RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 29 e2028 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20190019

Voltar ao Sumário

Artigo de Revisão

Prevenção da oftalmopatia de Graves: quem deve ser tratado e qual a dose?

Prevention of Graves ophthalmopathy: who should be treated and what dose?

Tatiane Souza Borba Cançado1; Nathália Alves Matheus1; Victor David Fonseca1; Thiago Fernandes Rodrigues1; Marcelo Geraldo Alves Junior2

1. Unifenas, Acadêmico Medicina - Belo horizonte - Minas Gerais – Brasil
2. Hospital das Clínicas e Unifenas, Endocrinologista e Professor - Belo Horizonte - Minas Gerais – Brasil

Endereço para correspondência

Nathália Alves Matheus
nathalia.alves00@gmail.com

Recebido em: 12/07/2017.
Aprovado em: 09/07/2019.

Instituiçao: Unifenas- Belo Horizonte- Minas Gerais- Brasil

Resumo

INTRODUÇÃO: A oftalmopatia de Graves (OG) é uma doença autoimune complexa com sinais e sintomas característicos que acomete a órbita ocular. Tem incidência anual aproximada de 14 novos casos a cada 100.000 habitantes. Estudos relatam existir relação entre o uso de glicocorticoides na prevenção da doença em pacientes submetidos à radioiodoterapia, entretanto, ainda não há um consenso sobre quais pacientes seriam beneficiados, qual dose e qual via de administração do fármaco seria adequada a cada caso.
OBJETIVOS: Levantar dados presentes na literatura sobre o uso de glicocorticoides (dose, via de administração e indicação) para pacientes com hipertireoidismo na prevenção da oftalmopatia de Graves.
MÉTODOS: Revisão sistemática da literatura e análise crítica de trabalhos pesquisados na base de dados PubMed e consensos sobre o tema abordado. Foram incluídos na pesquisa os artigos dos anos de 2000 a 2016.
RESULTADOS: Foram selecionados 12 artigos e 1 consenso. A maioria conclui que o uso de glicocorticoides, antes da terapia com radioiodo, foi efetivo na prevenção da exacerbação da OG, porém alguns autores sugerem o uso de doses mais baixas e por um período mais curto.
CONCLUSÃO: A pesquisa demonstrou que existem benefícios no emprego profilático de corticosteroides em pacientes com hipertireoidismo e oftalmopatia leve a moderada na prevenção da evolução do quadro ocular.

Palavras-chave: Oftalmopatia de Graves; Glucocorticoides; Prevenção de Doenças.

 

INTRODUÇÃO

A oftalmopatia de Graves (OG) é uma doença autoimune complexa com sinais e sintomas característicos que acomete a órbita ocular, principalmente de pacientes com a tireoidopatia de Graves, mas pode acometer também pacientes com tireoidite de Hashimoto ou até mesmo pacientes eutireoideos.1 Tem incidência anual aproximada de 14 novos casos a cada 100.000 habitantes.2

Geralmente se expressa de forma suave, mas em 3 a 5% dos casos pode ser severa e causar profunda interferência na qualidade de vida de seus portadores. A OG é resultante de uma interface entre fatores endógenos e exógenos, entre esses últimos o mais importante é o tabagismo.3 Esse hábito, além de aumentar o risco de progressão da oftalmopatia após o tratamento com radioiodo, diminui a eficácia do uso de glicocorticoides.4 Outros fatores de risco que influenciam a progressão desta doença são os níveis de T3 e a escolha da modalidade de tratamento do hipertireoidismo.5

O presente trabalho visa levantar dados presentes na literatura sobre o uso de glicocorticoides (dose, via de administração e indicação) para pacientes com hipertireoidismo na prevenção da oftalmopatia de Graves.

