RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 18. 4

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Relato de Caso

Malformação adenomatóide cística

Cystic adenomatoid malformation

Heraldo Carlos Pereira1; Jose Adriano Sicca2; Ana Paula Piazzalunga Cambraia Pereira3; Bráulio Braz Pinheiro4

1. Membro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia, Chefe do Serviço de Imagenologia do H.U.A.V. (Hospital Universitário Alzira Velano) e professor da Faculdade de Ciências Médicas de Alfenas/MG
2. Estagiário do 3º ano do serviço de radiologia do H.U.A.V.
3. Residente do 2º ano do serviço de radiologia do H.U.A.V.
4. Acadêmico do 6º ano da Faculdade de Ciências Médicas de Alfenas/MG

Endereço para correspondência

Heraldo Pereira
Rua Rondônia, n. 315 - Jardim Elite
Alfenas - MG CEP: 37.130-000
E-mail: heraldo@pitnet.com.br

Instituição: Hospital Universitário Alzira Velano ( UNIFENAS )

Resumo

A patologia é uma malformação pulmonar rara, acreditando ser uma falha na conexão entre o desenvolvimento do coto brônquico e os espaços aéreos distais. O presente trabalho relata um caso de malformação adenomatoide cística, diagnosticada intra-útero, durante a realização de ultra-sonografia de rotina, em uma gestante de 18 anos, com vinte e duas semanas de idade gestacional e o acompanhamento pós natal, dando ênfase aos exames complementares antes e após a intervenção cirúrgica ( lobectomia parcial direita ).

Palavras-chave: Pulmão/anormalidades; Anormalidades do Sistema Respiratório; Malformação Adenomatóide Cística Congênita do Pulmão.

 

INTRODUÇÃO

A malformação adenomatóide cística é uma anormalidade congênita rara, com repercussões respiratória e circulatória.1-4 Pode-se observar anasarca ou hidropsia fetal, devido à obstrução mecânica do retorno venoso e a angústia respiratória no período neonatal é muito freqüente e pode ser complicada por infecções pulmonares.4

Inicialmente, a malformação comporta-se como uma massa torácica cheia de líquido, que provoca balanço mediastinal contralateral e compressão do tecido pulmonar remanescente. Como esses cistos geralmente se comunicam com as vias aéreas, o ar acaba substituindo o líquido e, então, são visualizadas as bolhas.3,4

Em geral, a lesão é unilateral e tem sido correlacionado a uma anomalia do suprimento sangüíneo da aorta.5

A malformação adenomatóide cística tem sido classificada em três subtipos, de acordo com os aspectos clínicos e anátomo-patológicos, a saber: o tipo I contendo componentes bronquiolares, relativamente bem diferenciados e ausência de cartilagens, surgindo possivelmente antes da 10ª semana de gravidez; o tipo II ocorre, provavelmente, antes de 31 dias de vida, devido ao grande número de anomalias estruturais associadas; o tipo III apresenta pouca diferenciação dos tecidos epiteliais e mesenquimais, sugerindo início desta anomalia, entre 26 e 28 dias.6,7

O diagnóstico definitivo é dado pelo estudo histológico, mas os métodos de imagem vêm contribuindo, substancialmente, na elucidação diagnóstica.8

Os achados radiológicos são variáveis e dependem do tamanho da lesão e de seu conteúdo: ar ou líquido.5

Na fase inicial, geralmente, a lesão é sólida, com cistos cheios de líquido. Neste estágio é difícil diferenciá-los do pulmão cheio de líquido do enfisema lobar ou da atresia brônquica. À medida que o ar substitui o líquido e formam-se as bolhas, elas podem simular pneumatoceles de uma pneumonia estafilocócica ou as alças cheias de ar, como ocorre na presença de hérnia diafragmática congênita. Em alguns casos, os cistos tornam-se extremamente grandes e de parede tão delgada que dificulta sua detecção e faz diagnóstico diferencial com um grande pneumatórax.4,8

A sobrevivência dos fetos portadores da malformação adenomatóide cística depende da presença ou não de hipoplasia pulmonar e das anomalias associadas. O tipo I apresenta excelente prognóstico, caso não haja hipoplasia pulmonar, devendo, o recém-nascido, submeter-se à ressecção da área pulmonar comprometida. O tipo II apresenta um prognóstico ruim, devido às anomalias associadas. Enquanto o tipo III, freqüentemente, está associado ao óbito perinatal, em decorrência de hipoplasia pulmonar e hidropisia fetal.7

 

RELATO DE CASO

M.M.F., 18 anos, casada, dona de casa, hipertensa em uso de metildopa, com 22,4 semanas de gestação sem queixas, é encaminhada ao ambulatório de gestação de alto risco do nosso serviço, com história de alteração ultrasonográfica na região torácica do feto, suspeitando-se de hérnia diafragmática.

