ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Prevalência e fatores associados ao baixo peso ao nascer no estado de Minas Gerais, Brasil
Prevalence and factors associated with low birth weight in the state of Minas Gerais, Brazil
Glenia Junqueira Machado Medeiros1; Maria de Lurdes Zanolli2; André Moreno Morcillo2
1. Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina de Itajubá (FMIT), Itajubá, Minas Gerais, Brasil
2. Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (FCM Unicamp), Campinas, São Paulo, Brasil
Glenia Junqueira Machado Medeiros
Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (FCM Unicamp)
Campinas, São Paulo
E-mail: gleniajmmedeiros@gmail.com
Recebido em: 23 Maio 2023
Aprovado em: 11 Dezembro 2023
Data de Publicação: 01 Julho 2024
Editor Associado Responsável:
Cassio Ibiapina
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte/MG, Brasil.
Comitê de Ética: Número do Parecer - 886.462.
Fontes apoiadoras: Não houve fontes apoiadoras.
Conflito de Interesse: Não houve conflito de interesse.
Resumo
INTRODUÇÃO: Um dos indicadores de saúde do recém-nascido é o baixo peso ao nascer (BPN) - peso inferior a 2.500 g - que pode ser determinado pela influência de diversos fatores, como maternos, fetais, placentários e ambientais.
OBJETIVO: Determinar a prevalência e fatores associados ao BPN no estado de Minas Gerais (MG).
MÉTODOS: Estudo de corte transversal que analisou dados de 259.863 nascimentos em MG a partir das Declarações de Nascidos Vivos do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) de 2011. Desses, 242.487 registros preenchiam os critérios de inclusão: peso maior ou igual a 500 g, sem malformações, 22 semanas ou mais de idade gestacional. Determinou-se a prevalência do BPN e as razões de prevalência brutas e ajustadas por regressão de Poisson.
RESULTADOS: A prevalência do BPN foi 9,2%, sendo maior em mães com menor escolaridade, primigestas, filhos mortos de gestações anteriores, <5 consultas de pré-natal, prematuridade, gravidez múltipla, sexo feminino. A prevalência foi menor nas macrorregiões de saúde Norte, Nordeste, Noroeste, Leste, Leste do Sul, Sudeste, Triângulo do Sul, Jequitinhonha.
CONCLUSÃO: A prevalência do BPN é alta em MG. As variáveis associadas com maior prevalência foram: idade gestacional, gravidez múltipla, escolaridade materna, número de consultas de pré-natal, paridade, sexo, local de nascimento. A menor prevalência ocorreu nas macrorregiões de saúde nas quais as condições socioeconômicas e sanitárias são menos favorecidas, caracterizando o paradoxo do BPN.
Palavras-chave: Baixo peso ao nascer; Saúde materno-infantil; Planejamento em saúde; Sistema de Informação em Saúde.
INTRODUÇÃO
O baixo peso ao nascer (BPN), considerado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como o peso de nascimento inferior a 2500g, pode ocorrer como resultado de uma interrupção precoce da gestação, por restrição do crescimento intrauterino ou da combinação de ambos1. Mais de 20 milhões de crianças em todo o mundo nascem com BPN1.
O BPN está associado a maior risco de comprometimento do desenvolvimento cognitivo, motor e comportamental, assim como a várias doenças na idade adulta como: eventos cardiovasculares, síndrome metabólica e diabetes mellitus tipo 2 (DM2), dislipidemia, hipertensão arterial, asma e maior mortalidade no primeiro ano de vida2-5.
Quanto menor o peso do recém-nascido (RN), maior a mortalidade infantil. Em 2013, a mortalidade infantil nos Estados Unidos, no grupo com BPN, foi 50,26/1.000 nascidos vivos, 219,56/1.000 nascidos vivos no grupo com menos de 1.500 g e de 2,05/1.000 quando o peso de nascimento era maior que 2.500 g2.
A prevalência do BPN em 2011 foi de 3,2% na Islândia, 4,2% na Suécia, 4,6% na Noruega, 6,4% na Suíça, 6,6% na Holanda, 6,8% na França, 7,0% no Reino Unido, 6,2% na Austrália, 6,2% no Canadá, 8,4% nos Estados Unidos, 5,9% no Chile, 8,6% no México. A prevalência foi maior na Turquia (11,0%), na Indonésia (11,1%), na África do Sul (13,2%) e na Índia (27,6%)6.