 

MÉTODOS

A metodologia utilizada seguiu os preceitos do estudo exploratório, por meio de uma pesquisa sistemática da bibliografia. Nesta perspectiva, com o propósito de responder a pergunta que norteou o trabalho: O uso de glicocorticoides na prevenção da oftalmopatia de Graves é eficiente? Para a criação dessa pergunta de pesquisa, adotou-se o método PICO; em que P representa a população de crianças, adolescentes e adultos; I é a intervenção representada pelo uso de glicocorticoides; C significa a comparação entre o uso de glicocorticoides ou não; O relaciona-se com o desfecho estudado, que no caso é observar se o uso de glicocorticoides em portadores de oftalmopatia de Graves previne o desenvolvimento de sua patogênese. A partir da pergunta estruturada, foram identificados os descritores que constituíram a base de busca da evidência na base de dados PubMed. Essa busca ocorreu no primeiro trimestre de 2017. A revisão prosseguiu em novas etapas, a saber:

1. Busca de descritores: utilizou-se o Decs a fim de obter os descritores dos elementos chave PICO. Os descritores formalizam a padronização/classificação da linguagem científica utilizada na indexação de áreas e subáreas do conhecimento. Tal procedimento visou facilitar a sistematização, busca e recuperação de artigos indexados em bases eletrônicas. Os descritores selecionados foram: Graves Ophtalmopathy, Glucocorticoids, Disease Prevention.

2. Combinação de descritores: foi baseada na aplicação dos operadores booleanos, com o intuito de recuperar apenas os documentos que contenham os descritores selecionados na etapa 1. Desta forma, a estratégia de busca foi a seguinte combinação: Graves Ophtalmopathy AND Glucocorticoids AND Disease Prevention.

3. Determinação dos limites ou filtros: foi necessária a aplicação de filtros, devido à grande quantidade de artigos encontrados, a fim de determinar limites e otimizar a busca de artigos que potencialmente pudessem responder à pergunta norteadora desta revisão. Desta forma, optou-se por selecionar os filtros: artigos em que o texto completo estava disponível e que foram publicados entre os anos de 2000 até 2016.

4. Critérios de inclusão: foram incluídos na pesquisa os estudos com pacientes com ou sem oftalmopatia de Graves, artigos que pelo menos na introdução ou em outra parte dos mesmos aprofundassem no uso de glicocorticoides para prevenção da oftalmopatia, artigos em que o estudo foi realizado em crianças, jovens e adultos de ambos os sexos, além de artigos do ano 2000 a 2016.

5. Critérios de exclusão: foram excluídos estudos com outro tipo de desenho que não acordassem com os critérios de inclusão a seguir: estudos cujo foco não fosse o uso de glicocorticoides afetando direta ou indiretamente no desenvolvimento da oftalmopatia de Graves.

As estratégias de busca selecionadas foram subdivididas entre os pesquisadores, dessa forma, cada pesquisador avaliou a sua estratégia nas bases de dados, sendo eleitos os artigos significativos, com base na qualidade de cada artigo, sendo que foram analisados pelo CASP6 e STROBE,7 avaliados via EQUATOR.8 Pretendeu-se encontrar nos artigos, estudos (ensaio clínico, coorte, caso-controle, transversal e outros) que indicassem e/ou comprovassem o efeito do uso de glicocorticoides na prevenção da oftalmopatia de Graves.

 

REVISÃO DA LITERATURA

A patogênese da doença em estudo ainda é compreendida parcialmente. A hipótese mais aceita é de autoanticorpos produzidos contra antígenos (um deles é o receptor de TSH) da própria tireoide e da órbita ocular. Isso gera uma resposta anti-inflamatória com produção de citocinas (IL-1, TNF alfa, IFN gama) pelas células de defesa, principalmente linfócitos T e macrófagos. Além disso, as citocinas estimulam a proliferação de fibroblastos que produzem glicosaminoglicanas. Todo esse processo gera um edema local com aumento do volume dos músculos extraoculares.3,9

