ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Estudo ecológico do ofidismo em Minas Gerais, 2007 a 2019: mapeamento de áreas de risco e correlação com urbanização e trabalho agropecuário
Ecological study of snakebites in Minas Gerais, Brazil, 2007 to 2019: mapping of risk areas and correlation with urbanization and agricultural work
Flávia Cappuccio de Resende1; Priscila Moreira Tavares1; Clara d'Ávila Fonseca Paiva de Paula Freitas1,; Mariana d'Ávila Fonseca Paiva de Paula Freitas2; Giselle Agostini Cotta1; Yukari Figueroa Mise3
1. Fundação Ezequiel Dias, Belo Horizonte. Minas Gerais, Brasil
2. Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil
3. Universidade Federal da Bahia. Salvador, BA, Brasil
Flávia Cappuccio de Resende
E-mail: flavia.resende@funed.mg.gov.br
Recebido em: 31 Maio 2022
Aprovado em: 18 Novembro 2022
Data de Publicação: 08 Março 2023
Editor Associado Responsável:
Dr. Enio Roberto Pietra Pedroso
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais Belo Horizonte/MG, Brasil
Conflito de Interesse: Os autores declaram que não há conflito de interesse
Resumo
INTRODUÇÃO: O ofidismo é um problema de saúde pública negligenciado em muitos países tropicais. No Brasil, são registrados cerca de 27.000 acidentes ofídicos por ano. O objetivo deste estudo é descrever o perfil epidemiológico dos acidentes ofídicos em Minas Gerais, Brasil, mapeando áreas de risco e correlacionando a incidência de acidentes com urbanização e trabalho agropecuário.
MÉTODOS: Estudo ecológico que analisou os 853 municípios de Minas Gerais (2007-2019), utilizando dados do Sistema de Notificação de Agravos de Notificação (SINAN): município de ocorrência, idade, sexo, escolaridade, raça, tempo de atendimento, serpente, gravidade, evolução clínica. O grau de urbanização municipal e o percentual de trabalhadores agrícolas foram obtidos no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Avaliamos e mapeamos as áreas de risco para acidentes ofídicos no estado.
RESULTADOS: Os 41.725 casos notificados acometeram principalmente homens (75,1%), jovens (40,5%) e pardos (43,97%). As regiões de alto risco foram Leste do Sul, Leste, Vale do Aço e Nordeste. A incidência de acidentes ofídicos foi negativamente correlacionada com o nível de urbanização (r=-0,22/p<0,0001) e positivamente correlacionada com o percentual de trabalhadores agropecuários (r=0,52/p<0,001).
CONCLUSÕES: A caracterização dos acidentes ofídicos no estado segue o padrão nacional, em que a maioria dos acidentes ocorre com serpentes dos gêneros Bothrops e Crotalus, com homens em idade produtiva, de baixa escolaridade e de cor parda. A maioria das vítimas recebe atendimento médico nas primeiras horas após o acidente, com alto percentual de casos que evoluem para cura. As áreas de risco estão distribuídas de forma desigual, destacando o papel da urbanização e do trabalho agropecuário na incidência do agravo.
Palavras-chave: Picadas de serpentes; Análise de risco; Estudos epidemiológicos; Determinantes sociais da saúde
INTRODUÇÃO
O ofidismo é um problema de saúde pública negligenciado em muitos países tropicais1. A estimativa do número de casos e mortes anuais é variável. Chippaux (1998)2 estimou que a ocorrência de envenenamentos por serpentes no mundo seja superior a cinco milhões de casos anuais, com 125.000 mortes. Kasturiratne et al. (2008)3 apresentam estimativas um pouco mais modestas de casos, com ocorrência anual de 1,2 a 5,5 milhões de acidentes ofídicos no mundo e 94.000 mortes. Na América Latina e Caribe estima-se que ocorram anualmente de 137.000 a 150.000 acidentes por serpentes4, sendo que cerca de 27.000 são registrados por ano no Brasil5. Nos acidentes ocorridos em território nacional, o gênero Bothrops é responsável pela maioria desses casos (70,5%), seguido pelos gêneros Crotalus (7,5%), Lachesis (2,8%), e Micrurus (0,6%)6. Nos 18,6% restantes dos casos, não havia informação sobre o gênero da serpente, ou não foram encontrados traços de envenenamento6.
Os fatores que determinam a gravidade do acidente e a letalidade incluem a espécie de serpente envolvida no acidente, a idade da vítima, o local da picada e o tempo entre o acidente e o atendimento médico6. Um estudo realizado sobre os acidentes ofídicos no Brasil, entre os anos de 2001 e 2012, revelou que as serpentes do gênero Micrurus são responsáveis pela maior proporção de casos graves, independentemente do tempo entre a picada e o atendimento médico6. Para os acidentes envolvendo serpentes Crotalus, houve alta correlação entre os acidentes classificados como graves e a demora no atendimento médico6.
