ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Plataformas Digitais no Ensino de Pediatria da UFMG
Digital Platforms in Pediatrics Education at UFMG
Felipe Jose Medeiros de Oliveira; Maria Aparecida Martins
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Pediatria - Belo Horizonte, Minas Gerais - Brasil
Endereço para correspondênciaFelipe Jose Medeiros de Oliveira
E-mail: felipejmed@gmail.com
Recebido em: 03/04/2019
Aprovado em: 20/05/2020
Instituição: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Pediatria - Belo Horizonte, Minas Gerais - Brasil
Resumo
A Internet é uma ferramenta útil para fins educativos e técnicas inovadoras têm fortalecido o ensino virtual. Acompanhando o avanço tecnológico, o Departamento de Pediatria do curso médico da Universidade Federal de Minas Gerais disponibilizou material didático em plataformas virtuais, página na Intranet e Moodle, que podem ser acessadas por professores e alunos. Objetivando conhecer e avaliar a utilização dessas plataformas pelos alunos das disciplinas que abordam o ensino da Semiologia foi elaborado um estudo transversal, descritivo e, por meio de um questionário estruturado, o acesso e o aproveitamento desse material foram avaliados. Dos 299 alunos que estavam matriculados nessas disciplinas no período, 85% responderam anonimamente, após esclarecimentos e aspectos éticos contemplados. Os resultados mostraram que 96,1% dos participantes utilizavam pelo menos uma das plataformas digitais frequentemente, enquanto apenas 3,9% deles nunca haviam acessado o material. A contribuição de tais recursos no processo de aprendizagem foi avaliada positivamente por 97,2 % dos participantes. Alguns alunos relataram desconhecer a existência dessas ferramentas, apontando para a constante necessidade de divulgação e criticaram a instabilidade dos sistemas informáticos que abrigam as plataformas. Essa avaliação reforçou a possibilidade do uso de recursos virtuais no ensino da Medicina na instituição.
Palavras-chave: Educação Médica; Educação a distância; Pediatria.
INTRODUÇÃO
O Brasil passou a integrar a Internet na década de noventa, que atualmente é muito utilizada nos centros de pesquisa e nas instituições de ensino superior e representa uma ferramenta fundamental no processo de educação e difusão do conhecimento1. A rede integrada se mostrou um sistema muito útil no contexto ensino-aprendizagem, ampliando as possibilidades de interação entre professor e aluno, flexibilização dos estudos e estímulo à autonomia do estudante.2 Acompanhando a rápida tendência de expansão das tecnologias digitais, percebe-se o surgimento e propagação de recursos voltados para o ensino virtual, com destaque paraas plataformas online interativas, aplicativos para celulares e as redes sociais, que oferecem conteúdos bem acessíveis como vídeo-aulas, sequências de imagens, livros digitais, roteiros de estudo, entre outros.
Existem desvantagens relacionadas ao uso da Internet na educação, como o possível reforço a superficialidade do conhecimento e dos relacionamentos. Entretanto há uma série de vantagens como a facilidade na comunicação, o acesso à informações em tempo hábil e a interação dinâmica e colaborativa que a rede possibilita no processo ensino-aprendizagem. Esse modelo permite que os discentes, por meio da troca entre pares e com o docente, possam construir coletivamente conhecimentos sobre interesses em comum.3
No contexto da Medicina, o uso das novas tecnologias tem ganhado força como complemento às formas tradicionais de ensino presencial, especialmente por meio da utilização de ferramentas multimídia em disciplinas.4 O uso de material interativo é um método útil para o ensino no curso médico e parece ser tão eficaz como o método tradicional de aula expositiva,5 além de ser bem aceito e avaliado positivamente pelos alunos.6,7
Acompanhando esse momento de incorporação de novas tecnologias e flexibilização do ensino, a equipe de professores e monitores das disciplinas Pediatria I e Pediatria II da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) elaborou um projeto para utilização de novas ferramentas digitais no ensino médico, com a intenção de disponibilizar materiais didáticos relevantes para seus alunos por meio de plataformas virtuais de ensino. No curso de medicina da UFMG, tais disciplinas são ofertadas, respectivamente, no 4º e 5º períodos e, em ambas, o foco central é o ensino da semiologia pediátrica.
