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CAPES/Qualis: B2
Uso de medicamentos durante a gestação e a lactação em mulheres militares na regiao metropolitana de Belo Horizonte e sua associação com o tempo de aleitamento materno
Medication use during pregnancy and breastfeeding among military policewomen in the Metropolitan Area of Belo Horizonte and correlation with duration of the breastfeeding period
Tatiana Caroline Santiago Bossert Freitas1; Joel Alves Lamounier2; Roberto Gomes Chaves3; Sheyla Cristina da Silva4
1. Tenente Farmacêutica da Polícia Militar de Minas Gerais - PMMG. Belo Horizonte, MG - Brasil
2. Professor Titular de Pediatria Universidade Federal de São João Del Rei e Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, MG - Brasil
3. Professor Adjunto de Pediatria Universidade Federal de São João Del Rei e Universidade de Itaúna, MG. Itauna, MG - Brasil
4. Profissional em Educação Física. Belo Horizonte, MG - Brasil
Tatiana Caroline Santiago Bossert Freitas
Rua Felipe dos Santos, 760 ap 1601, torre 1 Bairro: Lourdes
Belo Horizonte, MG - Brasil CEP: 30180160
E-mail: tatianabossert@yahoo.com.br
Recebido em: 15/02/2012
Aprovado em: 29/05/2012
Instituição: Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG; Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG)
Resumo
OBJETIVO: investigar a associação do uso de medicamento com a duração do aleitamento materno em maes militares com crianças de até 24 meses na regiao metropolitana de Belo Horizonte.
MÉTODOS: trata-se de estudo transversal realizado nas unidades da Polícia Militar com 100 maes militares que tiveram filhos no período de maio de 2007 a setembro de 2011. O efeito do uso de medicamentos sobre o tempo de aleitamento materno foi avaliado pela análise univariada. O teste de Mann Whitney foi utilizado para verificar o tempo de aleitamento materno. As publicações da Food and Drug Administration (1990), Academia Americana de Pediatria (2001) e Hale (2006) foram adotadas para análise de segurança do uso de medicamentos durante a gestação e a amamentação.
RESULTADOS: a frequência de uso de medicamentos foi de 76% na gestação e 47% na lactação. Dos medicamentos utilizados na gravidez, 0,9% possuíam risco para o feto. Seu uso na gestação e lactação não esteve associado à duração do aleitamento materno.
CONCLUSÃO: o uso de medicamentos apresentou-se como prática frequente durante a gestação e a lactação. A utilização mais frequente de medicamentos seguros contribuiu para que essa prática não apresentasse associação com o tempo de amamentação.
Palavras-chave: Aleitamento Materno; Lactação; Gestação; Militares; Uso de Medicamentos.
INTRODUÇÃO
As gestantes, devido às suas peculiaridades biológicas, se expoem a riscos, entre os quais se destacam aqueles decorrentes do consumo de fármaco.1
As informações sobre os efeitos dos medicamentos na gravidez humana geralmente passam a ser disponíveis após a comercialização dos produtos a partir de relatos individuais de anomalias congênitas, relatos de casos clínicos, estudos epidemiológicos e sistemas de notificação de eventos adversos.2
Mulheres que amamentam frequentemente utilizam fármacos, podendo haver problemas relacionados à sua exposição às medicações, sendo um dos fatores responsáveis pela suspensão precoce da amamentação.3-6 Apesar disso, é elevado o índice de utilização de medicamentos pelas nutrizes e o desconhecimento dos efeitos adversos destes medicamentos em lactentes destas nutrizes. 7
O desconhecimento dos profissionais de saúde sobre o tema, as informações não científicas em bulas de medicamentos, a escassez de informações publicadas sobre a segurança dos fármacos para uso na lactação e o receio materno de usar medicamentos nesse período são fatores considerados como justificativa para a prática do desmame na vigência do uso de medicamento pela nutriz.8
O objetivo do presente estudo foi avaliar o uso de medicamentos pelas maes militares da regiao metropolitana de Belo Horizonte e classificar essa prática quanto à segurança dos medicamentos durante a gestação e a lactação, além de analisar seus efeitos durante o aleitamento materno.
MÉTODO
Trata-se de estudo transversal realizado com maes militares que tiveram partos no período de maio de 2007 a setembro de 2011. Os dados de interesse foram obtidos pelo Instituto de Previdência dos Servidores Militares (IPSM). A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (COEP) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Hospital da Polícia Militar de Minas Gerias (HPM).
Para o cálculo amostral, considerando que são realizados, em média, 65 partos em mulheres militares por ano na regiao metropolitana de Belo Horizonte e que o estudo foi realizado com militares que tiveram partos no período entre maio de 2007 e setembro de 2011, considerou-se uma população de 275 indivíduos.
Foi realizada amostra aleatória simples, de conveniência, totalizando-se 100 mulheres, o que corresponde a 36% da população do estudo.