O tratamento do envenenamento é baseado na administração de antiveneno. Pacientes graves necessitam de terapia apropriada de suporte a vida, como tratamento de choque, ventilação assistida e terapia renal7. Os acidentes ofídicos podem resultar em sequelas físicas e psicológicas permanentes em um número desconhecido de pessoas, causando sofrimento pessoal e social significativos7. Estudos indicam que a incidência de acidentes ofídicos pode estar relacionada a atividades ocupacionais, ambientais e de infraestrutura urbana8,9. No estado da Bahia, um estudo ecológico considerando o período de 2000 a 2009, demonstrou que a incidência do ofidismo foi fortemente associada às características do município, como áreas de plantio de cacau e café, e tamanho da criação doméstica e gado8. Para o estado do Tocantins (período de 2007 a 2015), foi demonstrado que a incidência do ofidismo estava associada ao trabalho agrícola, ao índice de desenvolvimento municipal, e à área plantada com mandioca9.
Embora haja plausibilidade biológica/social para a relação do ofidismo com o trabalho agropecuário, faz-se necessário investigar particularidades regionais. No estado do Rio de Janeiro, Bochner e Struchiner (2004)10, encontraram um efeito protetor para o ofidismo nas lavouras de tomate, mandioca e arroz. Para o estado de Minas Gerais não foram encontrados estudos que averiguam a associação do ofidismo com atividades ocupacionais, ambientais ou de infraestrutura urbana. Desta forma, investigar a relação entre o percentual de pessoas ocupadas na agropecuária e a incidência dos acidentes ofídicos, bem como avaliar uma associação do grau de urbanização dos municípios e a incidência desse agravo, é importante para compreendermos os fatores ocupacionais e ambientais que estão relacionados ao ofidismo em Minas Gerais. Além disso, até o momento não foram investigadas áreas de risco para o ofidismo no estado, e a identificação dessas áreas é fundamental para o fortalecimento e capilarização das ações de vigilância em saúde e para a organização dos serviços de saúde no tratamento dos acidentados.
O presente estudo tem como objetivo descrever o perfil epidemiológico do ofidismo em Minas Gerais, Brasil, avaliando e mapeando áreas de risco e correlacionando com urbanização e trabalho agropecuário.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo ecológico do envenenamento ofídico notificado em Minas Gerais, cuja unidade de análise correspondeu aos 853 municípios mineiros no período de 2007 a 2019. A população do Estado é de aproximadamente 20 milhões de pessoas e a cobertura vegetal é composta por Cerrado, Mata Atlântica e Caatinga11. O estado é composto por 14 macrorregiões de saúde: Centro, Centro-Sul, Jequitinhonha, Leste, Leste do Sul, Nordeste, Noroeste, Norte, Oeste, Sudeste, Sul, Triângulo do Norte, Triângulo do Sul, e Vale do Aço12. A casuística para cada município foi obtida a partir da base de dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN)13, e os dados agregados foram extraídos através do TabNet considerando as seguintes variáveis: município de ocorrência, idade (<15, 15-39, 40-59, ≥60 anos), sexo (masculino, feminino), escolaridade das vítimas (analfabeto, ensino fundamental incompleto ou completo, ensino médio e superior), raça (branca, preta, amarela, parda e indígena), tempo decorrido entre a picada e atendimento médico (0-1h, 1-3h, 3-6h, 6-12h, 12-24h, >24h), tipo de serpente (Bothrops, Crotalus, Micrurus, Lachesis, não peçonhenta), classificação da gravidade (leve, moderado e grave), evolução do caso (cura, morte pelo agravo, morte por outra coisa).
Anualmente e acumuladamente para o período, foram estimados o coeficiente de incidência (número de casos notificados/população, por 100.000 habitantes) e a letalidade (número de óbitos por acidente ofídico/número de casos notificados de acidentes ofídicos) para cada município e para cada macrorregião de saúde com auxílio do programa Excel Microsoft 19®. A fim de analisar a sazonalidade dos acidentes, realizamos teste de Mann-Whitney, agrupando os acidentes que ocorreram no período chuvoso (outubro a abril) e seco (maio a setembro). Com base no coeficiente de incidência, classificamos as áreas de risco para o ofidismo, considerando as macrorregiões de saúde, por meio do teste não-paramétrico de Kruskal-Wallis, ajustado ao valor de p. Para isso, utilizou-se o programa Stata® versão 12.0. O coeficiente de incidência de cada macrorregião foi comparado aos demais. O valor de p<0,05 sinalizava risco diferente e o valor de p>0,05, indicava riscos similares. Desta forma, as macrorregiões puderam ser agrupadas com base na similaridade estatística entre as áreas, baseada no coeficiente de incidência e valor de p (<0,05). A partir dos coeficientes de incidência das macrorregiões que compunham os grupos resultantes da aplicação do teste, as áreas foram classificadas quanto ao risco.
