RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 31 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.v31supl.10.04

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Artigo Original

Prevalência e susceptibilidade de bactérias isoladas em uroculturas de pacientes internados em hospital pediátrico público

Prevalence and antimicrobial susceptibility of uropathogens isolated from pediatric patientes

Valadares, PCP1; Dias, CS2; Romanelli RMC3; Bragança, JWF4; Rodrigues, LU5; Souza Lima, MC6; Carellos, EVM7

1. Paula Cristina Valadadares. MD. Especialista em Pediatria e Área de atuação em Infectologia Pediátrica. Hospital Infantil João Paulo II - in memorian
2. Cristiane dos Santos Dias.MD, PhD. Departamento de Pediatria - Faculdade de Medicina da UFMG. Belo Horizonte, Brazil - https://orcid.org/0000-0001-6559-3300
3. Roberta Maia de Castro Romanelli, MD, PhD. Departamento de Pediatria - Faculdade de Medicina da UFMG. Belo Horizonte, Brazil -https://orcid.org/0000-0002-1660-0751
4. John Wesley Fernandes Bragança Miranda. Enfermeiro, Especialista em Urgência e Emergência Pediátrica pelo Hospital Infantil João Paulo II. Faculdade Pitágoras. Belo Horizonte, MG - https://orcid.org/0000-0002-0180-8795
5. Letícia Ubaldo Rodrigues. MD, residente do 3° ano de Pediatria. Hospital Infantil João Paulo II - Minas Gerais. Brasil - https://orcid.org/0000-0003-3133-0988
6. Marina Cunha de Souza Lima. MD, residente do 3° ano de Pediatria. Hospital Infantil João Paulo II - Minas Gerais. Brasil - https://orcid.org/0000-0003-0224-700X
7. Ericka Viana Machado Carellos, MD, PhD. Departamento de Pediatria - Faculdade de Medicina da UFMG. Belo Horizonte, Brasil - https://orcid.org/0000-0002-3319-7597

Endereço para correspondência

Roberta Maia de Castro Romanelli
Instituição: Hospital Infantil João Paulo II
Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
Email: rmcromanelli@gmail.com

Resumo

O objetivo deste trabalho foi descrever o perfil de bactérias isoladas em uroculturas de crianças internadas com suspeita de infecção do trato urinário (ITU) em um hospital pediátrico público de referência no estado de Minas Gerais. Trata-se de um estudo transversal observacional, cujos dados foram coletados de 2007 a 2017. A população estudada foi composta por crianças com até 13 anos incompletos, que permaneceram internadas no Hospital Infantil João Paulo II (HIJPII) com suspeita de ITU. Foram analisados dados de 264 pacientes, sendo a maioria do sexo feminino e faixa etária menor que um ano. Foram isolados Bastonetes Gram Negativos fermentadores em 85,2% das amostras de urina. Os principais uropatógenos isolados foram Escherichia coli, Klebisiela pneumoniae e Pseudomonas aeruginosa. O perfil geral de sensibilidade a antimicrobianos isolados em uroculturas foi superior a 80%. Os antimicrobianos empíricos que se mostraram eficazes após revisão dos dados de suscetibilidade foram em ordem decrescente: aminoglicosídeos (96,9%), cefalosporina de 3ª geração (92,2%), quinolonas (92,0%) e carbapenêmicos (90,9%). Cefalosporinas de 1ª geração foram relacionadas a taxas menores de sucesso (78,2%).

Palavras-chave: Infecção do trato urinário, crianças, recém nascidos, infecções bacterianas, antibióticos, exame de urina, urocultura, resistência bacteriana.

 

INTRODUÇÃO

A infecção do trato urinário (ITU) é uma das principais causas bacterianas de febre sem sinais de localização em lactentes.1 Encontra-se na literatura, uma prevalência de até 7% em lactentes febris com ITU.2 Em estudos observacionais conduzidos no Reino Unido, ITUs são diagnosticadas em 11,3% das meninas e 3,6% dos meninos até os 16 anos de idade.3 Estima-se que até 3-7% das meninas e 1-2% dos meninos serão diagnosticadas com ITU até os 6 anos de idade e 12-30 % dessas crianças desenvolvem ITU recorrente.

