RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 22. 4

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Artigo Original

Avaliação de estratégia combinada de eletroforese capilar e PCR triplo metilação-específica para diagnóstico molecular da Síndrome do X Frágil

Assessment of a combined strategy of capillary electrophoresis and methylation-specific triple polymerase chain reaction for molecular diagnosis of the Fragile X Syndrome

Marcos José Burle de Aguiar1; Melissa Machado Viana2; Letícia Lima Leao3; Amanda Silva Matos4; Dora Méndez del Castillo5; José Nélio Januário6

1. Médico geneticista. Professor Associado do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais-FM/ UFMG. Vice-Diretor do Núcleo de Açoes e Pesquisa em Apoio Diagnóstico-NUPAD/ FM/ UFMG. Serviço Especial de Genética Médica, Hospital das Clínicas da - UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Médica geneticista. Serviço Especial de Genética Médica, Hospital das Clínicas da UFMG. Doutoranda em Ciências da Saúde - Area de Concentraçao em Saúde da Criança e do Adolescente, FM/ UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Médica Geneticista. Serviço Especial de Genética Médica, Hospital das Clínicas da - UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
4. Biomédica, Técnica em Biologia Molecular do Laboratório de Genética e Biologia Molecular do NUPAD/FM/UFMG Belo Horizonte, MG - Brasil
5. Médica geneticista. Coordenadora do Laboratório de Genética e Biologia Molecular do NUPAD/FM/UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
6. Médico. Professor do Departamento de Clínica Médica da FM/UFMG. Diretor geral do NUPAD/FM/UFMG. Belo Horizonte, MG - Brasil.

Endereço para correspondência

Prof. Dr. Marcos José Burle de Aguiar
Av. Alfredo Balena, 198, 10º andar, sala 1006
Bairro: Santa Efigênia
CEP: 30130-100
Belo Horizonte, MG - Brasil
E-mail: aguiarmr@terra.com.br

Recebido em: 17/08/2011
Aprovado em: 29/09/2012

Instituiçao: Núcleo de Açoes e Pesquisa em Apoio Diagnóstico da Faculdade de Medicina da UFMG Belo Horizonte, MG - Brasil

Resumo

INTRODUÇÃO: a síndrome do X frágil é a principal causa de retardo mental de natureza familiar. Suas características clínicas pouco marcantes fazem com que um diagnóstico de certeza a partir de testes moleculares seja imprescindível.
OBJETIVO: descrever e avaliar as vantagens e desvantagens de uma estratégia combinada de PCR triplo metilação-específica e eletroforese capilar para o diagnóstico molecular da síndrome do X frágil, visando baixo custo, exequibilidade, reprodutibilidade e sensibilidade.
MÉTODOS: foram coletadas 43 amostras de sangue de pacientes com déficit cognitivo e de suas maes, quando indicado. Tais indivíduos possuíam exame citogenético positivo, fenótipo e/ou história familiar sugestivas de síndrome do X frágil. Após extração de DNA, foi realizada eletroforese capilar com marcadores fluorescentes, tratamento com bissulfito de sódio e três reações de PCR metilação-específicas em cada amostra.
RESULTADOS: foi possível determinar o genótipo em 29 pacientes: 23 (14 homens e nove mulheres) apresentavam alelos com tamanho normal e seis (todos do sexo masculino) possuíam alelos na faixa de mutação completa. Em outras seis amostras, todas do sexo feminino, foi possível determinar um alelo na faixa normal e outro alelo alterado, entretanto, sem diferenciação entre faixa de pré-mutação ou de mutação completa. Nas demais oito amostras (cinco homens e três mulheres), não se pôde determinar o genótipo.
CONCLUSÕES: a técnica proposta faz uma triagem de pacientes, mas apresenta desvantagens, como não terem sido obtidos resultados satisfatórios com as reações para alelos metilados e a análise dos rastros das PCRs com três primers ter se mostrado difícil e dependente de observador.

