ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Mortalidade Prematura por Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT) em Minas Gerais no Período de 2011 a 2019: Análise Comparativa das Macrorregiões do Estado
Premature Mortality Due to Chronic Non-communicable Diseases (NCD) in Minas Gerais From 2011 to 2019: Comparative Analysis of the State´s Macroregions
Barbara Carolina Ferreira Martins; Carlos Eduardo Vidal Leal; Juliana Dias Moreira Caetano; Juliana Maria Mendes de Araújo; Laura Tanos Gomes; Lêda Mendes Pereira
Faculdade de Medicina de Barbacena. Barbacena, MG-Brasil
Endereço para correspondênciaJuliana Dias Moreira Caetano
E-mail: julianadmc.aluna@funjob.edu.br
Resumo
INTRODUÇÃO: As Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) - tumores, diabetes, doenças cardiovasculares e respiratórias crônicas - representam um problema de saúde pública devido às elevadas taxas de mortalidade e impactos socioeconômicos. Em Minas Gerais essas doenças possuem altas taxas de morbimortalidade.
OBJETIVOS: Verificar as taxas de mortalidade por DCNT nas 14 macrorregiões de saúde de MG.
METODOLOGIA: Estudo observacional ecológico, utilizando dados do DATASUS, com indivíduos de ambos os sexos na faixa etária de 30 a 69 anos, nas macrorregiões de MG entre 2011 e 2019. Para calcular as taxas de mortalidade, foram efetuadas correções para causas mal definidas e para o sub-registro de óbitos informados. Resultados: No período estudado ocorreram 1.182.570 óbitos em MG, em todas as faixas etárias, predominantemente no sexo masculino (55,9%). Do total, 713.025 (60,3%) foram de mortes pelas quatro principais DCNT. As doenças cardiovasculares e neoplasias representaram as principais causas de mortalidade no estado, sendo verificado crescimento do número de óbitos por doenças respiratórias em todas as macrorregiões. Observou-se diferenças nos coeficientes entre as regiões estudadas na comparação das médias trienais. O percentual de mortes por causas mal definidas diminuiu ao longo da série histórica, passando de 10,6% em 2011 para 6,9% em 2019, significando melhora na qualidade do preenchimento da declaração de óbito.
CONCLUSÃO: O presente estudo apontou redução das taxas de mortalidade prematura em MG na maioria das macrorregiões, mas é necessário aumentar a adesão dos pacientes aos serviços primários, fortalecimento dos cuidados na atenção básica e implantação de ações de promoção à saúde.
Palavras-chave: Doenças não Transmissíveis. Doenças Crônicas. Mortalidade por Faixa Etária.
INTRODUÇÃO
As Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) - doenças cardiovasculares, câncer, diabetes e doenças respiratórias crônicas - constituem um grave problema de saúde pública, sendo responsáveis por cerca de 70% da mortalidade no mundo, estimando-se cerca de 40 milhões de mortes anuais. Dessas, aproximadamente 80% ocorrem em países de baixa e média renda, sendo que um terço acomete indivíduos na faixa etária de 30 a 69 anos, ou seja, são causas prematuras de óbito.1,2 Associado às repercussões negativas das elevadas taxas de mortalidade, estima-se que essas patologias provoquem gastos de US$ 7 trilhões, nesses países,3 durante os anos de 2011 a 2025. Esses dados parecem refletir a incapacidade de algumas nações em gerir medidas de prevenção e controle de doenças, incluindo operações de monitoramento e vigilância. Além disso, infere-se que, pela falta de investimentos em prevenção e promoção da saúde, tratamento e de mecanismos de regulação, 15 milhões de pessoas continuarão a morrer prematuramente por DCNT anualmente em âmbito global.4
Baseado nesses altos índices, o Brasil, em 2011, elaborou o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis,5 com diretrizes que objetivavam reduzir as mortes por essas causas em 2% ao ano. Esse Plano foi de fundamental importância, uma vez que as DCNT agravam as desigualdades sociais existentes no país e culminam em um ciclo vicioso da pobreza, resultando na perda de produtividade, faltas ao trabalho, maiores gastos assistenciais e previdenciários.2 Dados de 2019 mostraram que as doenças cardiovasculares, os diversos tipos de câncer, o diabetes e as doenças respiratórias crônicas foram responsáveis, respectivamente, por 381.428, 246.044, 90.747 e 70.780 mortes.6