Com o objetivo de investigar a relação do ofidismo com o trabalho agropecuário e com a urbanização, utilizamos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O percentual de pessoas que exercem o trabalho agropecuário no município foi calculado dividindo-se o número de pessoas com ocupação na agropecuária (Censo Agropecuário - dados para 2017)14 pelo total de habitantes do município (projeção intercensitária para ano de 2017 a partir do censo de 2010). O grau de urbanização municipal (apresentado em valores percentuais) foi obtido da Classificação e Caracterização dos Espaços Rurais e Urbanos do Brasil15, e corresponde à proporção da população total que reside em áreas urbanas, segundo a divisão político-administrativa estabelecida pelas administrações municipais. Foi realizada uma correlação de Spearman entre a incidência dos acidentes ofídicos e o nível de urbanização dos municípios mineiros, bem como entre a incidência dos acidentes e o percentual de pessoas empregadas na agricultura e pecuária.
A distribuição espacial dos números de casos para cada tipo de acidente ofídico e dos coeficientes de incidência de acidentes foi realizada com auxílio do programa ArcMap 10.1. GraphPad Prism foi utilizado para realizar os testes estatísticos. Os testes foram considerados significativos quando p<0,05. Por se tratar de um estudo utilizando dados de domínio público disponíveis na internet não se fez necessária a submissão do protocolo de pesquisa ao Comitê de Ética em Pesquisa.
RESULTADOS
No período investigado, foram notificados 41.725 acidentes com serpentes em todo o estado de Minas Gerais (Tabela 1). A maioria das vítimas tinham entre 15 e 39 anos (40,51%), era do sexo masculino (75,08%), possuía a 1ª a 4ª séria incompleta do ensino fundamental (16,43%), era de raça parda ou branca (43,97% e 33,67%, respectivamente), recebeu atendimento médico até três horas após o acidente (75,41%) e teve boa evolução, levando à cura (92,43%). A maioria dos acidentes ocorreu com as serpentes do gênero Bothrops (67,62%), seguidas pelo gênero Crotalus (16,51%), Micrurus (0,66%) e Lachesis (0,10%). O gênero da serpente não foi identificado em 11,00% dos casos. Acidentes com espécies não peçonhentas corresponderam a 4,11% dos casos (Tabela 1).
Observou-se um padrão sazonal de acidentes com serpentes, uma vez que a maior parte dos acidentes ocorreu nos meses quentes e úmidos, correspondendo ao período de outubro a abril (71,07%) (p≤0,005). Houve média de 3.220 acidentes anuais por serpentes no estado de Minas Gerais (DP=429,6), com amplitude de 2.491 a 3.834 casos. A Figura 1 representa a distribuição espacial dos casos de acordo com o gênero da serpente causadora do acidente e o município mineiro de ocorrência, com as cores mais escuras indicando maior número de casos.
O coeficiente de incidência acumulado de acidentes ofídicos do estado de Minas Gerais entre 2007 e 2019 foi de 15,8/100.000 habitantes, com variação anual de 11,98 a 19,13 (Figura 2A). No período investigado ocorreram 119 óbitos pelo agravo notificado, sendo a letalidade média para o estado de 0,29%, variando entre 0,15% e 0,52% (Figura 2A). Os óbitos ocorreram principalmente em homens (71,2%) entre 40 e 59 anos (36%), acidentados por serpentes do gênero Bothrops (59,3%), seguido por Crotalus (28,8%). Das vítimas fatais, 52,5% receberam atendimento médico até três horas após o acidente. Os percentuais de vítimas fatais que receberam atendimento entre três e seis horas, seis a 24 horas e após 24 horas foram de 12,7; 13,6 e 13,6, respectivamente. Em 7,6% dos óbitos, a informação sobre o horário do atendimento médico não foi preenchida. Os municípios com os maiores coeficientes de incidências foram: Água Comprida (154,6/100.000 habitantes), Santana do Manhuaçu (154,4/100.000 habitantes) e Durandé (130,6/100.000 habitantes) (Figura 2B).
