RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 23. 1 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20130002

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Artigo Original

Adiposidade e perfil metabólico em crianças de escolas da zona urbana de Ouro Preto - MG

Adiposity and metabolic profile of schoolchildren in the urban areas of Ouro Preto, Minas Gerais

André Everton de Freitas1; Joel Alves Lamounier2; Danusa Dias Soares3; Thiago Henrique de Oliveira4; Débora Romualdo Lacerda5; Joyce Batista Andrade6; Flávia Komatsuzaki7; Vanessa Gontijo de Freitas8; Leida Maria Botion9; Flávio Diniz Capanema10

1. Fisioterapeuta. Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC Minas. Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Médico. Professor Titular de Pediatria da Universidade Federal de São João Del Rei, Campus Centro-Oeste. Divinópolis, MG - Brasil. Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança e do Adolescente, Faculdade de Medicina da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Educador Físico. Professora Titular de Fisiologia do Exercício da Escola de Educação Física da UFMG. Laboratório de Fisiologia do Exercício EEFFTO da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
4. Fisioterapeuta. Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança e do Adolescente Faculdade de Medicina da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
5. Educador Físico. Laboratório de Fisiologia do Exercício EEFFTO/UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
6. Nutricionista. Programa de Pós-graduação em Saúde da Criança e do Adolescente Faculdade de Medicina da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
7. Estatística. Professora Assistente da Faculdade de Engenharia da UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
8. Psicóloga. Professora da Faculdade Pitágoras. Divinópolis, MG - Brasil. Programa de pós-graduação em Psicologia Social da Puc Minas. Belo Horizonte, MG - Brasil
9. Farmacêutica. Professora Associada. Laboratório de Metabolismo do ICB/UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
10. Médico. Professor Adjunto e Coordenador do Núcleo da Saúde da Criança e do Adolescente da Faculdade de Saúde e Ecologia Humana - FASEH. Vespasiano, MG - Brasil. Gerência de Ensino e Pesquisa da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais - FHEMIG. Belo Horizonte, MG - Brasil

Endereço para correspondência

Flávio Diniz Capanema
E-mail: flavio.capanema@fhemig.mg,gov.br

Recebido em: 02/10/2012
Aprovado em: 15/11/2012

Instituição: Fundação Hospitalar de Minas Gerais - FHEMIG Belo Horizonte, MG - Brasil

Resumo

A obesidade, doença multifatorial definida como excesso de gordura corporal, apresenta concomitância entre fatores de risco genéticos e ambientais. O diagnóstico precoce e as intervenções no período crítico do desenvolvimento da obesidade - infância e adolescência - têm sido recomendados, buscando-se evitar desfechos desfavoráveis na idade adulta. Este estudo transversal teve como objetivo caracterizar perfil lipídico, glicemia, adiponectina, leptina e grelina de escolares entre seis e nove anos, portadores de sobrepeso e obesidade, do município de Ouro Preto-MG. Os dados foram analisados a partir do teste de normalidade Shapiro Wilk; e nas comparações entre os grupos foi aplicado o teste paramétrico (Teste t) ou não paramétrico (Teste Mann Whitney), adotando-se intervalo de confiança de 95% e nível de significância para valores < 0,05. A idade média da população escolar foi de 7,8 ± 1,1 anos, com prevalência de 8,9% de sobrepeso e 3% de obesidade. Foram identificados hipercolesterolemia em 5,5%, HDL alterado em 98,7%, taxa limítrofe de LDL em 32,4% e glicemia alterada em 46,6% das crianças. Na análise estratificada quanto ao gênero, foram observados valores mais altos para leptina em meninas (p=0,032) e grelina nos meninos (p=0,033), não havendo diferença para as demais variáveis. Os resultados demonstram ser o excesso de peso entre escolares problema de saúde relevante no município, ressaltando-se a importância de implementação de programa de intervenção precoce por parte dos gestores. Elucidar os precursores da obesidade na infância pode levar a intervenções capazes de atenuar ou impedir suas consequências na juventude e fase adulta.

Palavras-chave: Sobrepeso; Obesidade/prevenção & controle; Saúde da Criança; Transtornos da Nutrição Infantil.

