RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 20. (4 Suppl.3)

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Educação Médica

A importância da escuta na atuação do profissional da saúde

The importance of listening in the performance of professional health

Patrícia Fonseca Costa1; Valéria Tassara2

1. Professora do Curso de Nutrição - Centro Universitário de Sete Lagoas - UNIFEMM. Sete Lagoas-MG, Brasil
2. Professora dos Cursos de Enfermagem e Nutrição - Centro Universitário de Sete Lagoas - UNIFEMM. Sete Lagoas-MG, Brasil

Endereço para correspondência

Rua Plinio de Moraes, 885/101 Cidade Nova
CEP 31.170.170 - Belo Horizonte-MG, Brasil
E-mail: val.tassara@terracom.br

Instituição: Centro Universitário de Sete Lagoas - UNIFEMM. Sete Lagoas - MG, Brasil

Resumo

Trata-se de um breve relato de experiência de estágio realizado pelos alunos do curso de Nutrição do Centro Universitário de Sete Lagoas-Minas Gerais, no Programa de Atenção Primária-Estratégia Saúde da Família. Nesse estágio foram realizadas consultas de avaliação nutricional às gestantes, com ênfase a uma escuta acolhedora, de forma ética e cuidadosa em uma perspectiva sistêmica de saúde. Observou-se a importância dessa escuta diferenciada, para sensibilização e aprimoramento da formação dos alunos da área da saúde, agregando benefícios ao processo de Promoção da Saúde dos pacientes.

Palavras-chave: Relações Médico-Paciente; Anamnese; Pacientes/história.

 

"Construímos o mundo a partir de laços afetivos. Esses laços tornam as pessoas e as situações preciosas, portadoras de valor. Preocupamo-nos com elas. Tomamos tempo para dedicarmos a elas. Sentimos responsabilidade pelo laço que cresceu entre nós e os outros. A categoria cuidado recolhe todo esse modo de ser. Mostra como funcionamos enquanto seres humanos".

Lenonardo Boff

A escuta na atuação do profissional da saúde faz-se importante pela própria necessidade das pessoas de conversar. Conversar significa, em sua origem, "dar voltas com o outro" 1 no sentido de visualizar de um outro ângulo e atribuir outros significados às suas histórias, em vez de recolher e aprisionar em si mesmas seus sofrimentos. O profissional da saúde desenvolve escuta sensível para dar voltas com o outro com ética e cuidado.

Nesse aspecto, os alunos do curso de Nutrição do Centro Universitário de Sete Lagoas-MG tiveram a oportunidade de, no estágio supervisionado na Estratégia Saúde da Família, aprender a desenvolver escuta acolhedora de forma ética e cuidadosa às pessoas, especificamente às gestantes, em uma visão sistêmica de saúde.2

Uma vez que (co)construimos as aulas da disciplina de Psicologia da Saúde, nessa perspectiva sistêmica do processo adoecimento/saúde, o aluno pode escutar, dentro do possível, a pessoa em seu contexto de relações, ou seja, a pessoa faz parte de uma família, grupo social e religioso; possui atividades de trabalho, lazer e/ou comunitária. Portanto, a pessoa ao longo da vida tece sua rede pessoal, familiar e social.3

Essa breve, porém significativa, experiência de estágio dos alunos demonstra que conversar com os pacientes nesse âmbito integrado em saúde favoreceu, no caso das gestantes, que elas se expressassem sobre sua angústia e expectativas em relação a seu estado gestacional nutricional e emocional; e aos alunos, que eles sentissem a importância dessa escuta diferenciada do profissional da saúde. Além dos conhecimentos técnicos específicos, há, no campo da Nutrição, algo mais simbólico e intersubjetivo e voltado para questões sociais. As práticas alimentares que respeitam as diferenças culturais e são capazes de se sustentar social, econômica e ambientalmente podem ser consideradas promotoras de saúde.

Diante disso, torna-se necessário ao aprendizado do aluno da Nutrição a prática/estágio integrada em saúde para ter a oportunidade de vivenciar sua atuação no estágio, compreendendo a inter-relação dos aspectos biogenéticos, orgânicos e emocionais na história e contexto de vida do paciente. Isso lhe possibilita, ainda, identificar a demanda dos pacientes para atendimento psicológico e encaminhar a informação para o profissional gerenciador da instituição, beneficiando ainda mais o processo de promoção da saúde dos pacientes.

De acordo com Santos et al.5, na formação do acadêmico ocorre um hiato entre os conhecimentos biológicos e sociais, entre a teoria e a prática, como também entre o ciclo básico e o profissionalizante. O estágio supervisionado na Estratégia Saúde da Família surge como uma possibilidade de vivenciar a prática do exercício profissional na área de saúde pública precocemente, buscando direta conexão entre a teoria aprendida em sala de aula desde o início do curso e a prática profissional. As habilidades desenvolvidas ao longo do estágio são de fundamental importância para a formação do profissional generalista, humanista e crítico, características fundamentais ao nutricionista, conforme descrito nas Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Nutrição.6

É importante, ainda, ressaltar a relevância das Instituições de Ensino Superior no princípio da indissociabilidade da pesquisa-ensino-extensão, no qual estão inseridas a justiça social, a solidariedade e a cidadania.7 Os alunos do estágio iniciam o desenvolvimento dessas habilidades humanas a partir do momento que vivenciam a realidade da Estratégia Saúde da Família, atuando, em conjunto com o supervisor de estágio, na intervenção nutricional de gestantes e nutrizes atendidas por essa estratégia.

Desta maneira, o estágio supervisionado na Estratégia Saúde da Família proporciona ao acadêmico desenvolver habilidades, inclusive a da escuta diferenciada, para compreender melhor a inserção social do seu cliente/paciente. Essa habilidade, aliada à sólida formação técnica e humanista, resulta em um profissional consciente do seu papel social na saúde e apto para provocar transformações junto às gestantes e puérperas em relação aos seus hábitos alimentares e estilo de vida.

 

REFERÊNCIAS

1. Maturana HR. Ontologia do conversar. In: Maturana HR. Da biologia à psicologia. Porto Alegre: Artes Médicas; 1998. p.80-93.

2. Organização Panamericana de Saúde. OPAS/OMS, 2005. [Citado em 2010 mar 20]. Disponível em: http://www.opas.org.br.

3. Sluzki CE. A rede social na prática sistêmica. São Paulo: Casa do Psicólogo; 1997. 147 p.

4. Caniné ES, Ribeiro VMB. A prática do nutricionista em escolas municipais do rio de janeiro: um espaço-tempo educativo. Ciên Edu. 2007;13(1):47-70.

5. Santos LAS Silva MCM, Santos JM, Assunção MP, Portela ML, Soares MD, et al. Projeto pedagógico do programa de graduação em Nutrição da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia: uma proposta em construção. Rev Nutr. 2005;18(1):105-17.

6. Brasil. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Nutrição. Resolução CNE/CES Nº 5, de 7 de novembro de 2001. [Citado em 2010 mar 20]. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/2001/pces1133_01.pdf

7. Henningtin EA. Acolhimento como prática interdisciplinar. Cad. Saúde Pública. 2005;21(1):256-65.