ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
A experiência assistencial da Fhemig na atenção a doenças infecciosas respiratórias agudas durante o enfrentamento da epidemia de Influenza A H1N1, no estado de Minas Gerais em 2009
Fhemig experience in the care of acute respiratory infectious diseases during the fight against the H1N1 Influenza epidemic, in Minas Gerais State in 2009
Adriana Carla de Miranda Magalhães1; Alcy Moreira dos Santos Pereira2; Marcelo Militão Abrantes3; Tânia Maria Marcial4; Valéria de Melo Rodrigues e Oliveira5; Terezinha Finamore6; Gláucia Cota7; Paulo Roberto Lima Carreiro8; Salete Cristina Carvalho9; Verônica Cézar Laranjeira Santos10; Érika Regina Coelho11; Nathália Suelen de Miranda11; Ninon Miranda Fortes12
1. Médica epidemiologista da Diretoria Assistencial
2. Médico clínico, Diretor Assistencial
3. Doutor em Epidemiologia, médico da Diretoria de Assuntos Estratégicos e Pesquisa
4. Médica Infectologista, Gerente Assistencial do Hospital Eduardo de Menezes
5. Médica epidemiologista do Núcleo de Epidemiologia Hospitalar do Hospital Infantil João Paulo II
6. Médica neonatologista, Gerente Assistencial da Maternidade Odete Valadares
7. Médica Infectologista do Hospital Eduardo de Menezes, Coordenadora do ambulatório de Influenza
8. Mestre em Cirurgia, Gerente Assistencial do Hospital João XXIII
9. Enfermeira epidemiologista da Diretoria Assistencial
10. Enfermeira do Grupo de Pesquisa em Economia da Saúde - Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais
11. Acadêmicas de Enfermagem da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
12. Docente da Disciplina Práticas de Administração e Gerenciamento de Enfermagem da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Endereço para correspondência
Adriana Carla de Miranda Magalhães
Alameda Álvaro Celso, 100, Santa Efigênia
Belo Horizonte, Minas Gerais, CEP: 30150-260
Email: adriana.miranda@fhemig.mg.gov.br
Recebido em: 02/12/2009
Aprovado em: 10/12/2009
Instituição: Diretoria Assistencial da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, MG
Resumo
A epidemia pelo vírus influenza A H1N1 no estado de Minas Gerais mobilizou a sociedade e a resposta articulada dos serviços de saúde em ações coordenadas pelo Comitê Estadual.
OBJETIVO: descrever o atendimento ambulatorial e hospitalar para doenças respiratórias infecciosas agudas realizado nas Unidades da rede Fhemig nas semanas epidemiológicas 33 a 41 de 2009.
MÉTODO: estudo prospectivo de dados fornecidos semanalmente pelas unidades assistenciais à administração central, para fins de monitoramento e gestão da clínica.
RESULTADOS: ocorreu um total de 1.396 atendimentos no período em 11 unidades na região metropolitana de Belo Horizonte e interior do estado, com 29% de internações em enfermarias e 6,7% em CTI, predomínio de pacientes de 15-24 anos, 42,4% sem fatores de risco para complicações e 2,4% de óbitos; 50% (698) dos casos receberam antiviral oseltamivir. O pico de atendimentos ocorreu na 35ª semana (entre 30/08 e 05/09/2009). Confirmou-se influenza A H1N1 em 2,4% dos casos atendidos e 399 exames permaneciam pendentes. Insuficiência renal dialítica, uso de ventilação mecânica e vasopressores foram preditores de óbito. Pneumonia associada à ventilação elevou o risco de óbito em 76% (RR:1,76; IC95% 1,07-2,88).
CONCLUSÃO: a Fhemig participou de forma articulada no processo assistencial durante a epidemia e desenvolveu mecanismos de gestão da clínica de forma a garantir a qualidade assistencial e responder à demanda da sociedade, junto com os demais parceiros.
Palavras-chave: Influenza Humana; Vírus da Influenza A; Vírus da Influenza A Subtipo H1N1
INTRODUÇÃO
A rápida expansão da primeira pandemia de influenza do século XXI pelo vírus Influenza A H1N1 pandêmico 2009, favorecida pela globalização e rapidez de deslocamento propiciado pelos meios de transporte modernos, trouxe significativo desafio de enfrentamento mundial, articulado pela Organização Mundial de Saúde (OMS)1.
