RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Número Atual: 34 e-34205 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.2024e34205

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Artigo de Revisão

Fragilidades e oportunidades no manejo do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade em adultos na atenção primária - revisão integrativa

Weaknesses and opportunities in the management of Attention Deficit Hyperactivity Disorder in adults in primary care - integrative review

Fellipe Oliveira Melo; Nadia Mori Vilares; Juliane de Souza Cavazzana

Faculdade de Medicina de Marília, São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência Fellipe Oliveira Melo
E-mail: fellipeoliveiramelo@gmail.com

Recebido em: 10 Março 2024.
Aprovado em: 28 Abril 2024.
Data de Publicação: 19 Novembro 2024.

Editor Associado Responsável:
Dr. Frederico Duarte Garcia
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte/MG, Brasil

Fontes apoiadoras: Não há.

Conflito de Interesse: Os autores declaram não ter conflitos de interesse.

Resumo

O transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) é uma patologia do neurodesenvolvimento que costuma se manifestar na infância e pode continuar na fase adulta, com prejuízos pessoais e laborativos importantes. O objetivo desta revisão é a contribuição científica na melhoria dos serviços da atenção básica aos adultos com TDAH. O presente artigo traz uma revisão integrativa da literatura, com buscas realizadas nas bases de dados PUBMED e SciELO. Foram incluídos artigos completos nos idiomas português, inglês e espanhol dos últimos 10 anos, e excluídos aqueles não apresentavam relevância à temática ou que não se enquadravam nos critérios de elegibilidade. Foram incluídos 18 artigos, com delineamentos de estudos diversos, cujos resultados demonstraram como principais fragilidades as dificuldades de acesso à atenção básica, variação expressiva nos protocolos clínicos entre os serviços infantis/adulto, estigmas sobre a patologia e má adesão ao tratamento. As oportunidades destacadas são o estreitamento do vínculo médico-paciente, melhorias na estrutura dos serviços, educação contínua para profissionais da saúde, psicoeducação para a comunidade, fortificação de senso de corresponsabilização e autonomia dos pacientes. Apesar de já existirem modelos teóricos sobre a transição do cuidado da fase infantil e adolescência para a adulta em pacientes com TDAH, mais pesquisas são necessárias para avaliar o papel de cada uma das oportunidades terapêuticas no longo prazo.

Palavras-chave: TDAH; Adulto; Atenção primária; Revisão integrativa.

 

INTRODUÇÃO

O transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH) é uma patologia do neurodesenvolvimento que envolve alterações nos estágios iniciais de desenvolvimento cerebral, com repercussões nas áreas dos gânglios da base, lobo pré-frontal e cerebelo em suas vias dopaminérgica e noradrenérgica. Estudos de imagem demonstram uma redução volumétrica dessas áreas afetadas, resultando em uma diminuição cerebral global de cerca de 3% a 4% e redução da perfusão estriatal1-3.

Trata-se de uma patologia que costuma se manifestar ainda na infância, sendo muitas vezes difícil seu diagnóstico antes dos 4 anos e de sua entrada nos anos escolares, quando o aumento das demandas coloca em evidência as dificuldades relacionadas à patologia. Possui forte herdabilidade, chegando a 77% em estudos com gêmeos monozigóticos, atribuindo-se a um amplo polimorfismo genético com fatores ambientais variados como prematuridade e resultando, por fim, em um fenótipo complexo e diverso1,4.

Associação Americana de Psiquiatria em sua 5ª edição revisada do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (do inglês: "Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders 5th - text revision", cuja sigla é amplamente conhecida como DSM-5-TR) lançada no ano de 2022, traz as referências e critérios sobre o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, mantendo-as no capítulo de transtornos do neurodesenvolvimento, como na edição anterior. Trata-se de uma referência para clínicos de todo o mundo para que suas ações possam ser respaldadas, mitigando diferenças e unificando condutas1.

As características do polo desatento destacadas neste manual são agrupadas em 9, a saber: dificuldades em prestar atenção acometendo erros; dificuldades em manter o foco em tarefas e atividades; parecer não escutar quando é chamado; dificuldades para completar atividades e instruções até o fim; dificuldades em gerenciar tarefas e sua organização; relutância e desprezo em atividades prolongadas; perda de objetivos importantes; fácil distratibilidade e esquecimentos em atividades corriqueiras. As características do polo hiperativo e impulsivo também são agrupadas em 9 categorias: hipercinesia de membros e de tronco; dificuldades de se manter sentado em situações necessárias; sensação de inquietude ou taquicinesia propriamente dita; incapacidade de se envolver em atividades de forma calma; dificuldades de se manter parado; taquilalia; dificuldades em aguardar término de perguntas; dificuldades em aguardar horários; tendência a interromper e se intrometer em assuntos alheios1.

