RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 31 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.v31supl.5.05

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Artigo Original

Impacto da capacitação em equipes de saúde básica acerca do HPV e da sua vacinação em um município de médio porte de Minas Gerais

The impact of training on basic health care about HPV and its vaccination in a medium-sized city of Minas Gerais

Betina Alves Ferreira de Andrade1; Larissa Maia Lemos Barreto1; Letícia Caldeira Lima1; Luiza Miraglia Firpe1; Roberta Evelyn Furtado1; Cristina Maria Miranda Bello1,2; Renato Santos Laboissière1,2

1. Faculdade de Medicina de Barbacena
2. Universidade Federal de Minas Gerais

Endereço para correspondência

Cristina Maria Miranda Bello
Email: bello.cm@hotmail.com

Instituição: Faculdade de Medicina de Barbacena - FAME/FUNJOB, Barbacena - Minas Gerais - Brasil

Resumo

Introdução: O Papilomavírus Humano (HPV) é o vírus de DNA causador da infecção sexualmente transmissível mais prevalente no mundo, sendo responsável por cerca de 70% dos casos de câncer de colo uterino e até 90% das verrugas anogenitais. A proximidade dos profissionais da atenção básica com a comunidade em que estão inseridos permite que orientem os indivíduos a respeito da prevenção e tratamento dessa infecção, transformando o conhecimento técnico em linguagem acessível a todos. Objetivos: Determinar o impacto do treinamento das equipes de saúde básica no conhecimento acerca do HPV e sua vacinação em município de médio porte de Minas Gerais (MG). Métodos: Trata-se de um estudo analítico, do tipo transversal, realizado em nove Unidades Básicas de Saúde (UBSs) de Barbacena (MG) com 73 profissionais da saúde. Foi aplicado um questionário antes e depois da capacitação, que foi fundamentada na metodologia ativa do Arco de Charles Maguerez. Resultados: A intervenção teve impacto comprovado por meio de diferença significativa no aumento do número de acertos (p<0,0001) e na redução do número de dúvidas (p<0,0001) entre as aplicações do questionário. O nível de conhecimento sobre HPV previamente estabelecido como satisfatório foi superado por mais participantes na segunda aplicação do questionário em relação à primeira. Conclusão: Os resultados enfatizam a importância de realizar capacitações sobre o HPV e sua vacinação para os profissionais atuantes na atenção básica, principalmente aos agentes comunitários de saúde, já que possuem uma relação mais próxima com os usuários das UBSs e grande influência nas decisões da população atendida.

Palavras-chave: Infecção por Papilomavírus. Atenção primária à Saúde. Aprendizagem Baseada em Problemas. Capacitação Profissional e Estratégia Saúde da Família

 

1. INTRODUÇÃO

O Papilomavírus Humano (HPV) é um vírus de DNA, não envelopado, que se replica no núcleo de células epiteliais escamosas da pele e em mucosas das regiões orofaríngea e anogenital. Ele representa a infecção sexualmente transmissível (IST) mais prevalente no mundo, contaminando três de cada quatro pessoas ao menos uma vez na vida1-3. Geralmente, essa infecção é assintomática e autolimitada, mas uma minoria pode desenvolver infecção persistente, acarretando maior risco de transformação maligna a partir das lesões proliferativas provocadas pelo vírus1.

Alguns subtipos de HPV são de alto risco oncogênico, sendo responsáveis por cerca de 70% dos casos de câncer de colo uterino; já os de baixo risco oncogênico estão associados a até 90% das verrugas anogenitais4. Além disso, estima-se que o vírus do HPV associado a outros fatores seja responsável por 90% dos casos de câncer anal, 30% dos de vulva, 50% dos de pênis e 72% dos de orofaringe4-7. O câncer de colo de útero é o terceiro mais frequente entre as brasileiras, desconsiderando o de pele não-melanoma. O Instituto Nacional do Câncer (INCA) divulgou, em 2020, a estimativa de 16.590 novos casos a cada 100 mil mulheres, sendo 6.385 vítimas fatais no ano de 20178. Assim, a vacinação para o HPV torna-se imprescindível para reduzir o número de pacientes infectados e prevenir a evolução para diferentes tipos de câncer relacionados ao HPV.

