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CAPES/Qualis: B2
O papel da família como modificador da formação do médico
Family role as a physician graduation modifier
Carlos Alberto Benfatti
Professor. Faculdade de Medicina de Itajubá. Preceptor de Ética e Bioética da Residência Médica do Hospital Escola da Faculdade de Medicina de Itajubá. Itajubá, MG - Brasil
Endereço para correspondênciaRua Juscelino Kubitschek, 99/304 Bairro: Pinheirinho
CEP: 37500-188 Itajuba, MG - Brasil
E-mail: benfatti_@uol.com.br
Recebido em: 03/09/2012
Aprovado em: 09/10/2012
Instituição: Faculdade de Medicina de Itajubá Itajubá, MG - Brasil
Resumo
A família constitui a base para a formação do médico. E para O médico a responsabilidade sobre competência, formação e habilidade representa o compromisso de vida de pais e maes e a realização de seus projetos de vida na trajetória de seus filhos.
Palavras-chave: Educação Médica; Educação de Graduação em Medicina; Escolas Médicas; Currículo; Formação de Recursos Humanos; Família.
INTRODUÇÃO
As questoes familiares desde os anos 70 até os dias atuais produziram grandes variáveis na célula da sociedade, entre elas nova configuração de família, de relacionamentos, dos papéis masculino e feminino, das relações hierárquicas familiares, das posturas sociais, dos preconceitos. Naturalmente, dentro de um processo evolutivo, também as modificações nas leis que regem o país e sua sociedade cada vez têm mais tendência à organização e participação.
As realidades socioculturais se modificaram e as famílias, dentro das variáveis que se apresentam no cotidiano, também sofreram alterações, desde o ato simples de levar ou buscar filhos na escola até a influência na escolha da profissão.
É óbvio que toda a nova apresentação da família se baseia também na evolução da sociedade e nas suas conquistas, sejam relacionadas ao conforto, bem-estar, acesso a tecnologia, aumento de poder aquisitivo e melhor formação cultural e profissional.
Assim, baseado no processo evolutivo da sociedade, faz-se necessário também abordar a influência que essa nova família passa a ter na escolha da profissão e na formação do médico.
A OPÇÃO PELA CARREIRA PROFISSIONAL
O jovem estudante em formação pré-universitária vivência grandes dilemas, dúvidas, crises, algo natural no ainda adolescente. A influência da família, nesse momento, pode transformar esse dilema em decisão acertada, na maior parte das vezes, mas também inadequada, quando a base de sua decisão não foi bem-sedimentada no correr dos anos do preparo educacional e das posturas familiares que podem modificar os projetos de vida dos filhos.
A modernidade dos dias atuais transformou radicalmente a tendência do coletivo à prática quase perversa da busca incansável da individualidade e da realização de projetos de vida permeados por valores como autonomia e liberdade, que constituíram a identidade social e profissional do jovem candidato a uma vaga na Universidade. A qualidade do resultado dessa busca tem direta influência da família e suas variáveis têm base naquilo que se chama de "berço", no sentido da educação e dos exemplos recebidos em casa.
Passa-se, assim, a discutir de que forma a transmissão da escolha da profissão se relaciona à família, que se apodera muitas vezes, ainda que invisíveis aos seus próprios olhos, dos campos de possibilidade oferecidos, deixados, herdados e transmitidos por gerações, inseridos no cenário de trabalho.
Esses legados vêm sofrendo interferências da modernidade que gerou o transporte do presente para o futuro profissional, a partir de processos reflexivos, principalmente calcados no fascínio tecnológico e nas possibilidades do retorno econômico-financeiro que a escolha profissional pode proporcionar.
O jovem passa a viver ideias de liberdade de escolha e sua relação direta com o contexto contemporâneo. Sente-se cobrado na elaboração de um projeto de vida, torna-se reflexivo e repensa esse projeto conforme as transformações que não cessam de surgir e, sob a percepção de que o que seria natural na sua concepção inicial, sofre grande influência do meio social e da família.
