ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Emergência do vírus Influenza A-H1N1 2009 no Brasil: a propósito do primeiro caso humano de doença respiratória aguda grave em Minas Gerais
Emergency in influenza A-H1N1 in 2009 in Brazil: about the first human case of severe acute respiratory disease in Minas General
Viviane Dias Cruz1; Mariana Benevides Santos Paiva1; Kamilla Maria Araújo Brandão2; Maria Camilo Senna1; Ana Carolina Gomes Pereira1; Renata Lanna Maciel1; Álvaro Borges1; Cristiano Melo1; Adriano Carvalho2; Alessandra Coutinho de Faria2; Antônio Orlando Scalabrini Neto2; Eduardo Nasser Barbosa2; Maria Ercília Souza2; Renato Almeida Magalhães3; Ricardo Mendes Pereira2; Rogério Gerspacher Lara3; Sidney Maciel dos Santos Rosa2; Vítor Tadeu Vaz Tostes3; Unaí Tupinambás3; Marise Fonseca3; Vandack Alencar Nobre Junior3; Enio Roberto Pietra Pedroso3
1. Residente
2. Médico do corpo clínico permanente
3. Professor
Email: enio@medicina.ufmg.br
Recebido em: 02/10/2009
Aprovado em: 20/11/2009
Instituição: Faculdade de Medicina da UFMG
Resumo
Este relato apresenta as características clínico-epidemiológicas do primeiro caso de doença respiratória aguda grave pelo vírus Influenza A-H1N1 2009 registrado em Minas Gerais, com melhora após 68 dias de internação hospitalar. O paciente era do gênero masculino, terceira década de vida, com índice de massa corpórea entre 30 e 40, sem outras comorbidades. A internação hospitalar foi necessária devido ao desenvolvimento, em uma semana desde o início de sua sintomatologia, de dispneia de rápida progressão para insuficiência respiratória e necessidade de suporte de ventilação mecânica (VM) devido à síndrome de angústia respiratória do adulto. Houve também o surgimento de rabdomiólise e insuficiência renal aguda. O início da sintomatologia ocorreu por volta da 24a semana epidemiológica, em Belo Horizonte (Minas Gerais), sem contato aparente com caso suspeito ou comprovado. A característica sintomatológica inicial foi de aumento da temperatura corpórea, tosse, mialgia, e rinorreia. A telerradiografia de tórax revelou inicialmente consolidação na base direita, com progressão rápida para múltiplas consolidações em vários lobos, sem aumento da área cardíaca. Os parâmetros necessários para a VM, que perdurou por 40 dias, foram de pressão expiratória final positiva de 20 cmH2O, fração inspirada de oxigênio de 100%, pressão inspiratória de 37 cmH2O, relação inspiração/expiração de 1:1,5 e saturimetria de pulso de 75%. Surgiu hipotensão após a sedação para a intubação, revertida pela infusão de 1.000 mL de NaCl 0,9% e norepinefrina. A terapia de substituição da função renal foi necessária durante 27 dias e realizada por intermédio da hemodiálise. O oseltamivir foi administrado por sete dias. Houve o desenvolvimento de infecções hospitalares associadas aos seguintes agentes: Enterococcus faecalis, Acinetobacter baumannii meticilina-resistente e Candida albicans. Os antibióticos e antifúngicos usados, em algum momento de sua evolução, foram: cefepima, ampicilina, cefepima, ciprofloxacino, fluconazol, polimixina E. A tomografia do tórax revelou, no último dia de sua internação hospitalar, bronquiectasias residuais e áreas de sequelas de síndrome de angústia respiratória do adulto. A evolução, apesar da gravidade clínica, com múltiplos órgãos e sistemas acometidos, foi com melhora progressiva, com restabelecimento de suas funções principais. Não houve registro de manifestações clínicas semelhantes em nenhum membro de sua família com quem manteve contato íntimo ou não.
Palavras-chave: Vírus da Influenza A Subtipo H1N1; Síndrome Respiratória Aguda Grave; Síndrome do Desconforto Respiratório do Adulto; Influenza Humana.
INTRODUÇÃO
A Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciou em 24 de abril de 2009 a emergência da infecção humana pelo vírus influenza A (H1N1), detectado no México 36 dias antes dessa notificação, com transmissibilidade interpessoal. O vírus Influenza A H1N1 2009 possui origem porcina, com dados iniciais alarmantes quanto à sua capacidade de promover síndrome gripal aguda, preferencialmente em pessoas na faixa etária de cinco a 59 anos, e letalidade inicial em torno de 6 a 10%, isto é, projetada a sua capacidade de provocar a morte de 100 a 200 milhões de pessoas em todo o mundo. Esses dados iniciais provocaram comoção mundial e alarme da OMS com alertas diários para a sua infectividade e patogenicidade1-4 e a introdução de medidas para sua suspeição, identificação, biossegurança e tratamento.