A partir da análise para classificação das áreas de risco das 14 macrorregiões de saúde do estado de Minas Gerais, foram identificados três grupos distintos em relação aos coeficientes de incidência. Esses grupos apresentaram similaridade estatística entre si. O grupo um, por apresentar coeficientes de incidência mais baixos em relação aos demais, foi classificado como baixo risco. O grupo dois, por possuir coeficientes de incidência com valores intermediários, foi classificado como médio risco. Por fim, o grupo três, por apresentar os maiores coeficientes de incidência, foi classificado como alto risco. Desta forma, (i) a região de alto risco compreende as macrorregiões Leste do Sul (54,4/100.00), Leste (51,2/100.000), Vale do Aço (47,8/100.000) e Nordeste (46,9/100.000); (ii) a região de médio risco, compreende as macrorregiões Noroeste (38,3/100.000), Triângulo do Sul (38,2/100.000), Sudeste (32,4/100.000), Jequitinhonha (32,1/100.000), Centro Sul (30,9/100.000) e Triângulo do Norte (28,8/100.000); e (iii) a região de baixo risco compreende as macrorregiões Norte (24,6/100.000), Centro (21,3/100.000), Oeste (20,0/100.000) e Sul (17,1/100.000) (Tabela 2, Figura 2).
O grau de urbanização dos municípios mineiros variou de 0 a 99,66%, sendo que 81 municípios tiveram nível de urbanização superior a 90% e 277 municípios, menor que 20%. O percentual de pessoas ocupadas na agropecuária variou de 0 a 83,84%, sendo que 24 municípios tiveram mais de 50% da população com ocupação na agropecuária, e 464 municípios tiveram menos de 20%. Observou-se correlação negativa e significativa entre a incidência de acidentes e o nível de urbanização dos municípios (r=-0.22; p<0.0001) (Figura 3). Por outro lado, foi observada correlação positiva entre o percentual de pessoas ocupadas na agricultura e pecuária e a incidência de acidentes ofídicos nos municípios mineiros (r=0,52; p<0,001) (Figura 3).
DISCUSSÃO
O perfil dos acidentes ofídicos em Minas Gerais é similar àquele encontrado para o Brasil, em que a maior parte dos casos ocorrem com indivíduos do sexo masculino, com idade entre 15 a 59 anos, baixa escolaridade, e a maioria dos acidentados recebem atendimento médico entre 1 e 3 horas após o acidente, com elevado percentual de casos que evoluem para cura6. A distribuição dos acidentes ofídicos em Minas Gerais também é semelhante ao padrão encontrado para o Brasil, onde a maioria ocorre com serpentes do gênero Bothrops e Crotalus16. Enquanto o percentual de acidentes botrópicos ocorridos em Minas Gerais (67,69%) é comparável à média nacional (69,93%), os acidentes crotálicos notadamente têm contribuição relativa maior em Minas Gerais (16,51%) que na média nacional (8,81%)16. Na região metropolitana de Belo Horizonte, que é formada por 34 municípios, o percentual de acidentes crotálicos é ainda maior, chegando a 30% dos casos. Essa distribuição diferenciada pode ser explicada pelo tipo de vegetação da região estudada, onde predomina o Cerrado11, bioma preferencialmente ocupado por serpentes do gênero Crotalus17. A cascavel Crotalus durissus ocorre em formações secas do México ao norte da Argentina17, e há evidências de que esta espécie também pode ocorrer em áreas perturbadas da Mata Atlântica18.
O percentual de acidentes com Micrurus na região estudada é de 0,66%, similar à média nacional (0,90%)16. A raridade desses acidentes pode ser explicada pelo hábito fossorial e baixa agressividade das serpentes corais, além das pequenas presas anteriores fixas e ângulo de abertura da boca limitado, o que dificulta a injeção do veneno19. Foram notificados 0,10% de acidentes laquéticos na região estudada; entretanto, acredita-se que esse percentual ainda possa ser menor, uma vez que os municípios que apresentaram registros desses acidentes no estado de Minas Gerais não correspondem à distribuição geográfica da espécie Lachesis muta20. A surucucu é restrita a fragmentos florestais, habitando mais frequentemente florestas primárias. Desta forma, os acidentes laquéticos relatados podem ter sido erros de diagnóstico, identificações incorretas dos animais, ou mesmo erros no preenchimento da ficha de notificação. No presente estudo, 42 casos foram registrados como acidente laquético. Destes, 36 evoluíram para cura, e nos outros seis casos essa informação não foi preenchida. Considerando que o tratamento dos acidentes com serpentes Lachesis é feito com soro antibotrópico-laquético21, se esses acidentes fossem causados por serpentes do gênero Bothrops, o tratamento implementado também teria sido apropriado, dada a bivalência do antiveneno. A despeito disso, a menor disponibilidade do soro antibotrópico-laquético reforça a necessidade da correta dedução da serpente no intuito do uso apropriado desse imunobiológico.