A oftalmopatia endócrina, apresentada pelos pacientes com doença de Graves, ocorre devido a uma inflamação dos músculos do olho, gordura retro-orbital e tecido conjuntivo. Há irritação dos olhos, retração da pálpebra e graus variáveis de edema da pálpebra e inchaço periórbita. Os músculos do olho afetados tornam-se inchados e sua motilidade prejudicada de tal forma que a diplopia pode ocorrer. O alargamento dos músculos e tecidos retro-orbitais leva à proptose. O inchaço retro-orbital pode causar compressão do nervo óptico, com comprometimento do campo visual e/ou acuidade visual.10

Os glicocorticoides têm sido utilizados há décadas no manejo da OG. A via oral de administração proporciona respostas favoráveis globais em pouco mais de 60% dos doentes, enquanto a via local está associada a efeitos benéficos apenas em cerca de 40% dos casos.1 Estes medicamentos são principalmente eficazes em pacientes com doença ocular grave e ativa. A via endovenosa é relativamente nova no manejo da doença e parece ser mais eficaz e mais bem tolerada do que glicocorticoides orais ou locais.1,9

O uso de somatostastinas no tratamento de oftalmopatia de Graves demonstrou ser eficaz nas formas severas e ativas, entretanto, a maioria dos estudos publicados não são randomizados ou não controlados.9

Já o uso de imunoglobulina humana não ganhou grande popularidade entre os tireoidologistas e não há mais relatos sobre o seu uso para OG publicados nos últimos cinco anos. Em uma pesquisa recente da European Thyroid Association, apenas 2% dos entrevistados sugeriram seu uso para esta doença devido à pequena quantidade de doentes tratados e estudos realizados, ao preço do tratamento e à possibilidade de transmissão através de produtos derivados do plasma.9

Fármacos imunossupressores ou imunomoduladores, como azatioprina, ciclofosfamida, clorambucil e ciamexona, têm sido geralmente desencorajados. Os resultados com ciclosporina como agente único foram bastante conflitantes e insatisfatórios. No entanto, a ciclosporina pode ter um papel, em associação com glicocorticoides, em pacientes que não respondem apenas aos glicocorticoides.9

A ablação da tireoide tem sido considerada uma ferramenta para tratar a oftalmopatia. No entanto, os dados da literatura, derivados de estudos não randomizados, são controversos.9 A evidência indireta de uma ligação entre a ablação total da tireoide e a melhora da doença ocular vem de um estudo que mostra que o risco de progressão da doença é maior em pacientes que necessitam de mais de uma dose de radioiodo do que naqueles que necessitam apenas de uma dose terapêutica.1

Embora a prevenção da oftalmopatia de Graves possa ser realizada nas diferentes fases da doença, a razao pela qual apenas uma minoria de pacientes desenvolve a doença ainda é desconhecida. Alguns estudos relatam existir uma relação entre o uso de glicocorticoides na prevenção da doença em pacientes submetidos à radioiodoterapia, entretanto, ainda não há um consenso na literatura sobre quais pacientes seriam beneficiados com seu uso, qual dose e qual via de administração do fármaco seriam adequadas em cada caso. Considerando que 5% do pacientes apresentam risco de desenvolver a doença ocular grave com necessidade de tratamento específico, somado ao fato que a intervenção preventiva só poderia ser utilizada em fatores de risco exógenos, o estudo desse tema torna-se relevante.

 

RESULTADOS

Foram encontrados 31 artigos na base de dados utilizada. Após aplicação de limites e dos critérios de inclusão e exclusão, foram selecionados 12 artigos para a análise e 1 consenso. Como pode ser visto no Flow Chart (Fig. 1).

Todos os artigos foram publicados no idioma inglês, e o consenso em português, entre os anos de 2000 e 2016. Foram cinco artigos de revisão (dentre eles, uma revisão sistemática da literatura), três do tipo coorte retrospectivo, um observacional prospectivo, dois ensaios clínicos e duas meta análises.

As populações estudadas são diferentes entre os artigos. Somando todas as populações, encontrou-se um total de 3193 pacientes, com média de 246 pessoas por artigo. O artigo de revisão sistemática avaliou 32 estudos.

