RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 32 e-32108 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.2022e32108

Voltar ao Sumário

Artigo Original

Análise do perfil e fluxo de atendimento de crianças vítimas de violência sexual em um serviço de referência

Profile and follow-up analysis of sexual abused children in a reference service

Isabela Resende Silva Scherrer1*; Débora Mattoso Lemos Lopes2; Marcela Campos dos Reis2

1. Universidade Federal de Minas Gerais - Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
2. Hospital Odilon Behrens - Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil

Recebido em: 05 Outubro 2020
Aprovado em: 29 Março 2022
Data de Publicação: 01 Junho 2022

Fontes Apoiadoras: O presente trabalho recebeu financiamento da Associação de Apoio a Residência Médica de Minas Gerais (AREMG), através do concurso para incentivo financeiro para desenvolvimento de trabalho de conclusão em programa de residência médica (TCPRM) de 2018, projeto número 16 - Minas Gerais, Brasil.

Conflito de Interesse: Não há

Editor Associado Responsável:

Ana Paula Pinheiro Chagas Fernandes
Faculdade de Ciências Médica de Minas Gerais
Belo Horizonte/MG, Brasil

Resumo

OBJETIVOS: Levantar dados sobre o perfil do agressor e da vítima de abuso sexual na infância atendida no pronto-socorro e ambulatório de violência sexual. O estudo visa também avaliar a efetividade do fluxo de encaminhamentos que possibilitam a longitudinalidade do cuidado.
MÉTODOS: Trata-se de estudo transversal retrospectivo, em hospital de referência no atendimento a esses pacientes na cidade estudada, no qual foram avaliados 121 prontuários de possíveis vítimas menores de 13 anos em 2018. Foram coletados dados do perfil da vítima e agressor, além de informações sobre encaminhamentos e frequência nas consultas de seguimento.
RESULTADOS: Foi realizada uma análise descritiva dos dados, nos quais entre os resultados encontrados destacam-se a predominância do gênero masculino entre os agressores e feminino entre as vítimas. A prevalência do gênero da vítima e do agressor foram semelhantes a outros estudos. A maioria dos abusos aconteceram em residência, o agressor era conhecido. Dentre as 121 crianças atendidas no pronto socorro, 90 foram encaminhadas ao ambulatório e apenas 33 compareceram à consulta. Notou-se uma falha no encaminhamento do paciente acolhido no pronto atendimento ao ambulatório, comprometendo o seguimento longitudinal. Houve uma dificuldade na coleta dos dados devido à inexistência de um prontuário eletrônico único.
CONCLUSÃO: O perfil da vítima e do agressor nesse estudo foram similares a outros estudos publicados anteriormente sobre violência sexual. Foi percebida uma falha comunicativa entre os atendimentos em que a criança abusada permeia, com uma importante descontinuação do acompanhamento após agressão.

Palavras-chave: Violência Sexual Infantil; Violência Sexual na Adolescência; Abuso Sexual Infantil; Abuso Sexual na Adolescência; Vítima de Violência Sexual; Ambulatório de Atendimento de Violência Sexual; Pediatria.

 

INTRODUÇÃO

Os abusos sexuais constituem importante fenômeno mórbido que vitimiza crianças e adolescentes. Define-se como todo ato sexual com intenção de estimular sexualmente o menor, visando utilizá-lo para obter satisfação sexual, em que os autores da violência estão em estágio de desenvolvimento psicossexual mais adiantado que a vítima1-6. É uma violência principalmente doméstica e é comum que os agressores sejam pessoas do convívio da vítima, como padrasto, pai biológico e outros que estabelecem uma relação de afeto, dependência ou confiança1,4,5,7-9. A maioria dos estudos concluiu que a violência sexual contra meninas é 1,5 a 3 vezes mais prevalente que a dos meninos1,5,7,10-13.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) é um desafio estabelecer verdadeiras taxas de incidência e até estimativas de abuso sexual infantil devido a problemas de subnotificação2: raramente é relatado no momento em que ocorre e, em muitos casos, nunca é relatado. Existem também dificuldades para se firmar o diagnóstico em menores, que frequentemente estão à mercê do agressor e dependem dele física e psiquicamente2,3,7,9,14,15. Além disso, muitos países não dispõem de um sistema confiável de denúncia de abuso sexual infantil. No Brasil, de acordo com dados sobre violência sexual da Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte, em 2015 foram notificados 511 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. Representam assim, uma prevalência de 1% de crianças e adolescentes da capital, considerando os dados do IBGE de 2010, em que a população de crianças e adolescentes até 19 anos equivale a 690.049 habitantes8.