Essa nova cepa de vírus surgiu, possivelmente, de mutação de material genético de vírus humano, suíno e aviário, que se encontravam, simultaneamente, em porcos, por reorganização genética.5-10
A infecção pela nova cepa de vírus Influenza A H1N1 2009 foi identificada em vários países, inclusive no Brasil, com transmissão autóctone.11-17
A OMS elevou, em 11 de junho de 2009, o nível de alerta dessa infecção para o de pandemia fase 6, caracterizado por surtos em mais de dois países em diferentes regiões, devido, especialmente, à extensão geográfica do acometimento do que à sua gravidade.
A infecção pelo vírus Influenza A H1N1 2009 determina, principalmente, doença das vias aéreas, sendo mais frequentemente associada a náuseas e vômitos. Em suínos provoca sintomatologia respiratória, altamente contagiosa, sem significativa mortalidade. Os pacientes descrevem doença febril, com tosse, dispneia e potencial evolução para insuficiência respiratória, aumento da desidrogenase lática e condensação pneumônica bilateral. Outro achado comum é o aumento dos níveis séricos da creatinina quinase (62% dos pacientes) e linfocitopenia (61%).19,20
A abordagem da infecção pelo vírus Influenza A H1N1 2009 representa desafio epidemiológico-clínico-laboratorial-terapêutico em todo o mundo. Requer esforço multi-institucional para que seja feita atenção médica em ritmo simultâneo à criação de conhecimento para o seu enfrentamento. Requer esforço coletivo para impedir o seu avanço e os riscos de letalidade e mortalidade incluídos em sua disseminação.21-27
Esse relato informa o primeiro caso de doença respiratória aguda grave (DRAG) em Minas Gerais, cuja instituição de várias medidas de sustentação avançada de vida permitiu a sobrevivência do paciente. Contribui para o esforço geral de abordagem de nova entidade clínica, seu entendimento e elaboração de medidas terapêuticas, enquanto o desenvolvimento de métodos de prevenção, por intermédio de imunobiológicos, seja efetivo e disponível.28-36
RELATO DO CASO
RSN, 27 anos de idade, casado, analista de sistema, natural e procedente de Belo Horizonte (Minas Gerais), com índice de massa corpórea (IMC) entre 30 e 40, sem uso de medicação, não-tabagista nem etilista, hígido até então, procurou atendimento médico ambulatorial devido a aumento da temperatura corpórea, tosse seca, mialgia, e rinorreia há três dias. Recebeu medicação sintomática e aconselhamento para manter-se em repouso relativo domiciliar.
Evoluiu nos cinco dias seguintes sem melhora clínica. Voltou a procurar atendimento médico. Foi examinado e submetido a estudo radiológico do tórax, que revelou opacidade no lobo pulmonar inferior direito (Figura 1), e aos seguintes exames em amostra de espécime clínico de sangue venoso: proteína C reativa (PCR) de 154,1 ng/dL; contagem por mm3 de leucócitos, neutrófilos, bastonetes, linfócitos, monócitos e eosinófilos, respectivamente, de: 5.700, 4.845, 161, 483, 322 e 57; hemoglobina de 14,3 g%, plaquetas de 202.000/mm3. Foi iniciada antibioticoterapia com levoflaxino. Na tarde do mesmo dia procurou o Ambulatório de Referência para o Atendimento de Influenza A H1N1 2009 do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC). Foi coletado espécime clínico de secreção de nasofaringe, mantida a antibioticoterapia e orientado a permanecer sob isolamento domiciliar pelo Programa de Atenção Domiciliar da Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais (PAD).
