RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 27 e-1856 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20170051

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Artigo Original

Efeitos dos lasers Hélio-Neônio (HeNe) e Arseneto de Gálio (AsGa) associados à educação em saúde com foco na promoção da saúde de portadores de úlcera por pressão

Effects of Helium-Neon (HeNe) and Gallium Arsenide (GaAs) lasers associated with prevention guidelines and treatment of pressure ulcers

Lia Machado Fiuza Fialho1; Miriam Viviane Baron2; Cristine Brandenburg3; Aline Barbosa Teixeira Martins4

1. Pós-doutora/Universidade Federal da Paraíba. Joao Pessoa, PB - Brasil
2. Mestre/Hospital santa Cruz do Sul. Santa Cruz do Sul, RS - Brasil
3. Doutoranda/Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, CE - Brasil
4. Doutoranda em Cirurgia/Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, CE - Brasil

Endereço para correspondência

Lia Machado Fiuza Fialho
E-mail: lia_fialho@yahoo.com.br

Recebido em: 13/03/2017.
Aprovado em: 10/11/2017.

Instituiçao: Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza, CE - Brasil.

Resumo

INTRODUÇÃO: As úlceras por pressão são áreas localizadas de morte celular que se desenvolvem quando o tecido mole é comprimido entre uma proeminência óssea e uma superfície dura por um período de tempo prolongado. As úlceras são de difícil cicatrização, sendo responsáveis por um alto índice de morbidade. A laserterapia de baixa intensidade vem sendo empregada como um recurso fisioterápico capaz de apresentar resposta efetiva na cicatrização de tecidos.
OBJETIVOS: Comparar a ação dos lasers Hélio-Neônio e Arseneto de Gálio no processo cicatricial de úlceras por pressão e desenvolver um trabalho com medidas de prevenção como tratamento.
MÉTODOS: Foram tratados um usuário com o laser Hélio-Neônio e dois com o laser Arseneto de Gálio, selecionados aleatoriamente, além de ter sido realizado um trabalho preventivo com esses sujeitos.
RESULTADOS: Os dois tipos de laser demonstraram resultados eficazes na cicatrização dos processos ulcerativos.
CONCLUSÃO: Usuários que, juntamente com a laserterapia, seguiram corretamente as medidas preventivas obtiveram melhores resultados do que aqueles que não seguiram corretamente as orientações.

Palavras-chave: Ulcera por Pressão; Lasers; Cicatrização; Prevenção; Educação em Saúde.

 

INTRODUÇÃO

A pele constitui o maior órgao sensorial do corpo humano e é responsável pela recepção de estímulos táteis, térmicos e dolorosos. Ela possui funções vitais para a manutenção dos mecanismos de defesa contra doenças,1 tais como: proteger o corpo contra o meio ambiente, abrasões e substâncias nocivas; secretar e excretar água e produtos metabolizados; regular a temperatura corporal; contribuir para pressão e fluxo sanguíneo e linfático; receber estímulos das terminações nervosas sensitivas; defender contra micro-organismos; dentre outras.

De acordo com Dardengo et al.,2 a integridade da pele pode ser prejudicada por diversas causas fisiopatológicas e/ou degenerativas que podem gerar o aparecimento da úlcera por pressão, que ocorre quando é exercida uma pressão maior do que a pressão capilar normal de 32 mmHg. Para Declair,3 uma pressão maior que 25 mmHg já é suficiente para ocluir o fluxo sanguíneo dos capilares dos tecidos moles, ocorrendo hipóxia, podendo levar à necrose local.

A European Pressure Ulcer Advisory Panel4 define as úlceras por pressão como lesões na pele decorrentes da compressão não aliviada das proeminências ósseas; todavia, elas são consideradas áreas de morte celular, localizadas na pele e tecidos subjacentes, causadas por pressão, cisalhamento, fricção e/ou combinação desses.5

A incidência das úlceras por pressão não possui diferenças consideráveis entre os países desenvolvidos e os emergentes. Nos Estados Unidos da América, a prevalência e o aumento dos custos com o internamento prolongado dos pacientes são de 15% a 50%.6 No Brasil, essa prevalência varia entre 27% e 39,4% entre os internados.6,7 No continente europeu, países como Inglaterra, Alemanha, Suécia, Itália e Holanda apresentam percentuais de 7,9%, 8,3%, 20%, 23% e 24,2%, respectivamente. Na Asia, em nações como a Coreia do Sul, por exemplo, a prevalência de úlceras por pressão oscila entre 10,5% e 45,5%.8

