ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Impacto da sonolência excessiva na qualidade de vida e a influência do regime de turno de trabalho
Impact of excessive sleepiness on quality of life and the influence of the work shift regime
Juliana Arruda Silveira1; Karina Taíssa de Oliveira1; Roberta de Alvarenga Batista1; Letícia Sauma Ferreira2; Hudson de Araújo Couto3
1. Acadêmico do 5º ano de Medicina da FCMMG, Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Acadêmico do 8º período de Medicina da UFMG, Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Médico do trabalho e professor coordenador da disciplina de Fisiologia da FCMMG, Belo Horizonte, MG - Brasil
Hudson de Araújo Couto
Av. Carandaí, 291 apto. 401, Funcionários
CEP: 30130-060, Belo Horizonte, MG, Brasil
Email: hudson@ergoltda.com.br
Recebido em: 01/04/2009
Aprovado em: 12/04/2010
Instituição: Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, Mineradoras Brasileiras Reunidas
Resumo
OBJETIVO: verificar a qualidade do sono de população que, além das atividades cotidianas, possui alteração em seu ciclo sono-vigília e quais as consequências dessas mudanças para a saúde e o desempenho cognitivo.
MÉTODOS: aplicaram-se 620 questionários em trabalhadores de turno fixo diurno de Belo Horizonte e nos de turno ininterrupto de revezamento da empresa Minerações Brasileiras Reunidas (MBR). Realizou-se o inquérito por meio do questionário desenvolvido pelo Serviço de Distúrbios do Sono do Hospital Saint-Antoine, França. Incluiu-se no questionário a Escala de Sonolência de Epworth (ESE).
RESULTADOS: em ambas as populações evidenciou-se alta incidência de alterações do sono, como: ronco (58,21%), irritabilidade (50,40%), paradas respiratórias durante o sono (12,66%), comprometimento da memória recente (40,61%), sonolência excessiva diurna (63,48%), diminuição da atenção (34,30%) e ESE > 10 (30,08%). Entre os que apresentavam queixa de sonolência diurna (63,69%), 47,33% tinham também dificuldade de memória, 42,60% déficit de atenção e 57,50%, irritabilidade. Foram mais evidentes a queixa de ronco e paradas respiratórias entre portadores de sobrepeso do que entre os com IMC < 25 kg/m2 - ronco (70,24 vs 43,70%) e parada respiratória (17,86 vs 6,64%), p<0,01 para as duas variáveis. Conclusão: as alterações no sono não estão restritas aos trabalhadores de turno. A inversão do ritmo circadiano não é a única causa de comprometimento da qualidade do sono, pois este se mostra alterado e algumas vezes com qualidade inferior também nos trabalhadores da população com turno fixo diurno. É importante a conscientização da população sobre o impacto do sono na qualidade de vida.
Palavras-chave: Distúrbio do Sono por Sonolência Excessiva; Privação do Sono; Síndromes da Apneia do Sono; Transtorno do Sono; Transtornos do Sono do Ritmo Circadiano.
INTRODUÇÃO
De acordo com uma definição comportamental simples, o sono é estado reversível no qual há pouca resposta e nenhuma interação com os estímulos do ambiente.1 É processo fisiológico e comportamental.1
O sono apresenta variações conforme a faixa etária. Do recém-nascido até o idoso, o sono sofre modificações quanto à distribuição dos diversos estágios e quanto ao próprio ritmo circadiano, passando de poli para monofásico na idade adulta, podendo ainda ser mais fragmentado no envelhecimento.1 O adulto dorme, em média, sete a oito horas por dia, contudo, existem os dormidores curtos, que necessitam de menos horas de sono, e os dormidores longos, que necessitam de mais horas.1
O sono pode ser comprometido em função da sociedade ativa 24 horas, sete dias por semana. Para manter a economia funcionando, faz-se necessário o estabelecimento de turnos de trabalho fora do horário habitual - de sete da manhã às seis da tarde. Essa escala ininterrupta de turno, presente, primeiramente, na indústria e nos serviços de transporte, estende-se, agora, ao setor terciário. São exemplos de atividades que passaram a exigir funcionamento ininterrupto os serviços bancários, de telecomunicações, supermercados, drogarias e hospitais.2