De acordo com o DSM-5-TR, o diagnóstico dessa condição faz-se perante um quadro persistente seja de desatenção e/ou hiperatividade e impulsividade com profundas repercussões funcionais e de desenvolvimento. Das 9 características elencadas no manual, são necessárias pelo menos 6 dessas, por pelo menos 6 meses, com a exceção de serem necessárias apenas 5 no caso de maiores de 17 anos e adultos. Desses sintomas, vários devem estar presentes antes dos 12 anos de idade, devido a essa ser uma doença típica do desenvolvimento neural do ser humano. É necessário, ainda, possuir prejuízo na funcionalidade seja social, acadêmica e/ ou laborativa e devem ser descartados causas que melhor expliquem os sintomas como diagnósticos diferenciais dessa condição1.

Para refinarmos esse diagnóstico são utilizados os especificadores, que delimitam características em comum quanto ao padrão da apresentação: combinada, predominantemente desatenta e predominantemente hiperativa/impulsiva; quanto à sua gravidade: leve, moderada e grave levando em conta os sintomas e seu impacto na funcionalidade e ainda quanto a seu estado atual como remissão parcial1.

A prevalência estimada mundial é de cerca de 7,2% das crianças e de 2,5% dos adultos, sendo mais frequente no sexo masculino numa proporção de 2:1 nas crianças e diminuindo sua diferença para 1,6:1 nos adultos1,5. Das crianças acometidas pelo TDAH, cerca de 15% se tornam adultos com sintomatologia em sua forma plena, cerca de 65% chegam à maioridade com remissão parcial e apenas o restante remite completamente6.

Os adultos com essa condição podem apresentar prejuízos significativos nas mais variadas esferas como: vida pessoal, desempenho acadêmico e profissional, com possível desenvolvimento de comorbidades como abuso de substâncias, transtornos de humor, transtornos de ansiedade, dificuldades em relacionamentos interpessoais, baixa autoestima, aumento na incidência de acidentes automobilísticos, ferimentos e acidentes e ainda aumento na incidência de divórcio, fracasso ocupacional e acadêmico podendo inclusive culminar em casos de suicídio1,3.

O tratamento é individualizado e multidisciplinar, com foco em terapia cognitiva comportamental e, se necessário, tratamento psicofarmacológico com medicamentos padrãoouro, como estimulantes bloqueadores da recaptação présináptica de noradrenalina e dopamina como metilfenidato e lisdexanfetamina, e de segunda linha como atomoxetina, guanfacina, clonidina e ainda bupropiona e imipramina3.

Embora seja uma doença do neurodesenvolvimento, com prejuízos claros no transcorrer da infância e adolescência, muitos pacientes não conseguem diagnóstico nessa faixa etária, vindo a ter uma elucidação de seus quadros apenas na vida adulta. Dessa forma, não se deve descartar esse diagnóstico em pacientes adultos apenas porque ainda não foram diagnosticados, já que as repercussões clínicas nessa faixa etária são significativas e os benefícios da terapêutica são possíveis e transformadores na vida dessas pessoas perante os grandes prejuízos observados quando não tratados, mesmo que ocorram de forma tardia1,3.

Em nosso país, a atenção primária à saúde representa a principal porta de entrada ao sistema de saúde público, respeitando seus atributos essenciais como acessibilidade, universalidade, integralidade e equidade. Acredita-se que cerca de 80% das demandas possam ser solucionadas nesse nível de atenção. Além de reduzir custos e facilitar seu acesso, cuidar diretamente das principais condições e agravos à saúde com generalistas leva a uma atenção mais apropriada com melhores resultados e a possibilidade de um tratamento longitudinal, integral e próximo à realidade dos usuários7,8.

A proposta deste artigo de revisão integrativa é investigar e sintetizar como a continuidade dos cuidados das crianças e adolescentes que se desenvolvem em adultos com TDAH é realizada na atenção primária, destacando suas fraquezas e potenciais pensando em maximizar esse cuidado, ao fornecer subsídios para que políticas de saúde pública possam ser planejadas e repensadas.