A paciente foi prontamente submetida a um novo ultra-som, que evidenciou gestação tópica, única com idade gestacional ecográfica, estimada em 23 semanas; feto com bons sinais vitais; normoidrâmnio, placenta com grau I de granum e presença de formação cística lobulada, no hemitórax direito do feto, medindo 5,0 x 3,1 cm em seus maiores diâmetros de etiologia a esclarecer, como se observa na Figura 1.

 


Figura 1 - Ultra-sonografia

 

Durante o período de gestação, foram realizadas ultra-sonografias seriadas, com preservação das medidas e das características da malformação torácica fetal.

Com 39 semanas de idade gestacional, após início do trabalho de parto, foi optado pela realização de cesárea, com o objetivo de diminuir o risco de rompimento do cisto torácico, durante a passagem do feto através do canal de parto.

O parto foi bem sucedido, no entanto, o recémnascido apresentou desconforto respiratório, durante o nascimento, necessitando, assim, de assistência ventilatória.

Ao ser realizado radiografia de tórax, que evidenciou pulmão direito aumentado de volume, apresentando, em seu interior, algumas pequenas formações císticas e uma formação cística maior, medindo 4,5 cm de extensão, condicionando importante desvio contralateral das estruturas mediastinais e área cardíaca de difícil avaliação.

Aspecto radiográfico compatível com malformação adenomatoide cística à direita. (Figura 2)

 


Figura 2 - Radiografia do tórax

 

Foi solicitado a realização de tomografia computadorizada de tórax, após a infusão de contraste oral, visualizando estruturas mediastinais anatômicas compatíveis com a faixa etária, desviadas para a esquerda; presença de inúmeras formações bolhosas em pulmão direito, de tamanhos variados, contornos regulares com infiltrado interstício alveolar do parênquima remanescente, condicionando aumento volumétrico e desvio do mediastino para a esquerda; e partes moles e arcabouço ósseo da parede torácica de aspectos usuais. Aspecto tomográfico compatível com malformação adenomatóide cística do pulmão direito. (Figura 3)

 


Figura 3 - Tomografia comutadorizada de tórax

 

Sete dias após o nascimento foi realizado lobectomia parcial em pulmão direito com sucesso e, após treze dias de pós-operatório, o recém-nascido assumiu respiração espontânea, mantendo-se apenas taquidispneico.

Paciente com boa evolução, mantendo saturação de oxigênio desejável, recebeu alta hospitalar com orientações à mãe.

Atualmente, a criança recebe acompanhamento pediátrico e radiográfico. A última radiografia de tórax observou pulmão direito hiperinsulflado e hipertransparente, especialmente na base (cirurgia prévia de malformação adenomatóide cística ), seios costofrênicos livres e área cardíaca normal. (Figura 4)

 


Figura 4 - Ultima radiografia de tórax

 

No momento, a criança encontra-se bem e, segundo a mãe, apresenta ruídos inspiratórios e taquipnéia durante as mamadas.

 

CONCLUSÃO

Atualmente, com a utilização da ultra-sonografia obstétrica de rotina, a detecção pré-natal da malformação adenomatoide cística não e tão rara e merece atenção de todos, especialmente, dos profissionais diretamente ligados aos métodos de imagem.

 

REFERÊNCIAS

1. Adzick NS, Harrison MR, Flake AW, Howell LJ, Golbus MS, Filly RA. Fetal surgery of cystic adenomatoid malformation of the lung. J Pediatr Surg. 1993 Jun; 28(6):806-12.

2. Brasileiro Filho G. Bogliolo Patologia. 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2000.

3. Beryl RB. Diagnostico ultra sonografico das síndromes fetais. Rio Janeiro: Revinter; 2001.

4. Swischuk LE. Diagnóstico por imagem em neonatologia e pediatria. 5ª ed. Rio Janeiro: Revinter; 1991.

5. Lange S, Stark P. Atlas de radiologia torácica. Rio Janeiro: Revinter, 1999. 290 p

6. Lenza GF, Furley PR, Benazzi A, Ventura HJ, Lopes JMA. Cisto endematóide congênito do pulmão fetal diagnóstico ultra-sonográfico. J Bras Ginecol. 1993; 103:129-31.

7. Pastore AR, Cerri GG. Ultra sonografia Obstetrícia/Ginecologia. São Paulo: Sarvier; 2000.

8. Juhl JH, Crummy AB, Kuhlman JE. Paul & Juhl: Interpretação radiológica. 6ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1996.

9. David S. A textbook of radiology and imaging. 4th ed. Churchill Livingstone;1987. Vol one.