O regime de turnos ininterruptos de revezamento, cuja jornada foi reduzida a seis horas pela Constituição de 1988 (art. 7º, XIV), caracteriza-se por três fatores: a) atividade empresarial ininterrupta; b) distribuição dos horários de trabalho em turnos para cobrir todo o período de atividade da empresa; e c) sistema de revezamento das equipes de trabalho, com alternância, para cada empregado, de jornadas diurnas e noturnas.3
O trabalho em turno de revezamento rompe com a relação harmônica entre o relógio biológico interno e o meio ambiente.4 Ele exige que o ser humano trabalhe durante seu período normal de sono, causando inversão no ritmo circadiano, que provoca a dessincronização interna dos processos biológicos, com consequências negativas para o funcionamento de todo o organismo.2
Distúrbios do sono são observados comumente em trabalhadores de turno de revezamento. Os mais frequentes são sonolência excessiva, síndrome da apneia/hipopneia do sono (SAHS) e insônia.1,5
O trabalho em turno de revezamento gera também outras consequências para a saúde. Entre elas estão o comprometimento gastrintestinal, cardiovascular, depressão, abuso de substâncias1,4-7 obesidade, alterações da libido, diminuição de reflexos e atenção.1
Constata-se, da mesma maneira, que a privação do sono é forma de estresse com consequente redução no desempenho no trabalho, que favorece acidentes e incidentes.8,9 Ela está também associada à diminuição do desempenho psicomotor, alterações do humor, das funções autonômicas e do sistema imunológico.9
O sono de boa qualidade é necessidade fundamental e com pouca repercussão tanto na população leiga quanto na classe médica, sendo ainda desvalorizado e visto como desperdício de tempo.10
A pesquisa da qualidade do sono de trabalhadores de turno de revezamento e da população é imprescindível para identificar influências na qualidade de vida provocadas pelo trabalho rotativo de turno e por outros fatores presentes em toda a população - estresse, trabalho excessivo, jornadas duplas, álcool, nicotina, luminosidade e ruídos excessivos no período do sono.1,4,6-8
Este estudo tem por finalidade avaliar qualitativamente o sono de duas populações trabalhadoras distintas: uma que trabalha em turno fixo diurno e outra composta de trabalhadores que exercem sua atividade em turnos contínuos de revezamento, trabalhando algumas noites durante a semana e dormindo durante o dia.
O objetivo é verificar a ocorrência de transtornos relacionados ao débito de sono e de que forma isso interfere no desempenho profissional e relacionamento interpessoal. Espera-se, com isso, avaliar a qualidade do sono da população que, além das atividades cotidianas, possui alteração em seu ciclo sono-vigília e quais as consequências dessa mudança para a saúde e o desempenho cognitivo.
MÉTODO
Trata-se de estudo transversal com amostra envolvendo dois grupos: população da região metropolitana de Belo Horizonte - grupo 1; e trabalhadores das Minerações Brasileiras Reunidas (MBR) - grupo 2, constituindo amostra de 620 indivíduos distribuídos equitativamente.
No grupo 1, estão inclusos os trabalhadores de turno fixo diurno, da região metropolitana de Belo Horizonte, masculinos e com idades entre 20 e 60 anos.
No grupo 2, foram avaliados os trabalhadores que exercem atividade laboral em turno ininterrupto de revezamento na empresa MBR, masculinos, com idades entre 20 e 60 anos. Serão estes trabalhadores referidos como em turno de revezamento ou trabalhadores da Mineradora.
Os empregados da Mineradora receberam palestras educativas e informações nutricionais. Todavia, eles ainda não haviam sido tratados pela medicina do sono da referida empresa.
Foi avaliado, qualitativamente, o sono nos dois grupos e seu impacto sobre a qualidade de vida.
Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido no qual se informava sobre os objetivos, procedimentos e benefícios deste estudo.
Para a escolha da amostra do grupo 1, foram adotados os seguintes critérios de inclusão: idades entre 20 e 60 anos, morar na região metropolitana de Belo Horizonte, ser do gênero masculino e trabalhar em turno fixo diurno. Os critérios para o grupo 2 foram: trabalhar na Mineradora em turno ininterrupto de revezamento e ter passado pela avaliação da medicina do sono sem ter recebido tratamento.
Realizou-se inquérito epidemiológico descritivo e analítico por meio de questionário padronizado do sono desenvolvido pelo Serviço de Distúrbios do Sono do Hospital Saint-Antoine em Paris, França.