Estudo publicado em 2015 verificou a tendência de mortalidade prematura por DCNT nos estados brasileiros e apontou cenários de cumprimento ou não da meta de redução da mortalidade definida no Plano de Enfrentamento. Considerando-se todos os grupos de DCNT, apenas os estados do Amapá, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Santa Catarina, Distrito Federal e Espírito Santo apresentaram cenário favorável. A análise dos óbitos por cada uma das doenças separadamente foi variável, mas predominou o cenário desfavorável na maioria dos estados. Especificamente no caso das neoplasias, nenhuma unidade federada apresentou cenário favorável.7
Em Minas Gerais as DCNT ficaram entre as causas mais frequentes de internação hospitalar, junto com as internações obstétricas e aquelas por causas externas, no período de 2010 a 2017, destacando-se as doenças do Aparelho Circulatório (12,7%), doenças do Aparelho Respiratório (11,3%) e Neoplasias (6,6%). No mesmo período, as principais causas de óbitos foram as doenças cardiovasculares (41,0%), seguidas por neoplasias (25,0%), doenças respiratórias (18,0%) e doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas (9,0).8 Todas essas doenças apresentam fatores de risco passíveis de modificação, como tabagismo, obesidade, abuso de bebidas alcoólicas, entre outros, os quais, se controlados, podem reduzir a morbimortalidade por esses agravos.1
A distribuição desses óbitos não foi homogênea entre as diversas Unidades Regionais de Saúde de Minas Gerais no mesmo período considerado e nem na comparação dos anos inicial e final do estudo. É provável que essa não homogeneidade tenha relação com as diferenças socioeconômicas existentes entre as macrorregiões de saúde mineiras.9,10
Com base nos dados acima e devido à escassez de estudos específicos sobre mortalidade prematura em Minas Gerais, o presente trabalho objetiva verificar as taxas de mortalidade por DCNT nas 14 macrorregiões de saúde do estado, a distribuição dos óbitos por faixa etária e sexo e a mortalidade proporcional das DCNT entre indivíduos com idade entre 30 e 69 anos, considerando os triênios de 2011-2013 e 2017-2019.
2. MÉTODOS
2.1 Desenho do estudo e local do estudo
Estudo observacional ecológico, onde foram verificados os coeficientes de mortalidade prematura por doenças crônicas não-transmissíveis (Neoplasias, Diabetes, Doenças Cardiovasculares e Respiratórias) em indivíduos de ambos os sexos, com idade entre 30 e 69 anos nas macrorregiões de saúde de MG no período de 2011 a 2019. As unidades de análise foram o estado de MG como um todo e as suas 14 macrorregiões de saúde, cuja população total estimada variou de 20.096.163 em 2011 a 21.168.791 habitantes em 201911, distribuídos em 853 municípios. Considerando-se apenas os indivíduos na faixa etária de 30 a 69 anos estima-se 9.303.904 e 10.707.211 habitantes, respectivamente, em 2011 e 2019. Essas macrorregiões possuem características distintas quanto à densidade demográfica e condições socioeconômicas. As regiões situadas ao norte do estado (Norte, Noroeste, Nordeste e Jequitinhonha), concentram municípios com situação socioeconômica menos favorecidas, agrupam pequena população em grande extensão territorial, apresentam maiores carências e baixos indicadores de desenvolvimento. Ao contrário, as regiões ao sul e ao centro, bem como o triângulo mineiro, se destacam por maior desenvolvimento econômico e social. Essas desigualdades têm reflexos semelhantes na área da saúde, ocorrendo maior concentração de serviços e recursos humanos especializados nas regiões centrais e ao sul do estado10 o que pode ocasionar discrepâncias nos indicadores epidemiológicos entre as macrorregiões estaduais.
A população estudada foi a de indivíduos de ambos os sexos com idade entre 30 e 69 anos, divididos nas seguintes faixas etárias: 30-39, 40-49, 50-59 e 60-69 anos, conforme a metodologia proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS)12, que considera os óbitos em pessoas com 30 anos ou mais em intervalos de 10 anos até 69 anos de idade. Os percentuais referentes à composição etária exibiram pequena diferença dentro e entre cada macrorregião no período considerado, com exceção da faixa etária de 30 a 39 anos, que mostrou maiores percentuais nas macros Norte e Jequitinhonha quando comparados às demais regiões, sendo a variação máxima de 4,5% e 5,0%, respectivamente, nos sexos masculino e feminino. Esses dados são apresentados no quadro abaixo.
