ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Videogame: suas implicações para aprendizagem, atenção e saúde de crianças e adolescentes
Videogame: its implications for children and adolescents learning, attention and health
Luciana Alves1; Alysson Massote Carvalho2; José Carlos Cavalheiro da Silveira3; José Ferreira Belizário Filho4; Márcio Silva Fortini5; Domingos Sávio de Figueiredo Costa6; Eduardo Amaral Gomes7; Raquel Avelar Figueiredo Costa8; Éric Bambirra9
1. Psicóloga, Especialista em Saúde Mental e Neuropsicologia, Mestre em Ciências da Saúde - Área de Concentração: Saúde da Criança e do Adolescente -Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
2. Pós-Doutor em Psicologia - UNCG Orientador do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde - Saúde da Criança e do Adolescente - da Faculdade de Medicina (UFMG)
3. Psiquiatra, Doutor em Ciências pela UNIFESP. Atualmente é professor adjunto da UFMG e Membro do (NELC) Núcleo de Estudos da Linguagem e Cognição da Universidade Federal de Minas Gerais
4. Psiquiatra e Mestre em Saúde Coletiva pela UFMG. Atualmente é doutorando em Ciências da Saúde no Centro de Pesquisas Renè Rachou - CPQRR- BH/MG. É Coordenador do Ambulatório de Déficit de Atenção - AMBDA
5. Otorrinolaringologista. Mestre em Pediatria pela Faculdade de Medicina da UFMG. Preceptor da Residência Médica de Otorrinolaringologia do Hospital das Clínicas da UFMG
6. Médico Oftalmologista
7. Médico Ortopedista e Membro Titular da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia e da Associação da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Mão. É Ortopedista do Hospital Governador Israel Pinheiro (IPSEMG/BH) e Coordenador da Clínica Ortopédica e Traumatológica do Hospital Unimed de Betim
8. Psicopedagoga com ênfase em Educação Inclusiva e pós-graduada em Informática Educativa
9. Graduando do 4º período do Curso de Gestão de Tecnologia de Informação - UNI BH
Luciana Alves
Rua São Paulo, 351/1403 - Bairro: Centro
Belo Horizonte - MG CEP 30170-130
E-mail: lualbhmg@hotmail.com
Resumo
INTROCUÇÃO: o videogame tornou-se fenômeno social que envolve todos os seres humanos. É necessário avaliar a sua influência sobre a cognição e saúde de seus usuários.
OBJETIVOS: apresentar uma experiência de inserção de jogos de videogame como instrumento educacional; descrever os aspectos positivos e negativos dos jogos e sua repercussão sobre o funcionamento cerebral e sobre a saúde a partir dos achados na literatura científica e avaliar se a performance em teste de atenção sustentada é qualitativamente diferente entre quem joga e quem não joga videogame.
MÉTODO: foi investigada a performance em um teste que avalia a atenção sustentada, o Continuous Performance Test (CPT- II), em uma amostra de 30 adolescentes divididos em dois grupos, um de jogadores de videogame (JVG n = 20) e outro de pessoas que nunca jogaram videogame (NJVG n = 10). Após uma intervenção experimental, na qual o grupo de NJVG foi exposto a dois jogos de videogame por 20 sessões, três vezes por semana, 50 minutos por dia, este grupo foi retestado no CPT - II.
RESULTADOS: verificou-se que o grupo de JVG apresentou desempenho qualitativamente melhor do que o grupo de NJVG. Após a intervenção experimental, constatou-se que este último grupo teve performance qualitativamente superior em relação à avaliação inicial.
CONCLUSÕES: o videogame se constitui em instrumento que melhora o desempenho em teste que avalia a atenção. Verifica-se também a necessidade de pesquisas para esclarecer melhor estes efeitos, considerando-se variáveis sociodemográficas.
Palavras-chave: Jogos de Vídeo; Processos Mentais; Cognição; Atenção, Aprendizagem; Avaliação.