Observou-se que em 11,00% dos casos não foram notificadas informações da cobra envolvida no acidente, de forma similar à média nacional, que é de 11,48%16, esse fato traz consequências negativas para o planejamento da produção e distribuição do soro antiveneno no estado de Minas Gerais.
Embora o SINAN seja fonte de grande quantidade de dados de alta qualidade, o que nos permite traçar um perfil epidemiológico para os acidentes ofídicos para diferentes locais, ainda temos um grande número de campos não preenchidos. A identificação da serpente envolvida no acidente é fundamental para o uso do antiveneno adequado e o sucesso do tratamento. Para auxiliar na identificação, protocolos baseados na manifestação de sintomas são ferramentas importantes22. Além disso, atualmente, recursos tecnológicos que permitem o acesso dos profissionais de saúde a especialistas em serpentes têm sido utilizados com sucesso6.
Observou-se um padrão sazonal de acidentes ofídicos na região estudada, com maior incidência no período chuvoso no estado23, uma vez que a maioria dos acidentes ocorre de outubro a abril (71,07%). Entre os meses de julho e setembro, temos o menor percentual de acidentes (14,53%). Esse padrão, já observado em outros estudos epidemiológicos, poderia ser explicado pelo aumento da atividade das serpentes nos meses quentes e úmidos, e, associado a isso, essa é a época em que as pessoas estão mais expostas a áreas naturais, seja em atividades agrícolas ou de lazer6,24. Cabe ressaltar que mudanças climáticas na região, com previsão do aumento da temperatura média para as próximos décadas25, pode impactar o perfil de sazonalidade dos acidentes ofídicos no estado, dado que as serpentes são ectotérmicas e o padrão de atividade destes animais é influenciado pela temperatura.
A maior proporção de acidentes graves ocorreu com serpentes do gênero Micrurus, seguido do gênero Crotalus, Lachesis e, por último, Bothrops. O percentual de atendimento nas primeiras três horas após o acidente na região estudada foi semelhante à média das regiões Sudeste e Sul. Na região estudada, 75,41% das vítimas receberam atendimento médico em até três horas, enquanto nas regiões Sudeste e Sul, esses números são 73,3% e 79,9%, respectivamente6.
Os resultados encontrados para sexo e idade, ressaltam que os homens em idade produtiva correspondem às pessoas mais acometidas por picadas de serpentes6,26. A pouca escolaridade da maior parte das vítimas encontrada neste estudo proporciona uma evidência de um problema de vulnerabilidade social. Esse padrão tem sido apontado desde o trabalho de Vital Brazil com indivíduos picados por cobras no sudeste do Brasil no início do século XX27.
A correlação negativa observada entre o nível de urbanização e a incidência de acidentes demonstra que municípios nos quais a ocupação proporcional do espaço urbano é maior, apresentam menor risco para acidentes ofídicos. A urbanização diminui a disponibilidade de vegetação que serve de refúgio para as serpentes, afeta o acesso à corpos d'água não poluídos, altera as características abióticas que favorecem a ocorrência do animal28. Todas essas questões interferem na presença das serpentes e consequentemente na possibilidade do acidente ofídico.
Por outro lado, a correlação positiva entre percentual de trabalhadores na agricultura e pecuária e a incidência do ofidismo reforçam o efeito do trabalho rural na ocorrência desse agravo. Essa relação já foi observada em estudos realizados nos estados da Bahia e de Tocantins, tanto com dados agregados, quanto individuados8,9. A centralidade do trabalho agropecuário no risco da ofidismo remonta as observações de Vital Brazil, nos primeiros estudos sistematizados sobre o ofidismo no país27 e reforça a necessidade de que esse agravo seja incorporado às pautas da saúde do trabalhador. Desta forma, especial olhar deve ser dado ao trabalhador da agropecuária, indicado pela literatura9,29 como principal vítima do envenenamento ofídico e, portanto, deve ser foco de políticas e programas de proteção à saúde do trabalhador.
As macrorregiões Centro e Oeste, que apresentaram baixo risco de acidentes, possuem uma média 12,9% e 16,6% das pessoas ocupadas na agropecuária14. Nestas regiões, a maioria dos municípios possuem no setor de serviço e indústria, suas principais atividades. Já nas macrorregiões norte e sul, que também apresentaram baixo risco de acidentes, temos 27,8 e 21,1% das pessoas ocupadas na agropecuária14. Nessas regiões, a maior parte dos municípios possui a agropecuária como principal atividade. Estudos mais detalhados em relação ao tipo de atividade agropecuária de cada município serão importantes para avaliar se o ofidismo ocorre com maior frequência em algum tipo de cultivo específico ou determinada prática pecuária. Dados do IBGE referentes ao censo agropecuário de 2017 mostraram que na maioria dos estabelecimentos agropecuários, o produtor é do sexo masculino (85%), da raça branca (57,01%) ou parda (35,58%). Na maioria dos estabelecimentos agropecuários (43,34%), o produtor tem entre 45 e 65 anos30. Esses resultados coincidem com os observados em relação às vítimas de acidentes ofídicos.