Semiologia é a parte da medicina que trata dos sinais ou sintomas das doenças8 sendo de grande importância no curso médico pois fornece o sustentáculo para o desenvolvimento do raciocínio clínico no atendimento ao paciente. O ensino da semiologia deve ser gradativo, cuidadoso, visto que o público-alvo é o jovem estudante, futuro médico, que nessas disciplinas, pela primeira vez, estabelece um contato mais próximo com o paciente e seus familiares. Nas disciplinas de Pediatria I e Pediatria II da UFMG, o ensino da semiologia é essencialmente prático e envolve o atendimento ao paciente por um professor e um grupo de aproximadamente 10 alunos. Devido à inexperiência dos alunos, as consultas são demoradas, com longas demonstrações das técnicas semiológica pelo professor, o que frequentemente acarretam ao paciente e a seus familiares, constrangimento e cansaço.
Dentre os materiais disponibilizados pelo departamento de Pediatria, destacam-se roteiros de estudo para os grupos de discussão presencial, o conteúdo do CD-ROM "Semiologia Virtual" - incluso no livro de Semiologia da Criança e do Adolescente, referência bibliográfica elaborada pelos professores do departamento9, além de vídeos que abordam a anamnese e exame físico, todos com o intuito de auxiliar o aluno na sistematização e dinamização da consulta pediátrica, minimizando sua ansiedade e insegurança.
Este estudo objetivou conhecer e avaliar a percepção e adesão dos alunos matriculados nas disciplinas de Pediatria I e II em relação às plataformas virtuais já adotadas na Faculdade de Medicina da UFMG.
A partir dos resultados obtidos pretende-se realizar mudanças nas páginas, inclusive nos materiais didático-científicos, a fim de aumentar a experiência dos acadêmicos e melhorar o seu atendimento aos pacientes.
MATERIAL E MÉTODOS
Os materiais didáticos-científicos produzidos foram disponibilizados nas duas plataformas online adotadas pela Faculdade de Medicina, conhecidas como Intranet e Moodle, ambas acessíveis por todos os alunos matriculados na instituição por meio de suas credenciais individuais (disponível em: www.medicina.ufmg.br/intranet/pediatria). O conteúdo ofertado representa a bibliografia básica das disciplinas Pediatria I e Pediatria II, que pode ser consultada livremente pelos alunos e por seus professores. Após a disponibilização desses recursos didáticos, foi desenhado um estudo transversal, observacional e descritivo que foi desenvolvido em Setembro de 2016.
Foi elaborado um questionário destinado aos alunos dessas disciplinas sobre o uso da Intranet e da Plataforma Moodle. Esse questionário continha oito perguntas, sendo seis objetivas, que investigavam: o conhecimento da existência de cada plataforma; a frequência de utilização de cada uma, com nível de concordância expresso em escala de Likert10; a preferência entre as duas plataformas e a avaliação das plataformas como positivas ou não no aprendizado da pediatria. As duas perguntas discursivas solicitavam a indicação de pontos positivos e negativos e sugestões para melhoria dessas ferramentas.