O abuso sexual na infância tem impacto direto no desenvolvimento psíquico e nas relações interpessoais da vítima3,5,16,17. A exposição precoce a uma agressão sexual pode gerar uma alteração bioquímica permanente na vítima e pode culminar em danos futuros pessoais, além de ocasionar repercussões econômicas e sociais17-19. A fim de auxiliar a vítima, deve-se oferecer acolhimento multidisciplinar, com amparo psicológico e médico, realizar anamnese completa e exame físico minucioso, ambos bem descritos em prontuário, que será principal fonte de consulta de atendimentos futuros para evitar a revitimização8,9,20,21.

Com o intuito estabelecer uma assistência continuada, o hospital estudado, serviço de referência ao atendimento às vítimas de violência sexual (VVS), busca oferecer cuidado multidisciplinar em pronto atendimento e ambulatório vítimas de violência sexual, além de vincular o paciente ao centro de saúde à alta tentando garantir assistência continuada ao caso. O presente estudo objetiva analisar o perfil do agressor e do menor vítima de violência sexual nesses setores e avaliar a efetividade do fluxo de encaminhamentos que possibilitam longitudinalidade do cuidado.

 

MÉTODOS

Trata-se de estudo transversal retrospectivo para levantamento de dados e avaliação do fluxo e da adesão do atendimento em um hospital público, de ensino e de grande porte, plenamente inserido no Sistema Único de Saúde (SUS) e com participação ativa no atendimento do paciente pediátrico vítimas de violência sexual, sendo uma das principais referências da região metropolitana de Belo Horizonte. O serviço possui um ambulatório de violência sexual, que visa dar seguimento às VVS, com atendimento multidisciplinar, para a posterior transferência de cuidado ao centro de saúde. É pertinente destacar a vulnerabilidade social em que se encontra grande parte da população atendida neste hospital, já que sua localização é próxima a mais antiga comunidade de Belo Horizonte.

Foram incluídas no estudo os prontuários de crianças e adolescentes, de até 12 anos 11 meses e 29 dias, atendidos no pronto atendimento e ambulatório de VVS do serviço entre janeiro e dezembro de 2018. Para os fins deste estudo, foi considerado como violência sexual qualquer ato ou tentativa de obter atividade de cunho sexual sem consentimento, havendo ou não penetração, englobando o uso de coerção, violência física e ameaças de qualquer tipo para obter proveito sexual3. Apenas foram incluídos no estudo casos em que houve contato físico não consensual entre a agressor e a vítima, abrangendo carícias, tentativa de estupro e estupro.

Para análise de dados foram levantados os pacientes notificados através das fichas de notificação compulsória como VVS do hospital, nas datas pré-estabelecidas. Obteve-se o acesso ao prontuário eletrônico das vítimas através do Alert (sistema adotado no pronto socorro) e Gestão (sistema da prefeitura de Belo Horizonte utilizado no ambulatório de VVS e centros de saúde). Ressalta-se o fato de que as informações obtidas foram inseridas em uma plataforma de análise de dados que confere o total anonimato aos pacientes e que o trabalho foi aprovado pelo comitê de ética e pesquisa do hospital estudado.