Diante desse cenário, o Ministério da Saúde adotou a vacina quadrivalente que confere proteção para os subtipos de HPV 6, 11, 16 e 18, com esquema vacinal de duas doses, sendo oferecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS)4,9,10. Desde 2017, o público alvo da vacinação contempla as meninas de nove a 14 anos e os meninos de 11 a 14 anos de idade, uma vez que a aplicação da vacina possui maior indicação para indivíduos que ainda não iniciaram a vida sexual, pois apresenta maior eficácia na proteção de indivíduos ainda não expostos aos subtipos virais presentes em sua composição11.

Atualmente, existem poucos dados acerca da orientação dos profissionais da saúde da atenção primária em relação à infecção por HPV e às formas de prevenção, principalmente sobre a vacinação. Acredita-se que, quando há capacitação sobre o tema, é feita utilizando um método tradicional de ensino, centrado na exposição de fatos pelo locutor, enquanto o ouvinte apenas memoriza e reproduz o que lhe foi passado. Em contrapartida, na educação voltada para o adulto ou andragogia, quando associada à metodologia ativa, o estímulo para o aprendizado é relacionado à aplicabilidade do tema no cotidiano, aumentando o engajamento por parte dos ouvintes e possibilitando a associação de experiências pessoais dos envolvidos com o assunto em discussão12.

Considerando a importância da atenção primária na orientação da população a respeito do HPV e o número reduzido de pesquisas abordando esse segmento, o presente estudo teve como objetivo determinar o impacto do treinamento das equipes de saúde básica no conhecimento sobre o HPV. No contexto pré e pós intervenção, avaliou-se a assimilação do conteúdo acerca da infecção por HPV e da estratégia de vacinação, com enfoque na problematização e na realidade das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) do município de Barbacena - MG.

 

2. MÉTODOS

Delineamento do estudo

Trata-se de um estudo analítico, do tipo transversal, conduzido por pesquisadoras da Faculdade de Medicina de Barbacena, em Minas Gerais, no mês de setembro de 2020.

População

A intervenção foi realizada em nove UBSs da cidade de Barbacena-MG: Boa Vista, CAIC, Carmo, Funcionários, Nova Suíça, Santo Antônio, Santa Cecília, Santa Efigênia e Vilela, com a participação de 73 profissionais de saúde da equipe de saúde básica, entre agentes comunitários de saúde (ACSs), médicos, enfermeiros e auxiliares e/ou técnicos de enfermagem. Foram excluídos aqueles que não aceitaram participar do estudo ou que não compareceram à UBS no dia realizado.

Procedimentos e Intervenção

Para avaliar o conhecimento dos participantes, foi escolhido um questionário autoaplicado, desenvolvido e validado para o idioma inglês em 2012 por Waller J. e colaboradores, que foi traduzido para a língua portuguesa pelos pesquisadores Manoel A.L. e colaboradores13. O questionário é composto por 29 questões divididas em primeira, segunda e terceira seção, de acordo com as seguintes áreas temáticas: conhecimento acerca do HPV (16 itens), conhecimento relacionado à vacina para o HPV (sete itens) e conhecimento sobre os testes e exames para o HPV (seis itens), respectivamente. A questão 2f "A vacina contra o HPV deve ser dada em três doses" foi anulada e desconsiderada na avaliação estatística devido às divergências quanto ao número de doses disponibilizadas na rede pública e privada. As opções de respostas foram verdadeiro (V), falso (F) e não sei (NS). As variáveis sociodemográficas analisadas foram idade, sexo, estado civil, número de filhos, religião, profissão e escolaridade.

Para evitar um possível viés de comunicação e garantir a validação do método, foi criado um padrão de intervenção para ser replicado com cada equipe de saúde, com o tempo de duração pré-definido de 50 a 60 minutos.

Em cada UBS, houve um contato inicial com os participantes, momento em qual ocorreu a primeira aplicação do questionário com intuito de estabelecer o nível de conhecimento prévio dos participantes sobre o assunto, com tempo pré estabelecido de seis minutos para respondê-lo. A ação prosseguiu com a aplicação do método ativo de aprendizagem, baseado na estratégia do Arco de Charles Maguerez que é composto por cinco etapas14.

A primeira etapa do Arco, denominada "Observação da realidade", consistiu na participação ativa dos profissionais de saúde. Foi feita uma pergunta chave para direcionar a reflexão dos participantes e, em seguida, duas pesquisadoras interpretaram mães que eram contra a vacinação de seus filhos, apresentando diferentes argumentos. Com base nessa encenação, foi estimulada uma discussão orientada por perguntas previamente selecionadas, indagando o papel dos profissionais no estímulo à vacinação para o HPV, segurança para abordar o assunto e se houve capacitação fornecida pelos órgãos de saúde sobre o tema.