Foram verificados os números absolutos de mortes pelas seguintes causas e de acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID)13: neoplasias (C00-C97), diabetes mellitus (E10-E14), doenças cardiovasculares (I00-I99) e doenças respiratórias crônicas (J30-J98). Foram calculados os coeficientes médios de mortalidade no primeiro e terceiro triênios (2011 a 2013 e 2017 a 2019) para cada macrorregião e os coeficientes de mortalidade de acordo com o sexo e idade. A variação percentual das taxas foi realizada considerando-se os anos inicial e final da série. Devido à diferença populacional entre as macrorregiões optou-se por analisar os dados agregados por triênios.14
Foram calculados os percentuais de morte por DCNT para cada macrorregião, por sexo e faixa etária, e a distribuição das mortes por DCNT e por causas mal definidas (CMD) - por triênio e de acordo com o sexo. O indicador utilizado para analisar a completude do preenchimento da causa básica de óbito foi a Proporção de Óbitos por Causas Mal Definidas (PCMD).14
Para calcular as taxas de mortalidade, foram efetuadas correções para causas mal definidas e para o sub-registro de óbitos informados. As redistribuições dos óbitos por causas mal definidas foram realizadas proporcionalmente, entre todas as causas definidas de óbitos, exceto para as causas externas de mortalidade (capítulo XX da CID 10). As taxas brutas de mortalidade foram padronizadas calculadas pelo método direto, utilizando-se como padrão a população brasileira de 2010.15
Os dados foram obtidos do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS).11 O cálculo da população foi realizado com base nos dados obtidos do DATASUS e por meio das estimativas e projeções populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)15. A coleta dos dados encerrou-se em janeiro de 2022, considerando as ocorrências compreendidas no período de 2011 a 2019.
2.2 Análise dos dados
Os dados foram colhidos em formulário próprio, criado para tal finalidade pelos pesquisadores, e digitados em planilhas no programa Excel. A análise estatística foi realizada no software StatisticalPackage for the Social Sciences (SPSS), versão 17.0. O nível de significância adotado foi de 5%.
2.3 Considerações éticas
Por se tratar de pesquisa que utilizou informações de acesso público e banco de dados sem possibilidade de identificação individual, não houve necessidade de submissão do estudo ao Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), conforme Resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde.
3.RESULTADOS
No período de 2011 a 2019 ocorreram 1.182.570 óbitos em Minas Gerais, em todas as faixas etárias, sendo 55,9% de indivíduos do sexo masculino (661.672). Do total, 713.025 (60,3%) foram de mortes pelas quatro principais DCNT (Neoplasias, Diabetes, Doenças Cardiovasculares e Respiratórias Crônicas), com maior ocorrência no sexo masculino, 56,1% (370811). Os óbitos correspondentes à faixa etária de 30 a 69 anos, por todas as causas, totalizaram 487.268 (41,2%). Considerando apenas as mortes prematuras (30 a 69 anos) pelas quatro DCNT mencionadas, o total de óbitos foi, no mesmo período, de 276.548 (56,8%). Desse total 31,8%, 33,4% e 34,8% ocorreram, respectivamente, no primeiro, segundo e terceiro triênios. As taxas de mortalidade bruta e padronizada e a variação observada entre os dois períodos, são apresentadas na Tabela 1, onde pode ser observada a desigualdade dos coeficientes entre as macrorregiões e nas reduções dos mesmos entre os 1º e 3º triênios.
Na tabela 2, são apresentados os coeficientes de mortalidade por sexo, onde se observa percentuais de redução mais expressivos dos coeficientes entre o 1º e 3º triênios na macrorregião do Jequitinhonha, em ambos os sexos, seguidas pelas regiões Oeste e Norte no sexo feminino e pelas regiões T. do Sul e Centro para o sexo masculino. A razão entre os coeficientes masculino e feminino, que variou de 41% a 57% no primeiro triênio, contra 37% a 65% no segundo triênio, indica maior redução da mortalidade nas mulheres na maioria das macrorregiões.