Os critérios de exclusão para fins desse estudo foram prontuários que não mencionaram violência sexual como uma hipótese diagnóstica, vítimas cuja idade extrapola a faixa etária pré-estabelecida, vítimas apenas de violência sem cunho sexual, datas que extrapolaram o período de análise predeterminado, duplicação da notificação e abuso descartado.

Obteve-se o cálculo amostral em que foi fixado uma margem de erro de 5% com aproximadamente 100 prontuários com o objetivo de obter um p=0,07%. A amostra do presente estudo foi de 121 prontuários, representando, portanto, uma amostra de conveniência.

Foram coletados dados do perfil da vítima e agressor (idade e sexo), a relação entre eles e local de maior ocorrência, como a violência foi descoberta. Além disso, foram avaliadas informações sobre o atendimento no pronto-socorro, ambulatório e centro de saúde através da frequência dos pacientes nas consultas nesses setores e encaminhamentos.

Os dados obtidos foram armazenados em planilhas do software Microsoft Excel® 2010. Para fins de análise descritiva, foi feita distribuição de frequência das variáveis categóricas envolvidas no estudo. A análise estatística foi realizada por serviço terciário de estatística, a qual fez uso do programa IBM SPSS versão 25.

 

RESULTADOS

No período entre janeiro e dezembro de 2018, foram identificados 397 casos de suspeitas de vítimas de violência doméstica, sexual e/ou outras violências interpessoais. Entre esses casos, 135 prontuários adequaram-se em relação à faixa etária pesquisada, sendo que desses 14 prontuários foram excluídos. Assim, foram analisados 121 prontuários de paciente com suspeita de violência sexual até 13 anos incompletos no período pré-estabelecido, que equivalem a um N estatisticamente relevante.

Sobre as frequências gerais, em 81,8% dos casos o potencial agressor é conhecido. Dentre os dados coletados, em apenas 33,9% a idade do agressor foi constatada em prontuário. Deste modo, entre os dados registrados, resultou-se uma média de idade de 16 anos, com desvio padrão de 18 anos, sendo que a faixa etária variou entre 11 e 70 anos. Apesar da disparidade das idades, destaca-se homens adolescentes, mas deve ser salientado que a idade só foi constatada em 31 prontuários. Em contrapartida, em todos os prontuários a idade do paciente estava presente, ocasionando em uma idade média das vítimas de 6 anos, com desvio padrão de 3 anos.

Os Gráficos 1 e 2 demonstram uma comparação em relação ao gênero das vítimas e agressores. Dentre as 121 vítimas, 89 eram do sexo feminino, o que equivale a 73,6%, enquanto apenas 32 vítimas eram do sexo masculino, correspondendo a 26,4% do total. Houve, portanto, uma variação de 1 vítima do sexo feminino para cada 2,78 do sexo masculino até os 13 anos incompletos. Considerando que em 3 casos existiam dois agressores, o total de possíveis agressores foi de 124. O gênero do possível agressor não era conhecido apenas em 13,1% dos casos, sendo o mais prevalente o agressor do sexo masculino correspondendo a 85,3%, contra apenas 1,6% do sexo feminino.

 


Gráfico 1. Gênero prevalente do suspeito da agressão.

 

 


Gráfico 2. Gênero prevalente da potencial vítima.

 

Em relação ao grau de parentesco do agressor com a vítima (Tabela 1), o mais prevalente foi o pai, em 17,7% dos casos, seguido de vizinho, 12,1%. Os namorados das mães corresponderam a 4,8% e os padrastos foram responsáveis por 6,5% dos casos.

 

 

Quando avaliado o local de maior ocorrência dos abusos, o mais prevalente foi a residência, correspondendo a 73,6%, seguidos de 9,9% em que a família e/ou vítima não sabiam informar o local da agressão. A escola correspondeu a 5%, via pública 3,3% e a creche 0,8%. Em 51,2% dos casos havia relatos em prontuário do abusador ser uma pessoa que habitava na mesma casa da vítima e tinha contato frequente com a vítima.