No Brasil, em 1994, a prevalência do BPN foi 8,75%. No período de 1994 a 2000, observou-se uma redução, atingindo o menor valor em 2000 (7,7%). Posteriormente, entre 2000 e 2010, observou-se uma lenta elevação, chegando a 8,41% em 2010. Essa queda na prevalência seguida de elevação ocorreu em todas as regiões do país. Entre 1994 e 2010, a prevalência do BPN nas regiões Sul e Sudeste foi superior à observada nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e no Brasil7.
Nesse período, a prevalência do BPN no estado de Minas Gerais teve o mesmo comportamento, passando de 10,72% em 1994 para 8,8% em 2000, chegando a 9,48% em 2010, sendo sempre superior à das regiões Sudeste, Sul, Norte, Nordeste, Centro-Oeste e do Brasil7.
O objetivo deste trabalho foi determinar a prevalência e os fatores associados ao BPN no estado de Minas Gerais a partir das Declarações de Nascidos Vivos (DNV) do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) e informações referentes aos municípios, tais como população, índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM), coeficiente de mortalidade infantil (CMI), renda per capita e regiões administrativas de saúde.
MÉTODOS
Realizou-se um estudo observacional de corte transversal, descritivo e analítico, a partir das Declarações de Nascidos Vivos (DNV) do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), referentes aos nascimentos ocorridos no estado de Minas Gerais em 2011, disponibilizados pelo Ministério da Saúde em 20138.
Foram selecionados para análise os registros de nascidos vivos com idade gestacional maior ou igual a 22 semanas, com peso ao nascer maior ou igual a 500 g, sem malformações congênitas, de mães residentes, e cujo parto ocorreu no estado de Minas Gerais.
O peso ao nascer (variável desfecho) foi categorizado como: baixo peso, quando o peso de nascimento era menor ou igual a 2499 g, e não baixo peso, quando era maior ou igual a 2500 g1.
As variáveis independentes obtidas do SINASC foram: idade da mãe (menos de 20 anos, 20 a 34 anos e 35 anos ou mais), escolaridade da mãe (menos de oito, oito a onze e doze ou mais anos de estudo); situação conjugal (com e sem companheiro); ocupação fora do lar (sim e não); filhos vivos de gestações anteriores (nenhum, um, dois e três ou mais); filhos mortos de gestações anteriores (nenhum, um, dois e três ou mais); duração da gestação (menos de 37 semanas, 37 a 41 e 42 ou mais); número de consultas no pré-natal (três ou menos, quatro a seis e sete ou mais); gravidez (única, dupla, três ou mais); parto (vaginal e cesárea); local de nascimento (hospital, outro estabelecimento de saúde, domicílio e outros locais - ambulância, rua etc.); sexo do recém-nascido (masculino e feminino); cor da pele (branca, preta/parda e outras).
Além dessas, foram incorporadas na análise outras variáveis relativas aos municípios de Minas Gerais: tercis do coeficiente de mortalidade infantil (CMI) (menor que 5,89; 5,89 a 16,94 e 16,95 ou mais por mil nascidos vivos), Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) (menor que 0,500; 0,500 a 0,599, 0,600 a 0,699; 0,700 a 0,799 e 0,800 ou mais), tercis de renda (R$) per capita (menos de 87,40, 87,40 a 147,77, mais de 147,77), tercis da população (menos de 5.580, 5.580 a 12.322, mais de 12.322) e macrorregião de Saúde (Centro, Centro Sul, Jequitinhonha, Leste, Leste do Sul, Nordeste, Noroeste, Norte, Oeste, Sudeste, Sul, Triângulo do Norte e Triângulo do Sul), a partir do índice Mineiro de Responsabilidade Social (IMRS), da Fundação João Pinheiro Governo de Minas Gerais, referente ao ano de 2011.
Os dados foram processados com o programa SPSS 16.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, USA).
Determinaram-se os valores das Razões de Prevalência (RP) brutas e seus Intervalos de Confiança de 95% (IC95%) por regressão de Poisson. As RP ajustadas foram determinadas por regressão de Poisson Multivariada Hierárquica (função genlin; Distribution = Poisson; link = log, variância robusta).
Foram selecionadas para inclusão na primeira etapa do modelo todas as variáveis que apresentavam p-valor menor que 0,20 na análise bivariada.