A incidência média encontrada para o estado de Minas Gerais (15,8,0/100.000 habitantes) é similar à média nacional (14,84/100.000 habitantes) e a letalidade média para o estado (0,29%) é menor que a média nacional para o ano de 2020 (0,39%)16, o que pode ser um reflexo das melhores condições dos serviços de saúde no estado, tanto para identificar os casos e fazer a efetiva notificação, quanto para o manejo dos pacientes picados, reduzindo a probabilidade do êxito letal16. Cabe ressaltar o papel da Secretaria Estadual de Saúde como norteadora das ações estaduais e a importância da potencialização das ações da vigilância em saúde, aprimorando a notificação dos acidentes, a dedução do táxon presumido da serpente, a correta avaliação do estadiamento e subsequente indicação de soroterapia apropriada para a gravidade do envenenamento. As macrorregiões que apresentaram alto risco de acidentes (Leste do Sul, Leste, Vale do Aço e Nordeste) possuem em média, respectivamente, 28,8%; 18,1%; 17,5% e 19,5% da população ocupada na agropecuária15. Os municípios que compõem essas macrorregiões estão localizados na Zona da Mata, Vale do Rio Doce, Vale do Mucuri e Jequitinhonha.
As análises das regiões de risco para acidentes ofídicos podem complementar as ações de vigilância em saúde e auxiliar na organização dos serviços de saúde e na distribuição de soros antiofídicos9. A definição dos municípios com postos de atendimento às vítimas, o planejamento de campanhas de prevenção de acidentes, bem como o treinamento dos profissionais de saúde para diagnóstico dos acidentes são algumas das ações que podem ser intensificadas levando em consideração a análise de risco de acidentes.
Como há diversos padrões de acidentes ofídicos em diferentes regiões do Brasil, o estudo de regiões específicas é importante para o desenvolvimento de políticas locais de saúde pública8. Conhecer a epidemiologia dos acidentes com serpentes em todos os municípios mineiros, bem como conhecer as pessoas que são acometidas por essa condição, é fundamental para as ações de prevenção dos acidentes e tratamento dos acidentados. A incorporação de dados sobre a ocupação da vítima, especialmente, se o acidente ocorreu durante o trabalho, bem como o ambiente em que se encontrava no momento da picada, pode ser importante para um melhor entendimento deste grave problema de saúde. Adicionalmente, é necessário abordar nos cursos de treinamento para profissionais de saúde, a importância do preenchimento completo das fichas de notificação, dada o alto percentual de campos não preenchidos. É preciso divulgar a esses profissionais que as informações das fichas de notificação são utilizadas para o planejamento da produção, armazenamento e distribuição do antiveneno, bem como para planejar o treinamento de equipes especializadas no tratamento de acidentes ofídicos6. A alta proporção de acidentes em que o tipo de serpente era indeterminado é indicativa da necessidade de treinamento dos profissionais de saúde6, dado que é a combinação do táxon presumido da serpente com a intensidade das manifestações clínicas que determina o tipo de soro e o número de ampolas. A conduta terapêutica adotada em um paciente em que a serpente é indeterminada pode implicar na utilização do antiveneno inadequado6.
Como limitações do estudo, podemos citar a subnotificação de casos e a qualidade das informações presentes na base de dados do SINAN, além de ser um estudo retrospectivo. Em especial, é importante pontuar a incompletude dos dados, especialmente nas variáveis socioeconômicas que historicamente apresentam problemas na notificação e mascaram vulnerabilidades sociais.
Conclui-se que a distribuição dos acidentes ofídicos em Minas Gerais segue o perfil nacional tanto na morbimortalidade quanto na caracterização dos casos. Os homens em idade produtiva, com baixa escolaridade e cor parda são as principais vítimas. A maioria dos acidentes ocorre com serpentes dos gêneros Bothrops e Crotalus, no entanto, notadamente os acidentes crotálicos têm maior contribuição relativa em Minas Gerais se comparados a todo o país. A maioria das vítimas recebe atendimento médico entre uma e três horas após o acidente, com alto percentual de casos que evoluem para cura. As áreas de risco se distribuem desigualmente no estado, estando mais concentradas na Zona da Mata, Vale do Rio Doce, Vale do Mucuri e Jequitinhonha, o que demanda investigações adicionais sobre a incidência do ofidismo associada ao perfil produtivo de cada área, à sensibilidade dos serviços de saúde, assim como outros elementos macroestruturantes. A presença de determinantes ambientais e ocupacionais para o risco do envenenamento ofídico no estado, a exemplo do grau de urbanização e trabalho agropecuário, indica que o enfrentamento desse agravo requer ações integradas que ultrapassam o setor saúde.
