino e Pesquisa e ao Comitê de Ética e Pesquisa da FHEMIG (co-participante) e atendeu às normas estabelecidas pela Resolução nº 466, de 2012 do Conselho Nacional de Saúde, que trata de pesquisas em seres humanos. Os números dos pareceres consubstanciados aprovados são 758.158 e 860.890.

Houve dispensa de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) devido ao elevado número de pacientes e dificuldade ou impossibilidade de acessá-los. Entretanto, foram adotadas medidas de cautela para preservar a identidade dos participantes da pesquisa, respeitando-se as diretrizes nacionais e internacionais de condução de pesquisas envolvendo seres humanos.

 

RESULTADOS

Os resultados deste estudo incluem a caracterização demográfica e clínica dos pacientes, as medidas de frequência (incidência e prevalência) e os fatores associados ao aumento do número de LP.

Caracterização demográfica e clínica dos pacientes

Foram avaliados um total de 258 prontuários, a maior parte dos pacientes era do sexo masculino (76,7%) e de cor parda (50,4%). Apresentavam idade média de 47±16,29 anos, mediana de 46. A idade mínima foi 18 anos e a máxima 93 anos. Houve predomínio da faixa etária de 30 a 50 anos sendo que, 42 indivíduos eram idosos e 203 eram não idosos (Tabela 1).

 

 

Quanto à procedência, 82,6% dos pacientes foram encaminhados do Hospital Pronto Socorro Joao XXIII (HPSJXXIII). Em relação à evolução, 33,3% evoluíram a óbito, 18,2% receberam alta e 2,7% foram transferidos para outra unidade hospitalar. (Tabela 2).

 

 

No que diz respeito ao tempo de internação, a média foi de 219±296 dias com variação de 2 a 1700 dias e mediana de 108 dias. A média de tempo de internação para ocorrência do desfecho óbito foi de 423±1490 dias, mediana de 109 dias, com variação de 1 a 40,7 anos

Entre 2010 e 2013 foram admitidos um total de 178 pacientes. Destes, 33,7% apresentaram alto risco para o desenvolvimento de LP; 62,9% apresentaram moderado risco e 3,4% apresentaram baixo risco (Tabela 3). Em 2014 foram admitidos um total de 42 pacientes. Destes 4,8% apresentaram risco muito alto para o desenvolvimento de LP; 54,8% apresentaram moderado risco e 11,9% apresentaram baixo risco. Todos tinham algum risco para desenvolvimento de LP, inclusive, 197 pacientes (89,5%) já apresentavam pelo menos uma úlcera no momento da admissão.

 

 

Dos 258 pacientes, 224 já apresentavam LP quando foram incluídos no estudo e, somente 34 não as apresentavam. Destes, 10 pacientes (3,88%) desenvolveram a primeira LP durante o período analisado. A média de tempo para o desenvolvimento da primeira LP foi de 179,3±168,06 dias, a mediana de 72 dias, com variação de 20 a 520 dias. O número médio de LP à admissão foi de 5±4,40, mediana de 4 sendo o mínimo 0 e o máximo 25. Já o número médio de LP na alta foi de 6±5,92, mediana de 4, com mínimo de 0 e máximo de 26.

Incidência e prevalência de LP

No período de 2010 a 2014, 10 pacientes admitidos sem LP as desenvolveram: incidência = 10/34*100 = 29,4%

A admissão, 224 pacientes já possuíam LP e 10 desenvolveram LP ao longo da internação. A prevalência de LP nesta unidade durante o tempo de acompanhamento foi: prevalência = 234/258*100 = 90,7%.

Fatores associados ao aumento do número de LP

A análise estatística multivariada de Poisson foi realizada com 177 pacientes, referente àqueles que tiveram a classificação de risco de LP utilizando o mesmo escore no período de 2010 a 2013. No ajuste desse modelo foi utilizado como variável dependente o número de LP na admissão e como variáveis independentes foram utilizados sexo (feminino/masculino), cor da pele (branca/parda/preta), escore de Braden na admissão hospitalar (baixo/moderado/alto), óbito (sim/não), idade e tempo de internação (dias).

A Tabela 4 apresenta o modelo final da regressão multivariada de Poisson, as variáveis independentes que foram consideradas como sendo significativas, assim como seus coeficientes, erro padrao, teste Z,e valor -p.

 

 

As variáveis que apresentaram associação estatística significativa (p≤0,05) com o aumento do número de LP na admissão foram: cor da pele parda, aumento da idade, escore de Braden moderado e alto à admissão hospitalar, tempo de internação menor que 108 dias e ter ido à óbito. O escore de Braden e a cor da pele apresentaram alta significância estatística quando associados com o número de LP na admissão.

 

DISCUSSÃO

Os resultados desse estudo podem ser relacionados com a característica da população estudada. Como retaguarda do HPSJXXIII, o hospital onde foi realizada essa pesquisa recebe muitos pacientes jovens em sua maioria vítimas de politrauma. Muitos desses pacientes apresentavam mobilidade e sensibilidade reduzidas relacionadas a lesões medulares; eram dependentes de oxigenoterapia; traqueostomizados e faziam uso de cateteres.

Quanto à ocorrência de LP, a incidência de 29,4% encontrada neste estudo é semelhante com a incidência (28,0%) encontrada entre os feridos da Segunda Guerra Mundial e a prevalência de 90,7% supera a prevalência anual de LP estimada entre jovens militares norte americanos com mobilidade reduzida (14,7%).14,15 Possivelmente, nos Estados Unidos os seguros de saúde exercem uma pressão considerável no comportamento da LP, uma vez que este é um evento considerável evitável e por isso não custeado pelas seguradoras. 15,16

Assim como foi encontrado em alguns estudos, neste estudo a maioria dos pacientes que desenvolveu LP era do sexo masculino.9,15,17,18 Porém, por não apresentar nível de significância estatística (p>0,05), a variável sexo foi excluída do modelo final da regressão de Poisson.