Na execução da análise multivariada, as variáveis independentes foram divididas em quatro níveis hierárquicos. O mais periférico (nível I) era composto por população, coeficiente de mortalidade infantil, renda per capita, IDHM e macrorregião de saúde. O nível seguinte (nível II) continha as informações referentes à situação conjugal, escolaridade da mãe, ocupação da mãe, idade da mãe, número de filhos vivos e número de filhos mortos. As informações referentes à duração da gestação, número de consultas no pré-natal, tipo de gravidez, tipo de parto e local de nascimento foram incluídas no nível III. No quarto nível hierárquico, foram incluídas a raça/cor da pele e o sexo do recém-nascido.
As categorias adotadas como referência, tanto na análise univariada quanto na multivariada, foram aquelas que, de acordo com a literatura, apresentam menor risco esperado para o baixo peso de nascimento: mãe com 20 a 34 anos de idade, com 12 anos ou mais de estudo, sem ocupação fora do lar, com companheiro, sem filhos mortos, com um filho vivo anterior, com sete ou mais consultas de pré-natal, com gravidez única e a termo, parto vaginal, parto hospitalar, pele branca, recém-nascido do sexo masculino, 3º tercil de população, 1º tercil de CMI, 3º tercil de renda per capita, maior IDHM e macrorregião centro.
Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa, via Plataforma Brasil, Parecer CEP 886.462.
RESULTADOS
De acordo com o SINASC, ocorreram 259.863 nascimentos no ano de 2011 no estado de Minas Gerais. Desses, 242.487 registros preencheram os critérios de inclusão e foram selecionados para análise.
A prevalência do baixo peso ao nascer foi 9,2% (IC95%: 9,1% - 9,3%), sendo de 1,3% no grupo com peso entre 500 e 1499 g e 7,9% entre 1500 e 2499 g.
Verificou-se, na análise bivariada, que somente a variável "ocupação fora do lar" não apresentava associação (p=0,745) com o BPN. As demais se mostraram associadas ao BPN e, portanto, foram selecionadas para a análise multivariada.
As prevalências do BPN e as razões de prevalência ajustadas (RP ajustadas) em relação às variáveis dos quatro níveis hierárquicos são apresentadas nas Tabelas 1 a 4.
Após a análise multivariada, permaneceram no modelo somente as variáveis: macrorregião de saúde do nível hierárquico I (Tabela 1); escolaridade da mãe, número de filhos vivos e mortos de gestações anteriores do nível II (Tabela 2); tipo de gravidez, duração da gestação, número de consultas no pré-natal e local de nascimento do nível III (Tabela 3) e sexo do recém-nascido do nível IV (Tabela 4).
Observou-se maior prevalência do BPN em mães com menos de oito anos de escolaridade, com nenhum filho vivo ou um ou mais filhos mortos de gestações anteriores (Tabela 2), com insuficiente número de consultas de pré-natal, na gravidez múltipla, com menos de 37 semanas de gestação, outro local de nascimento (Tabela 3) e recém-nascidos do sexo feminino (Tabela 4). Por outro lado, a prevalência foi menor em macrorregiões de saúde (Tabela 1), nas quais as condições socioeconômicas e sanitárias são menos favorecidas, tais como as regiões Norte, Nordeste, Noroeste e Jequitinhonha, quando comparadas com a região Centro (Tabela 1).
DISCUSSÃO
A prevalência do baixo peso ao nascer no estado Minas Gerais em 2011 foi 9,2% e de muito baixo peso foi de 1,3%. Comparando com outras regiões, a prevalência de BPN em Minas foi maior que a observada nos Estados Unidos6, na maioria dos países da União Europeia6, na Colômbia9, no Brasil e suas respectivas regiões10. Considerando as razões de prevalência, as duas principais variáveis associadas ao BPN foram a gravidez múltipla e a prematuridade. Após o ajuste por análise multivariada, verificou-se que, além dessas, a escolaridade da mãe, o número de filhos vivos e mortos de gestações anteriores, o número de consultas no pré-natal, o local de nascimento, o sexo do RN e a macrorregião de saúde também tinham associação com o BPN.
Minas Gerais em 2011 tinha uma população aproximada de 19,72 milhões de habitantes. Do ponto de vista administrativo, o estado é dividido em 13 macrorregiões de saúde. Assim como ocorre em outros estados brasileiros, Minas apresenta desigualdades regionais quanto ao desenvolvimento socioeconômico. As macrorregiões Norte, Nordeste e Jequitinhonha, por exemplo, são as que apresentam os piores indicadores sociais, econômicos, de saneamento básico e de recursos de saúde quando comparadas à macrorregião Centro; que é mais desenvolvida, possui maior Produto Interno Bruto (PIB) e maior dinamismo11.