Palavras-chave: Síndrome do Cromossomo X Frágil; Patologia Molecular; Eletroforese Capilar; Bissulfito de Sódio, Reação em Cadeia da Polimerase; Metilação.

 

INTRODUÇÃO

A síndrome do X frágil é a principal causa de retardo mental de natureza familiar. Calcula-se sua prevalência em 1:4.000 no sexo masculino e 1:6.000 no sexo feminino.1 Em Belo Horizonte, estudando alunos com retardo mental leve e grave matriculados em escolas públicas de ensino especial, foi encontrada prevalência próxima de 2%.2,3 Clinicamente não existem características físicas singulares e marcantes que diferenciem um paciente com retardo mental como parte da síndrome do X frágil e outro com retardo mental sem tal diagnóstico etiológico.4

Em 1991, foi identificado o gene envolvido na síndrome do X frágil, denominado FMR15, localizado em Xq27.3 (sítio FRAXA), com extensão de 38 kb e 17 éxons.6 Em sua regiao 5'-UTR (5' - untranslated region) há uma repetição polimórfica CGG não transcrita que, quando expandida, causa a síndrome do X frágil.

De acordo com o número de repetições CGG, seus efeitos sobre a proteína produzida e, consequentemente, sobre o fenótipo dos indivíduos, dois tipos de mutações são identificados: as pré-mutações e as mutações completas. As mutações completas, com mais de 200 repetições, são completamente metiladas, o que inativa o gene FMR1. As mutações completas se associam à deficiência mental em todos os homens e em 50 a 70% das mulheres.7 Já portadores de pré-mutações, com 55 a 200 repetições, podem apresentar pelo menos uma de três alterações clínicas: déficit cognitivo e/ou comportamental leve, insuficiência ovariana prematura associada ao X frágil (Fragile-X Associated Premature Ovarian Insufficiency-FXPOI) em mulheres e distúrbio neurodegenerativo em portadores adultos do sexo masculino, conhecido como síndrome de tremor /ataxia associada ao X frágil (Fragile X-associated Tremor/Ataxia Syndrome-FXTAS).8,9

Até a clonagem do gene FMR1, o único método disponível para o diagnóstico da síndrome do X frágil era a detecção do sítio frágil na regiao q27.3 do cromossomo X por técnicas citogenéticas. O resultado é dado a partir do percentual de células encontradas com o sítio frágil. Trata-se de método caro, demorado e dependente do observador, uma vez que exige a análise de elevado número de metáfases. É também pouco acurado, com resultados falso-positivos e falso-negativos.

Atualmente, o padrao-ouro para diagnóstico molecular da síndrome do X frágil é uma combinação entre Southern blot e técnicas de reação em cadeia da polimerase (PCR) metilação-específica. A combinação de ambos faz com que o diagnóstico seja bastante confiável, uma vez que a maior desvantagem do método de Southern blot é distinguir com dificuldade alelos normais grandes e pré-mutações pequenas, enquanto as técnicas de PCR metilação-específica apresentam baixa sensibilidade para detecção de pré-mutações grandes e alelos com mutações completas, especialmente em mulheres. Apesar da confiabilidade, todo o processo diagnóstico é lento e tedioso.10 Por isso, vários métodos diagnósticos são desenvolvidos na comunidade científica com o objetivo de substituir a técnica padrao-ouro.11-13

Em 2004, Zhou et al.10 descreveram um teste de diagnóstico molecular alternativo que envolvia modificação do DNA com bissulfito e três reações em sequência de PCR-metilação específica, as quais, sendo analisadas em conjunto, forneciam a categoria dos alelos estudados (normais, pré-mutados e mutação completa). Esse método mostrou-se eficaz, confiável e mais rápido em relação à associação Southern blot e PCR-metilação específica.