 

INTRODUÇÃO

A obesidade é doença crônica definida como excesso de gordura corporal, em que se verifica concomitância de fatores de risco genéticos e ambientais.1-3 Sua etiologia não é de fácil identificação, sendo caracterizada como multifatorial. Acredita-se que fatores externos sejam mais relevantes na incidência de obesidade do que os genéticos.4-6

A prevalência de obesidade na infância e na adolescência cresce intensamente e tende a persistir na vida adulta: cerca de 50% de crianças obesas aos seis meses de idade e 80% delas aos cinco anos de idade permanecerao obesas na vida adulta.7 Estimativas mostram que em 2025 o Brasil será o quinto país no mundo a ter problemas de obesidade em sua população.5

A literatura destaca a idade próxima de seis anos como dos períodos mais críticos no desenvolvimento de mais acúmulo de gordura corporal, sendo a ocorrência de obesidade, segundo a distribuição por sexo e idade, evidenciada com alto risco em meninas.8

Considerada das condições mais estigmatizantes e de menos aceitação social na infância, crianças e adolescentes obesos apresentam pior qualidade de vida quando comparadas com indivíduos saudáveis da mesma idade.9 Crianças obesas, em relação às normais, caracterizam-se por apresentarem mais agressividade, apetite, interesse pela sexualidade, ansiedade, tendência à depressão, piores relações interpessoais, acentuado desequilíbrio afetivo e débil tolerância às frustrações.10

Alterações na composição corporal ao longo do tempo podem atrair consequências diretas nas funções do corpo, levando ao aumento da prevalência de várias condições associadas à obesidade, tais como: diabetes mellitus, dislipidemias, problemas cardiovasculares e respiratórios, desordens psicológicas, ortopédicas e elevação da pressão arterial.11,12

A prevenção de obesidade requer especial atenção para seu diagnóstico durante a infância e o período pré-escolar, visto que, nessa faixa etária, há substancial aumento da prevalência de obesidade e de seus fatores associados.13 O diagnóstico precoce e as intervenções no período crítico do desenvolvimento da obesidade (infância e adolescência) têm sido recomendados para se evitarem desfechos desfavoráveis na idade adulta.14

Tendo em vista que na infância o processo de crescimento e desenvolvimento é o período no qual se registra a formação dos hábitos alimentares, justifica-se a importância do conhecimento da situação nutricional desse grupo etário, para que, diante das inadequações, seja possível estabelecer orientações dietéticas efetivas, promoção de hábitos saudáveis e prática de atividade física. Nesse contexto, este estudo teve como objetivo caracterizar a adiposidade, perfil lipídico, glicemia, adipocitocinas (adiponectina e leptina) e grelina de crianças na faixa etária de seis a nove anos, matriculados em escolas públicas do município de Ouro Preto-MG.

 

CASUISTICA E MÉTODOS

Delineamento do estudo

Trata-se de estudo de corte transversal com crianças de seis a nove anos matriculadas em sete escolas públicas da zona urbana do município de Ouro Preto, Minas Gerais, nos turnos da manha e tarde, da fase introdutória até a IV fase escolar.

População do estudo e amostra

De um universo inicial composto de 1.019 escolares elegíveis para o estudo, buscou-se identificar os portadores de sobrepeso e obesidade. Após a realização da avaliação nutricional, foram diagnosticadas 119 crianças com sobrepeso e obesidade e, destas, um total de 79 crianças pôde ser incluído neste estudo, a partir do consentimento por escrito fornecido pelos pais e/ou responsáveis. Foi coletada amostra sanguínea para determinação do perfil lipídico, glicemia, adiponectina, leptina e grelina. O estudo foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais.

Coleta de dados

Foi realizada mediante avaliação de parâmetros antropométricos (índice de massa corporal, percentual de gordura, pregas cutâneas e relação cintura/quadril) e de sangue (perfil lipídico, adiponectina, leptina, grelina e glicemia).

Todas as avaliações previstas para o estudo aconteceram no período da manha. Para as coletas de dados elaborou-se um protocolo para padronização dos procedimentos, sendo todos os pesquisadores previamente selecionados e treinados quanto aos procedimentos da pesquisa.