 

DISCUSSÃO

Na metanálise de Ren et al.2 foi realizada uma comparação entre o uso de quatro tipos de terapia: a primeira foi apenas com radioiodo (RAI), a segunda com radioiodo mais prednisona, a terceira com drogas antitireoidianas e a quarta com cirurgia para o tratamento da oftalmopatia de Graves. O resultados do estudo é que o uso da radioiodoterapia mais prednisona teve uma diminuição estaticamente significante, na incidência de novas lesões da órbita ocular do paciente com a doença, quando comparado com o uso das drogas antitireoidianas (OR 5.402×1013, 95%CI 4.45×1013 contra 6.541×1014), com a cirurgia (OR 7.094×1013, 95%CI 5.386×1013 contra 1.005×1015) e com o uso de apenas o radioiodo (OR 1.555 × 1014, 95 %CI 1.302 × 1014 contra 1.896 × 1015). Mas os próprios autores concluem que o estudo apresentou vários vieses.

Dederichs et al.10 realizaram um estudo em que 196 pacientes (53%) não tinham OG no momento do radioiodoterapia e 173 pacientes (47%) apresentavam OG em graus variáveis. A taxa de incidência de OG após a radioiodoterapia foi de 3,4% em pacientes com seguimento de 12 meses e que receberam 0,4 - 0,5 mg/kg de prednisona.

Estes autores sugerem a administração profilática de glicocorticoides em pacientes sem OG preexistente, entretanto, ressaltam que este procedimento não irá proteger contra a ocorrência da doença por toda a vida do paciente, mas parece conseguir uma diminuição da taxa global de desenvolvimento de novos casos.

No ensaio clínico randomizado realizado no Japao, com 295 pacientes, 147 não receberam profilaxia com glicocorticoides (GC) e 148 receberam os GC. Foi percebido que não houve significativa diferença na progressão da OG nos dois grupos, mostrando uma exacerbação de 12,1% no grupo que recebeu GC contra 7,5% no grupo que não recebeu, porém com o valor de p maior que 0.01 (p=17). Entre as exacerbações foram citadas a diplopia e a exoftalmia. A dose de corticoide utilizada se iniciou com 0,5 mg/kg/dia e seu uso foi descontinuado em 3 meses.11 Nesta dosagem e duração foi visto uma prevenção adequada, mas com a presença de vários efeitos colaterais.

Já no trabalho de Lai et al.12 uma dose baixa desse medicamento e por um período curto (0,22 mg/kg/dia por seis semanas) foi efetiva. Porém, neste estudo alguns vieses foram observados, como uma amostra pequena e o tipo do estudo ser coorte retrospectivo, que sabemos ser um estudo de baixa qualidade quando comparado com metanálise e ensaio clínico.

A metanálise de Shiber et al.13 avaliou ensaios clínicos randomizados e artigos retrospectivos do tipo controle já publicados. Inicialmente, foi avaliado o uso de GC em pacientes com OG preexistente, houve um resultado efetivo em 378 pacientes, quando se usou a dose de 0,2 a 0,5 mg/kg durante 1 a 12 meses (OR 0,14 CI 0,06–0,35). A dose preconizada de 0,4 a 0,5mg/kg/dia por 3 ou mais meses também apresentou eficácia (OR 0.16 [CI 0,06–0,37], p<0,01).

Foi comparado também um grupo que usou baixas doses de prednisona (0,2 a 0,3mg/kg/dia por 4 a 6 semanas) contra um outro que fez uso de placebo, chegando-se à conclusão que o uso de prednisona foi benéfico (OR 0,20 [CI 0,07–0,60], p=0,004). Porém, quando as baixas doses foram comparadas com a dose preconizada, não houve significância estatística (OR 1,7 [CI 0,52–5,52], p=0,47).