Outro dado levantado foi de como a agressão foi descoberta: em 75,2% dos casos a própria vítima, seja ela criança ou adolescente, que contou sobre a agressão. Em 16,5% o paciente foi levado ao pronto atendimento por suspeita do acompanhante e em 5,8% dos casos a violência foi presenciada por um familiar.

Sobre o atendimento no hospital estudado (Gráfico 3), do total de 121 pacientes com suspeita de abuso sexual, 90 deles (74,4%) foram encaminhados para o ambulatório de VVS. Desses pacientes, apenas 33 (36,7%) compareceram a pelo menos uma consulta no ambulatório de seguimento do hospital de referência; 35 (38,9%) tinham cadastro no Gestão ou acompanhavam no centro de saúde e 23 (24,4%) não foram encontrados nenhum registro no Gestão. Entre os pacientes que acompanharam no ambulatório de VVS, apenas 4 crianças (12,1%) descontinuaram o acompanhamento. O número médio de consultas no ambulatório com médico e/ou equipe multidisciplinar foi de 1 e o máximo de consultas foram 6.

 


Gráfico 3. Fluxo de pacientes suspeitos de VVS entre PA, ambulatório de VVS e centro de saúde.

 

DISCUSSÃO

Belo Horizonte é uma das maiores capitais do Brasil, no entanto, poucos são os dados sobre violência sexual na infância, o que reforça a relevância desse estudo. Assim como já foi apontado em outros estudos, nacionais e internacionais, a verdadeira prevalência é um dado de difícil alcance, já que é um agravo subnotificado3.

Apesar da grande prevalência da própria vítima ter se manifestado sobre o abuso nesse estudo, essa frequência não se repete em outros estudos, o que denuncia a culpabilização de uma vítima sem estrutura psicológica para denúncia e encontra-se detida num pacto de silêncio com o abusador. Algo que dificulta ainda mais o estabelecimento do número de casos é a baixa confiabilidade dada a palavra da criança associado a um exame médico legal frequentemente sem alterações1,5. Destaca-se assim a necessidade de educar a criança sobre o contato físico inapropriado e a quem ela pode confiar essas informações, uma vez que se aumentam as chances de denúncia pela criança vitimada, como já demonstrada em revisão sistemática da Cochrane22,23.

Houve predominância do sexo feminino como vítima de violência sexual, independente da faixa etária, o que se repete em diversos estudos mundiais, sendo um reflexo da sociedade patriarcal1,5,12-15. Outro dado que retrata essa realidade social é sobre o gênero do agressor. No presente estudo, a maioria eram homens, o que pactua com estudos anteriores e reforça a discussão da influência do gênero. Essa prevalência de agressores do sexo masculino reproduz o contexto social atual, ainda mais prevalente em populações com grande vulnerabilidade social, em que há subjugação masculina sobre o sexo feminino1,5,24.

O presente estudo constatou como agressor suspeito mais frequente o pai, o que diverge um pouco dos demais estudos, em que a maior prevalência tende a ser do padrasto. Isso pode ter acontecido por ter sido considerado como padrasto apenas aquele que tinha união conjugal com a mãe. Em contrapartida, apenas duas mulheres foram consideradas agressoras, uma delas era namorada do pai e outra a mãe, que juntamente ao namorado abusavam do filho. Novamente esse dado levanta a discussão acerca do predomínio do sexo masculino como o agressor e o feminino como agredido1,25.

Outro dado que se destacou foi a média de idade das vítimas, semelhante a literatura internacional, como descrito em estudo na Venezuela que a cada 100 pacientes vítimas de violência sexual, 20 são crianças abaixo de 6 anos11. Acerca da faixa etária predominante do potencial agressor ser adolescentes, uma possibilidade para esse resultado seria a ciência da identidade do agressor por ter algum tipo de contato frequente com a criança, seja por ser um familiar (irmão, primo), vizinho ou amigo da escola. Outra possibilidade seria que uma parte desses agressores possivelmente foi também vítima, mas essa relação não pode ser concluída a partir do presente estudo17-19.