Para a caracterização da adiposidade, foi avaliado o índice de massa corporal (IMC), calculado a partir da relação entre peso corporal total em quilogramas e estatura em metros ao quadrado (índice de Quetelet).15 Utilizaram-se os pontos de corte preconizados em 2007 pela Organização Mundial de Saúde (OMS).16

Para a medida da estatura, adotou-se o antropômetro vertical da marca Alturaexata, com graduação em centímetros até 2,13 metros e precisão de 0,1 cm, com visor de plástico e esquadro acoplado a uma das extremidades. Para a medida de peso em quilograma e percentual de gordura corporal, empregou-se balança digital eletrônica marca TANITA, modelo BF599, com capacidade máxima para 180 kg e divisão de 50 g, segundo normas definidas por Jellife.17

Para a realização das medidas de pregas cutâneas tricipital (PCT) e panturrilha (PT) usou-se adipômetro marca Lange Skinfold Caliper, com escala de 0 a 60 mm e precisão de ± 1 mm, pressão constante de ~10 g/mm2, sem variação com a sua abertura, de acordo com as técnicas preconizadas por Heyward et al.18 Foi empregada a equação proposta por Slaughter et al.19 para a avaliação do percentual de gordura corporal. Todas as medidas foram realizadas por um examinador previamente treinado, no braço não dominante e com no mínimo três repetições alternadas no mesmo local, considerando-se como valor representativo da regiao a média aritmética. Para a circunferência de cintura e quadril, usou-se fita métrica com extensão de 2 m, flexível e inelástica, dividida em centímetros e subdividida em milímetros, tomando-se cuidado para não comprimir as partes moles, adotando-se os pontos de corte propostos por Taylor et al.20 A relação cintura-quadril foi obtida procedendo-se à divisão das circunferências da cintura pela do quadril.

Para as variáveis bioquímicas, todas as coletas de sangue foram realizadas nas escolas no período da manha (entre 07:00 e 09:00 h), sendo coletados de cada criança 6 mL por amostra, centrifugados e armazenados a -20ºC. Todas as crianças foram orientadas a manterem jejum de 12 horas. As análises foram feitas pelo método enzyme-linked immunoabsorbent assay (ELISA) (Linco Research) para as concentrações de adiponectina, leptina e grelina.21-23 Para a análise sérica de triacilglicerol (TG), colesterol total (CT), lipoproteína de baixa densidade (LDL), lipoproteína de alta densidade (HDL) e glicemia adotou-se o método colorimétrico (labtest®). O LDL foi estimado com base na equação proposta por Friedewald et al. 24 O perfil lipídico foi caracterizado conforme os pontos de corte propostos para a infância e adolescência na I Diretriz de Prevenção da Aterosclerose na Infância e Adolescência.25

Análise dos dados

Os dados coletados foram organizados em planilha do Excel e depois transportados para os softwares utilizados para as análises estatísticas (EpiInfo versão 6.2 e SPSS versão 14.0).

Os dados do estudo foram analisados por listagem de frequência das características das diversas variáveis categóricas e da obtenção de medidas de tendência central (média) e medidas de dispersão (desvio-padrao). De acordo com a distribuição de probabilidade dos dados analisados a partir do teste de normalidade Shapiro Wilk, nas comparações de médias ou medianas entre os grupos (masculino e feminino) foi aplicado o teste paramétrico (Teste t) ou não paramétrico (Teste Mann Whitney), quando a distribuição foi considerada normal e não normal, respectivamente. Considerou-se diferença estatisticamente significante no nível de 5% (p < 0,05).

 

RESULTADOS

A prevalência de sobrepeso e obesidade encontrada na população de 1.019 escolares de seis a nove anos matriculados em sete escolas públicas da zona urbana de Ouro Preto foi de 8,9% (n=89) e 3º% (n=30), respectivamente, totalizando 119 crianças (Figura 1). Observou-se percentual de 82,3% (n=839) de eutróficos e 5,9% (n=60) de baixo peso. Para a análise das variáveis previstas, todas as crianças caracterizadas com sobrepeso e obesidade foram convidadas a participarem do estudo, sendo a amostra constituída de 79 crianças cujos pais assinaram o TCLE.

 

Figura 1 - Estado nutricional dos escolares de seis a nove anos, de escolas públicas do município de Ouro Preto, MG.

 

A Tabela 1 mostra as médias e desvios-padrao do grupo estudado (n=79), referindo a idade média do grupo estudado de 7,8 ± 1,1 anos, peso de 37,84 ± 8,77 kgf e IMC de 21,10 ± 2,85 kg/m2. Para as variáveis leptina, adiponectina e grelina, os valores médios foram de 21,16 ± 16,17 ng/mL; 27,59 ± 11,99; e 408,29 ± 203,36 pg/mL. Quanto ao perfil lipídico, os resultados foram: 126,91 ± 29,79 mg/dL para colesterol total; 19,86 ± 13,27 mg/dL para HDL; 91,18 ± 27,83 mg/dL para LDL; e 84,79 ± 47,31 mg/dL para triglicerídeo. Encontrou-se valor médio de glicemia de 86,32 ± 17,10 mg/dL.