INTRODUÇÃO
A história dos videogames começou na década de 50. Hoje há o consenso de que o primeiro jogo de videogame conhecido foi criado pelo físico Willy Higinbotham, para atrair visitantes ao Brookhaven National Laboratories, em Nova Iorque. Em plena Guerra Fria, a população visitava as instalações nucleares e tinha como entretenimento um jogo de tênis simples, em computador analógico. Foi um sucesso e, durante meses, era a atração mais cobiçada pelo público, que não estava nem um pouco interessado em saber sobre megatons e fissura de átomos.
Desde então o videogame se tornou um fenômeno social. Em 1996, a indústria do videogame arrecadou 2,6 bilhões de dólares com a venda de jogos de computador e videogame.1 Em 2002, a estimativa foi de que esta indústria tenha movimentado 31 bilhões de dólares pelo mundo e, de 2003 para cá, vem crescendo cerca de 8% ao ano.2 Em 2005, a arrecadação foi de 7,0 bilhões, com 228,5 milhões de unidades vendidas. Em 2006, uma pesquisa revelou que pelo menos 42% dos americanos pretendiam adquirir um ou mais jogos.1
Evidentemente, este tipo de entretenimento tem implicações na cognição e na saúde de seus usuários, tornando-se, portanto, importante investigar o impacto da interação entre o homem e este artefato tecnológico.
Os seres humanos, utilizando as mesmas estruturas cerebrais que seus ancestrais, desenvolvem novas habilidades que serão transmitidas, por intermédio da cultura, aos seus descendentes. Esta habilidade de aperfeiçoamento provavelmente nos acompanha desde o Paleolítico e nos possibilitou desenvolver a linguagem, arte, ciência instrumentos sofisticados como os videogames e o arco e flecha.
Na atualidade, quando se leva em conta o uso do computador por crianças e adolescentes e, principalmente, os jogos de videogame, também jogados por adultos, não é de assustar o número de pesquisas que estão sendo desenvolvidas neste campo. Neste trabalho é apresentada e discutida a influência do videogame e também de jogos de computador.
Toda exposição de um organismo a um ambiente visualmente alterado resulta, não raramente, em uma alteração do sistema visual do organismo. Os cientistas interrogam se é possível aumentar a "potência" do sistema nervoso humano por meio da exposição a um ambiente em que as tarefas exigidas extrapolam as demandas de processamento presentes na vida diária.3
O videogame figura como uma das mídias mais instigantes e estimulantes da atualidade. Os jogos possibilitam que o sujeito se torne protagonista de uma história e vivencie experiências as mais variadas. O interesse popular e científico se volta para as consequências advindas dessa interação homem/jogo, procurando indícios no comportamento, interações sociais e aprendizagem.3 O jogo é uma ferramenta que exige de seus usuários a habilidade de elaborar hipóteses, construir estratégias e solucionar problemas. É uma ferramenta amplamente usada por escolares como forma de entretenimento, na educação, no treinamento de profissionais como pilotos e cirurgiões, por exemplo. Os jogos de computador ajudam a desenvolver habilidades cognitivas. Embora possam abranger uma vasta coleção de habilidades, muitas pesquisas se concentram em componentes da inteligência visual, espacial e representação icônica, habilidades cruciais para a maioria dos jogos de videogame e jogos de computador.
