ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Lentes intraoculares e sensibilidade ao contraste: revisão literária
Bruno Grillo Monteiro1; Deborah Cristina da Silva Cardoso2; Senice Alvarenga Rodrigues Silva3; Lucas Martins Magalhães4
1. Especializando do terceiro ano em Oftalmologia - Instituto de Olhos Ciências Médicas de Minas Gerais
2. Especializanda do segundo ano em Oftalmologia - Instituto de olhos Ciências Médicas de Minas Gerais
3. Médica oftalmologista, preceptora do departamento de catarata do Instituto de Olhos Ciências Médicas de Minas Gerais
4. Especializando do terceiro ano em Oftalmologia - Instituto de olhos Ciências Médicas de Minas Gerais
Deborah Cristina da Silva Cardoso
Email: deborahcsilvac@gmail.com
Resumo
INTRODUÇÃO: A cirurgia de catarata evoluiu nos últimos anos por meio de novas técnicas cirúrgicas e lentes intraoculares com diferentes tecnologias, na busca de alcançar a melhor acuidade e qualidade visual. A sensibilidade ao contraste é uma métrica de qualidade visual definida pela detecção de gradientes de luminância. Dentre as opções de lentes intraoculares disponíveis encontram-se as lentes monofocais, bifocais, trifocais, multifocais, asféricas, esféricas, lentes de foco estendido e acomodativas. Apesar de apresentarem tecnologias diferentes, as lentes intraoculares têm o desafio de manter a sensibilidade ao contraste semelhante aos padrões aceitáveis e o desafio de induzir o mínimo de aberrações ópticas possíveis.
OBJETIVO: apresentar revisão narrativa de literatura a respeito de lentes intraoculares e sensibilidade ao contraste.
METODOLOGIA: busca de artigos indexados nas bases de dados PubMed, Scielo e Lilacs a partir dos descritores: lentes intraoculares e sensibilidade ao contraste e seus correlatos em inglês.
DISCUSSÃO: A sensibilidade ao contraste é um dos parâmetros que devem ser avaliados na busca por uma boa qualidade visual. Diante das inúmeras opções de lentes intraoculares a serem implantadas e do nível de exigência visual e funcional dos pacientes, destaca se a importância da escolha adequada. A comparação entre os múltiplos tipos de lentes é dificultada pela falta de padronização dos métodos de quantificação da sensibilidade ao contraste e outras variáveis confundidoras.
CONCLUSÃO: A falta de reprodutibilidade dos testes dificulta a comparação entre as lentes intraoculares, visto que os métodos empregados para avaliação da sensibilidade ao contraste se diferenciam entre os estudos.
Palavras-chave: Lente intraocular. Sensibilidade ao contraste. Pseudofacia. Catarata.
INTRODUÇÃO
A catarata é a principal causa de cegueira reversível no mundo e estima-se que no Brasil são realizadas mais de 90 mil cirurgias de facoemulsificação para restabelecer a visão destes pacientes.1 A cirurgia de catarata evoluiu nos últimos anos por meio de novas técnicas cirúrgicas e diversas opções de lentes intraoculares (LIOs) com diferentes tecnologias estão disponíveis. A evolução das LIOs, sobretudo as multifocais, têm o desafio de proporcionar a melhor acuidade visual, manter a sensibilidade ao contraste semelhante aos padrões aceitáveis e o desafio de induzir o mínimo de aberrações ópticas.5 Após implante de determinadas LIOs, estudos demonstraram perda de sensibilidade ao contraste e de visão funcional, associada ao aparecimento de fenômenos ópticos, tais como glare e halos.5 Esta perda de sensibilidade ao contraste e fenômenos disfotópicos são primordiais e impactantes na satisfação do paciente.2 Dentre as inúmeras opções de LIOs encontram-se as lentes monofocais, bifocais, trifocais, multifocais, asféricas, esféricas, lentes de foco estendido e acomodativas.
OBJETIVO
Apresentar revisão narrativa de literatura a respeito de lentes intraoculares e sensibilidade ao contraste.
METODOLOGIA
Realizada busca de artigos indexados nas bases de dados PubMed, Scielo, Lilacs a partir dos descritores: lentes intraoculares e sensibilidade ao contraste e seus correlatos em inglês. Foram encontrados 94 artigos com publicação entre os anos de 2003 e 2021 e selecionados 15 artigos. Foram excluídos os artigos disponibilizados apenas na forma de resumo, com metodologias inconclusivas e publicados em periódicos de baixo teor de impacto.
DISCUSSÃO
A acuidade visual (AV) é uma das medidas objetivas de avaliação da função visual no pós operatório imediato e tardio das cirurgias de catarata. No entanto, outros parâmetros devem ser avaliados no que se refere à qualidade e funcionalidade visual. A sensibilidade ao contraste (SC) é um dos parâmetros que devem ser avaliados neste contexto, sendo que a detecção de gradientes de luminância, estabelece uma base fundamental do processamento da visão e consiste na habilidade de distinguir os detalhes das imagens dependendo da luminosidade ambiente. Nos tempos atuais, diante das inúmeras opções de lentes intraoculares a serem implantadas e do nível de exigência visual e funcional dos pacientes, destaca-se a importância da escolha adequada e da satisfação visual pós-operatória.