A introdução e circulação do novo vírus no hemisfério sul e no Brasil durante o inverno, coincidindo com período de aumento de circulação de vírus sazonais, representaram desafio adicional na atenção à saúde, com pronta resposta organizada pelo Ministério e Secretarias de Saúde no país.2,3
Os planos previamente elaborados com a síndrome respiratória aguda grave, em 2003, e a gripe aviária, em 20064, foram fundamentais na preparação do sistema para esse enfrentamento. O Comitê Estadual, instância colegiada da qual participam todas as instituições parceiras nesse desafio, estabeleceu as estratégias para controle da epidemia, conforme as diretrizes ministeriais adaptadas às peculiaridades do estado de Minas.
MATERIAL E MÉTODOS
A Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) é a maior rede de hospitais públicos do país, integrando o Sistema Único de Saúde (SUS) com 20 unidades assistenciais, sendo nove localizadas no interior do estado e 11 na região metropolitana de Belo Horizonte, distribuídas em seis das 13 macrorregiões de saúde do estado. Constitui-se pela administração central e seis complexos assistenciais formados por unidades com perfil e missão assistencial semelhantes nas áreas de urgência e emergência, hospitais especializados, unidades de recuperação e cuidado ao idoso, saúde mental, hospitais gerais e o Complexo MG-Transplante. Oferece serviços de referência na assistência hospitalar de complexidade secundária e terciária, em consonância com a Política Estadual de Saúde.5
As unidades assistenciais distribuem-se nos complexos da seguinte forma:
Urgência e emergência: Hospital João XXIII (HJXXIII), Unidade Ortopédica Galba Velloso, Hospital Maria Amélia Lins, Hospital Infantil João Paulo II (HIJPII), Hospital Cristiano Machado (HCM) - Sabará;
especialidades: Maternidade Odete Valadares (MOV), Hospital Eduardo de Menezes (HEM), Hospital Alberto Cavalcanti (HAC);
saúde mental: Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena (CHPB), Centro Mineiro de Toxicomania, Centro Psíquico da Adolescência e Infância, Hospital Galba Velloso, Instituto Raul Soares;
hospitais gerais: Hospital Júlia Kubitschek (HJK), Hospital Regional Antônio Dias (HRAD), Hospital Regional João Penido (HRJP), Hospital Regional de Barbacena (HRB);
reabilitação e cuidado ao idoso: Casa de Saúde São Francisco de Assis (CSSFA) - Bambuí, Casa de Saúde Santa Izabel (CSSI) - Betim, Casa de Saúde Santa Fé (CSSFÉ) - Três Corações, Casa de Saúde Padre Damião (CSPD) - Ubá.5
MONITORAMENTO/GESTÃO DA CLÍNICA
A partir da definição do Ministério da Saúde da necessidade de isolamento por contato e gotículas para casos suspeitos de influenza A H1N1 e casos de síndrome respiratória aguda grave6, oito unidades assistenciais da Fhemig definiram setores específicos para internação desses pacientes, conforme orientações da diretoria assistencial e demanda do Comitê Estadual. Foram constituídas comissões multidisciplinares de enfrentamento da epidemia de influenza A H1N1, definidos protocolos clínicos para atenção domiciliar, internação em enfermarias e terapia intensiva, além de normatização de biossegurança.7
Os protocolos foram submetidos à validação externa pelo Departamento de Doenças Infecciosas e Parasitárias da Universidade Federal de Minas Gerais, Sociedade Mineira de Infectologia e Sociedade Mineira de Terapia Intensiva.7,8
Determinou-se que em todas as unidades da Fhemig fosse realizado o monitoramento da assistência prestada aos pacientes atendidos nos níveis ambulatorial e hospitalar com quadros de síndrome gripal, síndrome respiratória aguda grave (SRAG) e suspeitos de influenza A H1N1 pandêmica, por meio da notificação de variáveis identificadoras dos pacientes, causa do atendimento, fatores de risco conhecidos para complicações por influenza, história de contato ou vínculo epidemiológico, realização de pesquisa virológica, uso de antiviral, pneumonia à admissão, uso de ventilação mecânica, vasopressores e terapias dialíticas em terapia intensiva, desenvolvimento de pneumonia associada à ventilação mecânica e desfecho do atendimento, conforme definições no Anexo A, referenciadas nos protocolos do Ministério da Saúde e relatos clínicos prévios.6,9-11
Os conceitos e instrumento de coleta eletrônico foram padronizados e encaminhados às unidades para preenchimento diário a partir da zero hora do dia 17/08/2009 e envio semanal à administração central.