Na segunda etapa, intitulada como "Identificação do problema", os participantes foram estimulados a selecionar os pontos-chave da discussão. Assim, foi elaborado um cartaz em forma de mapa mental com os pontos ressaltados, que direcionou as etapas subsequentes.

Na terceira etapa, "Teorização", foi exibido um vídeo com duração aproximada de seis minutos cujo objetivo foi oferecer embasamento científico sobre o tema e padronizar a informação oferecida em todas as ações. O vídeo foi elaborado pelas pesquisadoras baseado no conteúdo das perguntas do questionário e está disponível no link https://youtu.be/JdqbcQwPuWQ.

A quarta etapa, "Hipóteses de solução", consistiu na elaboração de alternativas viáveis para solucionar os problemas levantados na segunda etapa. Novamente, a discussão foi estimulada por uma pergunta central e a partir daí, a crítica e a originalidade foram estimuladas para se pensar em estratégias de ação, de forma que os participantes aprendessem com a realidade ao mesmo tempo em que se preparavam para transformá-la.

A quinta etapa do Arco de Charles Maguerez, "Aplicação à realidade", foi realizada para possibilitar a implementação das soluções elaboradas de acordo com o conhecimento construído ao longo do processo. A mesma encenação da primeira etapa foi recriada pelas pesquisadoras com o auxílio dos integrantes das UBSs, em que os voluntários simularam a própria atividade profissional para fornecer informações às mães, exercitando as formas de transformação da realidade.

Por fim, foi realizada a segunda aplicação do questionário nos mesmos parâmetros do anterior, a fim de se observar o impacto da capacitação. Após a aplicação, foram solucionadas e esclarecidas demais dúvidas que surgiram durante a intervenção.

Aspectos éticos

Foram disponibilizados Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para todos os participantes do projeto. Também foi esclarecido que todas as informações seriam mantidas em sigilo e analisadas puramente pelas acadêmicas integrantes do projeto. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG) com o número do parecer 3.383.191, datado do dia 11 de junho de 2019.

Análise Estatística

Os dados dos questionários foram transcritos para a planilha eletrônica e processados em software estatístico STATA versão 9.2. Foram produzidas tabelas de frequência absoluta e relativa do tipo linha por coluna. A relação entre variáveis qualitativas foi medida por teste de qui-quadrado de exato DY Fisher, conforme indicação. A existência de relação entre variáveis qualitativas e quantitativas foi medida por teste T, análise de variância, teste U de Mann-Whitney ou Kruskal-Wallis, conforme indicação. Foram consideradas estaticamente significativas as diferenças que produziram valor p < 0,05.

Após a análise dos questionários, o conhecimento foi avaliado conforme os acertos dos participantes, tendo as autoras definido previamente, de acordo com o artigo de Manoel A.L. e colaboradores, o percentual de 70% como um bom nível de conhecimento sobre o HPV, considerando as duas aplicações13.

 

3. RESULTADOS

A pesquisa contou com a participação de 73 indivíduos na primeira aplicação do questionário, sendo que não houve perdas em relação à segunda aplicação. A amostra foi, em sua maior parte, de participantes do sexo feminino (79,45%), solteiros (45,21%), com filhos (54,79%) e religiosos (80%). Os participantes se enquadravam entre 22 e 63 anos e eram em sua maioria menores de 34 anos (53,42%). Dentre os participantes, 63 eram ACSs, dois médicos, seis enfermeiros e dois técnicos de enfermagem.

A análise estatística das respostas dos participantes constatou que a intervenção teve impacto significativo. Esse desfecho foi avaliado através da comparação entre os acertos na primeira e na segunda aplicação do questionário, que obteve diferença significativa (p<0,0001), assim como a comparação das dúvidas entre as aplicações, que também indicou diferença significativa (p<0,0001) (Tabela 1). Dentre as variáveis sociodemográficas analisadas, estado civil, ter ou não filhos e religião não apresentaram diferença significativa (p>0,05), tanto em relação à diferença de acertos quanto em relação à diferença de dúvidas entre as aplicações do questionário. Já o quesito profissão apresentou diferença significativa, tanto em relação ao aumento de acertos (p=0,0085), quanto em relação à redução de dúvidas (p=0,0105).