A amostragem aleatória simples foi feita e a prevalência do aleitamento materno esperado foi de 97,9%10, em 40 pessoas para se obter representatividade adequada. A amostra do estudo foi de 100 mulheres, sendo que se optou pela amostra de conveniência, considerando-se que a militar muitas vezes está em atividade nas ruas. Além disso, a militar que faz parte de um batalhao pode exercer sua função em uma companhia vinculada ao batalhao, localizada em outro endereço. Assim, os resultados não podem ser generalizados para a população militar, mas podem ser concluídos para as 100 militares, sendo o tamanho razoável, correspondendo a 36% das 275, que é o tamanho da população de estudo.
As entrevistas foram procedidas nos batalhoes, Companhias, diretorias e órgaos de apoio da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) da regiao metropolitana de Belo Horizonte a partir de busca ativa.
As informações coletadas foram registradas em questionário validado9, relativas às características de frequência do aleitamento, demográficas, socioeconômicas, trabalho militar, assistência à saúde e hábitos materno-infantis. As maes entrevistadas receberam informações referentes ao conteúdo, objetivos, finalidade da pesquisa e, após a apresentação e assinatura no termo de consentimento livre e esclarecido, foi realizada a entrevista, com garantia de sigilo das informações.
A publicação da Food and Drug Administration (1980) foi adotada para análise da segurança do uso de medicamentos durante a gestação; e as publicações da Academia Americana de Pediatria (2001) e de Hale (2006) foram eleitas para avaliação da segurança do uso de medicamentos durante a amamentação.4,5,10,
A agência americana Food and Drug Administration (FDA), com o objetivo de informar ao prescritor sobre a escolha terapêutica mais adequada para a gestante, classificou os fármacos quanto aos efeitos na gestação em categorias de risco A, B, C, D e X. A categoria A refere-se aos medicamentos que, em estudos controlados em gestantes, não demonstraram risco para o feto durante a gravidez; a categoria B, a medicamentos em que os estudos em animais não evidenciaram risco fetal, não existindo estudos controlados em mulheres grávidas; a categoria C, a medicamentos em que não foram realizados estudos em animais ou mulheres grávidas ou que pesquisas em animais demonstraram risco fetal; a categoria D, a medicamentos com evidências positivas de risco fetal humano, porém os benefícios potenciais para a mulher grávida podem justificar seu risco; e a categoria X, a medicamentos contraindicados na gestação.10
O software utilizado foi o SPSS, versão 13.0. A análise de associação entre o uso de medicamentos e o aleitamento materno foi univariada, a partir dos testes qui-quadrado de Pearson assintótico e exato. Já para os tempos, estes foram descritos a partir de média e desvio-padrao (normais) e medianas e intervalo interquartil (não normais) de aleitamento e aleitamento materno exclusivo, sendo utilizados os testes de Mann Whitney na comparação de amostras não normais e teste T na comparação de normais.
RESULTADOS
Das maes militares que utilizaram medicamentos, 76% fizeram uso na gestação e 47% durante a lactação. A classe das vitaminas (45,9%) foi usada com mais frequência na gestação, seguida pela classe dos antianêmicos (9,2%) (Figura 1). Na lactação, a classe dos antibacterianos sistêmicos (16,9%) foi a mais predominante, seguida pelos produtos tópicos (13,6%) e vitaminas (13,6%) (Figura 2).
Os fármacos utilizados na gravidez, de acordo com a classificação FDA (1980), enquadraram-se nas seguintes categorias: A 61,1°%, B 29,7%, C 8,3% e X 0,9% (Figura 3). O fármaco utilizado, pertencente à categoria X, foi o estrogênio. Dos fármacos administrados na lactação, conforme classificação de Hale (2006), 23,2% pertenciam ao grupo dos mais seguros, 41,8% aos seguros, 11,6% aos moderadamente seguros e 23,2% não foram classificados. Não foram empregados medicamentos contraindicados na lactação (Figura 4). Segundo a classificação da AAP (2001), 44,1% eram compatíveis com a lactação, 2,3% tinham efeitos desconhecidos e 53,6% não foram classificados (Figura 5).
A duração mediana do aleitamento materno exclusivo foi de quatro meses e do aleitamento materno de sete meses, tanto em gestantes que utilizaram medicamentos quanto naquelas que não fizeram uso de fármacos.
A duração mediana do aleitamento materno exclusivo foi de três meses e do aleitamento materno de seis meses em maes militares que usaram medicamento na lactação. A duração mediana do aleitamento materno exclusivo foi de quatro meses e do aleitamento materno de sete meses em nutrizes que não adotaram fármacos.
A utilização de fármacos na gestação não se associou, na análise univariada, à duração do aleitamento materno exclusivo (p=0,410) e ao aleitamento materno (p=0,331), conforme mostrado na Tabela 1. O uso do medicamento por nutrizes não se associou, na análise univariada, à duração do aleitamento materno exclusivo (p=0,7) e ao aleitamento materno (p=0,416), conforme Tabela 2.