Ainda foi comparado o uso dessa droga na dose preconizada em pacientes sem a OG, com resultados não benéficos (OR 1,87 [CI 0,81–4,3]), mas nesta comparação foram encontrados vieses, sendo que o grupo intervenção apresentava fatores de risco, como tabagismo e TRAb positivo, e o grupo controle não apresentava. Este trabalho conclui entao que a profilaxia com glicocorticoides na dose preconizada é o melhor regime para pacientes com moderado a alto acometimento da OG, que são aqueles que apresentam altos riscos de progressão da doença. A baixa dose de prednisona deve ser usada em pacientes com doença intermediária ou em pacientes sem a doença, mas com fatores de risco. Sendo que em pacientes sem OG e sem fatores de risco não devem utilizar a profilaxia.

Em outro estudo retrospectivo14 foi visto que nos doentes com OG ativa, tratados com RAI, devem ser oferecidos profiláticos de esteroides orais (0,3 - 0,5 mg de prednisona/kg/dia), começando com um a três dias após a RAI e diminuindo a dose até a sua retirada (aproximadamente em 3 meses). Sugere-se também que períodos mais curtos de terapia com esteroides (1-2 meses) podem ser igualmente protetores.

No entanto, o estudo destaca que não existe um protocolo padronizando quais pacientes devem ser indicados, a dosagem ideal e a duração do tratamento. Além disso, foi comparada a eficácia da profilaxia, com glicocorticoide intravenosos (GCIV) contra glicocorticoides orais (GCO). O tratamento profilático com GCO impediu a ativação da OG em cerca de 50% dos pacientes, em comparação com os submetidos aos GCIV.

Em uma revisão sistemática de estudos randomizados15 a RAI foi associada a um risco aumentado de OG em comparação com os antitireoidianos. E a profilaxia com prednisona para RAI foi altamente eficaz na prevenção da progressão da OG em doentes com diagnóstico prévio da doença. Mas o uso rotineiro em todos os pacientes submetidos à RAI foi considerado desnecessário.

Em um grupo foi utilizado prednisona (0,5 mg/kg/dia) durante um mês após a RAI, em outro grupo foi usado betametasona por sete semanas (6 mg/dia) durante 5 dias e depois semanalmente (5 mg/dia). A profilaxia com prednisona foi altamente eficaz na prevenção da piora de doença ocular em pacientes com oftalmopatia preexistente em comparação com pacientes submetidos a RAI sem prednisona.

A oftalmopatia piorou em 26 pacientes de 88 com doença preexistente que não receberam profilaxia com glicocorticoides. Nenhum dos 96 pacientes com OG que recebeu profilaxia com prednisona desenvolveu agravamento da doença. Em pacientes sem OG preexistente, seis dos 88 desenvolveram a doença depois de submetidos à RAI. Entretanto, isso não atingiu significância estatística.

Karlsson16 fez um estudo retrospectivo de pacientes com doença de graves, que utilizaram profilaxia com corticoides para tentar diminuir a oftalmopatia. Foi demonstrado que pacientes com sintomatologia de hipertireoidismo se beneficiam do uso crônico de 15 a 20 mg de prednisona por mais de 3 meses, uma vez que isso reduz o risco de desenvolver lesões oculares graves. A prednisona também diminui o risco de oftalmopatia após tratamento com iodo radioativo iniciada no 3º dia após essa terapêutica. A dose utilizada foi de 20 mg por duas semanas, seguida de 15 mg por 3 semanas, 10 mg por um mês, 7,5 mg por um mês e 5 mg por um mês.

De acordo com Bartalena et al.,1 o uso de glicocorticoide oral proporciona uma resposta favorável em 60% dos pacientes, sendo que esse efeito é mais eficaz nos pacientes com oftalmopatia severa ou ativa, principalmente naqueles com os tecidos moles inflamados, neuropatia ótica e músculos externos acometidos. Já com relação à proptose e fibrose do musculo externo, a terapêutica não é tao eficaz.