Essas informações foram monitoradas com o objetivo de planejamento e avaliação do processo assistencial desenvolvido e envio de sinopse descritiva às unidades. São objeto de avaliação no presente trabalho os atendimentos realizados de 17 de agosto a 17 de outubro de 2009, referentes às semanas epidemiológicas 33 a 41, não tendo sido excluídas da análise notificações com dados incompletos.
Os resultados de pesquisa virológica foram fornecidos pela Gerência de Vigilância Epidemiológica da Superintendência de Vigilância em Saúde em 19 de outubro 2009, com dados preenchidos na administração central.
Utilizou-se para construção e análise do banco de dados os programas Excel 5.0 e EPI-INFO versão 2000. Aplicaram-se técnicas de estatística descritiva, avaliação de magnitude de associações com base em odds ratio e risco relativo (RR) e testes de x2 com correção de Yates ou teste exato de Fisher, quando indicado, em análises univariadas. Em análise bivariada, utilizou-se teste de Mantel-Haenszel. O nível de significância foi de 5%.
RESULTADOS
Atendimento ambulatorial
A Fhemig realizou 984 consultas ambulatoriais para casos de síndromes gripais e outras síndromes infecciosas respiratórias agudas durante o período, em 11 de suas unidades assistenciais, conforme Tabela 1.
O ambulatório especializado do Hospital Eduardo de Menezes (HEM) e o Pronto-Atendimento do Hospital Júlia Kubistchek (HJK) foram responsáveis por 59,4% das consultas realizadas. Os atendimentos notificados no HIJPII referem-se apenas aos casos suspeitos de influenza A H1N1.
Dos pacientes atendidos, 61% (599) eram do sexo feminino, com predomínio de casos nas faixas etárias de 5-49 anos concentrando 84,6% dos atendimentos (Tabela 2).
As síndromes gripais ocasionaram 81,9% das consultas e a síndrome respiratória aguda grave (SRAG) 7,3% (Tabela 3), resultando em informação de pesquisa de influenza em 73 pacientes (7,4%) e prescrição de antiviral oseltamivir em 368 (36,8% dos atendidos).
Excluídos da análise 16 casos sem informação de síndrome clínica.
As situações de risco de complicação em infecção pelo vírus Influenza ocorreram em pelo menos 30% dos casos atendidos, sendo a gestação e as doenças do aparelho respiratório as mais frequentes (Tabela 4).
Em 134 (13,6%) pacientes houve contato com casos suspeitos ou confirmados, em 181 (18,4%) não ocorreu contato, em 669 (68%) não se verificou contato próximo, mas era procedente de área considerada afetada.
Os resultados da pesquisa virológica e sua distribuição conforme história de exposição encontram-se na Tabela 5. O baixo número de casos positivos (oito) não permitiu avaliação da associação entre história de contato e positividade para H1N1, com significância estatística.
Entre os casos positivos para H1N1, sete tiveram manifestação clínica de síndrome gripal e um caso de SRAG; o único caso positivo para influenza A sasazonal apresentou quadro de infecção aguda de vias aéreas semelhante a resfriado comum; e dos cinco casos com resultado negativo para influenza A, um teve SRAG e quatro, síndrome gripal.
Quanto ao desfecho do atendimento ambulatorial, a maioria dos casos (63,2%) recebeu alta após a primeira consulta, 8,6% demandaram retorno e 12,1% foram encaminhados para atenção em outros serviços; 7,5% dos atendidos foram encaminhados para internação em enfermaria e CTI (Tabela 6).
O pico de atendimentos ambulatoriais ocorreu na 35ª semana epidemiológica, correspondendo aos dias 30 de agosto a 05 de novembro de 2009, conforme Figura 1.
Internações em enfermarias
Foram notificadas 332 internações no período, com distribuição por unidades, conforme Tabela 7, predominando internações pediátricas.