ITU é causa de mais de um milhão de consultas ambulatoriais anuais, 500.000 visitas ao departamento de emergência e mais de 50.000 internações hospitalares nos Estados Unidos. É responsável também por altos gastos aos serviços de saúde e vários desdobramentos relacionados à investigação após o episódio infeccioso agudo.4

As crianças com pielonefrite são mais vulneráveis a desenvolver dano renal permanente formado a partir de necrose e fibrose decorrentes do processo inflamatório envolvido na infecção renal. As injúrias renais podem estar associadas ao desenvolvimento de hipertensão arterial, proteinúria e consequente doença renal crônica (DRC).5 Sendo assim, o diagnóstico precoce e o tratamento adequado são essenciais para evitar complicações em curto e longo prazo.

A infecção do trato urinário é definida por bacteriúria significativa de um uropatógeno clinicamente relevante em pacientes com quadro clínico sugestivo. O número de unidades formadoras de colônia (UFC) de um único uropatógeno por mililitro (mL) de urina que diferencia contaminação de infecção, conforme o método de coleta. Em amostras coletadas por jato médio e saco coletor, é considerada bacteriúria significativa o crescimento de mais de 100.000 UFC por mL de urina de um único patógeno, quando coletadas por sondagem vesical o valor é maior que 50.000 UFC por mL, e nas amostras obtidas por punção suprapúbica o crescimento de qualquer quantidade é considerado como sugestivo de bacteriúria significativa. O saco coletor é utilizado como método de triagem considerando seu alto valor preditivo negativo.6

Embora o padrão-ouro para o diagnóstico de ITU seja a urocultura quantitativa, o tratamento empírico é a regra na prática, baseado na alta suspeição clínica e na urinálise alterada. Essa conduta é justificada porque sabe-se que o atraso em iniciar a terapia aumenta a chance de dano renal permanente e doença renal crônica.7

São escassos na literatura dados referentes à prevalência da infecção do trato urinário na população brasileira pediátrica, assim como o perfil de suscetibilidade das bactérias envolvidas nesse tipo de infecção. O conhecimento dos agentes etiológicos da ITU e o perfil de sensibilidade antimicrobiana são fundamentais na escolha do antimicrobiano empírico inicial.8 Além disso, o aumento de patógenos resistentes dificulta a escolha da terapia empírica adequada. 6,9

Frente a tantas lacunas de conhecimento, este estudo busca contribuir para a identificação de uropatógenos mais prevalentes, perfil de sensibilidade antimicrobiana e fatores associados à resistência bacteriana entre agentes isolados em uroculturas de crianças internadas com suspeita de ITU em um hospital pediátrico público de referência do Estado de Minas Gerais, Brasil.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Trata-se de estudo transversal observacional que incluiu crianças internadas no Hospital Infantil João Paulo II (HIJPII), no período entre 2007 e 2017. O HIJPII pertence à Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG) e é considerado referência para todo o estado, sobretudo em doenças infecto contagiosas, e conta com equipe estruturada e protocolos bem definidos.

A população estudada foi composta por crianças com até 13 anos incompletos, internadas no hospital com quadro clínico sugestivo de ITU. Para análise, foram incluídas crianças com urocultura com crescimento superior a 100.000 UFC de um único uropatógeno, quando coletada em saco coletor, ou superior a 50.000 UFC em urina coletada por sondagem vesical. Em todos os casos havia suspeita clínica de ITU sem outro foco infeccioso determinado de forma clara, além de exames de rotina de urina estavam alterados.

Foram excluídos casos sem informações adequadas sobre a coleta da urina ou com suspeita de contaminação.

O HIJPII conta com uma Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) que mantém um registro atualizado de todas as culturas dos pacientes internados. Os pacientes foram identificados a partir desse registro e as informações referentes aos dados demográficos, clínicos e laboratoriais foram coletadas a partir da consulta aos prontuários eletrônicos dos pacientes.

A avaliação do antibiograma levou em consideração os limites estabelecidos pelo Clinical Laboratory Standards Institute (CLSI) para sensível, intermediário ou resistente para cada antimicrobiano padrão. A identificação bacteriana é realizada pelo sistema automatizado VITEK, na maioria das vezes. O teste de suscetibilidade antimicrobiana é realizado por difusão em disco pela técnica Kirby-Bauer.