COPYRIGHT
Copyright© 2022 Resende et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Licença Creative Commons Atribuição que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.
COMITÊ DE ÉTICA
Por se tratar de um estudo com dados de domínio público disponíveis na internet, não foi necessário submeter o protocolo de pesquisa ao Comitê de Ética em Pesquisa.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
FCR participou da concepção e delineamento do estudo, coleta e análise de dados, escrita do artigo. PMT participou da concepção e delineamento do estudo, coleta e análise de dados, revisão crítica do artigo. CDFPPF participou da concepção e delineamento do estudo, coleta e análise de dados, revisão crítica do artigo em inglês. GAC participou da concepção e delineamento do estudo, coleta e análise de dados, escrita do artigo. MDFPPF participou da concepção e delineamento do estudo, coleta e análise de dados, elaboração dos mapas, revisão crítica do artigo. YFM: participou da concepção e delineamento do estudo, análise de dados, e escrita do artigo.
REFERÊNCIAS
1. World Health Organization (WHO). Rabies and envenomings: a neglected public health issue: report of a Consultative Meeting. Geneva: WHO; 2007; [acesso em 2021 Fev 02]. http://www.who.int/bloodproducts/animal_sera/Rabies.pdf
2. Chippaux JP. Snake-bites: appraisal of the global situation. Bull World Health Organ. 1998;76(5):515-24.
3. Kasturiratne A, Wickremasinghe AR, Silva N, Gunawardena NK, Pathmeswaran A, Premaratna R, et al. The global burden of snakebite: a literature analysis and modelling based on regional estimates of envenoming and deaths. PLoS Med. 2008; 5(11):1591-604.
4. Gutiérrez JM, Calvete JJ, Habib AG, Harrison RA, Williams DJ, Warrell DA. Snakebite envenoming. Nat Rev Dis Prim. 2017;3:17063.
5. Schneider MC, Min KD, Hamrick PN, Montebello LR, Ranieri TM, Mardini L, et al. Overview of snakebite in brazil: Possible drivers and a tool for risk mapping. PLoS Negl Trop Dis. 2021;15(1):e0009044.
6. Bochner R, Fiszon JT, Machado C. A profile of snake bites in Brazil, 2001 to 2012. J Clin Toxicol. 2014;4(3):1-7.
7. Malaque CMS, Gutiérrez JM. Snakebite envenomation in central and South America. In: Brent J, Burkhart K, Dargan P, Hatten B, Megarbane B, Palmer R, et al., eds. Critical care toxicology. Switzerland: Springer; 2015. p. 1-22.
8. Feitosa SB, Mise YF, Mota ELA. Ofidismo no Tocantins: análise ecológica de determinantes e áreas de risco, 2007-2015. Epidemiol Serv Saude 2020;29(4):e2020033.
9. Mise YF, Lira-da-Silva RM, Carvalho FM. Agriculture and snakebite in Bahia, Brazil - an ecological study. Ann Agric Environ Med. 2016;23(3):416-9.
10. Bochner R, Struchiner CJ. Aspectos ambientais e sócio-econômicos relacionados à incidência de acidentes ofídicos no Estado do Rio de Janeiro de 1990 a 1996: uma análise exploratória. Cad Saude Publica. 2004;20(4):976-85.
11. Scolforo J, Carvalho L. Mapeamento e inventário da flora nativa e dos reflorestamentos de Minas Gerais. Lavras: Editora UFLA; 2006.
12. Governo do Estado de Minas Gerais (BR). Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais. Plano Diretor de Regionalização da Saúde de Minas Gerais [Internet]. Belo Horizonte: PDR/MG; 2020; [acesso em 2021 Ago 15]. Disponível em: https://www.saude.mg.gov.br/images/1_noticias/10_2020/2_out-nov-dez/28-10_PLANO-DIRETOR-DE-REGIONALIZACAO-DA-SAUDE-DE-MINAS-GERAIS_PDRMG.pdf
13. Ministério da Saúde (BR). Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2020; [acesso em 2021 Mar 15]. Disponível em: http://portalsinan.saude.gov.br/sinan-net
14. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Resultados do Censo Agro 2017 [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2020; [acesso em 2021 Jun 29]. Disponível em: https://censoagro2017.ibge.gov.br/templates/censo_agro/resultadosagro/produtores.html?localidade=31
15. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Classificação e Caracterização dos Espaços Rurais e Urbanos do Brasil | Uma primeira aproximação [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2017; [acesso em 2020 Jun 29]. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/geociencias/organizacao-do-territorio/tipologias-do-territorio/15790-classificacao-e-caracterizacao-dos-espacos-rurais-e-urbanos-do-brasil.html?=&t=downloads
16. Ministério da Saúde (BR). Epidemiologia dos acidentes ofídicos no Brasil em 2020. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2021.