De acordo com a literatura, os fatores determinantes - além da escolha do tipo da lente intraocular (LIO), para uma visão estereoscópica satisfatória e com boa sensibilidade ao contraste são: idade, diferença entre os olhos na acuidade visual, equivalente esférico, astigmatismo, comprimento axial, aniseiconia, descentração da LIO e diâmetro pupilar. 3
Na revisão bibliográfica realizada, foram encontrados estudos que realizam a comparação entre LIOs multifocais asféricas e cristalino transparente, entre LIOs asféricas e esféricas, entre as multifocais, entre bifocais e trifocais, entre as monofocais e multifocais, assim como as LIOs de foco estendido e acomodativas. Entretanto, a comparação entre os estudos é dificultada pela falta de padronização dos métodos de quantificação da SC e outras variáveis como idade dos pacientes e afecções oculares prévias.
Dentre os estudos encontrados, Alfonso JF comparou o diâmetro pupilar e a sensibilidade ao contraste após implantação de LIOs difrativas e concluiu que pupilas com maior diâmetro apresentaram melhor sensibilidade ao contraste em todas as frequências espaciais em ambientes claros e mais escuros, independente da LIO estudada.9
Já Ferrer-Blasco T et al comparou a sensibilidade ao contraste sob três condições de luminância diferentes, para longe e perto, sob condições mesópicas e fotópicas antes e depois de cirurgia de cristalino transparente com implante de LIO multifocal asférica difrativa AcrySof ®ReSTOR ® (modelo SN6AD3) e não encontrou diferença significativa da SC em nenhuma das condições analisadas.9 Em consonância Timo Eppig et al observou que olhos com LIOs asféricas podem atingir SC semelhantes a cristalinos jovens e que pacientes pseudofácicos apresentaram melhor SC quando comparados a pacientes fácicos do grupo controle. 7
Outro trabalho realizado por Espíndola, foi comparado a LIO asférica (Akreos AO) a LIO esférica (Akreos Fit), considerando que o implante de uma LIO esférica pode aumentar a aberração esférica positiva do olho e, subsequentemente, degradar a qualidade visual. A sensibilidade ao contraste foi medida usando o VCTS 6000 (Vistech Consultants Inc, Dayton, Ohio, EUA) com a melhor correção sob condições fotópicas e mesópicas. Foi demonstrado que a lente asférica reduziu significativamente a quantidade de aberrações de alta ordem e aberrações esféricas, melhorando a sensibilidade ao contraste em condições mesópicas. 4, 8, 15.
Em relação às lentes monofocais e multifocais, Oliveira et al, revelou desempenho superior da LIO multifocal na detecção da SC mesmo sem o emprego de qualquer outra correção óptica adicional. No entanto, no estudo de Hida et al 6, foi realizada comparação da performance visual entre essas LIOs e após a análise, concluiu-se que as LIOs multifocais propiciaram acuidade visual comparável às lentes monofocais para visão de longe e melhor visão de perto sem correção.6 As lentes asféricas apresentaram menor indução de aberração esférica e melhor visão em condições fotópicas, quando comparadas às esféricas. Na sensibilidade ao contraste em condições mesópicas, a monofocal asférica (SN60WF) foi superior a todas as lentes. Todas as lentes apresentaram menor indução de aberração esférica, coma, alta ordem e total quando comparadas à lente monofocal esférica (SN60AT). 10
Os resultados de Demirci Y et al comparou a SC da LIO multifocal com a monofocal em 60 olhos sob condições mesópicas e fotópicas e corroboraram os resultados encontrados por Hida et al em que a LIO monofocal apresentou melhor SC em comparação com a multifocal.14 Da mesma forma, a revisão sistemática e metanálise de Cao K e colaboradores comparou a acuidade visual, sensibilidade ao contraste e efeitos adversos a partir de 21 ensaios clínicos randomizados e concluiu que as lentes multifocais apresentaram melhor acuidade visual corrigida e não corrigida intermediária e para perto. No entanto, apresentaram mais halos, glare e menor sensibilidade ao contraste.12,13 Em contrapartida, outra investigação científica comparando lentes multifocais e monofocais foi realizado por Akaishi et al, em que foi avaliada a curva de sensibilidade ao contraste em cada um dos grupos e não foi observada diferença estatisticamente significativa entre os grupos comparados. Na meta análise de Yang JJ et al foram comparadas a acuidade visual, a sensibilidade ao contraste e a qualidade subjetiva da visão entre as LIOs trifocal e bifocal. Concluiu-se que não houveram diferenças entre a sensibilidade ao contraste. 9
Tratando-se das LIOS de foco estendido, Spadea L analisou em estudo prospectivo a AV e SC em 40 olhos de 20 pacientes que foram submetidos a facoemulsificação e implante de LIOs EDOF bilateralmente. Concluiu-se que esse tipo de LIO provê visão para longe, intermediária, para perto satisfatórias, e mantém boa SC, com a maioria dos pacientes reportando satisfação excelente.