O cálculo da amostra levou em consideração o nível de significância (α) de 5%, o poder do teste (1 - β) de 80%, e a diferença da taxa de resistência bacteriana em pacientes sem episódios prévios de ITU (21,6%) e com episódio prévio de ITU (37%), calculou-se em aproximadamente 300 o número de crianças com diagnóstico de ITU a ser estudado. 10, 11

Os dados foram analisados utilizando o pacote estatístico Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 16, que também foi utilizado para análise descritiva. As variáveis quantitativas foram expressas em médias e medianas com seus respectivos desvios padrões, amplitudes e quartis. As variáveis categóricas foram expressas em proporções. Para estabelecer a existência ou não de associação entre as variáveis categóricas foi utilizado o teste do Qui-quadrado e quando necessário o teste exato de Fisher. Para comparação das médias foi utilizado o teste t de Student, e para comparação das medianas, o teste de Mann-Whitney. Foram consideradas significantes as associações com valor de p ≤ 0,05. A medida para avaliar as possíveis associações entre a resistência antimicrobiana e as variáveis investigadas foi a razão de chances (Odds Ratio - OR), com intervalo de confiança (IC) de 95%.

O estudo foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa das instituições envolvidas.

 

RESULTADOS

Entre 2007 e 2017, foram registrados 264 pacientes internados por suspeita de ITU no HIJPII (Tabela 1). Em relação às características dos pacientes incluídos no estudo, havia registro de uso prévio de antimicrobianos em 41,3%, internação prévia em 32,6%, episódio prévio de ITU em 28,4%, e presença de malformações do trato genitourinário diagnosticadas previamente em 12,5%.

 

 

As doenças crônicas registradas foram doenças do sistema nervoso central isoladas (16,7%), genéticas isoladas (14,0%), hematológicas (6,8%), genética e geniturinário (4,2%), geniturinário isolado (2,7%), infecção de transmissão vertical (2,3%), sistema nervoso central e geniturinário (1,5%), respiratórias (0,8%) e cardíaca (0,4%).

O saco coletor foi utilizado para obtenção da amostra de urina em 60,6% casos. Na urinálise, as alterações sugestivas de infecção urinária foram nitrito positivo em 119 (45,1%) amostras, piúria em 262 (99,2%) e Gram de Gota com predominância de Bacilos Gram Negativos em 259 (98,1%) amostras.

A Escherichia coli foi isolada em 185 (70,1%) das 264 amostras de urocultura. Considerando as características das bactérias isoladas, foi observado crescimento de bacilos Gram-negativos (BGN) fermentadores em 90,5% das amostras de urina, bacilos Gram-negativos não fermentadores em 19 (7,2%), e Cocos Gram-positivos em 2,3%. Entre as bactérias Gram-negativas fermentadoras, 18 (7,5%) eram do grupo CESP (Citrobacter spp, Enterobacter spp, Serratia sp e Proteus spp produtoras de beta-lactamases), conforme mostrado na Tabela 2.

 

 

O perfil de sensibilidade dos principais uropatógenos identificados, estão descritos na Tabela 3. Foi observada 1,6% de taxa de resistência da Escherichia coli à amicacina, 6,5% à gentamicina, 7,5% à ceftriaxona e 20,5% à cefalosporina de primeira geração. A Klebsiella pneumoniae esteve associada à taxa de 100% de sensibilidade à amicacina, resistência de 8,3% à gentamicina, 13,9% à ceftriaxona e 16,7% à cefalosporina de primeira geração. A Pseudomonas aeruginosa, isolada em nove pacientes, mostrou taxas de 11,1% de resistência a amicacina e ciprofloxacino e 44,4% ao ceftazidime. Entre os quatro pacientes com amostras com crescimento de Pseudomonas resistentes ao ceftazidime, havia registro de uso prévio de antimicrobiano em 3 casos. O Enterococcus foi isolado em amostras de 5 pacientes, sendo que uma delas com resistência à ampicilina e dois à gentamicina.