Houve distribuição homogênea de internações na distribuição por sexo (52,7% do sexo feminino, valor p=0,162) e as internações se concentraram nas faixas etárias de menores de dois anos, de 5-24 anos e 30-49 anos (Tabela 8).
A maior frequência das internações foi devida à própria síndrome gripal em pacientes com fatores de risco para complicações (Tabela 9) e a complicação por pneumonia bacteriana foi responsável por 15,6% das internações. Em 174 casos houve informação quanto à presença desses fatores de risco, além da idade inferior a dois anos ou superior a 60 anos, sendo em ordem decrescente: 41 doenças respiratórias (23%), 29 gestantes (15,5%), 14 outras (8%), 13 imunossupressões primárias ou secundárias (6,3%), 11 doenças cardíacas (5,2%) e 10 doenças metabólicas (5,2%). Em 60 pacientes (34,5%) não foi identificada situação de risco e quatro apresentaram duas situações de risco associadas.
Em 76,3% dos casos internados houve prescrição de antiviral (Tabela 10) e em apenas 76 (25,7%) foi fornecida informação sobre uso de antimicrobianos. Nesses 76 casos, 82% (62) utilizaram antimicrobianos.
As internações tiveram média de permanência de 4,4 ± 3, 4 dias (0-26 dias), com necessidade de cuidados intermediários ou terapia intensiva em 14 casos (4,2%) e alta até a data da informação em 68,7% (Tabela 11).
O resultado de estudo virológico encontrava-se disponível até 19 de outubro para 12,7% dos casos, conforme Tabela 12.
Dos 19 pacientes com teste positivo para influenza A H1N1, 15 (78,9%) receberam alta, dois foram transferidos para CTI, um para cuidados semi-intensivo e um caso permanecia internado.
Dos 19 pacientes com pesquisa negativa para influenza A, 12 receberam alta, dois cuidados semiintensivos e cinco permaneciam internados.
Apenas três pacientes foram identificados com vírus influenza A sazonal, tendo dois recebido alta e um, cuidados semi-intensivos.
Dos 290 casos nos quais não havia informação sobre resultado de pesquisa virológica, quatro evoluíram para óbito, sete cuidados semi-intensivos e um necessitou de terapia intensiva; 197 (68,4%) receberam alta.
A curva de frequência de casos internados também apresentou pico de internação na semana epidemiológica 35 (Figura 2), com decréscimo nas semanas seguintes.
Internações em terapia intensiva de pacientes adultos
Foram notificadas 61 internações em Centros de Terapia Intensiva de Adultos em pacientes com SRAG e quadros críticos associados a infecções pulmonares em seis dos nove CTIs de pacientes adultos da Fhemig (Tabela 13).
Houve predomínio de internações em pacientes do sexo masculino (55,4%), p=0,256, em 56 pacientes com informação sobre o sexo. A média de idade foi de 44,7 ± 18,2 anos, mediana de 43 anos, mínima de 15 e máxima de 88 anos.
A principal causa de admissão em terapia intensiva foi insuficiência respiratória (91,1%), com 68,9% (42) dos casos internados demandando ventilação mecânica (Tabela 14). Pelo menos 27 (44%) pacientes foram considerados com pneumonia bacteriana à admissão por critérios clínico-laboratoriais.
Em 35% dos casos não foram diagnosticadas situações de risco de evolução complicada de infecção por influenza. Entre as situações de risco identificadas, as doenças respiratórias foram as mais frequentes (20%) (Tabela 15).
Dos 42 pacientes submetidos à ventilação mecânica, 10 (23,8%) desenvolveram pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV); 54% necessitaram de vasopressores durante a internação, denotando evolução com instabilidade hemodinâmica; e 32,1% dos casos informados (56) evoluíram com insuficiência renal, necessitando de terapia dialítica com hemodiálise ou hemofiltração.
Houve utilização do antiviral oseltamivir em 51 (84%) pacientes e constatou-se evolução para óbito em 29 (55,8%) dos 52 com alta definida na data da notificação. Houve resultados virológicos disponíveis em 14 (22,9%) dos 61 pacientes, sendo seis positivos para influenza A H1N1, seis negativos para influenza A, um caso de influenza A sazonal e um indeterminado.
A média de permanência global foi de 9,7 ± 9,11 dias (0-45 dias), sendo de 8,22 ± 5,79 dias nos pacientes que receberam alta e 10,9 ± 10,9 dias entre os pacientes que evoluíram para óbito.