A OPÇÃO PELA MEDICINA
Na escolha do curso de Medicina alguns fatores são determinantes e a influência familiar se destaca juntamente com a identificação pessoal, a busca pela independência financeira, o status profissional e o desejo de ajudar ou ser útil às pessoas. Alguns têm familiares médicos muito próximos, como os pais; outros sugerem fatores como a curiosidade sobre o corpo humano ou consideram a admiração dedicada aos médicos pela sociedade. O fator remuneração sempre é patente, acompanhando todas essas posturas e o entendimento de que o mercado de trabalho é amplo.
Na influência familiar a questao financeira tem peso significativo tanto para aqueles estudantes oriundos de famílias de poder aquisitivo médio a alto, quanto para aqueles originários de classes sociais menos aquinhoadas; para as possibilidades de investimento em tecnologia e a ocupação de espaço no mercado médico; como ainda para os que têm compromisso com os pais de proporcionar-lhes ajuda ou para irmãos em fase de estudos e de mudar o perfil sociocultural e financeiro da família.
Devem ser consideradas, ainda, as influências momentâneas como a perda de um ente querido ou a procura de autocura, o desejo de segurança financeira, a vaidade intelectual, o desejo de aprovação das pessoas - como, por exemplo, nos casos de familiares médicos, algumas vezes imposição crassa da família - ou o fato de terem sido bons alunos em Ciências ou Biologia, desejo de trabalhar com pessoas, altruísmo, até mesmo traumas de infância na doença de algum parente.
A DIMENSÃO DO ENSINO MÉDICO
Percebe-se que a motivação para a conquista do vestibular e a aprovação no curso de Medicina passa ao largo da grande necessidade, que se observa nos dias atuais, de priorizar, ainda na formação médica, a boa relação médico-paciente e de práticas mais humanizadas. É perceptível que não se tem valorizado o relacionamento interpessoal acadêmico-professor com o objetivo de melhor lidar com a dimensão do homem e com as relações terapêuticas imersas no entendimento e na empatia, que devem existir para a compreensão do universo psicológico e social do paciente.
O exemplo do professor é fundamental para a consolidação do perfil do estudante, somado às experiências vividas no ensino médio e, principalmente, ao anteriormente citado "berço", influência da família e os valores ensinados pelos pais até a chegada à escola médica.
Alterações nas grades curriculares podem ser necessárias para o cultivo de novas mentalidades tanto de professores quanto dos estudantes de Medicina e que irao refletir na relação médico-paciente.
A chegada do estudante ao curso de Medicina após todos os esforços pessoais e familiares não significa o fim das angústias e ansiedades, mas sim muito mais exigências para o desenvolvimento das habilidades para a prática profissional e expectativa se realmente o estudante se encontra no lugar ou na escola adequada, para satisfazer os seus já elaborados projetos de vida.
O ensino médico absorve praticamente todo o tempo do aluno, que passa a maior parte de suas horas em ambientes médicos, gerando, com isso, certo afastamento dos grupos sociais previamente experimentados e substituídos; e nesse momento um afastamento também da família, que passa a exercer menos influência, o que pode contribuir para a falta da humanização que tanto é observada no exercício da profissão.
Autocontrole, autoconfiança, bom senso, sabedoria, experiência, integridade, humildade, humanidade e compaixão. Esta última sempre torna o médico um ser diferenciado na atuação profissional e, somada à maturidade, constitui qualidades essenciais na prática da arte.
CONCLUSÃO
Não resta dúvida de que nesse cenário o pano de fundo continua sendo e será sempre a família, que fará as bases sólidas para a formação do futuro médico. Assim também o médico tem a responsabilidade de dominar competência, formação e habilidade, o que se constitui no compromisso de vida de pais e maes e a realização de seus projetos de vida na trajetória de seus filhos.
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