Os exames moleculares não são realizados no Sistema Unico de Saúde (SUS), fazendo com que o diagnóstico dessa doença em nosso país seja ainda dependente dos exames citogenéticos, o que traz consequências negativas nos dois sentidos. De um lado, deixa-se de firmar o diagnóstico de muitos afetados e de fazer o aconselhamento genético dessas famílias. Por outro lado, firma-se o diagnóstico e faz-se aconselhamento genético de famílias em que não há algum indivíduo afetado.

Desenvolveu-se uma estratégia combinada da técnica descrita por Zhou et al.10 de PCR triplo metilação-específica acrescida de eletroforese capilar para o diagnóstico molecular da síndrome do X frágil, visando baixo custo, exequibilidade, reprodutibilidade e sensibilidade, o que tornaria possível a sua implementação em laboratórios que prestam serviços para a rede pública de saúde. O objetivo do presente artigo é descrever e avaliar as vantagens e desvantagens dessa metodologia.

 

METODOLOGIA

Pacientes

Foram coletadas 43 amostras de sangue de pacientes e de suas maes, quando indicado. Participaram do estudo indivíduos com déficit cognitivo e/ou fenótipo sugestivo de síndrome do X frágil e/ou pesquisa citogenética de X frágil positiva e/ou história familiar compatível com a doença. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi assinado em todos os casos. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG (ETIC 124/00) e financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).

Métodos

O sangue coletado (amostras de aproximadamente 5 mL de sangue total colhidas em EDTA como anticoagulante) foi submetido à extração de DNA Chelex 10014, diluído em 50 µL de água e conservado a -20°C até a sua utilização.

As amostras de DNA foram usadas para padronização das reações de PCR com marcadores fluorescentes seguida de eletroforese capilar e PCR metilação-específica, objetivando detectar alelos normais, pré-mutados ou com a mutação completa no gene FMR1.

PCR e marcadores fluorescentes

As reações de amplificação foram realizadas em um volume de 25 µL, contendo 5 µL da solução de DNA e buffer, 200 µM de dATP, dTTP, dCTP e 7-deaza-dGTP em substituição ao dGTP, 1 mM de MgS04, 5 mL de GC Rich Solution e 0,5 U de pwo DNA polimerase (Boehringer Mannheim) com base em metodologia previamente descrita.15 Para a marcação fluorescente foram utilizados os seguintes primers: 25 pmoles do primer A e 25 pmoles do primer 517R16 marcado com 6-FAM. A amplificação foi realizada utilizando-se o termo-cicildor GeneAmpTM PCR System 9700 (Applied Biosystems). Os produtos de PCR obtidos foram submetidos à eletroforese capilar (empregando-se capilar de 36 cm de comprimento e poliacrilamida a 4%) no Analisador Automático de DNA ABI3I30XLTM (Applied Biosystems). Os resultados obtidos foram analisados com o software GenescanTM, do mesmo fabricante, por comparação com um padrao de peso molecular injetado com as amostras (GS500LIZTM, Applied Biosystems). Com tal metodologia, foi possível detectar e quantificar com precisão os alelos normais do locus FRAXA e os alelos pré-mutados até um tamanho de aproximadamente 120 repetições. O fator de correção para os valores dos tamanhos dos alelos obtidos por eletroforese capilar com 7-deaza-dGTP foi igual a 1,07.17

Modificação do DNA a partir do tratamento com bissulfito de sódio

Para a análise do estado de metilação de citosinas, o DNA foi tratado com bissulfito de sódio, que converte os resíduos de citosina em uracila por deaminação e posterior dessulfonação alcalina, o que afeta a forma metilada da citosina (5-metilcitosina).18 Quando o DNA tratado por bissulfito é amplificado via reação em cadeia da polimerase, a uracila é amplificada como timina e as citosinas metiladas são amplificadas como citosina. Essa técnica permite, portanto, diferenciar citosinas metiladas de citosinas não metiladas no DNA genômico.