O uso de vasopressores, insuficiência renal dialítica e necessidade de ventilação mecânica estiveram associados de forma estatisticamente significativa ao risco de óbito, em análise univariada (Tabela 16).
Em análise estratificada para ocorrência de PAV em pacientes com insuficiência respiratória, a pneumonia associada à ventilação aumentou em 76% o risco de óbito com RR de 1,76; IC 95% (1,07-2,88), valor p=0,045.
Registrou-se maior concentração de admissões em terapia intensiva na última semana de agosto e primeira semana de setembro (23/08 a 05/09/09), correspondendo às semanas epidemiológicas 34 e 35 (Figura 3).
Internações em CTI pediátrico e neonatal
Verificaram-se 19 internações pediátricas e neonatais em quatro unidades da Fhemig durante o período (Tabela 17).
Houve 10 admissões em crianças do sexo feminino e nove do sexo masculino; e 79% das admissões ocorreram em crianças < 1 ano de idade (Tabela 18).
A principal causa de internação foi insuficiência respiratória (68,4%); e entre as situações de risco, além do fator idade, a mais frequente foram doenças respiratórias (Tabelas 19 e 20).
Foi notificada pneumonia bacteriana à admissão em quatro (21%) dos pacientes e indicação de ventilação mecânica em 10 (52,6%).
Não houve notificação de pneumonia associada à ventilação mecânica, 31,6% dos casos necessitaram de vasopressores.
Em 13 de 16 pacientes (81,3%) administrou-se antiviral e não houve notificação de óbitos nessa população. A média de permanência foi de 11,4 ± 3, 7 dias (8-16 dias).
Foram disponibilizados 12 resultados de pesquisa virológica com sete resultados positivos para influenza A sazonal, quatro influenza A negativo e um positivo para influenza A H1N1 em criança de seis anos que necessitou de vasopressores e ventilação mecânica.
A mais alta frequência de internações ocorreu no mês de agosto (Figura 4).
DISCUSSÃO
A epidemia pelo vírus Influenza A H1N1 pandêmico no Brasil e demais países do hemisfério sul coincidiu com o período de maior circulação dos vírus de influenza sazonal e demais vírus associados a infecções respiratórias, com maior concentração de casos no final do mês de julho e início de agosto (semanas epidemiológicas 31 e 32).12
Desta forma, a experiência aqui apresentada reflete o aumento de demanda nos serviços de saúde no estado, tanto devido às infecções respiratórias por agentes já circulantes na comunidade quanto à introdução do novo vírus.
Os dados apresentados têm como limitação o sistema de coleta utilizado, dependente da notificação pelas unidades assistenciais. Entretanto, esse monitoramento mostrou-se instrumento ágil para avaliação e gestão da clínica e planejamento gerencial em uma organização de tal complexidade no SUS.
A escassez de informações dos resultados laboratoriais de exames virológicos limitou a análise de riscos de complicações, desfechos e letalidade hospitalar por infecções pelo H1N1 pandêmico 2009. Do total de 1.396 casos atendidos em ambulatórios e internações, foram identificados 34 (2,43%) de influenza A H1N1, 12 (0,85%) de influenza sazonal e 399 resultados pendentes.
Essa limitação de informações microbiológicas também é fator limitante para melhor compreensão da dinâmica de transmissão e prevalência da circulação da cepa pandêmica no país, dado que o Sistema de Vigilância Sentinela - Sivep Gripe -ainda não apresenta essa análise, estando os resultados limitados à técnica de imunofluorescência indireta, que não permite a identificação do subtipo H1N1.12
Na semana epidemiológica 33 (16/8 a 22/8/2009), 60% dos vírus respiratórios identificados de síndromes gripais na comunidade constituíram influenza A (cepas sazonais e pandêmica). Caso a proporção entre as cepas se aproxime da mesma distribuição encontrada na SRAG (85% influenza A sendo H1N1), teremos a proporção de H1N1 de 51% em síndromes gripais da comunidade, no país.
Em Minas Gerais, a proporção de H1N1 em SRAG foi menor que a média nacional, tanto na semana 33 (75%) quanto na semana 44 (75,4%), podendo refletir menor circulação regional do vírus, atraso nos resultados e notificações13, ou ainda, diferenças na evolução clínica.