Não houve melhora, ao contrário, desenvolveu dispneia; e três dias após foi admitido no HC com frequência respiratória de 40 irpm, em uso de musculatura ventilatória acessória e com tiragem intercostal moderada. Apresentava dor torácica ventilatória-dependente; pressão arterial sistêmica (PA) de 12/8 cmHg; saturimetria de pulso (Sat.O2) de 65% em ar ambiente e 85% com oxigênio em máscara facial a 15 L/min. Realizou telerradiografia do tórax, que revelou infiltrados ou opacidades com broncograma aéreo disseminados em todos os campos pulmonares, com o coração e os vasos da base normais (Figura 2). O exame clínico de sangue venoso e arterial de novo espécime revelou lactato: 0,9 mmol/L, creatinina: 1,53 mg/dL, ureia: 72 mg/dL, PCR: 217,4 ng/dL; pH: 7,39, pO2: 36 mmHg, e bicarbonato: 21,6 mEq/L. A Sat.O2 era de 77,5% com FiO2 de 0,25 com Sat.O2/FiO2 de 145, desidrogenase lática de 3.177 U/L e creatinaquinase de 6.324 U/L. A antibioticoterapia foi modificada para a associação de ceftriaxona com claritromicina e iniciado oseltamivir. A admissão hospitalar foi seguida, imediatamente, de intubação orotraqueal, realizada com muita dificuldade, e submissão à ventilação mecânica (VM). Os parâmetros iniciais para a VM revelaram a necessidade de pressão expiratória final positiva (PEFP) de 20 cmH2O, fração inspirada de oxigênio (FiO2) de 100%, pressão inspiratória (PI) de 37 cmH2O, relação inspiração/expiração (I:E) de 1:1,5, com saturimetria (Sat.O2) de 75%. Surgiu hipotensão após a sedação para a intubação, revertida pela infusão de 1.000 mL de NaCl 0,9% e norepinefrina 10 mL/h. A sedação foi instituída de forma contínua. Houve desenvolvimento de pneumomediastino e enfisema subcutâneo volumoso reabsorvido após redução da PEEP para 16 cmH2O.
A elevação da creatinaquinase associou-se à redução do volume urinário para menos de 500 mL/24 h e simultaneidade de elevação das escórias nitrogenadas sanguíneas, o que exigiu o início da terapia de substituição da função renal por intermédio da hemodiálise no quarto dia de internação hospitalar (DIH). O teste rápido para o vírus da imunodeficiência humana foi negativo.
Evoluiu com melhora da Sat.O2 e com estabilidade hemodinâmica. O resultado do exame virológico para o vírus Influenza A H1N1 2009 foi positivo.
O esquema antibiótico foi modificado três dias após a sua internação hospitalar, para cefepima e claritromicina. A administração de oseltamivir perdurou por sete dias. A antibioticoterapia foi novamente modificada no sétimo DIH, cinco e oito dias após a introdução, respectivamente, de cefepima e de claritromicina, por vancomicina e imipenam. Foi acrescida ampicilina dois dias após essa associação devido ao crescimento de Enterococcus faecalis em hemoculturas solicitadas para o controle de infecção e de antibioticoterapia. Evoluiu com redução progressiva dos parâmetros ventilatórios para a manutenção de normoxemia. A traqueostomia foi instalada por volta da segunda semana de ventilação mecânica. A temperatura corpórea apresentou tendência à elevação. Foi identificado Acinetobacter baumannii meticilinaresistente em aspirado traqueal, sendo acrescida à antibioticoterapia a polimixina E e suspensa a ampicilina. Tornou-se afebril duas semanas após, coincidindo com a redução dos parâmetros de controle da VM, quando foi possível a descontinuidade da sedação. No 28º DIH foram suspensos a vancomicina e o imipenam e mantida a polimixina E e dois dias após houve retorno da diurese efetiva, sendo interrompidas as sessões de hemodiálise. A polimixina E foi interrompida quatro dias após. Nessa época, a amostra de urina coletada para urocultura revelou a existência de Enterococcus, o que requereu a reintrodução de ampicilina quatro dias após a suspensão da polimixina E. Evoluiu sem sedação, afebril, com diurese espontânea e estabilidade hemodinâmica. Tolerou bem a descontinuação da VM. Recebeu alta da terapia intensiva uma semana após, sendo necessária oxigenioterapia a 1,5 L/min. Manteve-se com cognição normal, colaborativo, em recuperação da retenção de escórias nitrogenadas, com movimentação preservada. No sexto dia de uso de ampicilina surgiram aumentos transitórios da temperatura corpórea, sendo novamente introduzida a polimixina E associada à ciprofloxacina. Manteve-se com cognição normal, colaborativo, em recuperação da retenção de escórias nitrogenadas, com movimentação preservada. No sexto dia de uso de Ampicilina surgiram aumentos transitórios da temperatura corpórea, sendo novamente introduzida a Polimixina E associada com a Ciprofloxacina. O estudo pela tomografia computadorizada revelou consolidações acompanhando os feixes broncovasculares nos lobos superiores, língula e lobo médio, provavelmente, relacionadas à infecção, não necessariamente em atividade, podendo corresponder a imagens residuais, não sendo possível afastar a possibilidade de superposição de processo cicatrícial fibroso (Figuras 3 e 4). As hemoculturas revelaram Candida albicans, o que requereu a administração de fluconazol venoso por duas semanas. A polimixina E e o ciprofloxacino foram suspensos quatro semanas após terem sido introduzidos. O ecocardiograma transesofágico e a ultrassonografia abdominal estavam normais. A tomografia do tórax revelou, nessa época, bronquiectasias residuais e áreas de sequelas de síndrome de angústia respiratória do adulto. Permaneceu afebril e a cânula de traqueostomia foi retirada próximo de sua alta em cerca de três meses após sua internação hospitalar. As alterações fibróticas reveladas à tomografia computadorizada do tórax não se acompanharam, pelo menos, até quatro meses após a sua internação hospitalar, de repercussões identificadas à avaliação clínica (Figura 5).