PCR metilação-específica

Foram realizadas três reações de PCR metilação-específica:

PCR para alelos não metilados: com o uso de primers específicos para a sequência-alvo não metilada (alelos normais e pré-mutados não etilados) nas condições de reação previamente descritas;10

PCR para alelos metilados: com primers específicos para a sequência-alvo metilada (alelos normais, pré-mutados e com mutação completa até aproximadamente 350 pares de bases - pb, metilados), nas condições de reação previamente descritas;10

PCR específica tipo três primers: com dois primers específicos para amplificar internamente a regiao de repetições CGG e mais um terceiro primer complementar à sequência do primer reverso (esse sistema amplifica todos os alelos normais, pré-mutados e com mutação completa, metilados) nas condições de reação previamente descritas.10

Depois de feitas as reações de amplificação dos três sistemas descritos anteriormente, alíquotas de 20 µL dos produtos obtidos foram analisadas por eletroforese em gel de agarose a 1,5% e visibilizadas por SyberGreen (Promega).

Após a eletroforese, os três sistemas foram interpretados como se segue: no sistema 1, visibilização de bandas correspondentes aos alelos não metilados (normais ou pré-mutados); no sistema 2, bandas correspondentes aos alelos metilados (normais, pré-mutados ou mutados com tamanho de até 300 pb, aproximadamente - Figura 1); no sistema 3, visibilização de um "rastro" cuja extensão depende do tamanho da regiao de repetições CGG, sendo possível, nesse sistema, diferenciar o rastro produzido por um alelo mutado ou pré-mutado do correspondente a um alelo normal (Figura 2).

 


Figura 1 - Géis de agarose a 1,5% com produtos das PCRs para alelos não metilados e metilados.
A - Produtos de PCRs para alelos não metilados mostrando bandas facilmente visíveis. B - Comparação entre produtos de PCRs para alelos não metilados (à esquerda) e para alelos metilados (à direita). As PCRs para alelos metilados não foram confiáveis e reprodutíveis neste estudo.

 

 


Figura 2 - Géis de agarose a 1,5% com produtos de PCR com três primers.
Imagem obtida após visibilização com SyberGreen. Dois produtos de PCR apresentaram rastro longo (acima de 350 pares de base - pb), XF017F e XF018F. As demais canaletas continham produtos de PCR de outras amostras, porém com difícil visibilização de rastro. Controle (-): amostra de homem normal.

 

RESULTADOS

Foram coletadas 43 amostras de pacientes e de suas maes, quando indicado. Todos os indivíduos apresentavam déficit cognitivo e/ou fenótipo sugestivo de síndrome do X frágil e/ou pesquisa citogenética de X frágil positiva e/ou história familiar compatível com a doença. Na Tabela 1 estao descritos os pacientes (individuais ou agregados com seus respectivos familiares, quando a família foi estudada) e os resultados dos exames citogenético e molecular de acordo com o protocolo de eletroforese capilar e PCR triplo metilação-específica.

 

 

Das 43 amostras analisadas, foi possível determinar o genótipo em 29. Destes, em 23 (14 homens e nove mulheres) os alelos tinham tamanho normal e seis (todos do sexo masculino) possuíam alelos na faixa de mutação completa. Em outras seis amostras, todas de pacientes do sexo feminino, foi possível determinar um alelo na faixa normal e outro alelo alterado, entretanto, não foi possível saber ao certo se os alelos se encontravam na faixa de pré-mutação ou de mutação completa. Nas demais oito amostras (cinco homens e três mulheres), não foi possível determinar o genótipo.

A família 8 foi usada como controle positivo, uma vez que possuía exame molecular prévio, confirmando o genótipo de cada um de seus membros. Segundo tal diagnóstico prévio, a mae apresentava um alelo na faixa de pré-mutação e um alelo normal, dois filhos possuíam mutação completa e o terceiro filho apresentava alelo na faixa normal. De acordo com o método proposto no projeto, foi possível determinar que: a) a mae possuía um alelo na faixa normal e outro alelo alterado, não foi possível determinar se pré-mutação ou mutação completa; b) um filho com exame prévio mostrando mutação completa exibiu exame compatível com mutação completa em nosso estudo; c) no outro filho com mutação completa, não foi possível determinar o genótipo e, finalmente, no terceiro filho, foi encontrado exame compatível com alelo normal.