O período avaliado coincide com semanas de maior demanda de internação por pneumonia ou influenza em Belo Horizonte (das semanas 24 a 39) e no estado, bem como período de aumento de número de óbitos no estado14, entretanto, o pico de ocorrência de SRAG no país, nas semanas 31 e 32, antecedeu ao período relatado13.
O mais alto número de atendimentos ambulatoriais e internações notificados nos hospitais localizados em Belo Horizonte e Juiz de Fora corresponde também a municípios mais afetados no estado, nos quais existem hospitais da Fhemig.
O baixo número de notificações ambulatoriais de atendimento pediátrico no HIJPII foi restrito a casos graves e suspeitos de H1N1 por vínculo epidemiológico, não refletindo a demanda de atendimento por infecções em vias aéreas superiores nessa população.
O predomínio de atendimentos ambulatoriais nas faixas etárias de 15 a 49 anos se superpõe à faixa etária de casos confirmados no país e no estado.13,14 As internações em CTI de menores de um ano estiveram mais associadas ao vírus sazonal que ao pandêmico e está em concordância com a baixa incidência de confirmação de casos nessa faixa etária no estado.14
Quanto à demanda de internação, 29% necessitaram de internação em enfermarias e 6,7% em terapia intensiva ou semi-intensiva, no percentual de internações pelo vírus Influenza A H1N1 pandêmico em outros países, apesar desse relato provavelmente incluir outros agentes etiológicos circulantes.15
Entre os fatores de risco associados às complicações na infecção pelo vírus Influenza, a gestação foi o fator prevalente no atendimento ambulatorial; e as comorbidades respiratórias, nas internações em enfermarias e terapia intensiva. Essa frequência dos atendimentos a gestantes pode ser justificada pela atenção diferenciada dada às síndromes gripais nessas pacientes pelo protocolo estadual, que priorizou-lhes a avaliação médica e o pronto tratamento antiviral devido às evidências de risco específico e diferenciado de complicações nessa população.17-19 A complicação com pneumonia bacteriana foi um evento frequente, levando à internação em terapia intensiva de adultos em grande proporção dos casos (44%).
A evolução com insuficiência renal, uso de vasopressores e ventilação mecânica denotando instabilidade hemodinâmica e respiratória foi fator significativamente associado ao óbito, podendo representar evolução de choque séptico por complicações bacterianas19 e não necessariamente pneumonia viral grave. Da mesma forma, o diagnóstico de pneumonia associada à ventilação mecânica associada à insuficiência respiratória elevou de forma significativa o risco de óbito, salientando a necessidade de aplicação rigorosa das medidas preventivas para minimizar essa complicação de infecção relacionada à assistência.
Estoque de antiviral foi disponibilizado em todos os hospitais, sendo a utilização recomendada conforme protocolo estadual, a despeito de disponibilidade de resultados virológicos17. Em estudo específico de 522 formulários avaliados, a Comissão Central de Protocolos Clínicos notificou conformidade de prescrição com os critérios e posologia preconizada em 86,8% dos formulários.20
A maior frequência de influenza A sazonal isolada na população pediátrica até seis anos, em terapia intensiva, sugere que a circulação do vírus Influenza A H1N1 ainda não seja prevalente nessa faixa etária em Minas Gerais14, mas dados mais robustos são necessários para essa avaliação.
CONCLUSÕES
O enfrentamento da epidemia de influenza A H1N1 no país e no estado coincidiu com o período de aumento de circulação de outros vírus respiratórios sazonais, demandando mobilização articulada dos serviços de saúde nos aspectos assistenciais, epidemiológicos, de comunicação e educação em saúde. A Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, como rede assistencial articulada do SUS no estado, respondeu prontamente a essa demanda, cumprindo seu papel frente à sociedade. Estado de alerta e vigilância deve ser mantido para responder à recirculação do vírus em ondas posteriores.
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20. Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais-FHEMIG. Diretoria Assistencial. Relatório Preliminar das Ações Desenvolvidas pela Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais, para o Enfrentamento da Epidemia pelo Vírus da Influenza A H1N1 no Estado de Minas Gerais, em 2009. Belo Horizonte: DIRASS; out 2009.