Ainda segundo esses autores, em pacientes tratados com prednisona oral (100 mg/dia dose inicial que foi gradualmente diminuída no período de 5 meses) comparado com metilprednisolona intravenoso (15 mg/kg durante 4 ciclos, sendo que cada ciclo é constituído por duas infusões em dias alternados) as terapêuticas foram favoráveis. Porém, o grupo que recebeu metilprednisolona teve maior proporção de eventos favoráveis 83% contra 63% no grupo oral (p<0,005). Além disso, o grupo com metilprednisolona teve uma melhora maior (p<0,005). Este estudo também demonstrou que os efeitos colaterais ocorreram em 56% dos pacientes tratados com metilprednisolona e 83% em dos doentes tratados oralmente, sendo que a maior diferença foi nas manifestações cushingoides.

Em uma revisão publicada por Rasmussen et al.,4 143 pacientes com OG ou sem a doença foram tratados com 0,4 - 0,5 mg de prednisona/kg de peso corporal a partir de 2 - 3 dias após a terapia com iodo radioativo por 3 meses. Os autores concluíram que não houve piora da OG no grupo de pacientes que receberam prednisona, entretanto, no grupo que não recebeu ocorreu piora clínica em 15%, e que os esteroides impediram completamente o agravamento da doença ocular.

Em outra revisão publicada por Bartalena et al.,9 um pequeno grupo de pacientes, apresentando doença de Graves e oftalmopatia leve ou ausente, foi tratado com iodo radioativo isolado ou radioiodo associado a prednisona oral (0,4-0,5 mg/kg/dia, dose inicial) por um período de 3 meses. A progressão da oftalmopatia foi observada em 9 de 26 pacientes (35%) com comprometimento ocular antes da terapia com radioiodo. No grupo que recebeu prednisona também, a progressão não ocorreu, e a oftalmopatia pre- existente melhorou na maioria dos casos. Apesar de ter sido randomizado, o estudo não incluiu um grupo de controle.

De acordo com EUGOGO 2016,5 é recomendado que a profilaxia com prednisona oral inicie-se com uma dose diária de 0,3 - 0,5 mg/kg, administrada em doentes tratados com iodo radioativo e com alto risco de progressão da OG. A dose mais baixa do glicocorticoide pode ser utilizada em doentes de baixo risco. Os pacientes com OG inativo podem receber com segurança radioiodo sem cobertura de esteroides, desde que o hipotireoidismo seja evitado e que outros fatores de risco para a progressão OG, particularmente o tabagismo, estejam ausentes.

 

CONCLUSÃO

A pesquisa demonstrou que existem benefícios no emprego profilático de corticosteroides em pacientes com hipertireoidismo e oftalmopatia leve a moderada na prevenção da evolução do quadro ocular. Os estudos corroboraram e comprovaram o benefício quando se usa o glicocorticoide oral na dosagem que varia a 0,3 - 0,5 mg/kg durante o período de um mês após a terapia com radioiodo, sendo que as baixas doses de prednisona devem ser usadas em pacientes com doença intermediária ou em pacientes sem a doença mas com fatores de risco. Pacientes sem OG e sem fatores de risco não necessitam da cobertura de corticoides e podem receber radioiodo de forma segura.

Entretanto, é preciso evidenciar a necessidade de se realizar mais estudos do tipo ensaio clínico para descartar os vieses que permaneceram nos estudos de revisão analisados.

 

REFERENCIAS

1. Bartalena L, Tanda ML, Medea A, Marcocci C, Pinchera A. Novel approaches to the management of graves' ophthalmopathy. Hormones (Athens). 2002;1(2):76-90. DOI: https://doi.org/10.14310/horm.2002.1155

2. Ren Z, Qin L, Wang JQ, Li Y, Li J, Zhang RG. Comparative Efficacy of Four Treatments in Patients with Graves' Disease: a Network Meta-analysis. Exp Clin Endocrinol Diabetes. 2015;123(5):317-22. DOI: https://doi.org/10.1055/s-0035-1548824