Esses níveis de incidência fazem com que as úlceras por pressão sejam consideradas um problema de saúde pública e um importante objeto de pesquisa, o que respalda a relevância de estudos acerca da temática. Afinal, úlceras por pressão acarretam altos custos financeiros e consequências sociais negativas para o paciente, família, hospital e instituições de saúde, reverberando na sociedade como um todo, pois geram transtornos socioeconômicos para o sistema de saúde do país, visto que elevam a morbidade e a mortalidade, prejudicando a qualidade de vida do indivíduo e da família.9,10

A etiopatogenia para o desenvolvimento das úlceras por pressão está relacionada a fatores como intensidade, duração da pressão e tolerância dos tecidos em suportarem essa pressão. Outros fatores extrínsecos e intrínsecos também contribuem para o aparecimento das úlceras por pressão: a fricção, o cisalhamento e a umidade constituem fatores extrínsecos, enquanto a perda da sensibilidade e da mobilidade, a incontinência urinária e a fecal, a hipertermia, a anemia, a desnutrição proteica, o tabagismo e a idade avançada integram os fatores intrínsecos.7

Dardengo et al.2 classificam as úlceras por pressão em quatro estágios:

I - lesão de epiderme e derme com áreas de eritema de cor vermelho-escura ou púrpura;

II - lesão de epiderme e derme mais severa, podendo envolver o tecido subcutâneo. Neste a pele apresenta-se hiperemiada, com presença de bolhas, podendo ou não estar rompidas. A área circunvizinha encontra-se vermelha ou escurecida e dolorosa, já que os terminais nervosos da derme estao expostos; a cicatrização pode ser feita com terapia local e intervenção para interromper o fator causal;

III - lesão de derme e epiderme muito severa, as quais se encontram destruídas nesse estágio, a ponto de atingir o tecido subcutâneo e poder haver presença de drenagem de exsudado, crateras profundas, pontos de necrose e infecção. Nesse estágio, a cicatrização da úlcera por pressão pode levar meses e resultar em uma cicatriz instável, predisposta à repetição, sendo necessária a correção cirúrgica;

IV - lesão de epiderme e derme com destruição profunda dos tecidos, podendo atingir fáscias, tecido muscular, osso subjacente com tecido necrótico, gerando grande comprometimento. Esse tipo de lesão crônica possui baixa tendência à cicatrização espontânea, devido a uma perda notável de proteínas orgânicas, fluidos e eletrólitos, levando, assim, à debilidade progressiva, de modo que o risco de infecção é muito grande. Somam-se, ainda, a problemática da resistência bacteriana e a utilização de antissépticos para a desinfecção de feridas, que têm se mostrado tóxica não só às bactérias, mas também às células humanas.11,12

Lins et al.12 esclarecem que, quando instalada a úlcera, o tratamento local deve ser realizado com desbridamento da ferida, limpeza, revestimento, abordagem da colonização e infecção, agentes físicos e tratamento cirúrgico, além de ser indispensável a colaboração de familiares e cuidadores no controle e prevenção. Dentre os recursos fisioterapêuticos utilizados para aperfeiçoar o processo de cicatrização, o laser de baixa potência tem sido sugerido como uma modalidade favorável à promoção da cicatrização de feridas.

Dentre os lasers de baixa potência indicados para lesões profundas que apresentam propriedades analgésicas, anti-inflamatórias e bioestimulantes, destacam-se o laser de Hélio-Neônio (HeNe), cujo comprimento de onda é de 632,8nm, na faixa de luz visível (luz vermelha), e o laser de Arseneto de Gálio (AsGa), com comprimento de onda de 904nm, pulsátil, de cor infravermelha (invisível).13, 14

Justifica-se a relevância de disseminar esta pesquisa porque não há estudos específicos que investiguem a associação do uso de laser com cuidados com a lesão e prevenção durante o tratamento. Problematiza-se se o uso exclusivo dos lasers HeNe e AsGa é suficiente para a cicatrização da úlcera por pressão. Ante o questionamento, realizou-se um estudo de caso com o objetivo de investigar minuciosamente os fatores que interferem na eficácia dos lasers de baixa intensidade, associando-os à educação em saúde. Esse escopo busca compreender, dessa maneira, se a educação em saúde pode contribuir no tratamento da úlcera por pressão com a terapia por meio de laser.