Os dados relativos à distribuição dos óbitos de acordo com o sexo e faixa etária entre as regiões estão apresentados na Tabela 3. Destaca-se a variação crescente entre os percentuais de acordo com o avançar da idade e o predomínio das mortes masculinas em praticamente todas as regiões, com exceção das regiões Centro e Leste, na faixa etária dos 30 a 39 anos. Sobressai também a maior diferença percentual de mortalidade entre homens e mulheres nas regiões Jequitinhonha e Norte, que atingiu quase 20%. De igual maneira, a Tabela 4 exibe coeficientes de mortalidade crescentes e diretamente relacionados com o aumento da idade. Cabe ressaltar o expressivo percentual de redução dos coeficientes no Jequitinhonha em todas as faixas etárias, o mesmo observado na faixa de 40-49 anos no Triângulo do Sul. Destacam-se ainda os aumentos, também expressivos, dos coeficientes de mortalidade nas regiões Noroeste e Norte na faixa etária de 40-49 anos entre os dois triênios.
A tabela 5 aponta que as doenças cardiovasculares, seguidas pelas neoplasias foram as principais causas de morte em todas as regiões e para ambos os sexos, excetuando-se a macrorregião Centro que teve maior percentual de mortes por câncer no sexo feminino. Na tabela é possível observar que a distribuição percentual dos óbitos de acordo com a causa segue uma tendência uniforme e com poucas variações entre as regiões e entre os sexos. Como exceções aponta-se o percentual mais elevado de Neoplasias nas macrorregiões Norte e Jequitinhonha e a grande diferença entre os sexos. Outra desigualdade observada foi com relação aos percentuais bem mais elevados de mortes por doenças do aparelho circulatório entre os homens. A Tabela 6 complementa a anterior e exibe a variação do percentual entre os primeiro e terceiro triênios. Houve aumento do percentual de mortes por Neoplasia e Doenças Respiratórias crônicas em todas as macrorregiões, com exceção da Leste que mostrou diminuição nas mortes por doenças do sistema respiratório.
Por fim, a análise conjunta do percentual de mortes por causas mal definidas (CMD) evidenciou uma diminuição ao longo da série histórica, passando de 10,6% em 2011 para 6,9% em 2019, o que significa melhora na qualidade do preenchimento da declaração de óbito. Porém, consideradas separadamente, as macrorregiões Triângulo do Sul, Sudeste e Centro apresentaram percentual classificado como pouco adequado (7% - <10%), enquanto as macrorregiões Jequitinhonha, Norte e Nordeste exibiram percentual inadequado (10% - <15%). As demais tiveram percentual adequado (5% - <7%) ou altamente adequado (< 5%). O percentual de CMD foi superior para os óbitos do sexo masculino em todos os períodos e nas faixas etárias de 50 a 69 anos.
4.DISCUSSÃO
Este estudo descreveu a mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis, revelando diminuição das taxas de mortalidade prematura por DCNT na maioria das macrorregiões de Minas Gerais ao longo dos anos de 2011 a 2019, tanto nos coeficientes gerais quanto com relação ao sexo e faixas etárias consideradas. Tal queda foi importante, mas, para a maioria das macrorregiões, não correspondeu ao estabelecido no Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis no Brasil, elaborado em 2011, cuja meta era redução anual de 2% das mortes por essas causas no período de 2011 a 2022.4 Tal meta corresponderia, nesse estudo, a uma redução de aproximadamente 16% no intervalo considerado.
O referido Plano abordou as quatro principais DCNT, seus fatores de risco mais relevantes (tabagismo, consumo nocivo de álcool, inatividade física, alimentação inadequada e obesidade) e as medidas preventivas e de promoção à saúde associadas.5 Incluiu também a capacitação das equipes de saúde municipais e estaduais, a expansão da cobertura da Atenção Básica e ações de Vigilância das DCNT (monitoramento dos fatores de risco, da morbimortalidade e avaliação dos serviços e ações implementadas).