Além de beneficiar pacientes e cuidadores na melhora do sistema de saúde, o objetivo desta revisão é a contribuição científica na melhoria dos serviços da atenção básica aos adultos com TDAH, uma vez que existe uma lacuna de conhecimento a ser explorada, com consequência no tratamento atual que se dá de forma empírica.

 

MÉTODOS

O artigo possui como proposta uma revisão integrativa da literatura de caráter descritivo, por ser um instrumento de grande importância na chamada "Prática Baseada em Evidências" - PBE, com ampla abordagem de estudos permitindo uma gama de estudos diversos, sejam esses exploratórios ou não exploratórios e ainda por permitir sintetizar os conhecimentos de uma forma a serem utilizados na prática em saúde9.

O processo de criação respeitou as etapas de uma revisão integrativa, de forma sucessiva, a saber: elaboração da pergunta norteadora, busca ou amostragem na literatura científica, coleta de dados, análise crítica dos estudos incluídos, discussão dos resultados, e por fim apresentação da revisão9.

Utilizou-se da estratégia de formulação de perguntas a partir do acrônimo "PICO", que faz referência ao "P" de população (adultos portadores de TDAH), "I" de intervenção (continuidade dos cuidados na atenção primária), "C" de comparação (em relação ao tratamento infantil/adolescente) e "O" de "outcome" - desfecho em português (fragilidades e oportunidades). Assim, a seguinte questão norteadora foi elaborada: Quais são as fragilidades e oportunidades da continuidade dos cuidados na atenção primária dos pacientes adultos já diagnosticados com TDAH10?

A busca foi realizada através da plataforma "PubMed", da "National Library of Medicine" vinculado ao órgão norteamericano "National Institutes of Health" cuja base de dados de informações engloba a "Medical Literature Analysis and Retrievel System Online" (MEDLINE). Também se utilizou da base de informações eletrônica "Scientific Electronic Library Online" (SciELO).

A identificação e coleta dos dados se deu entre os meses de abril e maio do ano de 2023, através das palavras-chave, de acordo com os descritores do "Medical Subject Headings" (MeSH), a saber: "ADHD", "adult" e "primary care". Foi utilizado o operador booleano "AND" entre os descritores devido à importância da presença e da integração das palavras na busca.

Foram incluídos apenas artigos completos nos idiomas português, inglês e espanhol, publicados nos últimos 10 anos, abrangendo todos os tipos de estudo, com exceção de livros e documentos.

Foram excluídos os artigos que não estavam dentre os critérios de elegibilidade, idiomas e período selecionados e que não apresentavam relevância à temática. A seleção foi conduzida pelo pesquisador responsável, através de uma sistematização de sucessivas etapas como análise do título do artigo, leitura crítica de seu resumo e leitura integral do trabalho selecionado.

Os estudos selecionados foram catalogados em uma planilha do software Microsoft Excel 2016, contendo as seguintes informações: autor, ano da publicação, título do trabalho, delineamento de estudo, objetivos do estudo e resultados encontrados. Essas informações foram agrupadas de forma que contribuíssem para a análise, discussão e síntese dos resultados obtidos.

 

RESULTADOS

Foram obtidos 83 artigos na PubMed e 2 artigos na SciELO. Desses, não houve artigos duplicados, mantendo o número de 85 artigos na fase inicial de identificação. Não foram encontrados artigos no idioma português, sendo 84 desses em inglês e 1 espanhol (Figura 1).

 


Figura 1. Diagrama de sistematização de busca.
Fonte: Elaborado pelos autores

 

Os principais motivos da exclusão dos artigos durante a fase de leitura de título, resumo e leitura em sua íntegra foram: ênfase em outras patologias psiquiátricas como o Transtorno do Espectro Autista e Transtornos de Ansiedade, população infantil e adolescente e abordagem puramente farmacológica e/ ou de terapêuticas específicas que fogem ao escopo deste artigo.

Seguindo a sistematização de análise em passos e os critérios de originalidade, qualidade e relevância ao tema proposto desta revisão, foram selecionados 18 artigos, todos no idioma inglês, com datas de publicação em revistas internacionais dentro do intervalo de 2013 a 2020 (Tabela 1).