17. Campbell J, Lamar W, Brodie E. Venomous reptiles of the western hemisphere. 2nd ed. Ithaca: Comstock Publishing Associates Cornell University Press; 2004.
18. Bastos EGM, Araújo AFB, Silva HR. Records of the rattlesnakes Crotalus durissus terrificus (Laurenti)(Serpentes, Viperidae) in the State of Rio de Janeiro, Brazil: a possible case of invasion facilitated by deforestation. Rev Bras Zool. 2005 Set;22(3):812-5.
19. Almeida PCR, Prudente ALC, Curcio FF, Rodrigues MTU. Biologia e história natural das cobras-corais. In: Silva Junior NJ, ed. As cobras corais do Brasil: biologia, taxonomia, venenos e envenenamentos. Goiânia: Editora da PUC Goiás; 2016. p. 168-215.
20. Fernandes DS, Franco FL, Fernandes R. Systematic revision of the genus Lachesis Daudin, 1803 (Serpentes, Viperidae). Herpetologica. 2004;60(2):245-60.
21. Fundação Ezequiel Dias (Funed). Soro antibotrópico (pentavalente) e antilaquético [Internet]. Belo Horizonte: Funed: 2020; [acesso em 2020 Nov 17]. Disponível em: http://www.funed.mg.gov.br/wp-content/uploads/2020/04/Bula-para-o-profissional-do-soro-antibotr%C3%B3pico-eantilaqu% C3%A9tico_v16042020.pdf
22. Pathmeswaran A, Kasturiratne A, Fonseka M, Nandasena S, Lalloo DG, Silva HJ. Identifying the biting species in snakebite by clinical features: an epidemiological tool for community surveys. Trans R Soc Trop Med Hyg. 2006;100(9):874-8.
23. Reboita MS, Rodrigues M, Silva LF, Alves MA. Aspectos climáticos do estado de Minas Gerais. Rev Bras Climatol. 2015;17:206-26.
24. Lima JS, Martelli Júnior H, Martelli DRB, Silva MS, Carvalho SFG, Canela JR, et al. Perfil dos acidentes ofídicos no norte do Estado de Minas Gerais, Brasil. Rev Soc Bras Med Trop [Internet]. 2009 Out;42(5):561-4.
25. Reboita MS, Marrafon VHA, Llopart M, Rocha RP. Cenários de mudanças climáticas projetados para o Estado de Minas Gerais. Rev Bras Climatol. 2018;1:110-28.
26. Nunes DCO, Franco PS, Rodrigues VM, Mendes MM. Clinical-epidemiologic aspects of ophidian accidents occurred in Triângulo Mineiro Region, Minas Gerais State, Brazil: retrospective case series. Biosci J. 2014;30(6):1942-51.
27. Mott ML, Alves OSF, Dias CESB, Fernandes CS, Ibañez N. A defesa contra o ofidismo de Vital Brazil e a sua contribuição à Saude Pública Brasileira. Cad Hist Ciênc. 2011;VII(2):89-110.
28. French SS, Webb AC, Hudson SB, Virgin EE. Integrative and comparative biology town and country reptiles: a review of reptilian responses to urbanization. 2018 Jun;58(5):948-66.
29. Borges CC, Sadahiro M, Santos MC. Aspectos epidemiológicos e clínicos dos acidentes ofídicos ocorridos nos municípios do Estado do Amazonas. Rev Soc Bras Med Trop. 1999 Dez;32(6):637-46.
30. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Número de estabelecimentos agropecuários com pessoal ocupado/ Pessoal ocupado em estabelecimentos agropecuários/Número de estabelecimentos agropecuários com pessoal ocupado com laço de parentesco com o produtor/Pessoal ocupado em estabelecimentos agropecuários com laço de parentesco com o produtor, por tipologia, sexo, faixas de idade, condição do produtor em relação às terras e grupos de atividade econômica [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2017; [acesso em 2020 Jun 29]. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/tabela/6884
Copyright 2024 Revista Médica de Minas Gerais
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License