ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Relato de caso: carcinoma basaloide da próstata, um achado incomum
Case report: basaloid carcinoma of the prostate, an uncommon finding
Cláudia Hosana Silva Marques1; José Pedro Ferreira de Bastos Vieira2; Nonato Mendonça Lott Monteiro3; Pedro Paulo Lopes de Oliveira Júnior2; Thayles Vinícius Moraes3
1. Médica, Center Clínica, Sorriso, MT - Brasil
2. Médico Radioterapeuta do Centro de Oncologia e Radioisótopos de Ipatinga. Ipatinga, MG - Brasil
3. Médico, Centro de Oncologia e Radioisótopos de Ipatinga. Ipatinga, MG - Brasil
Nonato Mendonça Lott Monteiro
Rua: Nilo Peçanha, nº 270, Bairro: Areal
Ipatinga, MG - Brasil, CEP: 35.160-271
E-mail: nonatomlm@yahoo.com.br
Recebido em: 08/01/2009
Aprovado em: 17/06/2010
Instituição: Centro de Oncologia e Radioisótopos de Ipatinga (COR). Ipatinga, MG - Brasil
Resumo
Relata-se caso de paciente com 56 anos de idade, com disúria, estrangúria, um episódio de hematúria macroscópica e dosagem de antígeno prostático específico (PSA) total de 1,35 ng/mL. A propedêutica para doença oncológica da próstata diagnosticou carcinoma basaloide, um tumor com rara histologia e poucas vezes descrito na literatura.
Palavras-chave: Neoplasias da Próstata; Antígeno Prostático Específico; Adenocarcinoma; Diagnóstico.
INTRODUÇÃO
O câncer da próstata é a segunda causa de óbitos devidos a neoplasias em homens, sendo superado apenas pelo de pulmão. Esse tumor, na maioria dos casos, apresenta crescimento lento, levando 15 anos para atingir 1 cm3. 1 O tipo histológico mais frequente é o adenocarcinoma da próstata (AC), ocorrendo em 95% dos casos. O carcinoma com característica basaloide (CBP) é variante rara e agressiva do tipo espinocelular.2,3 Foi descrito pela primeira vez por Frankel3. O CBP apresenta-se, macroscopicamente, com aspecto branco e bem definido; e, histologicamente, com membrana basal eosinofílica, crivosa e com produção de muco. Consiste, ocasionalmente, de áreas trabeculares, sólidas e com ninhos de pequenas células com citoplasma escasso e figuras mitóticas abundantes. A necrose é comum e quando é de localização central, acompanhada de grandes ninhos sólidos e com ausência de marcadores basocelulares, caracteriza-se por comportamento mais agressivo de tumor, que apresenta frequentemente recorrências locais e metástases à distância, conforme documentações publicadas. Infiltra tipicamente os planos subjacentes e profundos e em mais da metade dos casos apresenta linfonodos inguinais acometidos, ao diagnóstico inicial.4-10
Os poucos relatos desse tipo de tumor na literatura referem-se a pacientes com média de idade na sétima década de vida, como relata um estudo americano, no qual a idade dos 29 pacientes variou de 42 a 89 anos (média de 69 anos), embora haja descrições isoladas, como em um artigo inglês, cujo paciente acometido tinha apenas 28 anos de idade.8,11,12
Considerado um dos melhores marcadores tumorais conhecidos, o PSA é uma glicoproteína produzida pela próstata e que compõe o líquido seminal. Sua utilização está indicada para fins de diagnóstico, prognóstico e acompanhamento terapêutico.13 Aceita-se como limite normal o PSA total cujo valor é até 4,0 ng/mL.14,15
O CBP pode se manifestar, clinicamente, com poucos sintomas do ponto de vista urológico, como obstrução urinária aguda ou desenvolvida ao longo de poucos anos, e, segundo o Instituto Europeu de Oncologia, tem apresentação e resultado clínico adversos.2,12
RELATO DO CASO
Em dezembro de 2005, o paciente ACA, 56 anos de idade, aposentado, procedente de Coronel Fabriciano-MG, sem história de câncer na família, oligossintomático do ponto de vista urológico, apresentou disúria terminal e sinais de estrangúria leve, mais intensas à noite (sic). Queixou-se, ainda, de único episódio de hematúria macroscópica, acompanhado de dor moderada, em cólica, no hipogástrio. A dosagem do PSA total, na ocasião, foi de 1,35 ng/mL e, como apresentava sintomatologia urinária, foi submetido ao toque retal, que mostrou próstata aumentada de volume, endurecida e multinodular.