 

 

DISCUSSÃO

A transição da vida infantil e adolescente para a adulta por si só já envolve grandes desafios biopsicossociais que podem ser amplificados pela carga de dificuldades impostas por patologias existentes, como o TDAH e suas comorbidades. Embora nos últimos anos tenha havido um aumento do reconhecimento e da consciência sobre a patologia, as dificuldades de diagnóstico e as interrupções do tratamento são frequentes11-16.

Nesse período, os sintomas que se sustentam podem ser danosos à vida profissional e familiar com frequentes esquecimentos de compromissos e prazos, prejuízo no funcionamento das demandas, desatenção em atividades que exijam foco, sentimento de frustração sobre a própria capacidade de organização, ficando mais propensos a comportamentos de risco, descontinuar o uso da medicação, ter menor perspectiva de emprego e renda e fazerem uso de substâncias psicoativas. Também estão sujeitos às patologias comórbidas somáticas como obesidade e transtornos do sono e psiquiátricas como transtornos ansiosos e depressivos. Os sintomas de hiperatividade tendem a amenizar, mas não devem ser negligenciados11-15,17-21.

Entre as fragilidades identificadas que dificultam a transição do cuidado da criança e adolescente com TDAH para a fase adulta, podem-se destacar as dificuldades de acesso ao sistema de saúde, sejam oriundas de vulnerabilidades individuais agravadas pela patologia como déficit executivo funcional, múltiplas comorbidades, maior assunção de riscos e as relacionadas ao sistema de saúde, como acesso geográfico precário, recursos limitados de infraestrutura e recursos humanos. Esses são desafios importantes e sabiamente conhecidos por todos nós e acabam por configurar uma barreira primordial para o sucesso da aliança terapêutica11,16,21-23.

A priorização ao atendimento emergencial em serviços de pronto atendimento é um agravamento de um sistema de saúde ineficaz, que, pela falha do acompanhamento longitudinal na atenção primária, faz com que o paciente se depare com um cuidado transversal e segmentado11,16,21-23.

Enfatizar o atendimento apenas a partir da procura ativa após comportamentos impulsivos e de risco não muda o prognóstico desses pacientes que, uma vez tratados a partir de práticas preventivas de saúde, poderiam não ter desfechos negativos 11,16,21-23.

Além disso, persistem a hierarquia e disposição da estrutura dos serviços que podem se comportar de maneira complexa, com barreiras de acesso aos serviços, regras estabelecidas de forma arbitrária, não consensuais, com variação expressiva nos protocolos entre os serviços de saúde infantil e do adulto11,16,21-23.

Outro empecilho para essa transição é a persistência da cultura de que a patologia TDAH seria relativa apenas às crianças e adolescentes, de forma incompatível com a "clínica de adultos", devido ao ceticismo e despreparo de alguns profissionais sobre a persistência desse agravo na fase adulta, apesar das inúmeras evidências científicas que provam o contrário. As comorbidades psiquiátricas que são extremamente prevalentes nessa população também podem mascarar e tirar o foco da terapêutica do TDAH, responsabilizando sinais e sintomas por outros diagnósticos isolados11,13,14,18,22,24,25.

No atual modelo da atenção básica em que a demanda de pacientes acaba sendo maior que a oferta disponível de mão de obra, os profissionais da atenção primária encontram-se cada vez mais com um número maior de tarefas no trabalho e menos tempo para cada paciente, dificultando que cuidados efetivos baseados em evidências científicas de qualidade possam ser fornecidos11,22.

A adesão ao tratamento também é um desafio nessa fase, com potenciais prejuízos devido ao elevado custo da medicação, déficits somados ao longo do tempo na psicoeducação, prejuízo da relação médico-paciente, reduzido número de encaminhamentos de pacientes em transição para a vida adulta na atenção básica apropriada e ausência de protocolos adaptados a cada sociedade, fazendo com que o paciente se sinta distante e excluído de ser um elemento ativo no seu próprio cuidado12,24.

Estratégias que podem ser adotadas para o sucesso do tratamento passam pelo estreitamento da relação médicopaciente, enfatizando a confiança, respeito mútuo e diálogo verdadeiro e aberto, com vistas à autonomia e utilização de recursos da comunidade, como criação de equipes com foco na transição e referência do cuidado na fase adulta e utilização de tecnologia como aplicativos para agendar consultas, confecção de portais informativos do paciente, terapias online, videoconferências de ensino em saúde, entre outros11.