Os indivíduos deveriam responder perguntas relacionadas à higiene do sono, segundo observações feitas nos três últimos meses. O questionário no grupo 1 foi respondido pela própria pessoa, sob supervisão de pelo menos um dos pesquisadores. Foi feito, dessa forma, com o intuito de evitar respostas não-fidedignas, devido ao constrangimento, e/ou respostas erradas ou em branco, devido à incompreensão. No grupo 2, os questionários foram aplicados pela equipe de medicina do sono da empresa MBR. O acesso a esses questionários foi autorizado pela Mineradora e as respostas das questões foram transcritas para uma planilha e posteriormente analisadas pelos pesquisadores.
Constam nesse questionário dados pessoais - nome, idade, índice de massa corpórea (IMC), profissão, turno em que trabalha, sexo, empresa e estado civil -, 24 perguntas a respeito da higiene do sono e a Escala de Sonolência de Epworth (ESE) (Anexo A).
As perguntas estão relacionadas ao sono - duração, características e qualidade do sono, ronco - e ao período de vigília - estado emocional, grau de atenção, atividade sexual, utilização de medicamentos, cigarro e bebidas alcoólicas. As questões avaliam a qualidade do sono dos entrevistados.
A Escala de Sonolência de Epworth (ESE), incluída no Anexo A, investiga a vigência de sonolência excessiva. Seus resultados têm modesta correlação com a medida fisiológica do sono, porém estão estritamente relacionados nos casos em que há distúrbios respiratórios como a apneia obstrutiva do sono. A escala possui pontuação que vai de zero a 24. E valores iguais ou acima de 10 acusam a presença de alterações do sono. A ESE capta uma impressão subjetiva, pois depende da habilidade de leitura, compreensão e resposta honesta do entrevistado.
Os dados foram passados para tabelas desenvolvidas pelos pesquisadores utilizando o programa Microsoft Office Excel 2000. Os valores da ESE encontrados nos dois grupos foram calculados e analisados pelos pesquisadores. As análises estatísticas foram realizadas no software: Epi Info 3.3.2 e DocEstat.11
Após o processamento dos dados, foi calculada a frequência das respostas para cada questão, nos dois grupos. Realizaram-se, também, cruzamentos entre diferentes questões em cada grupo amostral, assim como comparações entre os dois grupos. Para isso, foi utilizado intervalo de confiança 95%.
Os cruzamentos realizados foram: sono durante o dia e dificuldade de fixar atenção; sono durante o dia e dificuldade de memória; sono durante o dia e irritabilidade; ronco e paradas respiratórias durante o sono; acordar durante a noite e sono durante o dia; índice de massa corpórea e ronco.
RESULTADOS
Alterações decorrentes no sono da população total estudada
Foram relacionados diferentes fatores ligados ao sono - contidos no questionário aplicado - em busca de diferenças entre as duas populações e de associações causais significativas.
Em ambas as populações estudadas foram evidenciadas incidência de alterações do sono: ronco (58,21%), irritabilidade (50,40%), paradas respiratórias durante o sono (12,66%), comprometimento da memória recente (40,61%), sonolência excessiva diurna (63,48%), diminuição da atenção (34,30%) e ESE igual ou superior a 10 (30,08%).
Dos entrevistados que apresentaram queixa de sonolência diurna (63,69%), 47,33% tinham também dificuldade de memória, 42,60% déficit de atenção e 57,50%, irritabilidade.
Não se percebeu diferença considerável entre as duas populações no que diz respeito à percepção de sono durante o dia (60,52% na Mineradora e 66,45% na população em geral). Tampouco houve diferença da pontuação na Escala de Epworth entre os grupos.
Trabalhadores em turno de revezamento
Dos 310 trabalhadores da Mineradora, 55 (17,74%) estavam na faixa etária entre 20 e 30, 129 (41,61%) entre 30 e 40, 104 (33,55%) entre 40 e 50 e 22 (7,10%) entre 50 e 60 anos.
Quanto ao estado civil, 55 (17,75%) eram solteiros, 248 (80%) casados e seis (1,93%) divorciados.
Em relação ao peso, 93 (30%) exibiram IMC inferior a 25 kg/m2 e 217 (70%) igual ou superior a 25 kg/m2.