 

 

A análise da adequação do tratamento empírico foi avaliada de acordo com o resultado final do antibiograma (Tabela 4). O tratamento empírico iniciado foi adequado em 83,7% dos casos, sendo que os aminoglicosídeos se mostraram adequados em 96,9%, às cefalosporinas de 3ª geração em 92,2%, às quinolonas em 92% e os carbapenêmicos em 90,9% dos tratamentos empíricos. As classes de antimicrobianos mais prescritos foram as cefalosporinas de 3ª geração (34,8%), cefalosporinas de 1ª geração (20,8%) e aminoglicosídeos (12,1%).

 

 

A análise de fatores de risco para resistência da Escherichia coli (tabela 5) aos aminoglicosídeos mostrou associação entre resistência à amicacina e internação prévia (p=0,015) e doença crônica associada (p=0,050). Além disso, houve significância estatística de resistência à gentamicina e ser usuário do programa de atenção domiciliar para pacientes com patologias crônicas (p=0,022) e internação prévia (p=0,013). A resistência à cefalosporina de 3ª geração foi associada ao uso prévio de antimicrobiano e doença de base. Os fatores de risco associados com resistência à cefalosporina de 1ª geração foram o uso prévio de antimicrobiano (p <0,001), internação prévia (p = 0,005) e doença de base (p = 0,001).

 

 

DISCUSSÃO

Diante da suspeita de ITU, a escolha da técnica de coleta da urina deve levar em consideração o grau de suspeição clínica, a gravidade do paciente, presença ou não de controle esfincteriano e experiência do coletor. Em crianças com controle esfincteriano, a coleta por jato médio urinário, após higienização, é o recomendado. Em lactentes e crianças ainda sem controle esfincteriano, devem-se considerar técnicas de coleta limpa, como sondagem vesical ou punção suprapúbica.12

Durante o período que o estudo abrangeu, não existia um protocolo local para diagnóstico e tratamento da ITU, e o método de coleta por saco coletor era adotado no hospital. Portanto, apesar das limitações citadas na literatura, encontramos um alto percentual de crianças com suspeita de infecção urinária que foram investigadas utilizando o método de coleta pelo saco coletor, cerca de 61% dos casos. Foram consideradas alteradas as uroculturas com crescimento igual ou superior a 105 UFC/mL de um único patógeno.

Obter amostras de urina pelo saco coletor é comum e não invasivo, porém com altas taxas de contaminação. Até 85% das amostras positivas obtidas por saco coletor representam resultados falso-positivos.13 Assim, recomenda-se uma nova coleta por sondagem vesical ou punção suprapúbica para realizar urocultura para esclarecimento diagnóstico.6

A população avaliada no presente estudo era composta, predominantemente, por lactentes menores de 2 anos (71,2%), sem histórico de alterações do trato genito urinário (87,5%). Em 51,9% dos casos, havia comorbidade crônica associada, sendo mais prevalentes as associadas ao sistema nervoso central e as síndromes genéticas.

Concordante com a literatura, a Eschechiria coli foi o principal agente etiológico identificado nas uroculturas, sendo responsável pelo primeiro episódio de ITU em 90% das meninas e 80% dos meninos.14,15

A escolha assertiva da terapia antimicrobiana empírica requer a avaliação de fatores como idade, gravidade da doença, presença de comorbidades, alterações urológicas subjacentes e os perfis de resistência antimicrobiana na comunidade.7

Nai-Chia et al16 observou um aumento da incidência de ITU em crianças causadas por bactérias multirresistentes produtoras de beta lactamase de espectro estendido (ESBL). Foram detectadas bactérias produtoras de ESBL em 104 (33,3%) de 312 uroculturas com E.coli isoladas. A proporção de E. coli ESBL causando ITU foi de 0,59% em 2002, 0,81% em 2003, 0,85% em 2004, 0,90% em 2005 e 0,96% em 2006. Assim, a escolha dos antibióticos adequados torna-se um desafio e pode atrasar a terapia adequada.17,18

No trabalho atual, a E. coli apresentou sensibilidade de 97,3% à amicacina e 93% à gentamicina. As taxas de sensibilidade a ceftriaxona e cefalotina foram menores, de 74,6% e 71,4%, respectivamente.