Nos seis pacientes com exame compatível com mutação completa em nosso estudo, o exame citogenético foi positivo para a síndrome do X frágil. Dos pacientes que apresentaram alelo com tamanho normal, dois apresentavam citogenética positiva, 11 possuíam citogenética negativa e 10 não haviam feito exame citogenético (sete mulheres, sendo cinco maes de pacientes; e três homens). Entre os pacientes em que não foi possível determinar o genótipo, cinco possuíam citogenética positiva e três não haviam feito exame citogenético.

 

DISCUSSÃO

A demanda por métodos laboratoriais para o diagnóstico da síndrome do X frágil que sejam mais baratos, mais rápidos e mais sensíveis que o padrao-ouro tem aumentado nos últimos anos. O método considerado padrao para o diagnóstico da doença permanece lento e trabalhoso, uma vez que combina técnicas de Southern blot e PCR. Diante disso, os autores desenvolveram uma estratégia combinada de eletroforese capilar e PCR triplo metilação-específica para diagnóstico molecular da síndrome do X frágil.

Foram obtidos ótimos resultados com a metodologia de eletroforese capilar. O método padronizado permite detectar e medir os alelos normais e, provavelmente, pré-mutados até 120 repetições, ou seja, 360 pares de bases (pb). Não foi possível estabelecer o limite exato de detecção em relação ao tamanho de alelo por essa metodologia, uma vez que seria necessária uma amostra com número maior de pacientes do que o selecionado para o estudo. Em pacientes masculinos com mutação completa, é possível inferir o diagnóstico pela ausência de picos característicos no eletroferograma, pois pacientes do sexo masculino possuem apenas um cromossomo X. Já em pacientes do sexo feminino, a existência de apenas um pico mostra que, em um dos cromossomos X, existe um alelo normal ou pré-mutado até 360 pb, mas não é possível inferir sobre o segundo alelo presente no outro cromossomo X (se se trata de mutação completa ou pré-mutação acima de 120 repetições). Portanto, o método padronizado de eletroforese capilar é útil como uma triagem das amostras que serao submetidas ao tratamento com bissulfito de sódio e posterior PCRs para alelos metilados, não metilados e com três primers. De fato, Bosserhoff et al.19 consideraram a eletroforese capilar como método robusto, de fácil execução, boa reprodutibilidade e baixo custo, útil para triagem de alto número de amostras de forma automatizada.

Foram obtidos ótimos resultados para o tratamento com bissulfito de sódio sem a utilização de colunas de purificação. Tal tratamento mostrou ótimos resultados e reduziu o custo das reações. É um protocolo facilmente reprodutível, porém que necessita de tempo para a realização (somente uma das incubações dura cinco horas) e o produto final obtido é de apenas 20 µL de DNA modificado. Para se conseguir quantidade significativa de amostra é necessário que as reações sejam feitas em duplicatas ou até triplicatas, o que torna o processo ainda mais lento.

O tratamento com bissulfito de sódio, quando associado a sequenciamento de DNA, tem se tornado o método padrao-ouro para estudos de epigenômica que avaliam a influência do processo de metilação no genoma humano.20 No que diz respeito à síndrome do X frágil, o bissulfito tem sido utilizado em associação a uma variedade de técnicas.20-22 Na maioria dos estudos, são empregadas colunas de purificação após o tratamento com bissulfito, o que aumenta o custo da reação. No presente trabalho, foi possível desenvolver uma técnica sem a utilização de colunas de purificação e com obtenção de DNA modificado de qualidade comparável.