Em relação à idade, o modelo de Poisson revelou que para cada um ano a mais na idade, o número médio de LP é aumentado em 0,8%. Esse aumento não é considerado significativamente estatístico. Considerando que as LP são multifatoriais, o risco de adquiri-las ser maior em indivíduos mais jovens que apresentem piores condições de mobilidade, nutrição ou oxigenação. Ademais, outros fatores de risco para o desenvolvimento de LP, como obesidade, desnutrição, condições da pele e doenças associadas não foram investigados neste estudo.

No que diz respeito à cor da pele, nesse estudo a cor parda foi predominante (50,4%). Esse achado corrobora com o estudo de Pessoa, Rocha e Bezerra (2011) e diverge dos resultados encontrados por outros autores brasileiros.4,9 A estrutura da pele varia com a cor. A pele negra tem a camada de estrato córneo mais compacta, por isso é mais resistente a agressões externas pela umidade e fricção. Além disso, há dificuldade para identificar as pré-úlceras em indivíduos da cor negra, o que pode subestimar o número de LP nesta população.6

De acordo com a escala de Braden, a maioria dos pacientes internados nos anos de 2010 a 2013 apresentaram escore moderado. Os dados da regressão de Poisson mostraram que número médio de LP à admissão hospitalar foi 41,8% maior nos escores moderado e alto se comparado ao escore baixo. Esse resultado é de grande relevância, pois para essa amostra, a escala de Braden parece ser eficaz para predizer o risco de o paciente adquirir LP. Isso favorece o planejamento de cuidados individualizados por parte da equipe interdisciplinar com foco nos fatores de risco modificáveis.

Com relação ao tempo de internação, conforme a regressão de Poisson, o número médio de LP na admissão é 21,6% menor nos indivíduos que permaneceram internados por um período de 1 até 108 dias se comparado com os indivíduos que permaneceram internados por um período de 109 a 1700 dias. Ou seja, o número médio de LP foi diretamente proporcional tempo de internação.

Um período de internação prolongado pode acarretar complicações e, principalmente, o declínio funcional aos quais esses pacientes se tornam vulneráveis. A relação entre capacidade funcional e dias de internação também reflete na qualidade dos serviços hospitalares prestados, levando-se em conta uma assistência especializada e reabilitatória.19 As LP prolongam o tempo de internação hospitalar em até cinco vezes.20

Sobre a associação entre LP e mortalidade, um estudo realizado nos Estados Unidos utilizando registros de óbito codificados por causa revelou que 80% das mortes associadas às LP ocorreram em pessoas com idade superior a 74 anos.21 Estudos como o de Rocha, Miranda e Andrade (2006) mostrou que pacientes com LP têm o risco de morte 4,5 vezes maior se comparando com pacientes de mesmo risco prévio de mortalidade que não desenvolvam LP.20 Moraes et al. (2012) acrescenta que as LP elevam também o risco de infecção e sepse, o que, além de prolongar o tempo de internação e aumentar o total dos custos com cuidados com o paciente, agrava a taxa de mortalidade.22

Nesse estudo não foram geradas relações entre LP e os diagnósticos de óbito, mas a variável óbito apresentou associação significativa com o número de LP a partir da regressão de Poisson. O número médio de LP na admissão é 39,5% maior nos indivíduos que evoluíram a óbito se comparado com os indivíduos que não evoluíram a óbito.

A respeito do tempo para ocorrência do desfecho LP, entre os 258 pacientes que compuseram a amostra desse estudo, apenas 10 foram admitidos sem LP. Nesses pacientes a média de tempo para o desenvolvimento da primeira LP foi de 179,3 dias, a mediana de 72 dias, o desvio padrao de 168,06. Não há informações suficientes para garantir que algumas das primeiras LP destes pacientes tenham surgido no Hospital do qual o eles procederam, mas cabe considerar que os resultados desses estudos podem indicar que a ocorrência das LP adquiridas em instituições que são retaguardas de hospitais de politrauma é muito alta.

Este estudo apresenta algumas limitações. Devido às dificuldades de realizar coleta de dados secundários, a descrição da amostra foi prejudicada em relação a cor da pele e motivo da saída em decorrência de subnotificação dessa variável nos prontuários. Embora seja recomendado que a avaliação da pele ocorra em intervalos pré-definidos conforme o risco para o desenvolvimento de LP, o intervalo médio entre as avaliações dos pacientes desse estudo foi de 7 dias. Isso pode acarretar na subnotificação de LP mais superficiais (categorias I e II). Além disso, as diferenças na classificação de risco com Escala de Braden a partir de 2014 também limitaram a exploração dos dados coletados. Acredita-se, no entanto, que a pesquisa alcançou os objetivos propostos e trouxe contribuições para a prática clínica.

 

CONCLUSÃO

A ocorrência de LP em instituições de retaguarda de hospitais que atendem politrauma é muito elevada dada as peculiaridades desse perfil de pacientes. Por essa razao, o desenvolvimento de um programa de prevenção de úlceras de pressão adaptada para uma população específica (com ferimentos de politrauma) além de relevante pode ser considerado como um avanço necessário para assistência prestada a esses pacientes.

Predizer o risco que o paciente tem para desenvolver LP através da Escala de Braden é uma das primeiras medidas preventivas a serem adotadas. Além do mais, a análise estatística realizada fez conhecer pontos importantes que podem subsidiar a gestao de LP na população estudada.

 

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