Averiguou-se que 225 trabalhadores (73,53%) apresentaram Escala de Epworth abaixo 10; e 81 (26,47%) igual ou superior a 10.
Em relação à duração do sono nos dias de trabalho, 19 (6,13%) dormiam menos de cinco horas, 203 (65,48%) de cinco a oito e 74 (23,87%) mais de oito horas.
Verificou-se o ronco em 228 trabalhadores (74,26%) e queixa de sono durante o dia em 187 (60,52%).
Trabalhadores de turno fixo diurno
Dos 310 trabalhadores da região metropolitana de Belo Horizonte, 133 (42,90%) estavam na faixa etária entre 20 e 30, 58 (18,71%) entre 30 e 40, 64 (20,64%) entre 40 e 50 e 53 (17,10%) entre 50 e 60 anos.
Quanto ao estado civil, 149 (48,06%) eram solteiros, 143 (46,13%) casados e sete (2,26%) divorciados.
No tocante ao peso, 180 (59,80%) apresentaram IMC inferior a 25 kg/m2 e 121 (40,20%), igual ou superior a 25 kg/m2.
Averiguou-se que 205 trabalhadores (66,34%) apresentaram Escala de Epworth inferior a 10; e 104 (33,66%) igual ou superior a 10.
Em relação à duração do sono nos dias de trabalho, 23 (7,42%) dormiam menos de cinco horas, 251 (80,97%) de cinco a oito horas e 21 (6,77%) mais de oito horas.
Constatou-se ronco em 130 trabalhadores (42,20%) e queixa de sono durante o dia em 206 (66,45%).
Comparação entre as populações estudadas
A média de idade dos trabalhadores da Região Metropolitana de Belo Horizonte foi de 35,46 anos, mediana de 32 e moda de 24, enquanto a dos trabalhadores da Mineradora foi de 37,68 anos, mediana de 38 e moda de 39. Ao comparar a idade entre as populações estudadas, apurou-se diferença estatística (p<0,05)
Também foi encontrada diferença estatística significativa considerando-se o estado civil (p < 0,01) entre as populações. (Tabela 1)
Alterações do sono na Mineradora e relação com o IMC
Ronco e paradas respiratórias mostraram-se mais evidentes entre os portadores de sobrepeso do que entre os de IMC < 25 kg/m2: ronco (70,24% vs 43,70%) e parada respiratória durante o sono (17,86% vs 6,64%), p<0,01 para as duas variáveis.
Uma vez que a ocorrência de sobrepeso foi mais acentuada na Mineradora do que na população (70 vs 40,20%) e tendo em vista sua associação com distúrbios do sono, conforme referido anteriormente, comparou-se a prevalência de tais alterações, ronco e paradas respiratórias, em portadores e não-portadores de sobrepeso nos trabalhadores da Mineradora, em busca de explicação para a alta incidência de distúrbios do sono no grupo da Mineradora (Tabelas 2 e 3).
Não houve diferença estatística no estudo para as associações: sobrepeso e parada respiratória; sobrepeso e ronco. Qui-quadrado < 3,84 para ambas as associações, o que permite considerar que a incidência maior de transtornos na Mineradora esteja relacionada ao trabalho de turno, que implica sono diurno, sabidamente menos reparador, e menos ao excesso de peso.
DISCUSSÃO
As amostras da população de turno fixo diurno e dos trabalhadores da Mineradora em turno fixo de revezamento apresentaram características distintas em relação à idade e ao estado civil. Na Mineradora, a faixa etária predominante foi de 30 a 40, enquanto na população ela foi de 20 a 30 anos. Em relação ao estado civil, havia número consideravelmente mais elevado de trabalhadores casados na Mineradora do que na população de turno fixo diurno. Tais diferenças podem ter interferido nos resultados.12
Apesar do trabalho em turno ininterrupto de revezamento ser dos principais responsáveis por alterações no sono, existem diversos fatores que, se somados, podem acarretar distúrbios semelhantes. Variáveis como: idade, privação voluntária do sono, estresse, trabalho excessivo, jornadas duplas, álcool, nicotina, uso abusivo de cafeína, luminosidade e ruídos excessivos no período do sono1,2,6,12-14 são alguns dos fatores que podem ter contribuído para a elevada incidência de alterações do sono encontrada em ambas as amostras pesquisadas.