3. Bartalena L, Wiersinga WM, Pinchera A. Graves' ophthalmopathy: state of the art and perspectives. J Endocrinol Invest. 2004;27(3):295-301. DOI: https://doi.org/10.1007/BF03345280

4. Rasmussen AK, Nygaard B, Feldt-Rasmussen U. (131)I and thyroid-associated ophthalmopathy. Eur J Endocrinol. 2000;143(2):155-60. PMID: 10913933 DOI: https://doi.org/10.1530/eje.0.1430155

5. Bartalena L, Baldeschi L, Boboridis K, Eckstein A, Kahaly GJ, Marcocci C, et al.; European Group on Graves' Orbitopathy (EUGOGO). The 2016 European Thyroid Association/European Group on Graves' Orbitopathy Guidelines for the Management of Graves' Orbitopathy. Eur Thyroid J. 2016;5(1):9-26. DOI: https://doi.org/10.1159/000443828

6. CASP. [acesso 2017 Fev 20]. Disponível em: http://media.wix.com/ugd/dded87_a02ff2e3445f4952992 d5a96ca562576.pdf

7. STROBE. [acesso 2017 Fev 20]. Disponível em: http://www.strobestatement.org/fileadmin/Strobe/uploads/checklists/STROBE_checklist_v4_combined.pdf

8. EQUATOR Network: Enhancing the QUAlity and Transparency Of health Research: Reporting guidelines for main study types. [acesso 2017 Fev 20]. Disponível em: http://www.equator-network.org

9. Bartalena L, Pinchera A, Marcocci C. Management of Graves' Ophthalmopathy: reality and perspectives. Endocr Rev. 2000;21(2):168-99.

10. Dederichs B, Dietlein M, Jenniches-Kloth B, Schmidt M, Theissen P, Moka D, et al. Radioiodine therapy of Graves' hyperthyroidism in patients without pre-existing ophthalmopathy: can glucocorticoids prevent the development of new ophthalmopathy? Exp Clin Endocrinol Diabetes. 2006;114(7):366-70.

11. Watanabe N, Noh JY, Kozaki A, Iwaku K, Sekiya K, Kosuga Y, et al. Radioiodine-Associated Exacerbation of Graves' Orbitopathy in the Japanese Population: Randomized Prospective Study. J Clin Endocrinol Metab. 2015;100(7):2700-8. PMID: 25965082 DOI: https://doi.org/10.1210/jc.2014-4542

12. Lai A, Sassi L, Compri E, Marino F, Sivelli P, Piantanida E, et al. Lower dose prednisone prevents radioiodine-associated exacerbation of initially mild or absent graves' orbitopathy: a retrospective cohort study. J Clin Endocrinol Metab. 2010;95(3):1333-7. PMID: 20061414 DOI: https://doi.org/10.1210/jc.2009-2130

13. Shiber S, Stiebel-Kalish H, Shimon I, Grossman A, Robenshtok E. Glucocorticoid regimens for prevention of Graves' ophthalmopathy progression following radioiodine treatment: systematic review and meta-analysis. Thyroid. 2014;24(10):1515- 23. DOI: https://doi.org/10.1089/thy.2014.0218

14. Vannucchi G, Campi I, Covelli D, Dazzi D, Currò N, Simonetta S, et al. Graves' orbitopathy activation after radioactive iodine therapy with and without steroid prophylaxis. J Clin Endocrinol Metab. 2009;94(9):3381-6. PMID: 19567525 DOI: https://doi.org/10.1210/jc.2009-0506

15. Acharya SH, Avenell A, Philip S, Burr J, Bevan JS, Abraham P. Radioiodine therapy (RAI) for Graves' disease (GD) and the effect on ophthalmopathy: a systematic review. Clin Endocrinol (Oxf). 2008;69(6):943-50. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1365-2265.2008.03279.x

16. Karlsson FA. Endocrine ophthalmopathy and radioiodine therapy. Acta Oncol. 2006;45(8):1046-50. PMID: 17118837 DOI: https://doi.org/10.1080/02841860600760769