 

 

Na análise estratificada das variáveis do estudo quanto ao sexo, observou-se diferença significativa com intervalo de confiança de 95% entre os grupos feminino e masculino para leptina (p=0,032) e grelina (p=0,033). Para as demais variáveis, não houve diferença entre os grupos (Tabela 1).

Na Tabela 2 estao apresentadas as prevalências das alterações apuradas no perfil lipídico e glicemia dos escolares de seis a nove anos. A prevalência de hipercolesterolemia foi de 5,5%, HDL alterado em 98,7%, taxa limítrofe de LDL em 32,4% e glicemia alterada em 46,6% das crianças.

 

 

DISCUSSÃO

Os dados deste estudo revelaram prevalência de 8,9% de sobrepeso e 3% de obesidade entre os escolares de seis a nove anos, de sete escolas públicas do município de Ouro Preto, totalizando 11,6%. A comparação da prevalência de sobrepeso e obesidade com resultados de outros estudos torna-se complexa, devido a diferentes faixas etárias, pontos de corte utilizados para diagnóstico, variedade de métodos utilizados na determinação do estado nutricional e outros aspectos.

As prevalências de sobrepeso e obesidade em crianças, no Brasil, crescem em ritmo bem acelerado, ao mesmo tempo em que declina a desnutrição em crianças e adultos. A projeção dos resultados de estudos efetuados nas últimas três décadas é indicativa de um comportamento nitidamente epidêmico do problema, estabelecendo um processo de transição nutricional do país.26

Estudos revelam prevalências de sobrepeso e obesidade de escolas públicas de 18% em Fortaleza;27 16,5% de sobrepeso e 14,7% de obesidade na regiao de Palheiros-SP;28 10,4% de sobrepeso e 10,4% de obesidade em escolares da 1ª à 4ª série da rede municipal no Rio de Janeiro;29 15,4% de sobrepeso e 6% obesidade, com amostra de 4.964 escolares de seis a 10 anos das redes pública e privada de Santa Catarina;30 e prevalência de 13,1 e 9% de sobrepeso e obesidade, respectivamente, em estudo com 2.651 pré-escolares de escolas públicas e privadas de Recife.31

Estudos internacionais também acusam altas prevalências de sobrepeso e obesidade nessa faixa etária. Esses dados demonstram que a obesidade e o sobrepeso na infância apresentam altas prevalências, com aumento ao longo das últimas duas décadas em várias partes do mundo, confirmando a epidemia global desses eventos, tornando-se alvo de preocupações na saúde pública devido à sua possível associação com outras doenças na vida adulta e altas taxas de morbimortalidade.32-36

Embora alguns estudos apresentassem diferença nas prevalências de sobrepeso e obesidade entre crianças do sexo masculino e feminino, a presente pesquisa não detectou diferença significativa entre as variáveis avaliadas, exceto para a leptina, que exibiu valor mais alto para meninas (25,81 ± 16,69 ng/mL), e grelina, mais para os meninos (449,30 ± 222,16 pg/mL). Valor médio de 28,6 ± 15,1 ng/dL para leptina foi encontrado no acompanhamento a 34 crianças obesas de sete a 11 anos, resultado superior ao desta investigação.37 Em pesquisa com 30 meninos e 17 meninas de nove a 10 anos, os valores médios de adiponectina foram de 7,6 ng/dL para meninos e 8,3 ng/dL para meninas, enquanto que para leptina foram encontrados 10,6 ng/dL para meninos e 13,0 ng/dL para meninas.38 Por outro lado, valores inferiores de leptina foram observados no estudo de Hamidi et al.39 com crianças obesas de sete a 12 anos (8,25 ng/dL para meninos e 11,0 ng/dL para meninas). Whatmore et al.,40 em avaliação de crianças e adolescentes eutróficos, verificaram concentração de 162 pg/mL (60-493 pg/mL) para grelina e nenhuma diferença entre sexos.