Contudo, essas morbidades ainda representam, junto com os acidentes e as violências, as principais causas de óbito no Brasil. Assim, com o impacto crescente das causas externas no padrão de morbimortalidade da população, o Ministério da Saúde formulou um novo Plano, desta vez englobando as DANT (doenças e agravos não transmissíveis), denominado Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas e Agravos Não Transmissíveis no Brasil, com metas e ações propostas para o período de 2021 a 2030.17
O Brasil vem apresentando taxas de mortalidade prematura decrescentes desde os anos 2000, sendo que em 2019 os coeficientes total, masculino e feminino foram, respectivamente, de 275,5; 329,3 e 228,7 óbitos por 100 mil habitantes. No entanto, tal redução não ocorreu de maneira uniforme e teve padrões de decréscimo diferentes, e a perspectiva é que a meta de redução de 2% estabelecida em 2011 não seja atingida em 2022.16
Em 2017, a taxa de mortalidade por DCNT no Brasil foi de 329,6 óbitos por 100 mil habitantes. No mesmo ano o coeficiente de mortalidade por DCNT em MG foi de 305,6 óbitos por 100 mil habitantes, inferior ao coeficiente médio verificado no segundo triênio nesse estudo, o que pode significar um aumento real no período de dois anos ou apenas ser resultado de diferentes metodologias empregadas.
Até o ano de 2019 nem todas as propostas determinadas no Plano foram atingidas plenamente, o que pode explicar, em parte, os desfechos obtidos em nível nacional e no presente estudo. Metas como redução do tabagismo, aumento do consumo de frutas e hortaliças, aumento da prática de atividades físicas e ampliação da cobertura de mamografia para mulheres de 50 a 69 anos foram cumpridas. Com relação às demais, a previsão é de que a redução do consumo de bebidas alcoólicas, da obesidade e da cobertura do exame Papanicolau não sejam atingidas em 2022.16,18
Ainda em relação às metas de redução, algumas diferenças nos percentuais de decréscimo entre o primeiro e segundo triênios puderam ser verificadas entre as diversas macrorregiões, destacando-se a macro Jequitinhonha com maior percentual de redução. De fato, considerando-se o total de mortes na faixa etária de 30 a 69 anos, tanto o Jequitinhonha quanto as macrorregiões Norte e Nordeste apresentaram os menores percentuais de mortes por DCNT no período considerado. Por outro lado, essas mesmas regiões exibiram os maiores percentuais de óbitos por causas mal definidas e de óbitos por doenças transmissíveis entre as 14 macrorregiões de saúde de Minas Gerais,11 sugerindo que a redução observada nas mortes por DCNT possa não corresponder à realidade.
De 2011 a 2019 todas as macrorregiões apresentaram redução na proporção de causas mal definidas, mas seis regiões permaneceram ainda em níveis considerados pouco adequados ou inadequados. Dados de 2016 apontaram que 68,8% dos municípios brasileiros tinham informações adequadas ou altamente adequadas quanto à causa básica do óbito.14 Embora a maioria dos municípios tenha boa completude dessa informação, muitos ainda possuem preenchimento ruim e isso parece estar relacionado à escassez de recursos diagnósticos e treinamento em algumas regiões.
De forma geral, o percentual de óbitos por DCNT, nas faixas etárias consideradas, foi semelhante ao verificado no território nacional no período de 2011 a 2019, que foi de 56,6% para os homens e de 43,4% para as mulheres. Nesse estudo, os coeficientes de mortalidade de acordo com a faixa etária e sexo tiveram padrões semelhantes, com algumas variações regionais.
No presente estudo verificou-se aumento na mortalidade proporcional das neoplasias e doenças respiratórias, e redução em praticamente todas as macrorregiões. Em Minas Gerais, no período de 2010 a 2017 houve aumento do número absoluto de óbitos pelas quatro DCNT descritas, correspondendo a um incremento de 2,8% para as doenças circulatórias até 22,6% para as doenças respiratórias. As Neoplasias também exibiram crescimento expressivo, de 17,5%, seguidas pelas doenças endócrinas com 7,6% de aumento.8 No entanto, as taxas de mortalidade padronizadas revelaram diminuição para as quatro DCNT na comparação dos anos de 1990 a 2017, sendo mais expressivas para as doenças cardiovasculares, que teve redução de 53,9%.