Do ponto de vista das neurociências, é interessante investigar, entre outros assuntos, os fatores envolvidos no aprendizado e as consequências de interações específicas entre o homem e o ambiente. Enquanto várias pesquisas estão sendo desenvolvidas para avaliar o impacto negativo do uso do videogame para o comportamento, por exemplo, outras se voltam para investigação dos efeitos benéficos dessa interação. As atividades físicas e mentais estimulam o desenvolvimento cerebral, servindo de estímulo à neurogênesis e ao aumento de conexões, assim como à vascularização dessas regiões.4
Habilidades biologicamente herdadas e as adquiridas pela experiência são assuntos que fazem parte do escopo das neurociências. Sabe-se que, na maioria das vezes, o desenvolvimento de certas habilidades advém de uma convergência entre estes dois aspectos. Contudo, essa interação é complexa e apresenta uma relação de mão-dupla, em que um processo interfere no outro.3 Assim, profissionais de várias áreas se preocupam com o impacto das novas tecnologias para o ser humano e os jogos de videogame se tornaram um capítulo à parte nesta história. Neste artigo é abordada a repercussão dos jogos de videogame para o funcionamento cerebral, seus efeitos positivos e negativos gerais, os cuidados relacionados à saúde de crianças e adolescentes que participam de um projeto de inclusão digital com acesso a jogos de videogame e relatase a investigação da atenção sustentada em adolescentes com e sem experiência com videogame.
METODOLOGIA
Foram investigadas 30 crianças e adolescentes com idades entre 10 e 16 anos de idade, de ambos os sexos, de uma instituição educacional filantrópica. Foram descartados déficits visuais, daltonismo e deficiência mental, assim como também problemas relacionados à atenção. Pais e adolescentes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Foram formados dois grupos, um de NJVG e outro de JVG. O grupo de NJVG foi constituído como uma amostra de conveniência por 10 sujeitos e o de JVG por uma amostra de 20 sujeitos, alunos de 5ª série do Ensino Fundamental ao 2ª ano do Ensino Médio. O grupo de NJVG não tinha experiência prévia com jogos de videogame, incluindo jogos de celular ou PDA, características raras nesse tipo de investigação.
No CPT II, o sujeito deve emitir uma resposta motora quando aparecer na tela qualquer letra do alfabeto, exceto na letra "X". Foram avaliadas cinco variáveis relacionadas à avaliação da atenção (erros por omissão, erros de ação, tempos de resposta, detectabilidade e variabilidade).
Todos os NJVGs foram treinados em dois jogos de videogame, "Harry Potter e o Cálice de Fogo" (Electronic Arts, 2005) e "Madagascar" (Electronic Arts, 2005), jogos selecionados entre aqueles com que o grupo de JVG já tinha prática. As crianças foram expostas aos jogos por 20 sessões de 50 minutos/dia três vezes por semana. Após a exposição, o grupo de NJVG foi retestado no CPT.
RESULTADOS
A lógica que norteia a análise dos percentis no CPTII é de que quanto maior o percentil alcançado, pior o desempenho do sujeito, o que pode significar que este apresenta problemas atencionais. Vale ressaltar que o teste, ainda que seja utilizado mundialmente para auxiliar no diagnóstico de transtorno de déficit de atenção, não foi utilizado nesta pesquisa como ferramenta clínica. A análise dos resultados da média dos percentis dos dois grupos revelou que o grupo de JVG apresentou resultados melhores em três das cinco variáveis analisadas. Cometeu menos erros por omissão em responder a uma tarefa (não-X), com percentil igual a 35,96 contra 56,32 do grupo de NJVG. A média dos tempos de resposta (TR) apresentou percentil igual a 38,7 contra 55,49. E em relação à variabilidade da resposta, que avalia a consistência da resposta durante o teste, os JVGs obtiveram média de percentil de 31,73 contra 40,31. Não houve diferença expressiva para as variáveis que avaliam erros de ação (JVG 46,16 X 45,7 NJVG) e detectabilidade, que significa a capacidade de discriminar entre um alvo (não-X) e não-alvo (X) - (JVG 47,6 X 46,09 NJVG).
Portanto, os JVGs cometeram menos erros de omissão em responder frente a uma tarefa, ou seja, toda vez que qualquer letra, exceto a letra "X", apareceu na tela do computador, este grupo apresentou média de percentil melhor do que o grupo de NJVG. Um grande número de omissões indica que o sujeito está literalmente não orientado e respondendo ao estímulo ou que o sujeito apresenta uma resposta diminuída ou lenta. Desta maneira, pode-se afirmar que o grupo de JVG esteve mais bem orientado e respondeu ao estímulo alvo um maior número de vezes e que seus tempos de respostas mais rápidos também podem ter sido fundamentais para esse melhor desempenho.