Neste estudo encontraram-se baixa prevalência de hipercolesterolemia (5,5%), alta prevalência de HDL alterado (98,7%), taxa limítrofe de LDL de 32,4% e glicemia alterada em 46,6% dos escolares com sobrepeso e obesidade. Na literatura, além da relação do sobrepeso e da obesidade com doenças cardiovasculares, hipertensão, síndrome metabólica, osteoartrose, apneia do sono e certas formas de câncer,41,42 o aumento do excesso de peso infantil parece ter mais influência sobre mudanças negativas no perfil lipídico (CT, TG, LDL elevados e níveis baixos de HDL) em crianças e adolescentes.43,44

Em investigação conduzida com crianças e adolescentes observou-se que os indivíduos com sobrepeso apresentavam 1,6 a 9,1 vezes mais chances de fatores de risco de doenças cardiovasculares como hipertensão arterial sistêmica, elevados níveis de colesterol total, LDL, triglicérides, glicose e reduzidos níveis de HDL, quando comparados com os participantes eutróficos.45 Gerber e Zielinky,46 em estudo realizado no Sul do país com crianças e adolescentes, registraram prevalência de dislipidemia entre 24 e 33%, valores inferiores aos encontrados neste estudo. Em pesquisa feita em Florianópolis - SC. com 1.053 indivíduos de sete a 18 anos, verificaram-se médias de colesterol total, HDL, triglicerídeos e LDL de 162 ± 28, 53 ± 10, 93 ± 47 e 89 ± 24 mg/dL, respectivamente.47 Estudo com 52 crianças obesas de sete a 10 anos informou valores de glicemia de 87,2 ± 5,6 mg/dL para meninos e 86,5 ± 5,1 mg/dL para meninas e HDL de 53,2 ± 6,3 mg/dL para meninos e 49,2 ± 7,4 mg/dL para meninas.48

As consequências do colesterol elevado somadas a outros fatores de risco constituem problema de saúde pública. Do ponto de vista clínico, a vigilância e a detecção precoce dos fatores de risco associados às dislipidemias são primordiais nas ações preventivas, com destaque para o excesso de peso em crianças, cujo controle por meio da obtenção e manutenção do peso adequado para altura, sexo e idade é factível em ações primárias de atenção à saúde.

Vários estudos sugerem que as características socioeconômicas, fatores familiares, pessoais e ambientais são considerados relevantes na obesidade infantil.49-52 Segundo Duncan et al.,53 muitos dos comportamentos saudáveis são iniciados e mantidos no contexto familiar, podendo ser a família (pais e irmãos) considerada um dos principais fatores de âmbito social capaz de influenciar os comportamentos das crianças e adolescentes. Sendo assim, a identificação desses aspectos poderia contribuir para melhor compreensão dos fatores relacionados ao sobrepeso e obesidade, como também para o planejamento de estratégicas de prevenção e tratamento.

 

CONCLUSÃO

Os dados deste estudo revelaram prevalência de sobrepeso e obesidade de 11,6% e suas consequências para a saúde das crianças, constatado pelas alterações hormonais, perfil lipídico e glicemia. O aprofundamento na investigação dessas variáveis torna-se adequado para a determinação de mudanças político-sociais que possam intervir nas causas e no tratamento da obesidade infantil. A escola, por ser promotora e mantenedora de ideias, formação de valores, hábitos e ponto comum de comunicação social com as famílias, constitui forte aliado no combate à epidemia da obesidade infantil e suas comorbidades.

Os resultados evidenciaram um problema de saúde pública que acomete ambos os sexos, ressaltando-se a importância de um programa de intervenção precoce para prevenir sobrepeso e obesidade em crianças. Elucidar os precursores da obesidade na infância pode levar às intervenções eficazes para impedir o seu desenvolvimento ou para atenuar as suas consequências na juventude e fase adulta.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem aos escolares e familiares participantes do estudo; a toda a equipe do projeto; ao Centro de pós-graduação da Faculdade de Medicina e ao suporte financeiro da IAEA (International Atomic Energy Agency) ARCAL RLA 6/059; à FAPEMIG PPSUS 3282/06; ao CNPq MCT/CNPq 479616/2006-0; FIPPUC 2008/2515-S1; à Universidade Federal de Ouro Preto - Escola de Nutrição e Laboratório de Farmácia (LAPAC); à Prefeitura de Ouro Preto - Secretaria de Educação; à Universidade Federal de Minas Gerais - Laboratório de Fisiologia do Exercício - CENESP, Laboratório de Metabolismo - ICB e Faculdade de Saúde e Ecologia Humana - FASEH/MG.

 

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