Uma alternativa possível é a proposta de um modelo de escalonamento de responsabilidades que progridem conforme aumenta a idade do paciente, promovendo mudanças comportamentais, senso de empoderamento e comprometimento. Essas mudanças iniciam com a criança sabendo o nome da medicação e aumentam sucessivamente até a fase adulta, com o paciente sendo capaz de ser responsável pela sua medicação e os caminhos de seu tratamento11.

O papel do profissional no nível primário da saúde é crucial desde o reconhecimento e pronto diagnóstico até o início e monitoramento de seu tratamento, promovendo a abordagem multidisciplinar e maior redução de sintomas com preservação da funcionalidade em uma vida ativa, social e saudável. Esse processo é feito em conjunto com o paciente, de forma próxima, garantindo que ele tenha as informações corretas, mantendo motivação, corresponsabilização e comprometimento18-20,26,27.

A educação contínua dos profissionais também é uma oportunidade que não pode ser negligenciada. Deve ser enfatizado o acesso a manuais diagnósticos e a possibilidade do uso de ferramentas úteis como escalas de triagem para TDAH em adultos como a "Wender Utah Rating Scale", "Conner's adult ADHD Rating Scale" e a amplamente difundida "Adult ADHD self-report scale" cuja sigla do inglês é ASRS e possui valor preditivo negativo de 98%. Testes neuropsicológicos também são importantes para definir a disfunção executiva. Esses recursos auxiliam os clínicos, mas não devem ser um empecilho ao diagnóstico cuja clínica é imperativa. Iniciativas que melhorem o diagnóstico e manejo terapêutico, além de aumentar a qualidade do serviço, podem levar a um uso mais eficiente dos serviços de saúde12-14,22,23,25,28.

 

CONCLUSÃO

No âmbito de políticas de saúde pública, priorizar o ensino continuado dos profissionais sobre o TDAH, qualificando a assistência, associado à valorização da atenção básica e de sua mão de obra são passos fundamentais para fortalecer todo o sistema de saúde, com benefícios aos pacientes e a toda sociedade.

Ao desenvolver um plano terapêutico individualizado para adultos é importante reconhecer as demandas da vida adulta em suas mais variadas áreas e como os sintomas podem ser prejudiciais para seu sucesso, conduzindo o tratamento de forma integral e humanizada, evitando cometer os erros discutidos anteriormente.

Além disso, outro erro associado ao diagnóstico de TDAH está relacionado ao hiperdiagnóstico, ou seja, pacientes sem tal condição são diagnosticados erroneamente, pois há desconsideração e desatenção dos profissionais de saúde aos critérios propostos no "Manual Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais" da Associação Americana de Psiquiatria, o que ocasiona um aumento no número de pacientes diagnosticados erroneamente atrelado a casos de hipermedicação, com seus consequentes prejuízos.

O acesso ao diagnóstico, terapêutica farmacológica, psicoterápica e apoio interdisciplinar são fundamentais para o sucesso do cuidado de pacientes adultos com TDAH e demonstram a importância da equipe multiprofissional coesa, do cuidado próximo e longitudinal.

Existe um vácuo de conhecimento a ser compilado, identificado a partir da ausência de protocolos unificados, consensuais e testados, sobre o tratamento do TDAH na população adulta na atenção primária, a partir do rigor técnico da prática baseada em evidências na área da saúde mental.

Embora o presente estudo venha contribuir à literatura científica da área, ressaltam-se as limitações da metodologia empregada e do número da base de dados utilizada.

Utilizam-se modelos teóricos a partir do empirismo sobre a transição do cuidado da fase infantil e da adolescência para a adulta no contexto da patologia TDAH, com estratégias que possibilitam melhorar a assistência, evitando maiores traumas e iatrogenias durante o processo. Entretanto, mais pesquisas são necessárias para entender e otimizar tais mecanismos, com o intuito de apresentar de forma mais clara o real papel de cada uma das oportunidades terapêuticas no desfecho clínico no longo prazo.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

As contribuições dos autores estão estruturadas de acordo com a taxonomia ( CRediT ) descrita abaixo:

Conceitualização, Curadoria de dados, Análise formal, Investigação, Metodologia, Administração do projeto, Recursos, Software, Supervisão, Validação, Visualização, Redação - Rascunho Original, Redação - Revisão e Edição: FOM, NMV, JSC.

 

COPYRIGHT

Copyright© 2023 Melo et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Licença Creative Commons Atribuição que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.

 

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