A respeito do atendimento à vítima com suspeita de violência sexual do serviço estudado, existe uma falha no encaminhamento do paciente atendido no pronto atendimento ao ambulatório, uma vez que 25,6% não foram encaminhados ou não foram encontrados dados sobre o encaminhamento em prontuário. Além disso, existe uma lacuna muito grande entre os pacientes que efetivamente vão às consultas, já que apenas 36,7% comparecem a pelo menos uma consulta.

Estudos mostram que pessoas que não apresentam um acompanhamento adequado tem piores desfechos, o que reforça a necessidade de oferecer a essas crianças um cuidado longitudinal20,25,26. Uma possibilidade de melhoria seria através do treinamento dos profissionais do pronto atendimento e divulgação do ambulatório com fluxogramas simples expostos dentro das salas de atendimento do pronto socorro.

Outro fator que pode interferir nesse fluxo do primeiro atendimento é ausência da notificação compulsória, encaminhamentos, prescrição e receita por via eletrônica. Esse trabalho manual excessivo e sem uma ordem clara pode ser um fator importante que contribui para a descontinuidade desse fluxo. O sistema do pronto atendimento não é vinculado com o restante do hospital, pacientes internados não têm um prontuário eletrônico e pacientes que fazem acompanhamento ambulatorial no hospital tem um outro prontuário, o Gestão, que é o mesmo utilizado nos pelos centros de saúde.

A ausência de um sistema único entre os hospitais públicos de Belo Horizonte e os postos de saúde também interferem negativamente nesse cuidado continuado27. Por não haver uma comunicação eletrônica direta entre essas instituições, a informação sobre o abuso muitas vezes se perde. Assim, com um fluxo organizado de primeiro atendimento, associado a uma equipe bem treinada e um sistema automatizado, seriam minimizados os casos sem suporte após o abuso. O cuidado ideal para esses pacientes seria através da aproximação dos três pontos de atendimento: o pronto-socorro, o ambulatório de violência sexual e o centro de saúde.

A respeito do atendimento do ambulatório de violência sexual, o baixo número de consultas não configura como um ponto negativo para o acompanhamento, já que ele não se caracteriza como um cuidado permanente, propõem-se apenas a ser uma ponte entre o pronto-socorro e o centro de saúde. Sobre os dados que foram passíveis de serem coletados, observou-se que entre os pacientes encaminhados ao ambulatório que efetivamente foram as consultas, a taxa de adesão foi alta. Apenas 12,1% descontinuaram o tratamento, o que pode sugerir um bom vínculo da equipe, composta por psicóloga, assistente social e pediatra, com o paciente e família.

Uma barreira para a confecção deste trabalho foi a ausência do registro em prontuário de dados relevantes aos casos. A respeito do preenchimento dos prontuários do primeiro atendimento no pronto-socorro, alguns fatos foram difíceis de avaliar a prevalência uma vez que os prontuários não apresentavam uma uniformidade no preenchimento, dificultando ou até mesmo impossibilitando a análise estatística de alguns parâmetros. Esse problema não só se repetiu, como se intensificou durante a análise do ambulatório de violência sexual, em que, muitas vezes, o conteúdo das consultas do primeiro atendimento era apenas replicado, sem registros adicionais. Assim, fica evidente a necessidade latente de uma nova abordagem na coleta dos dados para o seguimento uniformizado do cuidado. Portanto, destaca-se novamente a necessidade de um prontuário eletrônico ou programa automatizado único, que possa esquematizar a coleta de dados, proporcionando um acompanhamento longitudinal homogeneizado.

 

COPYRIGHT

Copyright© 2020 Scherrer et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Licença Creative Commons. Atribuição que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.