DISCUSSÃO
Este relato descreve a evolução de paciente adulto jovem, com sobrepeso, infectado pelo vírus Influenza A H1N1 2009, que evoluiu com DRAG, com recuperação em 68 dias de evolução sob internação hospitalar. Contaminou-se por volta da 23ª semana epidemiológica da pandemia pelo vírus Influenza A H1N1, sem contato com caso suspeito ou confirmado dessa infecção, em Belo Horizonte. As alterações clínicas iniciais foram aumento da temperatura corpórea, tosse, mialgia, rinorreia e opacidade no lobo pulmonar inferior direito, com PCR elevada e linfocitopenia, sem leucocitose, neutroflia ou desvio para a esquerda. Desenvolveu em sete dias de infecção insuficiência ventilatória e opacidades radiológicas difusas pulmonares com área cardíaca normal, retenção de escórias sanguíneas, relação Sat.O2/FiO2 de 145 e aumento de enzimas musculares. Foi necessária a substituição das funções pulmonar e renal, respectivamente, pela VM por 41 dias e hemodiálise por 27 dias. Contraiu infecções hospitalares associadas ao Enterococcus faecalis, Acinetobacter baumannii meticilina-resistente e Candida albicans. A VM requereu parâmetros caracterizados por PEFP entre 25 e 30 cmH2O, FiO2 de 100%, PI de 37 cmH2O e I:E de 1:1,5. Evoluiu com mais de 15 pontos na escala APACHE II. Desenvolveu instabilidade hemodinâmica revertida pela infusão de volume e de vasopressor. A sua recuperação não deixou sequelas renais, entretanto, coincidiu com o desenvolvimento de áreas difusas radiológicas de bronquiectasias.1,10,37-43
A evolução clínica seguiu uma ordem de acometimento inicial das vias aéreas superiores e inferiores, seguida por insuficiência nefropulmonar aguda associada a síndrome de angústia respiratória do adulto, rabdomiólise, insuficiência renal aguda e infecções hospitalares.40-43
Os achados clínicos disponíveis sobre a DRAG associada à pandemia pelo vírus Influenza A H1N1 2009 em todo o mundo não foram suficientes para diferenciá-la da infecção pelo vírus Influenza sazonal. A faixa etária preferencial dos pacientes variou entre 13 e 47 anos, sendo em 20% das vezes associada à pneumonia bacteriana secundária e a alguma comorbidade, como: hipertensão arterial sistêmica, asma, apneia do sono obstrutiva, sobrepeso, gravidez, diabetes mellitus. O intervalo de tempo entre o início da sintomatologia e a admissão hospitalar foi de quatro a 25 dias (média de seis dias). Todos os pacientes tinham febre, com temperatura superior a 38ºC, tosse, dispneia ou insuficiência respiratória. A evolução para pneumonia lobar ocorreu, em geral, sete dias após o início da sintomatologia da influenza e a necessidade de intubação orotraqueal em menos de 24 horas após a internação hospitalar. Os óbitos decorreram da falência orgânica múltipla (FOM), observando-se a sua associação com rabdomiólise e falência nefropulmonar como seus constituintes principais. O aumento da creatininaquinase e a linfocitopenia foram encontrados em 62 e em 61% dos casos, respectivamente. A VM foi necessária em 66% e o óbito ocorreu em 58% dos pacientes, em decorrência de pneumonia hospitalar, provavelmente secundária à lesão primária do epitélio respiratório provocada pelo vírus Influenza A H1N1 2009 e/ou pela ação secundária de citocinas e de outros fatores da intermediação inflamatória. A evolução de pacientes com mais de 15 pontos na escala APACHE II representou gravidade extrema. A insuficiência respiratória requerendo intubação e VM desenvolveu-se, em geral, nas primeiras 24 horas após a admissão hospitalar, com a saturação média de oxigênio situando-se em 71% na ausência de oxigenoterapia. A PEFP requerida ultrapassou 16 cmH2O. A duração da VM variou entre sete e 30; e quatro e 17 dias nos pacientes que sobreviveram e faleceram, respectivamente. Os estudos radiológicos mostraram opacidades, revelando pneumonia. A mediana da escala APACHE II foi de 14 (média de 4 a 32) pontos, indicando alterações graves. A administração de antibióticos antes do diagnóstico