Já foi comprovado o efeito cicatrizante do laser, que ocorre pelo incremento à produção de Adenosina Trifosfato (ATP), proporcionando aumento da atividade mitótica e da síntese de proteína, com o estímulo à microcirculação, que aumenta o aporte de elementos nutricionais, facilitando a multiplicação das células e a formação de neovasos. A interação do laser com o tecido proporciona também aumento da atividade fagocitária e ação antibacteriana; como consequência, isso gera melhores condições para uma cicatrização rápida e esteticamente superior.15 O que não se investigou amiúde foi como essa terapia pode ou não ser intensificada com a utilização associada de cuidados preventivos e curativos realizados pelos próprios pacientes após receberem orientações educativas.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Considerando-se o objetivo de investigar os fatores que interferem na eficácia dos lasers HeNe e AsGa, associando-os à educação em saúde, tornou-se viável realizar um artigo de intervenção, com foco no estudo de caso de três indivíduos submetidos ao tratamento de úlcera por pressão mediante os referidos lasers, obtendo suporte educativo e orientação sistemática em educação em saúde.

A pesquisa, que foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), no Rio Grande do Sul, sob protocolo nº 1123/04, envolveu três sujeitos, os quais receberam de 22 a 52 atendimentos na clínica FisioUNISC, devidamente registrados em diário de campo. Como critério de inclusão, foi adotado no estudo portadores de úlcera por pressão de graus I a IV que atenderam ao chamado público divulgado pela referida clínica por um período de um mês, independentemente de sexo ou idade. Foram excluídos da pesquisa apenas os candidatos portadores de doenças crônicas, como o Diabetes Mellitus, e doenças neoplásicas.

Foram avaliados e tratados os três indivíduos portadores de úlcera por pressão que atenderam ao chamado e concordaram em participar da pesquisa; eles eram do sexo masculino e possuíam idades entre 48 e 62 anos. Um usuário foi submetido à aplicação do laser HeNe e os outros dois foram submetidos à aplicação do laser AsGa; essa divisão ocorreu de forma aleatória, já que não existe um consenso sobre qual dos dois tipos de laser é mais utilizado e eficaz na cicatrização de feridas crônicas.

O atendimento começou com a anamnese, iniciada com a avaliação de fatores intrínsecos e extrínsecos que contribuíam para o aparecimento das lesões e das condições sistêmicas e locais da área da lesão cutânea que interferiam na cicatrização da ferida. Foram levados em consideração a idade, o estado nutricional, os exames laboratoriais – hemograma e sumário de urina –, o diagnóstico de incontinência urinária e fecal, a diminuição da mobilidade, os tratamentos atuais e anteriores à lesão, os cuidados com a lesão, a prevenção com o uso de dispositivos e alternância da posição do paciente em casa e a presença de: pressão, fricção, cisalhamento, umidade e outras doenças associadas.

Após registro das condições iniciais dos pacientes, foi verificado o estágio da úlcera por pressão e a localização anatômica da lesão – o tamanho, a profundidade, a presença de tecido de granulação e/ou epitelização, odor, coloração e data do último debridamento. As úlceras foram mensuradas com fita métrica e registradas fotograficamente com máquina digital, para se constituir recursos avaliativos da evolução da cicatrização das feridas.

Foram dois os lasers utilizados no atendimento: HeNe, de marca KW, com comprimento de onda 632,8nm – vermelha, visível –, com emissão contínua, temporizador de energia de 1 a 9 J/cm2, potência de 3,6 Mw; e AsGa, também da marca KW, com comprimento de onda 904nm, temporizador de energia de 1 a 20 J/cm2, potência de 25 W (pico) ± 10%, potência média de 11 mW, com regime de emissão pulsado em 2000 KHz e duração de pulso 200 ns. O uso clínico para a cicatrização com a laserterapia se situa entre 1 e 5 J/cm2.16 Neste estudo, utilizou-se a dose 5 J/cm2 para os dois tipos de laser, com a aplicação na borda da úlcera em forma pontual de 1 em 1cm, de modo varredura no leito da ferida.

Os atendimentos ocorreram duas vezes por semana, consistindo na aplicação de laser HeNe ou AsGa, conforme o tratamento selecionado para cada paciente. Foram fornecidas orientações educativas sobre prevenção e fatores de risco para o desenvolvimento das úlceras por pressão, mudança de decúbito, uso de superfícies de apoio, com utilização de folder ilustrativo, realização do curativo em casa, cuidados com a higiene geral do paciente, dicas para uma alimentação saudável e explicação sobre os efeitos do laser na cicatrização. Caso algum paciente apresentasse ferida com infecção local, era encaminhado para consulta com seu médico assistente, a fim de dar início à antibioticoterapia. A cada sessão era realizada reavaliação da lesão, retomadas as medidas de prevenção e de cuidados e reforçadas as orientações educativas.

Foram realizadas oito sessões por mês, em meses consecutivos, com o objetivo de liberar o paciente do atendimento quando houvesse a finalização do processo cicatricial. No caso I, foram totalizadas 52 sessões de laserterapia com HeNe realizadas; já nos casos II e III, foram levadas a efeito de 22 a 46 sessões de AsGa, respectivamente.