A maior prevalência do BPN em filhos de mães com menos de oito anos de escolaridade já foi observada por Estrada-Restrepo et al. (2016)9, Friche et al. (2006)12, Carniel et al. (2008)13, Coutinho et al. (2009)14, Gonzaga et al. (2016)15, Mattei et al. (2017)16, Nascimento et al. (2017)17 e Bahrami et al. (2020)18.
Para Dachs et al. (2005)19, a renda e o nível de escolaridade determinam a posição social do indivíduo na sua comunidade, gerando diferenciais de exposição às doenças, assim como em relação à vulnerabilidade, acesso aos serviços de saúde etc. Há evidências, também, de que a educação formal tem um papel muito importante, independentemente da renda familiar. Assim, dentro de um determinado extrato de renda, observam-se evidências de maior proteção para os grupos de mães com melhor escolaridade.
A maior prevalência em mães que relatavam não ter filhos vivos de gestações anteriores foi relatada por Friche et al. (2006)12 em Belo Horizonte (MG), por Silva et al. (2006)20 em São Luiz (MA) e por Ferraz et al. (2011)21 em Santa Maria (RS). Friche et al. (2006)12 também descreveram em Belo Horizonte o maior risco associado a filhos mortos.
Quanto à maior prevalência em RN de mães com número insuficiente de consultas no pré-natal, também foi encontrada por Carniel et al. (2008)13, Coutinho et al. (2009)14, Gonzaga et al. (2016)15, Mattei et al. (2017)16, Nascimento et al. (2017)17, Silva et al. (2006)20 e de Souza Buriol et al. (2016)22 no Brasil e, por Estrada-Restrepo et al. (2016)9 na Colômbia. Sabe-se que a adequada assistência à gestante pode prevenir ou identificar precocemente situações de risco, tanto para a mãe quanto para o RN23-25.
A maior prevalência do BPN em RN do sexo feminino também já foi relatada por Carniel et al. (2008)13, Nascimento et al. (2017)17 e Silva et al. (2006)20, entretanto, apenas Nascimento et al. (2017)17 observaram que a mãe exposta a poluentes do ar durante o período da gravidez aumentaria o risco de RN do sexo feminino nascerem com baixo peso.
Um aspecto de especial interesse é a menor prevalência observada em macrorregiões de saúde reconhecidamente menos desenvolvidas. Pode-se interpretar esse achado como uma evidência do "paradoxo" do baixo peso ao nascer. Isso já foi relatado no Brasil por Silva et al. (2005)26 comparando resultados de coortes de nascimentos da cidade de São Luís (MA) e de Ribeirão Preto (SP), onde observaram a maior prevalência de BPN nesta última. Em Ribeirão Preto, havia maior proporção de RN prematuros e nascidos de parto cesárea. Consideraram que esses resultados provavelmente seriam decorrentes de diferenças no estilo de vida das populações das duas cidades, principalmente quanto ao tabagismo; além da prematuridade associada ao parto cesárea. Entretanto, deixavam claro a sua preocupação com a possível subnotificação de nascidos vivos na cidade de São Luís (MA).
Lima et al. (2013)27, estudando a desigualdade espacial do BPN no Brasil, com dados do SINASC, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostraram que as maiores taxas de BPN se concentraram nos estados da região Sul e Sudeste, ou seja, regiões mais desenvolvidas do país e com melhores níveis de saúde. Para os autores, esse "paradoxo do baixo peso" reflete as condições socioeconômicas dos estados e poderia estar relacionado ao fato de que a presença do serviço de saúde e sua utilização pela população fazem diminuir os números da mortalidade infantil e aumentar as taxas de baixo peso ao nascer.
Mattei e Carreno (2017)16, estudando os dados do SINASC do Rio Grande do Sul em 2012, encontraram uma heterogeneidade entre as regiões (Coordenações regionais de saúde) do Estado, em relação aos fatores sociodemográficos e cuidados de saúde, onde as regiões com alto Índice de Desenvolvimento Socioeconômico apresentaram as maiores proporções de BPN (superior a 10%), dentre outros fatores de risco para a saúde materno-infantil.
Andrade et al. (2008)28, analisando dados de nascimento do Brasil ocorridos no ano de 2005, observaram que em todas as regiões do Brasil a prevalência do BPN era maior nas cidades com mais de 50.000 habitantes quando comparadas com as de menor população, concluindo que havia evidência do "paradoxo" do BPN. Esses autores também destacaram a possível subnotificação de nascidos vivos de muito baixo peso nas regiões mais pobres, que seriam de forma inadequada classificados como natimortos por morrerem logo após o nascimento, em decorrência da insuficiente oferta de atenção perinatal adequada a esse grupo de alto risco.