de influenza foi feita em mais da metade dos casos. Foi observado aumento de desidrohenase lática, podendo exceder a 1.000 UI/L (1.086 a 6.309); da creatininaquinase, com mais de 1.000 UI/L (1.099 até 5.122); e de linfocitopenia, em 100, 60 e 61% dos pacientes, respectivamente.11-14 Estes dados podem indicar a possibilidade da associação de rabdomiólise com alteração glomerular e/ou necrose túbulo-intersticial aguda. A infusão de norepinefrina foi necessária em metade dos pacientes durante o período de hospitalização e em 25% dos casos foi administrada corticoterapia (hidrocortisona: 300 mg/dia ou metilprednisolona 60 mg/dia). A insuficiência renal estava presente em mais de 80% dos casos de morte. Em nenhum dos pacientes com DRAG foi observada síndrome de coagulação intravascular disseminada ou de complicações neurológicas. Os agentes responsáveis pelas infecções hospitalares associadas à VM foram: Acinetobacter baumanii, Achromobacter xylosoxidans, Staphylococcus aureus meticilina-resistente, Escherichia coli.1,7-14,19,20,37-43
A situação atual da transmissão pelo vírus A H1N1 o situa cada vez mais humano do que suíno. O número de casos descritos em todo o mundo atinge mais de 420.000 pessoas, com mais de 5.000 mortes em 191 países, tendo o Brasil 46.810 casos de DRAG, sendo confirmados 9.249 relacionados ao vírus Influenza A H1N1 2009, com mortalidade variando de 0,01 na Bahia a 2,08 no Paraná e 0,1% em Minas Gerais.12-14, 44-47
O caso aqui descrito trata-se da primeira DRAG identificada em Minas Gerais de infecção pelo vírus Influenza A H1N1 2009, algumas horas após a sua emergência no México. Revela algumas peculiaridades como o risco planetário em relação às doenças infecciosas, a rapidez da mobilização dos agentes infecciosos, o contato íntimo com familiares sem transmissão efetiva do vírus e o risco de que medidas de vigilância sanitária, mesmo eficazes, sejam impedidas pela mobilidade humana. Evidencia a necessidade do envolvimento social e humanitário de toda a população em risco para preservar a vida e a privacidade diante do impacto do não-usual a conferir curiosidade e a identificação de pessoas com o inusitado1-9, 44-46
Essa emergência do vírus representa oportunidade de promoção de políticas públicas para o enfrentamento de calamidades e catástrofes, mas de inclusão de todas as pessoas diante de possibilidades de emergência, reemergência e permanência de doenças, em que a solidariedade e a educação para a saúde são essenciais para o seu enfrentamento e a preservação da vida humana de forma definitiva, cuidadosa, ética e cidadã.10-13 Esse momento representa também oportunidade de observação e reflexão sobre como será o comportamento da curva epidemiológica dos países que nos próximos meses enfrentarão o inverno e como poderá ser transposta para a provável evolução da pandemia pelo vírus Influenza A H1N1 em 2010 no Brasil.14-17,25,26,32,33,40,41
CONCLUSÃO
O vírus Influenza A H1N1 2009 foi detectado pela primeira vez em Minas Gerais em maio de 2009, poucas horas após a sua emergência no México. A evidência dessa epidemia revela que o planejamento estratégico em relação ao controle de doenças deve incluir todo o planeta. A sintomatologia que determina é semelhante à da gripe humana sazonal. As medidas de vigilância sanitária parecem adequadas ao controle da endemia. A emergência dessa endemia colocou em prontidão todo o esforço humano a impedir que o vírus se disseminasse, revelando a capacidade de organização e a oportunidade de definição de enfrentamento das doenças por parte do Sistema Único de Saúde brasileiro. A sua gravidade relacionase à possibilidade de desenvolvimento de DRAG, que requer imediata abordagem de entidades sindrômicas que provocam síndrome de angústia respiratória do adulto, resposta inflamatória sistêmica grave, rabdomiólise e insuficiência renal aguda, que evoluem com FOM e elevado índice de letalidade.
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