Este estudo demonstrou mais incidência de sobrepeso e obesidade nos trabalhadores de turno da Mineradora do que na população. Essa diferença pode ser explicada pela alta prevalência de motoristas - ocupação sedentária - entre as profissões dos trabalhadores da Mineradora. É sabida também a dificuldade de se conciliar a rotina de exercícios físicos com o trabalho de turno de revezamento.1 E fator adicional, comum entre esses trabalhadores, a refeição noturna, fato menos comum entre pessoas de turno fixo diurno.
A obesidade relacionou-se com distúrbios do sono15-19 e o IMC igual ou acima de 30 aumentou 10 vezes o risco de desenvolver síndrome de apneiashipopneias do sono de adultos (SAHS).15,16 A obesidade é também variável independente em relação ao aparecimento da sonolência excessiva diurna em indivíduos sem SAHS.18-20
A baixa incidência de obesidade na população de turno fixo diurno, associada aos distúrbios de sono, reforça ainda mais a necessidade de se continuar pesquisando os motivos dos citados distúrbios nessa população.
Outro dado analisado em relação ao IMC demonstra que o relato de parar de respirar durante o sono foi mais frequente entre as pessoas com sobrepeso e obesidade. Essa observação está de acordo com o Consenso de SAHS Britânico20, que coloca a obesidade entre os principais fatores predisponentes para hipoapneias e/ou apneia do sono. É importante esclarecer que essa síndrome não é exclusiva dos obesos18,20, tendo como outros fatores relacionados: idade avançada, sexo masculino, uso de drogas sedativas, tabagismo e consumo de álcool.21
O ronco ocorre em 32% da população mundial de adultos.16 Nesta pesquisa, foi encontrado número maior nos dois grupos (41,93% na população e 73,55% na Mineradora). Isso demonstra a necessidade de se valorizar o tratamento do ronco, já que ele é importante sinal de desordem do sono e pode estar associado a apneias obstrutivas, entre outras doenças.1,19,21
Sabe-se que o sono é essencial para o aprendizado e para a consolidação da memória.1,10,21-23 Quando é avaliada a correlação entre sonolência excessiva diurna com a dificuldade de memória na Mineradora e na população, encontrou-se, nas duas populações, associação entre essas duas variáveis. Esse achado corrobora a hipótese do papel do sono para consolidação da memória.
Estudos demonstram prejuízo do sistema neurocognitivo associado à privação de sono, entre eles a irritabilidade e o déficit da atenção.24,25 Os resultados dos cruzamentos apresentados neste trabalho também confirmaram essa hipótese da redução dos processos cognitivos devido à privação do sono.24
CONCLUSÃO
Foi possível constatar, a partir deste estudo, que as alterações relacionadas ao sono estão presentes tanto em trabalhadores de turno ininterrupto de revezamento quanto na amostra analisada de trabalhadores de turno fixo diurno.
Quanto à prevalência de distúrbios do sono, pôde-se concluir que os dois grupos apresentaram índices importantes quando se avaliaram as diversas alterações no sono e suas consequências: ronco, paradas respiratórias, sonolência excessiva diurna, irritabilidade, déficit de atenção e dificuldade de memória recentemente - indicativos de sono não reparador.
Na busca por explicação da alta incidência desses transtornos relacionados ao débito de sono na Mineradora, comparou-se a ocorrência de alterações entre portadores e não-portadores de sobrepeso e obesidade. Não se registrou diferença estatística nessa relação, o que permite considerar que a alta incidência de transtornos na Mineradora pode estar relacionada ao trabalho de turnos, que implica sono diurno, sabidamente menos reparador. Em contrário a essa afirmação, este trabalho evidenciou incidência semelhante de sonolência excessiva diurna também na população. Os motivos da alta incidência de sono diurno na população é assunto para outra pesquisa.
AGRADECIMENTOS
Ao Dr. Sérgio Barros Vieira, pela disponibilidade, confiança e pelos conhecimentos a nós transmitidos por meio de sua experiência em Medicina do Sono.
À Drª. Ana América Ferreira Eduvige, pela atenção e intercessão junto à diretoria da Mineradora, visando à realização do trabalho na empresa.
Aos participantes que se dispuseram, voluntariamente, a responder ao Questionário do Sono, colaborando fundamentalmente para a realização deste estudo.
Enfim, aos nossos familiares e companheiros, pelo incentivo e compreensão nos momentos em que estivemos ausentes.
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