Foram obtidos bons resultados para a PCR específica para detecção de alelos não metilados e para a PCR específica com três primers. As PCRs para alelos não metilados produziram amplicons de fácil visibilização pela técnica proposta. Já as PCRs com três primers forneceram resultados satisfatórios quando os alelos mostravam rastro acima de 350 pb, facilmente visibilizados, entretanto, rastros abaixo de 350 pb não foram visibilizados de forma satisfatória, dificultando a diferenciação entre ausência de amplificação e rastro normal.

Os resultados obtidos para a PCR específica para alelos metilados foram variáveis. Não foram apurados resultados reprodutíveis nas condições de amplificação testadas. É sabido que fragmentos de DNA com alta concentração de citosinas e guaninas são dificilmente amplificados devido à estrutura secundária formada por tais bases, que dificultam a amplificação do segmento desejado durante a PCR. O acréscimo do nucleotídeo 7-deaza-GTP ajuda a evitar a formação das estruturas secundárias e melhora a reação de PCR, mas não foi suficiente para atingir a reprodutibilidade adequada. Mesmo após a diferenciação entre citosinas metiladas e não metiladas em consequência ao tratamento com bissulfito de sódio, as reações não foram confiáveis, o que dificulta a inserção dessa PCR como rotina na prática laboratorial para diagnóstico molecular da síndrome do X frágil. Sofocleous et al.13 deixam evidente em sua revisão os inúmeros protocolos de PCR já relatados, diferentes entre si pela introdução de diversos reagentes suplementares, a fim de reduzir os problemas do alto conteúdo de bases C e G.

O problema encontrado em pacientes do sexo feminino em que não era possível diferenciar entre alelos pré-mutados e alelos com mutação completa deve-se ao fato de a PCR para alelos metilados não ter sido confiável. Entretanto, a inativação do X e mosaicos (por exemplo, mulheres com pré-mutação e mutação completa) no sexo feminino podem complicar a interpretação de resultados de PCRs metilação-específica.23,24

Já nos pacientes em que não foi possível determinar o genótipo, encontrou-se uma combinação de resultados na eletroforese capilar, PCR para alelos não metilados e PCR com três primers que não era compatível com algum genótipo, segundo as especificações de Zhou et al. 10 Não nos foi possível determinar o motivo de tal ocorrência.

A estratégia combinada de eletroforese capilar e PCR triplo metilação-específica para diagnóstico molecular da síndrome do X frágil é teoricamente muito interessante, pois utiliza a eletroforese capilar como método de triagem dos pacientes, afastando, entre os suspeitos, aqueles que não têm a síndrome do X frágil. Os autores acreditam que a eliminação por eletroforese capilar de dois grupos de pacientes (homens normais e mulheres normais) das demais etapas propostas seja importante na prática laboratorial, pois permite diagnóstico mais rápido dos casos negativos e evita gasto desnecessário de tempo e recursos.

No geral, a estratégia proposta não obteve resultados satisfatórios. A determinação dos genótipos não foi confiável, não foi possível diferenciar entre mulheres pré-mutadas e com mutação completa e, em alguns pacientes com alta suspeição clínica de síndrome do X frágil, não se pôde inferir um diagnóstico molecular. Além disso, todo o processo requer considerável gasto de tempo e de recursos financeiros. Os autores acreditam que a publicação de pesquisas com resultado negativo deve ser encorajada, pois também contribuem para o conhecimento científico.

Protocolos mais avançados, como análise de curvas de fusão metilação-específicas e amplificação por meio de PCR multiplex em tempo real metilação-específica24-26, têm sido descritos, mas ainda não há validação de qualquer dos métodos, já que não foram aplicados em grandes grupos populacionais para análise sistemática de pacientes.13

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), pelos recursos financeiros que possibilitaram a realização do projeto "Avaliação de estratégia de diagnóstico molecular da síndrome do X frágil para aplicação na rede pública de saúde".

 

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