Em relação aos tempos de resposta, o percentil do grupo de JVG demonstra que estes foram mais ágeis em responder mediante o aparecimento do alvo do que NJVG. Como visto, este fator pode ter sido fundamental para o menor número de omissões cometidas por este grupo. E, por fim, também se observou que o JVG apresenta melhor consistência na velocidade de resposta no decorrer do teste.
Após a intervenção, o grupo de NJVG foi retestado no CPT-II e apresentou melhores percentis em todas as cinco variáveis avaliadas. Em omissões, apresentou média de percentil igual a 37,14, sendo, respectivamente, 25,1; 35,48, 15,6 e 26,07 os percentis para erros por ação (comissions), tempo de resposta (TR), variabilidade e detectabilidade (Figura 1).
Assim, em situação reteste o grupo de NJVG apresentou-se mais orientado e respondeu ao estímulo alvo um maior número de vezes, melhorou seus tempos de resposta, melhorou a consistência da velocidade da resposta, sua capacidade de discriminar entre alvo e não-alvo e cometeu menos erros por ação do que em situação de teste.
A análise das médias dos percentis dos grupos mostra, portanto, diferença qualitativa de desempenhos entre os grupos e que a exposição aos jogos de videogame foi capaz de influenciar o desempenho do grupo de NJVG no teste atenção sustentada com o CPT-II. Outras análises serão feitas para esclarecer quantitativamente o significado dessas diferenças qualitativas, inclusive com discriminação por faixas etárias.
DISCUSSÃO
Funções cognitivas
As funções cognitivas são o alicerce das operações mentais e se constituem nos componentes básicos para a atividade intelectual. Elas permitem perceber, elaborar e expressar informações e são passíveis de sofrer acomodações e adaptações a partir dos diferentes modos com que ocorre a interação com o ambiente.5
Essas funções são processos mentais que permitem: raciocinar, pensar e resolver problemas e incluem a compreensão e a utilização da linguagem; o reconhecimento dos objetos, assim como situá-los no espaço; aprender e recordar informações recentes; resolver problemas; sustentar, focar ou dividir a atenção; e planejamento, entre outros. As principais funções cognitivas incluem a percepção, atenção, memória, linguagem e funções executivas. É a partir da investigação da relação entre todas estas funções que se podem entender os comportamentos desde os mais simples aos de maior complexidade.
Os neurocientistas cognitivos não estão interessados somente na questão das consequências do treinamento com videogames, mas também nos fatores que envolvem seu aprendizado.
Repercussões dos games para o funcionamento cerebral
Pesquisas que investigam sobre as repercussões do videogame no comportamento cerebral têm demonstrado que existem modificações no nível de dopamina cerebral6; nas concentrações de hemoglobina (Hb) tanto oxi-Hb quanto dexoxi-Hb7,8; que mudanças fisiológicas, metabólicas e hemodinâmicas podem sofrer alterações com esta interação9; e que é possível acessar com confiabilidade a carga cognitiva induzida por jogar videogame a partir de meios comportamentais e neuroelétricos utilizando-se o event-related potential (ERP).10
A compreensão dos substratos neuroanatômicos e neuroquímicos envolvidos no uso do videogame e no aprendizado que este induz se constitui como um dos maiores desafios que os pesquisadores têm pela frente.