ANEXO A - DEFINIÇÃO DE TERMOS UTILIZADOS PARA INFORMAÇÕES ASSISTENCIAIS DE ATENDIMENTO ÀS DOENÇAS RESPIRATÓRIAS AGUDAS NAS UNIDADES DA REDE FHEMIG
História de contato: registro de contato próximo nos últimos sete dias com casos suspeitos ou confirmados de infecção por Influenza A H1N1 ou procedência nos últimos sete dias de área com transmissão autóctone ou residência em área com transmissão autóctone definida. C (caso confirmado), S (caso suspeito), A (área afetada - residência ou procedência), D (desconhecido). Em caso de indivíduo residente/procedente de área com transmissão autóctone e contato com caso confirmado ou suspeito, utilizar preferencialmente C ou S, na classificação. D (desconhecido) aplica-se à ausência da história de contato, em indivíduo procedente de área sem diagnóstico epidemiológico de transmissão autóctone.
Contato próximo: é considerado contato próximo o indivíduo exposto ao cuidar, conviver na mesma casa ou ambiente de trabalho ou sala de aula, encostar diretamente em secreções respiratórias ou viajar no mesmo carro, ônibus ou cabine de embarcação e, em caso de viagem aérea, ter estado na mesma fileira ou nas fileiras laterais ou até duas fileiras anteriores ou posteriores ao caso suspeito/confirmado de infecção por Influenza A H1N1; durante o período de transmissibilidade, isto é, um dia antes até sete (adultos) a 14 dias (crianças) após o início de sintomas.
Transmissão autóctone: presença de casos confirmados de infecção por Influenza A H1N1, sem histórico de viagens a áreas afetadas ou com contatos de casos confirmados importados.
Síndrome gripal: definida em indivíduos com doença aguda (com duração máxima de cinco dias), apresentando febre (ainda que referida) acompanhada de tosse ou dor de garganta, na ausência de outros diagnósticos.
Síndrome respiratória aguda grave: definida em indivíduo de qualquer idade com doença respiratória aguda caracterizada por febre superior a 38ºC, tosse E dispneia, acompanhada ou não de manifestações gastrointestinais ou dos seguintes sinais e sintomas:
a) Aumento da frequência respiratória (> 25 IRPMs - incursões respiratórias por minuto);
b) hipotensão em relação à pressão arterial habitual do paciente;
c) em crianças, além desses itens, observar também: batimentos de asa de nariz, cianose, tiragem intercostal, desidratação e inapetência.
Outras infecções respiratórias agudas:
J00 Nasofaringite aguda (resfriado comum)
J02.9 Faringite aguda não especificada
J03.9 Amigdalite aguda não especificada
J04.0 Laringite aguda
J04.1 Traqueíte aguda
J04.2 Laringotraqueíte aguda
J06 Infecção aguda das vias aéreas superiores de localizações múltiplas e não especificadas
Situação de risco: compreendem os seguintes grupos e fatores de risco definidos pelo Ministério da Saúde:
- Grupo de risco: pessoas que apresentam as seguintes condições clínicas:
Imunodepressão: por exemplo, indivíduos transplantados, pacientes com câncer, em tratamento para AIDS ou em uso de medicação imunossupressora;
condições crônicas: por exemplo, hemoglobinopatias, cardiopatias, pneumopatias, doenças renais crônicas, doenças metabólicas (diabetes mellitus e obesidade móbida (índice de massa corporal > 40)
Fatores de risco:
Idade: inferior a dois ou superior a 60 anos de idade;
gestação: independente da idade gestacional;
pesquisa de influenza A: realização de coleta de aspirado de nasofaringe ou suabe combinado ou aspirado traqueal, encaminhado para realização de RT-PCR para pesquisa de vírus Influenza.
Pneumonia bacteriana à admissão: diagnóstico definido pelo médico-assistente, com prescrição de antibioticoterapia para agentes etiológicos de pneumonia bacteriana.
Uso de vasopressores/inotrópicos: utilização de qualquer amina vasoativa durante a permanência no CTI.
Pneumonia associada à ventilação: suspeição e tratamento de pneumonia bacteriana após 72 horas de ventilação mecânica.
Terapia renal substitutiva: utilização de métodos dialíticos ou de hemofiltração devido à insuficiência renal aguda, durante permanência no CTI.
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