Outro estudo mostrou que a taxa de mortalidade prematura por DCNT no Brasil apresentou tendência decrescente de 2000 a 2014, com redução média de 4,2% ao ano, mas de forma não homogênea. Mesmo com essa redução, a taxa de mortalidade ainda permaneceu alta, impondo desafios para o enfrentamento das neoplasias e do diabetes.17 De forma conjunta, e num intervalo bem maior, de quase 30 anos (1990 a 2017), o número absoluto de mortes por DCNT aumentou 50,4%, mas a taxa de mortalidade padronizada pelas mesmas causas diminuiu 35,3%.1 No que diz respeito às mortes por doenças do aparelho respiratório, destaca-se a queda no percentual de fumantes nas capitais brasileiras e nas demais regiões brasileiras com a consequente diminuição da morbimortalidade associada ao fumo.4,19 No presente estudo, no entanto, houve aumento no percentual de mortes por doenças respiratórias na comparação do primeiro e terceiro triênio. De forma geral, a prevalência de doenças respiratórias crônicas varia de acordo com a região estudada, uma vez que sofrem influências ambientais, como a poluição, e nos aspectos sociodemográficas e econômicas,19 a exemplo a diferença entre população residente em área rural e urbana.
Com relação ao DM não houve uma uniformidade entre os diferentes locais, sendo observado pequenos aumentos na mortalidade proporcional na maioria das macrorregiões. O Brasil apresenta alta carga de diabetes, e a prevalência regional de fatores de risco como sedentarismo e obesidade, junto com a qualidade da atenção à saúde para indivíduos com diabetes4 podem explicar, em parte, as diferenças observadas.
Estudos mostram que as DCV sofreram uma diminuição no estado de Minas Gerais e nos demais estados brasileiros, entretanto permanece sendo a causa mais comum de morte, como visto no presente estudo. Medidas como o controle do tabagismo e o melhor controle e monitoramento dos pacientes na atenção básica contribuíram para esses resultados, mas o sedentarismo, a alimentação inadequada, obesidade e pouca atividade física ainda constituem importantes fatores a serem enfrentados para redução da mortalidade por essas causas.18,20,21
As neoplasias ainda representam uma alta parcela das mortes por DCNT e, sua tendência é ascendente22, o que foi verificado no presente estudo para todas as regiões do estado. A mortalidade por neoplasias malignas tem crescido em todo o mundo e representa a segunda causa de morte na maioria dos países6. Segundo o
Instituto Nacional do Câncer (INCA), o câncer é mais prevalente em homens do que em mulheres23, em concordância com o presente estudo, onde essa superioridade é evidenciada na região Nordeste, Norte e Jequitinhonha. Vale ressaltar que o país enfrenta dificuldades para o rastreamento, diagnóstico, tratamento e acompanhamento do câncer, principalmente em regiões menos favorecidas. Outros fatores que devem ser levados em consideração dizem respeito ao tipo de neoplasia, o sexo e a idade dos indivíduos,4 o que pode impactar na variabilidade encontrada entre as macrorregiões.
Algumas limitações desse estudo são apontadas. Em primeiro lugar, trata-se de estudo realizado com dados secundários com a utilização de dados do SIM, o que implica em desvantagens e limitações metodológicas, como a incompletude dos dados das causas dos óbitos, por exemplo. De qualquer modo, apesar da qualidade das informações do SIM ainda ser controversa, é possível observar a crescente ampliação da sua cobertura e confiabilidade.24 Outra possível limitação se refere ao cálculo das taxas de mortalidade ser feito com base em estimativas populacionais, o que limita a precisão dos coeficientes.
5. CONCLUSÃO
O presente estudo apontou uma redução das taxas de mortalidade prematura em Minas Gerais na maioria das suas macrorregiões de saúde. Apesar do declínio observado, ainda existe certa disparidade entre as regiões com algumas ainda apresentando taxas elevadas quando comparadas aos coeficientes médios nacional e estadual. Observa-se ainda redução mais expressiva apenas para as doenças cardiovasculares, e elevação da mortalidade por doenças respiratórias crônicas, diabetes e principalmente das neoplasias.
As metas estabelecidas pelo Plano Estratégico representam um desafio para o Brasil e para suas unidades federadas, sendo importante ressaltar a necessidade de ampliação de políticas públicas, visando aumentar a adesão aos serviços primários e a implantação de ações de promoção à saúde. Estas incluem a adoção de práticas saudáveis, como o estímulo à alimentação adequada, incluindo a redução do consumo de sal e açúcar, tabaco e bebidas alcoólicas, a realização de atividades físicas regulares. Além disso, cabe fortalecer os cuidados ofertados na atenção básica e favorecer o acesso aos níveis secundário e terciário de saúde tanto para questões diagnósticas quanto terapêuticas e de reabilitação.
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