O videogame na sala de aula: repercussões sobre a cognição, interação social e subjetividade dos adolescentes
Entre os professores que utilizam as Novas Tecnologias de Comunicação e Informação (NTCIs) como ferramentas educacionais, acredita-se que, além do aspecto lúdico intrínseco ao jogo, existem outros fatores que contribuem, significativamente, para o processo de desenvolvimento cognitivo, afetivo e interpessoal dos jogadores de videogame. O aspecto lúdico do jogo é entendido como algo estimulante, divertido, motivador, desafiante, que surpreende e faz refletir; em outro contexto, experimentar novas hipóteses. Os jogos estimulam as crianças e os adolescentes a desenvolverem a criatividade, imaginação, habilidades cognitivas e motoras, além de proporcionar interatividade que os estimula a tomar decisões e criar estratégias.
A prática do jogo é sempre permeada de emoções, atitudes e falas que revelam muito o jeito de ser, agir e as relações que o educando compartilha em casa ou na escola. No diálogo com os alunos sobre determinado jogo, o professor começa a conhecer melhor o seu grupo de trabalho e compreender o mundo que o cerca.
O jogo não deve ser visto como objeto estático sempre igual para todos os sujeitos. Ao contrário, é um objeto dinâmico que se altera em função do âmbito cultural do aluno. É importante levar em consideração a individualidade de cada aprendiz, uma vez que cada um pode aprender de forma diferenciada, permitindo, assim, que cada estudante assimile conhecimentos e experiências em seu próprio ritmo.
Vale dizer que o processo de aquisição do conhecimento passa pela prática de jogar, bem como pela exploração de algumas etapas do jogo que devem ser conduzidas pelo professor:
exploração do jogo e aprendizagem de regras;
prática do jogo e construção de estratégias;
resolução de situações-problema;
análise de resultados.
O relato de crianças que participam de um projeto com objetivo educacional, de inclusão digital com acesso, inclusive aos jogos de videogame, de uma cidade de médio porte, demonstra que o jogar extrapola a questão do meramente brincar, tem repercussões subjetivas positivas para esses adolescentes e promove interação social entre eles:
Desde que comecei a jogar, consigo prestar mais atenção em tudo, outra coisa importante foi que aprendi a perder. Tirei melhores notas em inglês porque tem jogos que são em inglês e vendo as palavras que não sei o significado olho no dicionário (A.A.S - 12 anos, 6ª série).
Gosto do jogo Sim City porque nele me transformo no prefeito de uma cidade. Preciso fazer contas, empréstimo bancário e fazer várias outras coisas com dinheiro. Além de desenvolver muito o nosso raciocínio (L. H. O - 14 anos, 8ª série).
Jogar em rede para mim é uma surpresa, porque a gente testa a habilidade do outro (G. C. - 12 anos, 6ª série).
O meu pensamento durante o jogo é ganhar, e não perder, mas se perco procuro saber onde errei (L.M. - 13 anos, 7ª série).
Quando estou jogando, sinto uma sensação muito boa de estar dirigindo meu próprio carro. Isso também mudou o meu comportamento, estou mais quieto, não brigo mais na escola (T. F. M - 12 anos, 6ª série).
Efeitos positivos gerais dos jogos de videogame
Desde a década de 70 o jogo eletrônico é parte integrante da nossa sociedade e se tornou alvo de preocupação de pais e profissionais das mais diversas áreas do conhecimento.
Em relação à aprendizagem, os jogos de videogame desenvolvem habilidades tais como11:
leitura: quando se usam games para promover a leitura, usando paralelos entre os jogos e os livros, como em "O Senhor dos Anéis" ou "Harry Potter e o Cálice de Fogo", entre outros.
pensamento lógico: jogos eletrônicos ajudam a pensar em como resolver problemas, propor estratégias, organizar elementos e antecipar resultados.
observação: a maioria dos jogos exige que o jogador seja capaz de discriminar na tela inúmeros objetos, reconhecendo cada um deles e traçando possíveis trajetórias.
localização e representação espacial: o desenvolvimento de cartografia e representação espacial é exigido em mapas; plantas e recursos como bússola estão presentes em muitos jogos para orientação do personagem.
resolução de problemas e tomadas de decisão: aspecto este particularmente importante em jogos de estratégia e onipresente em jogos que envolvem situações difíceis.
planejamento de estratégias: habilidade relacionada com a resolução de problemas, presente em muitos games que envolvem alto nível de atividade cognitiva, como os RPGs (Roling Players Games).