As taxas de sensibilidade dos demais uropatógenos foram similares às encontradas na literatura, sendo a K. pneumoniae com sensibilidade de 91,7% a 100% à aminoglicosídeos. A P. aeruginosa apresentou sensibilidade de 88,9% à amicacina e ao ciprofloxacino e o Enterococus de 80% à ampicilina.

Neste contexto, o estudo traz contribuição importante ao fornecer informações sobre o perfil de sensibilidade das bactérias e sobre os fatores de risco envolvidos na resistência bacteriana em pacientes internados com suspeita diagnóstica de ITU em um hospital terciário de grande porte, referência em internação pediátrica no Estado de Minas Gerais.

No estudo as amostras coletadas foram de conveniência. Destaca-se que no período em que este estudo foi realizado o Hospital Infantil João Paulo II não contemplava um protocolo de tratamento de infecção urinária, porém este protocolo já está em fase de elaboração.

Na amostra estudada, o tratamento empírico inicial foi eficaz em 83,7%. Quando há indicação de tratamento parenteral, os antimicrobianos empíricos comumente sugeridos na literatura são cefalosporinas de 3ª geração ou aminoglicosídeos. Já os esquemas orais preconizados são: penicilinas sintéticas + inibidor betalactâmico (amoxacilina-clavulanato), cefalosporina de 1ª geração (cefalexina) ou sulfonamidas (sulfametoxazol-trimetropim).19,2º

O trabalho atual identificou que essas seriam boas opções para o tratamento inicial, apresentando uma adequação de 96,9% em relação ao uso dos aminoglicosídeos, 92,2% na utilização de cefalosporinas de 3ª geração e 92% para quinolonas.

Entretanto, têm sido descritas altas taxas de resistência bacteriana às sulfonamidas, especialmente em pacientes muito jovens, com histórico de múltiplas internações hospitalares e terapia antimicrobiana anterior por mais de 4 semanas nos últimos 6 meses e outras classes de antimicrobianos devem ser consideradas para tratamento inicial.21,22

Observou-se alta prevalência de fatores possivelmente associados à resistência bacteriana, como internação prévia (32,6%), comorbidades (51,9%), e uso de antibióticos no momento do diagnóstico da ITU, ou nos últimos 3 meses (41,3%). Além de episódio prévio de ITU (28,4%) e presença de malformações do trato geniturinário (12,5%). Os principais fatores de risco para ITU na população pediátrica descritos na literatura são: sexo masculino em menores de um ano de idade, principalmente em não circuncisados, e no sexo feminino após os quatro anos, fatores genéticos e alterações obstrutivas urológicas que favorecem a formação de um meio de cultura para uropatógenos.11 A predominância do sexo feminino e uma prevalência maior dos casos em crianças abaixo de 2 anos, identificada neste trabalho, corrobora a literatura.

Embora o estudo seja retrospectivo, considera-se sua relevância devido à escassez de dados na literatura brasileira. Assim, como a ITU é uma das principais causas de atendimentos pediátricos, entender os uropatógenos mais comuns causadores de ITU nesta população, seus perfis de sensibilidade e resistência, para uma indicação assertiva da terapia antimicrobiana é essencial para evitar sequelas da ITU que podem afetar a qualidade de vida dessas crianças no futuro.

 

CONCLUSÃO

A E. coli foi indicada como principal patógeno associado a ITU durante a infância neste trabalho, corroborando os resultados encontrados em outros estudos.

A adequação do tratamento iniciado empiricamente, seguindo padrões de prescrição indicados em protocolos e artigos foi aproximadamente de 80% na amostra estudada. Houve sensibilidade satisfatória para os aminoglicosídeos, cefalosporinas de 3ª geração e quinolonas (ciprofloxacino) com adequação acima de 92%, podendo ser consideradas escolhas pertinentes para o tratamento empírico. Os dados não se apresentaram favoráveis à utilização das cefalosporinas de 1ª geração como escolha no tratamento inicial.

Deve-se considerar a maior possibilidade de resistência em pacientes com comorbidades, internação prolongada e uso de antibióticos prévios.

São necessários mais estudos em pacientes com ITU comprovada por método de coleta com baixo risco de contaminação para obter melhor entendimento do diagnóstico, do tratamento e da propedêutica adequados.

 

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