A automedicação não foi praticada na gestação, mas o foi por 1% das nutrizes, sendo utilizados polivitamínicos e domperidona, este no intuito de aumentar a produção láctea.
DISCUSSÃO
Das gestantes e nutrizes, 76 e 47% fizeram uso de fármacos assemelhando-se ao encontrado em seis cidades brasileiras (83,8%) e em Passo Fundo, Rio Grande do Sul (80%).1,11
Na Noruega, Matheson13 observou o emprego de pelo menos um fármaco por 25% das nutrizes entre três e cinco meses após o parto Em Itaúna-MG, 98% das nutrizes utilizaram medicamentos após a alta hospitalar.14
A classe das vitaminas foi a mais usada na gestação. A literatura tem registrado ser comum o consumo proporcionalmente mais expressivo de vitaminas entre as gestantes.15 A classe dos antianêmicos foi a segunda mais utilizada na gestação, o que parece refletir a conduta estabelecida pelo Ministério da Saúde para a assistência pré-natal.16
Os antibacterianos sistêmicos foram os mais utilizados no período de amamentação (16,9%). Em Itaúna-MG. essa frequência foi de 1,9% pelas nutrizes após a alta hospitalar em estudo realizado durante 12 meses.17 Os antibióticos geralmente são prescritos por curto período de tempo, reduzindo o risco para o lactente. Porém, eles podem alterar a flora intestinal da criança, podendo causar diarreia e interferência na interpretação do resultado de culturas do lactente18 Os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) estao entre os fármacos mais utilizados em todo o mundo, inclusive durante a lactação, sendo que entre os 27 AINEs comercializados no Brasil, foram encontradas referências sobre segurança para uso durante a amamentação de apenas 14.17 Neste estudo, os analgésicos e anti-inflamatórios foram a quarta classe mais utilizada pelas militares no período da amamentação.
A prevalência de consumo de medicamento na gestação observada foi mais alta na classe de risco A (61,1°%) e mais baixa na B (29,7%) e C (8,3%). Em estudo realizado em seis cidades brasileiras, a frequência encontrada foi de 34% para a classe A, 22,6% para a B e 39,7% para a C12. Em pesquisa feita em Piracicaba, São Paulo, essa prevalência foi de 35,7, 27,5 e 26%, respectivamente.19 Neste estudo, o consumo de medicamento da classe A foi quase duas vezes maior quando comparado com as localidades mencionadas anteriormente.
Os estrogênios foram utilizados por 0,9% das grávidas. Estudos recentes sugerem que substâncias estrogênicas podem apresentar efeitos duradouros no sistema reprodutivo em humanos expostos in útero, podendo causar em crianças nascidas de mulheres que fizeram uso desse medicamento, quando atingem a puberdade, disfunção no sistema reprodutivo, desordem no sistema imunológico e desenvolvimento de câncer vaginal.20,21
Na análise da segurança dos medicamentos empregados na lactação, de acordo com a classificação AAP (2001), o uso mais representativo foi de fármacos não classificados (53,6%), seguido pelos compatíveis com a amamentação (44,1%) e efeitos desconhecidos que exigem atenção (2,3%). Em avaliação feita em Itaúna-MG., essa classificação foi de 60,6, 30,8 e 6,4%, respectivamente.17 Esse resultado revela a necessidade de realização de estudos no intuito de avaliar a segurança de fármacos para uso na lactação.
Na análise univariada, o uso de medicamento na lactação não se associou ao tempo de aleitamento, divergindo de pesquisa realizada em Itaúna-MG., que mostrou longo tempo de aleitamento materno por nutrizes que não utilizaram medicamentos ou que fizeram uso de fármacos considerados seguros para uso na lactação.17
A duração do aleitamento materno exclusivo e do aleitamento materno não esteve associada à utilização de medicamento, o que pode ser explicado pelo baixo índice de uso de medicamentos que comprometam a segurança do feto e do lactente.
A automedicação não foi praticada na gestação e ocorreu em apenas 1% na lactação, divergindo de estudo realizado em Itaúna-MG, em que 51,2% das 246 nutrizes se automedicaram.17 O baixo índice de automedicação reduz o risco do uso de medicamentos potencialmente perigosos aos fetos e lactentes, podendo ser justificado pela boa qualidade da assistência à saúde prestada pelo Instituto de Previdência dos Servidores Militares (IPSM) aos militares e suas famílias.
Os polivitamínicos e a domperidona foram utilizados por automedicação. O uso da domperidona no intuito de aumentar a produção láctea merece reflexão, pois não há evidências científicas inequívocas acerca da eficácia da domperidona como galactagogo. No Brasil, esse fármaco é aprovado para uso apenas como gastrocinético.22
Este estudo permitiu verificar o perfil dos medicamentos usados na gravidez e lactação de militares, possibilitando o planejamento de atividades educativas dirigidas aos profissionais de saúde.
REFERENCIAS
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