São muitos os estudos que corroboram a noção de que os jogos são ferramentas úteis para a aprendizagem.12,13 No Brasil, pode-se citar o "Jogo Zig-Zaids"14, cujo objetivo é prevenir a AIDS entre pré-adolescentes e adolescentes; e o "Jogo da Onda", que se refere ao uso de drogas. Outros efeitos positivos dos jogos incluem a melhora da atenção visual15-17, melhora da habilidade espacial18,19 e da memória de trabalho visual17; estes jogos também podem se tornar fonte de motivação para atividade física.20,21
Efeitos negativos gerais
Na sociedade contemporânea, vivências diferenciadas por meio da evolução da esfera computacional e digital podem estimular condutas diversas, inclusive condutas agressivas.
O aumento da violência e dos níveis de agressividade, no cotidiano de crianças e jovens, por meios midiáticos com conteúdos violentos, tem sido foco para muitos estudos.
Os estudos a respeito dos efeitos negativos sobre os jogos se dão em relação aos seus efeitos sobre o afeto e comportamentos agressivos, cujos resultados revelam a existência desses potenciais efeitos22-24; vício ou dependências gerados pelos jogo25; problemas de saúde relacionados com epilepsia26, síndromes músculo-esqueléticas27,28; alterações no sono29; e problemas de saúde mental30; só para citar alguns.
Cuidados relacionados à saúde das crianças e adolescentes com acesso a jogos de videogame
Um assunto não abordado em pesquisas especificamente envolvendo videogames, mas que já se constitui um problema significativo de saúde, são as perdas auditivas advindas do uso de fones de ouvido. Os fones são usados por muitos jogadores. Muitos pesquisadores já estudaram o efeito que o som tem nos ouvidos e como ele prejudica a audição e a saúde do homem. Nos tempos atuais, vive-se num mundo barulhento, cheio de ruídos vindos de todos os lados: das fábricas, do trânsito, dos shows de música, dos brinquedos e até mesmo dos joguinhos eletrônicos. Todos muito barulhentos.
Cientistas comprovaram que se deve escutar determinados tipos de sons somente por certo período de tempo para evitar os prejuízos causados à audição. Quanto mais baixo, isto é, menos decibéis o som tiver, mais tempo pode ser escutado. Existem leis que protegem os trabalhadores de fábricas ou de locais muito barulhentos. Quanto mais alto for o barulho no ambiente de trabalho, mais curta vai ser a jornada do trabalhador. Mas, para as crianças e adolescentes não existem leis protetoras que limitem o som produzido pelos joguinhos eletrônicos, walkmans, fliperamas, discotecas. Não é informado às pessoas o quanto o som daquele aparelho pode danificar os ouvidos e, no futuro, levar à surdez.
Outro fator aspecto da saúde também importante é a saúde visual em relação às telas de computador. A síndrome visual relacionada a computadores (SVRC) também poderia acometer estes pequenos jogadores sem uma adequada supervisão. A popularidade do computador e a facilidade de acesso têm conquistado cada vez mais usuários, tanto profissionalmente quanto no uso doméstico. Esse aumento de uso tem desenvolvido sintomas em cerca de 80% dos usuários. A SVRC tem sido atribuída aos usuários dos microcomputadores que ultrapassam a média de três horas diárias de uso, em sua maioria. As queixas mais frequentes da SVRC são: dores de cabeça, olhos vermelhos, sensação de olho seco, ardência, cansaço e embaçamento. A exposição prolongada interfere no mecanismo de acomodação ocular, na capacidade de convergência dos olhos e ainda determina a indução de miopia passageira.