Silva et al. (2010)29 estudaram a tendência do BPN no Brasil no período de 1995 a 2007 e também encontraram evidência do "paradoxo" do BPN no Brasil. Sugerem que as diferenças regionais observadas devem estar associadas principalmente com a disponibilidade de serviços de saúde que fornecem adequada atenção perinatal e intervenções médicas, do que com as diferenças socioeconômicas. Lourenço et al. (2014)30, em estudo no estado de São Paulo, observaram que também a queda da mortalidade infantil no período analisado foi influenciada pelo crescimento do PIB per capita e pelo modelo Saúde da Família.
O achado da associação BPN com escolaridade materna no presente trabalho reforça que o "paradoxo" do BPN não está associado às diferenças socioeconômicas.
Este estudo apresenta limitações que impedem a total compreensão dos fatores associados ao baixo peso ao nascer. Uma delas é a impossibilidade de analisar separadamente os fatores associados ao baixo peso por restrição do crescimento intrauterino e da prematuridade. Como a idade gestacional é categorizada, não foi possível avaliar a adequação do peso à idade gestacional. Neste ano, aproximadamente 40% dos registros tinham a informação da idade gestacional em semanas.
Outra importante limitação é a ausência de informações sobre tabagismo e alcoolismo durante a gestação. Se essas variáveis fossem incluídas na análise, provavelmente haveria importante modificação nas razões de prevalência obtidas, pois o tabagismo é um dos mais importantes fatores associados ao baixo peso ao nascer. Além disso, deve-se ressaltar a ausência de informações relativas aos hábitos, costumes, trabalho etc. das mães.
Dachs et al. (2005)19 consideram que as desigualdades no estado de saúde da população são determinadas pelas iniquidades nas condições de vida. Intervenções que atuem basicamente sobre as iniquidades de acesso e o gasto em saúde terão resultados limitados. Esses autores referem ainda que a educação formal tem um importante papel na redução da pobreza e das desigualdades sociais, com importante efeito sobre a saúde das crianças menores de quatro anos.
Quanto aos fatores maternos (alcoolismo, paridade, idade gestacional, gestações múltiplas, prematuridade, tabagismo etc.), parece evidente que a identificação e o acolhimento das gestantes mais jovens, com baixa escolaridade, iniciando precocemente e de forma adequada o acompanhamento de suas gestações, permitiria diagnosticar e tratar as doenças de maior prevalência, tais como diabetes, hipertensão, infecção urinária, anemia por deficiência de ferro, reduzindo o impacto desses fatores maternos tanto sobre o BPN quanto para a mortalidade materna18,24,25,31.
Portanto, não basta somente ter acesso ao pré-natal. É necessário que haja boa qualidade e competência na assistência prestada. Vários trabalhos23-25,31 têm demonstrado que também há iniquidade com relação à qualidade da atenção à saúde prestada no sistema de saúde. Victora et al. (2011)23, avaliando dados de Pelotas (RS), afirmam que, apesar de o número de consultas realizadas durante o pré-natal ser adequado para a maioria das gestantes, metade delas não tinha as mamas examinadas e 25% não realizavam o exame ginecológico. Nesses casos, não se tratava de dificuldades no acesso ao sistema de saúde, simplesmente havia má qualidade na assistência prestada. Há que se melhorar o acesso ao pré-natal, mas também é necessário garantir a boa assistência médica à gestante.
CONCLUSÃO
Os resultados mostram que a prevalência do BPN no estado de Minas Gerais em 2011 foi alta e que a insuficiente escolaridade materna, paridade, prematuridade, gestações múltiplas, baixa frequência às consultas do pré-natal, RN do sexo feminino e parto ocorrido em outro local (ambulância, rua etc.) foram fatores associados ao maior risco de BPN. A menor prevalência ocorreu nas macrorregiões de saúde nas quais as condições socioeconômicas e sanitárias são menos favorecidas, caracterizando o "paradoxo" do baixo peso ao nascer.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
Os autores Glenia Junqueira Machado Medeiros, Maria de Lurdes Zanolli e André Moreno Morcillo participaram: da concepção e delineamento do estudo, aquisição de dados, análise e interpretação de dados; da escrita do artigo e revisão crítica do conteúdo intelectual relevante; e da aprovação final da versão a ser submetida.
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Copyright© 2022 Medeiros et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Licença Internacional que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.
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