Por fim, na revisão sistemática e metanálise de Zhou H et al não houve diferença significativa na visão corrigida para longe e SC comparando-se LIOS acomodativas e monofocais. 11
CONCLUSÃO
Com base nos estudos apresentados, observa-se que a qualidade visual almejada possui elevada relevância no momento da escolha da lente intraocular a ser implantada. Destaca-se que qualidade óptica é tão importante quanto a medida da acuidade visual ao se analisar a performance de qualquer LIO.
Apesar de diversos trabalhos apontarem para uma redução da SC em LIOs multifocais em comparação a LIOs monofocais, existem estudos que demonstram não haver diferença estatística.
No entanto, a falta de reprodutibilidade dificulta a comparação entre os estudos, visto que os métodos empregados para avaliação da sensibilidade ao contraste se diferenciam entre eles. Acrescenta-se a isso, os fatores confundidores - astigmatismo; diâmetro pupilar; comprimento axial; aniseiconia - os quais dificultam a comparação dos diversos tipos de LIOs. Portanto a escolha da lente deve ser realizada de forma individualizada para se alcançar o melhor resultado.
REFERÊNCIAS
1. Akaishi L, Araujo AGR, Santos RCN, Santos PM. Acuidade visual em implantes bilaterais de lentes intra-oculares monofocais e multifocais. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia. 2003;66(2).
2. Sieburth R, Chen M. Intraocular lens correction of presbyopia. Taiwan J Ophthalmol. 2019;9(1):4-17.
3. Oliveira F, Muccioli C, Silva LMP, Soriano ES, Souza CEB, Belfort Jr R. Avaliação da sensibilidade ao contraste e da estereopsia em pacientes com lente intra-ocular multifocal. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia. 2005; 68(4):439-443.
4. Espíndola RF, Santhiago MR, Monteiro MLR, Kara-Junior N. Influence of aspheric intraocular lens on frequency doubling technology and contrast sensitivity: a fellow eye study. Arquivos Brasileiros de Oftalmologia. 2014;77(6):373-6.
5. Hida WT, Yamane IS, Motta AFP, Silva MT, Alves E, José Junior NK, et al. Comparação da análise da frente de onda e da sensibilidade ao contraste em olhos pseudofácicos com implante de lentes intra-oculares esférica e asférica. Revista Brasileira de Oftalmologia. 2008;67(3).
6. Hida WT, Nakano CT, Yamane IS, Motta AFP, Tzeliks PF, Alencar LM, et al. Desempenho visual dos pacientes pseudofácicos com diferentes lentes intraoculares. Revista Brasileira de Oftalmologia. 2013; 72(5):287-93.
7. Nakano CT, Avakian A. Comparison between OPD-scan results and contrast sensitivity of three intraocular lenses: spheric AcrySof SN60AT, aspheric AcrySof SN60WF and multifocal AcrySof Restor lens. Revista Brasileira de Oftalmologia. 2009;68(4).
8. Yang JJ, Liu QP, Li JM, Qin L. Comparison of visual outcomes with implantation of trifocal versus bifocal intraocular lens after phacoemulsification: a Meta-analysis. Int J Ophthalmol. 2018; 11(3):484-492.
9. Alfonso JF, Fernández-Vega L, Baamonde MB, Montés-Micó R. Correlation of pupil size with visual acuity and contrast sensitivity after implantation of an apodized diffractive intraocular lens. J Cataract Refract Surg. 2007 Mar;33(3):430-8.
10. Ferrer-Blasco T, García-Lázaro S, Albarrán-Diego C, Pérez-Vives C, Montés-Micó R. Contrast sensitivity after refractive lens exchange with a multifocal diffractive aspheric intraocular lens. Arq Bras Oftalmol. 2013 Mar-Apr;76(2):63-8.
11. Zhou H, Zhu C, Xu W, Zhou F. The efficacy of accommodative versus monofocal intraocular lenses for cataract patients: A systematic review and meta-analysis. Medicine. 2018 Oct;97(40): e12693.
12. Cao K, Friedman DS, Jin S, Yusufu M, Zhang J, Wang J, et al. Multifocal versus monofocal intraocular lenses for age-related cataract patients: a system review and meta-analysis based on randomized controlled trials. Surv Ophthalmol. 2019 Sep-Oct;64(5):647-658.
13. Demirci Y, Toker MI, Bozali E, Ozec AV, Cetin Bahadir, Dursun A, et al. Comparison of visual functions and contrast sensitivities between monoblock hydrophobic acryrlic monofocal and monoblock hydrophobic acryrlic multifocal intraocular lenses. Adv Ophthalmol Vis Syst. 2019;9(3):85-90.
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15. Spadea L, Giannico ML, Formisano M, Alisi L. "Visual Performances of a New Extended Depth-of-Focus Intraocular Lens with a Refractive Design: A Prospective Study After Bilateral Implantation." Ther clin risk manag. 2021 Jul 16; 17: 727-738.
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