Os problemas posturais são outro aspecto relacionado à saúde. Os movimentos repetitivos que são feitos durante os jogos, seja nos comandos do teclado ou em manetes, também podem levar a lesões, fazendo com que a brincadeira se torne um problema de saúde. Por isso, é indicado que os usuários de computadores, com fins de trabalho ou diversão, como no caso dos videogames, deem uma pausa de 10 minutos a cada 50 minutos em suas atividades. Em relação às crianças que participam do projeto, o tempo de permanência no uso desta ferramenta é de 50 minutos, três vezes por semana.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não resta dúvida de que, para crianças e adolescentes, os jogos são fonte de entretenimento, motivo que pode levá-los a ficar horas em frente ao computador ou a uma TV conectada a um videogame. Contudo, também é uma constatação de que o uso indiscriminado deste artefato cultural pode levar ao comprometimento da saúde desses usuários.
Embora o resultado obtido na jogada nem sempre seja satisfatório, o que fica é o desejo de uma nova partida e a vontade de superar-se e vencer. Nesse sentido, o jogador elabora novas estratégias para a superação de desafios. Inicia-se um trabalho de levantamento de hipóteses para tentar explicar o que deu errado e o que precisa ser aperfeiçoado na jogada. Ou seja, há uma reestruturação do pensamento no sentido de aperfeiçoar: regras, habilidades motoras, concentração e atenção, aspectos estes que contribuem para a melhoria do desempenho do jogador. Além disso, os jogos promovem socialização entre os educandos, uma vez que dicas e "macetes" são trocados entre eles.
A interação com os jogos eletrônicos permite que as funções cognitivas (memória, atenção, percepção) sejam exercitadas, favorecendo a descoberta de novas formas de conhecimento. Aprende-se a aprender. Sobre a investigação da performance dos grupos no teste de atenção, este estudo destaca a necessidade de que outras pesquisas sejam feitas para esclarecer melhor esses efeitos em grupos populacionais maiores, de diferentes faixas econômicas e com grupos de JVG que tenham experiências com diferentes tipos de categorias de jogos (ação, aventura, etc.). É necessário também determinar melhor o nível em que a experiência com essas categorias pode afetar desempenhos em tarefas cognitivas.
REFERÊNCIAS
1. Entertainment Software Association (ESA). Essential facts about the computer and videogame industry. 2006. [Acesso em 15 nov. 2007]. Disponível em: http://www.theesa.com/facts/pdfs/ESA_EF_007.pdf.
2. Mendes CL. Jogos eletrônicos: diversão poder e subjetivação. Campinas-SP: Papirus; 2006.
3. Green CS, Bavelier D. The cognitive neuroscience of video games. In: Messaris P, Humphreys L, editors. Digital Media: transformations in human communication. New York: Peter Lang; 2004.
4. Cozolino LJ. The Neuroscience of psychotherapy: building and rebuilding the human brain. New York, London: WW Norton & Company; 2002.
5. Silva MC. Funções cognitivas Segundo Feuerstein. 2006 [Acesso em 11 nov. 2007]. Disponível em: http://www.psicologia.com.pt/artigos/textos/A0275.pdf.
6. Koepp MJ, Gunn RN, Lawrence AD, Cunningham VJ, Dagher A, Jones T et al. Evidence for striatal dopamine release during a video game. Nature. 1988;393:266-8.
7. Matsuda G, Hiraki K. Susteined decrease in oxygenated hemoglobin during video games in the dorsal prefrontal cortex: a NIRS study of children. Neuroimage. 2006;29:706-11.
8. Nagamitsu S, Nagano M, Yamashita Y, Takashima S, Matsuishi T. Prefrontal blood volume patterns while playing video games - A nearinfrared spectroscopy study. Brain & Development. 2006;28:315-21.
9. Wang X, Perry AC. Metabolic and physiologic responses to video game play in 7-to 10-year-old boys. Arch Pediatr Adolesc Med. 2006;160:411-5.