 

CONCLUSÃO

Os dados gerais levantados no hospital estudado obtiveram resultados semelhantes a outros estudos nacionais e internacionais publicados anteriormente sobre violência sexual contra crianças e adolescentes. Acerca do atendimento ofertado à vítima de violência sexual existem grandes falhas de comunicação entre os três atendimentos disponíveis de vítimas de violência sexual, além da omissão da disponibilização de atendimento para as famílias e para o agressor. O pronto-socorro representou o atendimento com a maior lapso de encaminhamentos dos pacientes, interrompendo assim a possibilidade do cuidado longitudinal para uma quantidade importante de pacientes. Outro aspecto relevante levantado foi a necessidade de uma nova abordagem na coleta dos dados para o seguimento uniformizado, possibilitando registro completo da equipe multiprofissional em prontuário eletrônico único. Concluímos que há grande necessidade de interação entre os profissionais responsáveis pelos atendimentos nos vários locais disponíveis, de atendimento ampliado para as famílias e agressor, da uniformização da coleta de dados do pronto atendimento e do acompanhamento no ambulatório às vítimas de abuso sexual para melhor seguimento longitudinal e resposta às necessidades.

 

REFERÊNCIAS

1. Martins CBG, Jorge MHP. Childhood and adolescent sexual abuse: profile of the victims and aggressors in a county in the South of Brazil. Texto Contexto Enferm. 2010 Jun;19(2):246-55.

2. Krug EG, Dahlberg LL, Mercy JA, Zwi AB, Lozano R. Relatório mundial sobre violência e saúde. Genebra; World Health Organization; 2002.

3. World Health Organization (WHO). Guidelines for medico-legal care for victims of sexual violence. Genebra: WHO; 2003.

4. Seth R, Srivastava RN. Child sexual abuse: management and prevention, and protection of children from sexual offences (POCSO) act. Indian Pediatr. 2017 Nov;54(11):949-53.

5. Silva WS, Ribeiro FM, Guimarães GK, Santos MS, Almeida VPS, Barroso-Junior UO. Factors associated with child sexual abuse confirmation at forensic examinations. Ciênc Saúde Colet. 2018;23:599-606.

6. Santos MJ, Mascarenhas DMM, Rodrigues TMP, Monteiro RA. Caracterização da violência sexual contra crianças e adolescentes na escola - Brasil, 2010-2014. Epidemiol Serv Saúde. 2018;27(2):e2017059.

7. Bates CK. Evaluation and management of adult and adolescent sexual assault victims. UpToDate [Internet]. 2021; [acesso em 2020 Set 09]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/evaluation-and-management-of-adult-and-adolescent-sexual-assault-victims

8. Nahas CC, Parizzi MR, Evangelista M, Nogueira MGS, Silveira MIRB, Cruz MNA, et al. Guia de atendimento: criança e adolescente vítimas de violência doméstica, sexual e outras violências na atenção primária à saúde [Internet]. Belo Horizonte: Prefeitura de Belo Horizonte; 2013; [acesso em 2020 Set 09]. Disponível em: https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/saude/2018/documentos/publicacoes%20atencao%20saude/guia_atendimento_crianca_adolescente_vitimas_outras_violencias.pdf

9. Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Linha de cuidado para a atenção integral à saúde de crianças, adolescentes e suas famílias em situação de violência: orientações para gestores e profissionais de saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2010.

10. Ribeiro MA, Ferriani MGC, Reis JN. Violência sexual contra crianças e adolescentes: características relativas à vitimização nas relações familiares. Cad Saúde Pública. 2004 Abr;20(2):456-64.

11. Brito AMM, Zanetta DTM, Mendonça RVC, Barison SZP, Andrade VA. Violência doméstica contra crianças e adolescentes: estudo de um programa de intervenção. Ciênc Saúde Colet. 2004;10:143-9.

12. Ayala RC, Rivera-Rivera L, Angéles-Llerenas A, Díaz-Cerón E, Allen-Leigh B, Ponce EL. Factores del abuso sexual en la niñez y la adolescencia en estudiantes de Morelos, México. Rev Saúde Pública. 2009;43(3):506-14.