 

 

Ademais, um segundo fator que constatou o impacto positivo da intervenção foi relacionado à meta de 70% de acertos, equivalente a 19,6 acertos. Esta foi definida previamente na metodologia como um nível satisfatório de conhecimento sobre HPV e foi superada por 53,42% dos participantes na primeira aplicação do questionário e por 97,26% na segunda aplicação. A grande maioria dos participantes (91,78%) acertou mais questões na segunda aplicação quando comparada à primeira, sendo que obtiveram de um a 20 acertos a mais. A mediana de acertos na primeira aplicação foi 20, e na segunda foi 25. Dentre os participantes, 76,08% obtiveram redução no número de dúvidas, sendo que a maioria (63,01%) solucionou entre uma e sete dúvidas (Tabela 1). A mediana de dúvidas na primeira aplicação foi quatro e na segunda foi zero.

As três seções do questionário foram avaliadas separadamente em relação aos acertos e às dúvidas. A terceira seção, que contém 16 questões e aborda os testes e exames para o HPV, foi a que obteve maior diferença de acertos entre a primeira e a segunda aplicação do questionário, o que corresponde a um acréscimo de 26,03 pontos percentuais. A segunda seção, composta por 6 perguntas sobre a vacinação para o vírus, obteve a menor diferença de acertos entre as aplicações, com acréscimo de 15,75 pontos percentuais. Já a primeira seção, com 6 perguntas acerca do conhecimento sobre HPV, obteve um acréscimo de 17,89 pontos percentuais (Tabela 2).

 

 

Na análise individual das perguntas do questionário, as questões 1n, 1o, 1p, 2b, 3c e 3e obtiveram uma grande diferença em relação aos acertos entre a primeira e a segunda aplicação do questionário, com aumento de pelo menos 27 acertos. Essas questões obtiveram um aumento de acertos maior que 100%, tendo a questão 1p um aumento de 675%. Três questões, sendo elas 1a, 1j e 3a, não obtiveram melhora no número de acertos (Tabela 3).

 

 

Em 14 questões, sendo elas 1b, 1d, 1e, 1f, 1g, 1h, 1j, 1l, 1o, 1p, 2c, 2g, 3a e 3f, foram resolvidas 100% das dúvidas. Em duas questões, 1a e 1c, não houve dúvidas na primeira aplicação do questionário e na questão 2a, não houve diferença no número de dúvidas entre as aplicações. A maioria das questões obteve diminuição de 77 a 100% das dúvidas, sendo que as questões 1n, 2b, 3c e 3e apresentaram maior redução de dúvidas (Tabela 3).

Foi avaliado o número de acertos por profissão em cada uma das seis questões que obteve maior diferença de acertos entre aplicações. Em todas as questões, os ACSs aumentaram seu desempenho em, no mínimo, 100% ao comparar as aplicações. Nas demais profissões, entretanto, o aumento não foi homogêneo em todas as questões analisadas. Entre os técnicos e médicos, a tendência foi de se manter o mesmo resultado da primeira aplicação, já que houve pouca alteração no número de acertos (Tabela 4).

 

 

4. DISCUSSÃO

No estudo em discussão, observamos que a intervenção realizada nas UBSs de um município de médio-porte em Minas Gerais produziu impacto significativo, tanto em relação ao aumento do número de acertos quanto em relação à redução do número de dúvidas no questionário aplicado após a intervenção. Diante disso, inferimos que houve uma repercussão positiva na aprendizagem e na capacitação dos profissionais que compõem as equipes de saúde básica das UBSs.

Visando a transmissão efetiva do conhecimento ao público alvo, a intervenção foi elaborada respeitando as características específicas do aprendizado dos adultos, denominado andragogia por Malcolm Knowles, que pressupõe a utilização de metodologias de ensino-aprendizagem que proponham desafios12,16. Com base nisso, selecionamos o método do Arco de Charles Maguerez, que tem como objetivo preparar o receptor para tomar consciência do seu mundo e atuar intencionalmente para transformá-lo, para embasar esse projeto17,18. Consideramos a aplicação desse método adequada devido ao aumento do número de acertos e à redução do número de dúvidas na segunda aplicação do questionário, que interpretamos como a resolução das dúvidas apontadas pelos participantes na primeira aplicação a partir das informações apresentadas no decorrer da intervenção, propiciando o acerto da resposta.

Uma das técnicas escolhidas para compor a etapa de teorização foi o recurso audiovisual, que visa proporcionar o aprendizado por um meio lúdico e estimular o pensamento criativo e o desenvolvimento intelectual do ouvinte, criando meios que facilitam a memorização, aprendizagem de conceitos e desenvolvimento de competências perceptivas e cognitivas. Essa estratégia foi considerada decisiva para o resultado impactante do projeto, uma vez que a visão e a audição são responsáveis por 70% da comunicação diária15.