Após propedêutica adequada, em início de janeiro de 2006, foi submetido à prostatectomia radical e evoluiu com disúria terminal e hematúria macroscópica no pós-operatório imediato.
O laudo histopatológico da peça cirúrgica revelou carcinoma basaloide da próstata (CBP), invasor, multifocal, acometendo ambos os lobos, com margens comprometidas e infiltração de vesículas seminais (Figuras 1 e 2) - os linfonodos dissecados estavam livres de metástase (pT3 pN0).
O paciente foi avaliado para tratamento radioterápico adjuvante dois meses após o procedimento cirúrgico e foi programado para receber dose total de 72 Gy em 40 frações, mediante quatro campos ântero-posteriores e látero-laterais, restritos à loja prostática, utilizando-se a energia do acelerador linear de 6 MeV, com técnica conformacional, com blocos de colimação individuais. A dose diária foi de 180 cGy e ao final das 40 frações, em abril de 2006, o paciente apresentava-se em bom estado geral e queixava-se apenas de leve ardência ao urinar, que foi aliviada com o uso de cloridrato de fenazopiridina.
Na consulta de controle em setembro de 2006 o paciente encontrava-se assintomático, com PSA total inferior a 0,04 ng/mL.
Em janeiro de 2007, não referiu queixas e o PSA manteve o mesmo valor (<0,04 ng/mL). Os demais exames, como hemograma, ureia, creatinina, transaminases, fosfatases alcalina e ácida prostática, estavam todos normais.
Em abril de 2007, um ano após a radioterapia e 14 meses após a cirurgia, o paciente mantinha-se em seguimento clínico, apresentando bom estado geral e PSA total < 0,09 ng/mL. A dosagem de ureia e creatinina encontraram-se elevadas e foi solicitado parecer da nefrologia que, após propedêutica especializada, descartou doença renal. Agendado retorno trimestral.
Em início de agosto de 2007, retornou para acompanhamento com PSA total inferior a 0,04 ng/mL, porém o EAS e a urocultura com antibiograma mostravam infecção urinária por Klebsiella spp., sensível à sulfametoxazol + trimetoprim, tendo sido medicado com essa associação por 10 dias. Ao final do tratamento apresentou melhora do padrão urinário e nova urocultura mostrou-se negativa, sem crescimento de germes patógenos.
Nas consultas seguintes, dezembro de 2007 e de maio de 2008, permaneceu assintomático e apresentava dosagens de PSA total sempre inferiores a 0,04 ng/mL.
Já em controle semestral, em novembro de 2008, retornou ao seguimento em bom estado geral, sem queixas urinárias e mantendo PSA total < 0,04 ng/mL.
Seguido em controle oncológico semestral, em maio e novembro de 2009, compareceu às consulta com bom estado geral, mantendo-se assintomático, sendo que em novembro de 2009 mantinha valor de PSA total < 0,04 ng/mL.
Paciente encontra-se em controle oncológico anual e tem retorno agendado para novembro de 2010.
DISCUSSÃO
O presente caso tornou-se particular, pois, além de tratar-se de tipo histológico raro, o exame de PSA do paciente encontrava-se dentro da faixa de normalidade (1,35 ng/mL ao diagnóstico), levando o médico a descartar, erroneamente, a possibilidade de neoplasia.
As queixas urinárias e, posteriormente, o toque retal foram efetivamente importantes para a suspeita diagnóstica de doença neoplásica, que nesse tipo histológico apresentou-se com poucas manifestações clínicas sugestivas de neoplasia e baixa relevância do PSA para o diagnóstico, o que difere dos relatos de comportamento agressivo e manifestação clínica adversa encontrados na literatura.10,16
Esse paciente apresentou, à diferença de outros relatos, boa evolução clínica, encontrando-se em controle anual no quarto ano após o diagnóstico dessa neoplasia e até a sua última consulta de controle, realizada em novembro de 2009, não apresentava sinais de acometimento linfático.8-10
CONCLUSÃO
Apesar do CBP ser subtipo raro de câncer da próstata, considerado de comportamento agressivo e manifestação adversa, esse paciente tem apresentado boa evolução clínica.
Neste caso, nota-se que para o correto e rápido diagnóstico de CBP, não se deve descartar a hipótese diagnóstica de neoplasia se o valor do PSA estiver dentro da faixa de normalidade e o paciente persistir com sintomatologia urinária.
A dosagem de PSA aliada ao toque retal é indispensável para o correto diagnóstico de CP, uma vez que, neste relato, o diagnóstico só foi possível devido às alterações encontradas ao toque retal.15
REFERÊNCIAS
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