13. Núñez A, Tortolero Y, Verschuur A, Camacaro M, Mendoza S. Violencia sexual: un fenómeno oculto en la experticia médico legal. Rev Obs ginecol Venez. 2008;68(4):233-9.

14. Bryant-Davis T, Ullman SE, Tsong Y, Tillman S, Smith K. Struggling to survive: sexual assault, poverty, and mental health outcomes of african american women. Am J Orthopsychiatry. 2010;80(1):61-70.

15. Campbell R. The psychological impact of rape victims' experiences with the legal, medical, and mental health systems. Am Psychol. 2008 Dec;63(8):702-17.

16. Bechtel K, Bennett BL. Management and sequelae of sexual abuse in children and adolescents. UpToDate [Internet]. 2019; [acesso em 2020 Set 09]. Disponível em: https://www.uptodate.com/contents/management-and-sequelae-of-sexual-abuse-in-children-and-adolescents/contributors

17. Center on the Developing Child - Harvard University. Early experiences can alter gene expression and affect long-term development [Internet]. Cambridge: Center on the Developing Child - Harvard University; 2010; [acesso em 2020 Set 09]. Disponível em: https://developingchild.harvard.edu/resources/early-experiences-can-alter-gene-expression-and-affect-long-term-development/

18. National Scientific Council on the Developing Child. Excessive stress disrupts the architecture of the developing brain. Working paper n. 3 [Internet]. Cambridge: Center on the Developing Child - Harvard University; 2005; [acesso em 2020 Set 09]. Disponível em: https://developingchild.harvard.edu/wp-content/uploads/2005/05/Stress_Disrupts_Architecture_Developing_Brain-1.pdf

19. Soares ALG, Howe LD, Matijasevich A, Wehrmeister FC, Menezes AMB, Gonçalves H. Adverse childhood experiences: prevalence and related factors in adolescents of a Brazilian birth cohort. Child Abus Negl. 2016 Jan;51:21-30.

20. Zijlstra E, Wong SLF, Teerling A, Hutschemaekers G, Lagro-Janssen A. Challenges in interprofessional collaboration: experiences of care providers and policymakers in a newly set-up Dutch assault centre. Scand J Caring Sci. 2018 Mar;32(1):138-46.

21. Caro P, Turner W, MacDonald G. Comparative effectiveness of interventions for treating the psychological consequences of sexual abuse in children and adolescents. Cochrane Database Syst Rev. 2019;2019:CD013361. DOI: https://doi.org/10.1002/14651858.CD013361

22. Zwi KJ, Woolfenden SR, Wheeler DM, O'Brien TA, Tait P, Williams KW. School-based education programmes for the prevention of child sexual abuse. Cochrane Database Syst Rev. 2007;2007:CD004380. DOI: https://doi.org/10.1002/14651858.CD004380.pub2

23. Tutty LM. Child sexual abuse prevention programs: evaluating who do you tell. Child Abus Negl. 1997 Set;21(9):869-81.

24. Souto RQ, Silva AFR, Oliveira RC, Cavalcanti AL. Violência sexual contra a mulher no município de Campina Grande, Paraíba. Rev Bras Pesq Saúde. 2010;12(3):30-8.

25. Platt VB, Back IC, Hauschild DB, Guedert JM. Sexual violence against children: authors, victims and consequences. Ciênc Saúde Colet. 2018;23(4):1019-31.

26. Ferreira AL. Acompanhamento de crianças vítimas de violência: desafios para o pediatra. J Pediatr (Rio J). 2005;81(5 Supl 1):S173-S80.

27. Silva AB, Guedes ACCM, Síndico SRF, Vieira ETRC, Andrade Filha IG. Registro eletrônico de saúde em hospital de alta complexidade: um relato sobre o processo de implementação na perspectiva da telessaúde. Ciênc Saúde Colet. 2019 Mar;24(3):1133-42.