Os questionários foram impressos e aplicados presencialmente, pelos alunos monitores das disciplinas Pediatria I e Pediatria II, no período letivo de 12 a 28 de setembro de 2016, durante o intervalo das aulas práticas no ambulatório de atendimento e com a autorização prévia do professor da turma. Nesse período estavam matriculados 138 alunos na disciplina de Pediatria I e 161 na Pediatria II. Não houve seleção de amostra e todos os alunos regularmente matriculados nessas disciplinas e presentes no período do estudo foram considerados aptos a participar desta pesquisa. Os alunos foram esclarecidos sobre a não-obrigatoriedade de participação e foi garantido o anonimato do preenchimento. Os questionários foram aplicados em duas semanas consecutivas, no intuito de maximizar o número de respostas. Fizeram parte do estudo apenas os alunos que concordaram em participar e estavam presentes no período da aplicação dos questionários.
As respostas para as questões objetivas foram compiladas pelos monitores em uma planilha do Excel, na qual foram usadas as fórmulas do software para extração da distribuição estatística das respostas do universo amostral. As respostas discursivas foram agrupadas por tema, sendo identificados os pontos mais recorrentes dentre todas as respostas.
Os aspectos éticos foram contemplados de acordo com a Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde.11
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Participaram do estudo 138 alunos matriculados na Pediatria I e 161 na Pediatria II totalizando 299 alunos. Foram obtidos 254 questionários devidamente preenchidos, o que representa 85% dos alunos regularmente matriculados nas duas disciplinas. Foram computadas 45 perdas, sendo a maioria representada por 43 alunos ausentes no momento de aplicação dos questionários; apenas 02 (dois) alunos não quiseram participar. Foram excluídos 03 (três) questionários por inadequação no preenchimento.
Os dados obtidos mostraram grande aceitação dessas ferramentas virtuais pelos alunos, visto que 97% disseram acreditar que os recursos têm contribuído no seu aprendizado pessoal de forma positiva. Dos participantes, mais da metade, 146 alunos (57%) relataram utilizar pelo menos uma das plataformas "frequentemente" ou "sempre". Apenas 3% dos alunos responderam que nunca utilizam os materiais disponíveis nas plataformas. Estes achados corroboram os dados da literatura que mostram a utilização das novas tecnologias como ferramentas complementares ao ensino.
Quando agrupados por período do curso médico, verificou-se um maior desconhecimento dos alunos da Pediatria I da existência das plataformas, em especial da página na Intranet, quando comparado com as respostas dos alunos da Pediatria II, o que aponta para a necessidade de uma divulgação mais precoce dessas páginas. Em algumas turmas específicas, observou-se um maior conhecimento das ferramentas, evidenciando uma provável influência da participação do professor da turma em estimular o acesso àsplataformas virtuais. Verifica-se então, a importância de incentivar a adoção desses recursos por todos os professores dos períodos, de forma a ampliar o conhecimento e a utilização precoce desse material complementar (Figura 1).
Os alunos de ambos os períodos mostraram preferir utilizar a plataforma Moodle em detrimento à página Intranet. A utilização de uma plataforma única foi sugerida pela maioria dos alunos, por centralizar o acesso ao material didático. Apenas 17% dos participantes concordaram com o uso concomitante das duas plataformas (Figura 2).
Este resultado provavelmente decorre do fato de a plataforma Moodle ser um software intuitivo e de fácil utilização, disponível há vários anos no mercado, ao passo que a Intranet é uma página desenvolvida localmente pelo Centro de Informática em Saúde da Faculdade de Medicina da UFMG, ainda em contínua adaptação. Diante desse resultado, será avaliada a possibilidade de concentração dos materiais em um único recurso, de forma a melhorar a experiência e atender a essa demanda dos alunos, com preferência ao uso da plataforma Moodle.
As críticas apontadas pelos alunos foram principalmente relacionadas à instabilidade dos sistemas informáticos que abrigam as plataformas - ambas são dependentes da página da universidade "Minha UFMG". As sugestões foram a criação de fóruns de discussão, simulados virtuais, a constante renovação do material disponibilizado e ampliação do ensino virtual para os períodos subsequentes da Pediatria e por outros departamentos da Faculdade de Medicina. Esse feedback dos alunos possibilitará o direcionamento mais adequado dos esforços na tentativa progressiva de aprimoramento dos recursos digitais.