Durante a análise dos resultados, um aspecto relevante foi a redução do número de dúvidas pelos profissionais das UBSs. Essa redução sugere que a capacitação proporcionou mais segurança para os participantes responderem às perguntas e se arriscarem mais, independente de acertar ou não. Associado a essa redução, o aumento do número de acertos sugere que os profissionais, a partir do embasamento oferecido, sentiram-se mais confiantes em apostar na resposta correta. Sendo assim, os profissionais têm mais preparo para se tornarem disseminadores de uma informação com conteúdo científico, o que é de extrema importância, já que os usuários do SUS tendem a recorrer a eles, principalmente aos ACSs, para sanar suas dúvidas e preocupações.

Ao analisarmos as três seções do questionário separadamente, observamos que a terceira seção, que aborda especificamente testes e exames para o HPV, foi a que apresentou menor percentual de acertos na primeira aplicação, mostrando uma provável falta de conhecimento prévio em relação ao tema apresentado, já que essas informações são mais comumente discutidas nas áreas de formação em saúde. Como a maior parte da nossa amostra era composta por ACSs e, sabendo que para exercer esse cargo não é necessária uma formação específica na área da saúde, pode-se explicar o menor percentual de acerto desses profissionais na primeira aplicação19. A segunda (vacinação para o HPV) e primeira (conhecimentos acerca do HPV) seções atingiram a meta de 70% de acertos, considerada satisfatória, provavelmente devido às campanhas de vacinação para o HPV, que promovem mais informação sobre a infecção pelo vírus e sobre os efeitos e condições para aplicação da vacina.

Identificamos que as mesmas questões que obtiveram as maiores diferenças entre o número de acertos entre as aplicações, também obtiveram os maiores números de erros e de dúvidas na primeira aplicação. Esses resultados reforçam a ideia de que afirmações mais específicas sobre o tema, principalmente epidemiologia da infecção e tratamento para o vírus, geraram maior dificuldade de resposta devido à provável falta de conhecimento do assunto. As questões que abordam os testes diagnósticos para o HPV mostraram que o tema, apesar de ser considerado específico, não é de grande complexidade, visto que foram as que obtiveram maior aumento percentual no número de acertos entre as duas aplicações.

A grande maioria dos participantes eram religiosos e, em geral, observa-se que ainda existem dificuldades na abordagem das infecções sexualmente transmissíveis, principalmente com a comunidade jovem, devido às mais diversas crenças em relação às práticas sexuais20. Assim, a conscientização sobre o tema é importante para oferecer embasamento científico para os profissionais de saúde, afastando ou pelo menos minimizando a transferência de possíveis informações equivocadas que podem interferir na conduta e acompanhamento no que diz respeito ao HPV.

Dentre os profissionais da equipe de saúde básica, a figura do ACS destaca-se como a de maior proximidade com a população. Como a maioria reside em sua área de atuação, possui conhecimento das peculiaridades e necessidades da região, permitindo que a comunidade se identifique com o profissional. Além disso, as visitas domiciliares proporcionam um ambiente menos formal de conversa para ambas as partes, sem a rigidez que muitas vezes ocorre na dinâmica médico-paciente. Tudo isso contribui para o estabelecimento de vínculos e a construção de uma relação de confiança com os pacientes que culmina em uma situação de maior conforto para conversar sobre sua realidade de vida e dificuldades21.

 

5. CONCLUSÃO

O estudo realizado produziu impacto estatisticamente significativo na capacitação dos profissionais de saúde das UBSs envolvidas em Barbacena, o que foi confirmado pelo aumento do número de acertos e pela redução do número de dúvidas na segunda aplicação do questionário. Diante dos resultados obtidos, enfatiza-se a relevância de prover e de viabilizar capacitações referentes ao HPV e sua vacinação aos profissionais atuantes em saúde básica, principalmente aos ACSs, já que possuem uma relação mais próxima com os usuários do sistema de saúde, possuindo grande influência nas decisões da população atendida.

A longo prazo, essa capacitação colabora para a desmistificação da infecção pelo HPV, de forma que a transmissão de conhecimento para a população melhore o entendimento das consequências e da gravidade da doença. Dessa forma, espera-se que ocorra um aumento da adesão à vacina e, então, a redução da prevalência da doença. Desejamos que esse trabalho possa inspirar futuras estratégias de capacitação nas equipes de saúde básica, dando continuidade ao trabalho iniciado com esse projeto.

 

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