10. Allison BZ, Polich J. Workload assessment of computer gaming using a single-stimulus event-related potential paradigm. Biol. Psychol. 2008;77:277-83.
11. Pinto RD, Ferreira LF. Ciência do Comportamento e aprendizagem através de jogos eletrônicos. I Seminário jogos eletrônicos, educação e comunicação - Construindo novas trilhas - Jogos eletrônicos e educação; 2005. Salvador-BA: UNEB; 2005.
12. Kato PM, Beale IL. Factors affecting acceptability to young cancer patients of a psychoeducational video game about cancer. J Pediatr Oncol Nurs. 2006;23:269-75.
13. Yoon SL, Godwin A. Enhancing self-management in children with sickle cell disease through playing a CD-ROM educational game: a pilot study. Pediatr Nurs. 2007;33(1):60-3.
14. Schall VT, Monteiro S, Rabello SM, Torres M. Evaluation of the Zig-Zaids game: an entertaining educational tool for HIV/Aids prevention. Cad Saúde Pública. 1999; 15(2):107-19.
15. Dubar G, Hill R, Lewis V. Children's attentional skill's and road behavior. J Exp Psychol Applied. 2001;7(3):227-34.
16. Green CS, Bavelier D. Action Video game modifies visual selective attention. Nature. 2003;423:534-7.
17. Green CS, Bavelier D. Enumeration versus multiple object tracking: the case of action video game players. Cognition. 2006;101:217-45.
18. Feng J, Spence I, Pratt J. Playing an action video game reduces gender differences in spatial cognition. Psychol Sci. 2007;18(10):850-5.
19. Green CS, Bavelier D. Action-video-game experience alters the spatial resolution of vision. Psychol Sci. 2007;18(1):88-94.
20. Betker AL, Szturm T, Moussavi ZK, Nett C. Video game-bases exercises for balance rehabilitation: A single-subject design. Arch Phys Med Reabil. 2006;87:1141-9.
21. Widman LM, McDonald CM, Abresch RT. Effectiveness of an upper extremity exercise device integrated with computer gaming for aerobic training in adolescents with spinal cord dysfunction. J Spinal Cord Med. 2006;29(4):363-70.
22. Anderson CA, Bushman BJ. Effects of violent video games on aggressive behavior, aggressive cognition, aggressive affect, physiological arousal, and prosocial behavior: a meta-analytic review of the scientific literature. Psychol Sci. 2001;12(5):353-9.
23. Gentile DA, Lynch PJ, Linder JR, Walsh DA. The effects of violent video game habits on adolescent hostility, aggressive behaviors, and school performance. Int J Adolesc Youth. 2004;27(1):5-22.
24. Bartholow BD, Sestir MA, Davis EB. Correlates and consequences of exposure to video game violence: hostile personality, empathy, and aggressive behavior. Personal Soc Psychol Bull. 2005;31(11):1573-86.
25. Tejeiro R. La adicción a los videojuegos. Una revisión. Adicciones. 2001;13(4):407-13.
26. Chuang Y-C, Chang W-N, Lin T-K, Lu C-H, Chen S-D, Huang C-R. Game-related seizures presenting with two types of clinical features. Addiction. 2006; 15:98-105.
27. Koh GTHH. Ulcerative "nintendinitis": a new kind of repetitive strain injury. Med J Australia. 2000;173:671.
28. Cleary AG, Mckendrivck H, Sills JA. Handa rm vibration syndrome may be associated with prolonged use of vibrating computer games. BMJ. 2002; 324:301.
29. Higuchi S, Motohashi Y, Liu Y, Maeda A. Effects of playing a computer game using a bright display on presleeep physiological variables, sleep latency, slow wave sleep and REM sleep. J Sleep Res. 2005;14:267-73.
30. Forsth R, Harland R, Edwards T. Computer game delusions. J R Soc Med. 2001;94:184-185.
Copyright 2025 Revista Médica de Minas Gerais
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License