Após a disponibilização dos materiais, percebeu-se maior homogeneidade da bibliografia consultada pelas diferentes turmas de alunos, com destaque especial para a maior utilização dos roteiros para grupos de discussão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maioria dos alunos participantes demonstrou conhecer e utilizar o conteúdo das plataformas digitais e que tais recursos têm contribuído positivamente no processo de aprendizado e no atendimento ao paciente pediátrico, o que estimula o contínuo investimento no aprimoramento dessas ferramentas.
A simples adoção de novas estratégias de ensino não garante que os alunos irão prontamente aderi-las, visto que alguns nunca tinham feito uso dessas ferramentas. É essencial o estímulo a adesão, principalmente para os iniciantes ao ciclo médico profissional.
Pretende-se continuar o desenvolvimento do projeto, adequando as ferramentas às sugestões realizadas pelos alunos, como o uso de plataforma única. Também serão revistas algumas das táticas adotadas para divulgação de tais materiais, além de capacitação dos docentes no uso de tais recursos. Os dados obtidos poderão ser utilizados como um estudo-piloto para subsidiar futuramente uma pesquisa mais sistematizada, além de procurar expandir estratégia semelhante para outras disciplinas do curso médico.
AGRADECIMENTOS
Profissionais do Centro de Informática em Saúde da Faculdade de Medicina da UFMG. Alunos que participaram da coleta de dados, monitores do Projeto de Monitoria de Graduação do Departamento de Pediatria da UFMG. Professores do Departamento de Pediatria, coordenadores das disciplinas Pediatria I e Pediatria II, envolvidas no projeto.
REFERÊNCIAS
1. Abrantes MM, Tavares EC. Usando a Internet para atualização em Pediatria. In: Leão et al. Pediatria Ambulatorial. Belo Horizonte: Coopmed, 2013:1423-29.
2. Lima EM, Nunes JN, Cardoso LLP et al. A importância da Internet como ferramenta de aprendizagem no ensino básico. 65ª Reunião Anual da SBPC, 2013. Disponível em: http://www.sbpcnet.org.br/livro/65ra. Acesso em Novembro de 2016.
3. Leite CLK, Passos MOA, Torres PL, Alcântara PR. A aprendizagem colaborativa no ensino virtual. Disponível em: www.pucpr.br/eventos/educere/educere2005/anaisEvento/documentos/.../TCCI167. pd. Acesso em Novembro de 2016.
4 Shutze M, Bueno MC, Grillo CFC, Martins M.A. Multimídia: um complemento ao ensino tradicional da Semiologia Pediátrica. Revista de Docência do Ensino Superior, 2011; 1: 27-37. Versão eletrônica.
5 Oliveira EFB, Azevedo JLMC, Azevedo OC. Eficácia de um simulador multimídia no ensino de técnicas básicas de vídeo-cirurgia para alunos do curso de graduação em medicina.Rev. Col. Bras. Cir. 2007;34 (4):251-256.
6 Mars M, Maclean M.Student's perceptions of a multimedia computer-aided instruction resource in histology. S Afr Med J. 1996; 86 (6):1098-102.
7 Teichmam JMH, Richards J. Multimedia to teach urology to medical students. Urology, 1999; 53 (5):267-70.
8 Ferreira ABH. Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. São Paulo: Editora Positivo Ltda., 2014.
9 Martins MA, Viana MRA, Vasconcellos, Ferreira RA. Semiologia da Criança e do Adolescente. Rio de Janeiro: Medbook, 2010.
10 McClelland J. Técnica de Questionário para Pesquisa - Escala de Likert. Disponível em: www.sbfisica.org.br/bjp/download/v06e/v06a06.pdf. Acesso em Novembro de 2016.
11 Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução Nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Diário Oficial da União, nº12, 13 de junho de 2013. Seção 1. Página 59.
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