 

RESULTADOS

Como a pesquisa qualitativa envolveu um número restrito de participantes, o que assegurou o minucioso acompanhamento dos pacientes participantes para um consubstanciado estudo de caso, optou-se por apresentar os resultados individualizados para cada um dos três casos, visando assegurar a clareza das informações sobre a anamnese dos participantes e as orientações de prevenção fornecidas individualmente, conforme as necessidades específicas.

Os aspectos considerados foram: sexo, idade, estágio da úlcera por pressão, localização anatômica, tamanho da ferida – comprimento, largura e profundidade –, presença ou não de túneis, aspecto do leito da ferida e da pele circundante, drenagem de secreção da ferida – quantidade, cor, consistência –, tipo de odor, avaliação da sensibilidade (estesiometria) e temperatura da pele na borda da ferida.

Outros fatores extrínsecos e intrínsecos que poderiam prejudicar a cicatrização ou propiciar o surgimento de novas úlceras também foram levados em consideração, como: medicamentos em uso, tratamentos anteriores para a cicatrização, conhecimento prévio sobre o tratamento com a laserterapia e prevenção das úlceras por pressão, dentre outros.

Relato de caso 1

O participante P.A.K., do sexo masculino, com 48 anos, era lesado medular com presença de paraplegia e com úlcera por pressão em estágio IV, localizada na regiao isquial, à esquerda. Na anamnese, verificou-se que o usuário ficava restrito ao leito e à cadeira de rodas, não realizava alternância de posição e permanecia sentado na mesma posição em decorrência do trabalho de digitador por dez horas diárias consecutivas.

Com provável presença de infecção antes do tratamento, o usuário relatou presença de febre semanalmente. Apresentou-se emagrecido, relatando fazer apenas duas refeições diárias por falta de tempo. Não fazia uso de medicamentos e como tratamento anterior para a ferida usava pomada à base de papaína e babosa. Realizava dois curativos diários e recebia o material necessário e acompanhamento pelo home care. Já havia seis anos que tratava das úlceras por pressão sem presença de cicatrização em nenhum momento.

As úlceras apresentavam 2,6 cm de comprimento, 3 cm de largura e 3 cm de profundidade, com formação de túnel. O aspecto do leito da ferida era de cor rosa pálido, com média quantidade de secreção serossanguinolenta e presença de esfacelo. A pele circundante apresentava-se frágil, seca e levemente hiperemiada, com ausência de odor. O teste de sensibilidade demonstrou sua diminuição na borda da ferida, presença de calor e ausência de dor.

Nesse caso, foi utilizado o laser do tipo HeNe e fornecidas orientações educativas sobre a realização do curativo, higiene pessoal, alimentação, alívio da pressão –de 2 em 2 horas na cama e de 15 em 15 minutos na cadeira de rodas– durante a jornada de trabalho, além do uso de dispositivos como colchão piramidal, almofada de ar na cadeira e autoexercícios para melhora do retorno venoso nos membros inferiores. A evolução da úlcera por pressão pode ser observada na Figura 1, com progressão positiva na área após 52 sessões.

 


Figura 1 - Fotos ilustrativas da UP antes e após laserterapia com HeNe.

 

Ao término das aplicações, observou-se redução da lesão em 100% e relato de melhora consubstancial na qualidade de vida do usuário, pois o mesmo afirmou não contrair mais a febre rotineira e estar se sentindo mais disposto, saudável e feliz. Importa inferir que o usuário seguiu as orientações educacionais prestadas, o que comprova o efeito bactericida e benéfico que o laser oferece quando associado aos cuidados de educação em saúde.

Relato de caso 2

O segundo participante foi J.E.E., do sexo masculino, com 62 anos, vítima de assalto por arma de fogo, devido ao qual permaneceu sedado na unidade de terapia intensiva, desenvolvendo, por isso, úlcera por pressão de grau IV, localizada na regiao isquial, à esquerda, com 4 cm de comprimento, 5 cm de largura e 5,5 cm de profundidade, com formação de túnel. A ferida apresentava o leito de cor rosa com média quantidade de secreção serossanguinolenta; a pele circundante apresentava-se frágil, hiperemiada, endurecida, edemaciada e seca, com ausência de odor e dor no local da ferida e temperatura normal na borda.

O teste de sensibilidade demonstrou moderada sensibilidade na borda da ferida. O paciente exercia pressão em todo o dorso do corpo enquanto dormia – aproximadamente dez horas diárias – e, por permanecer em decúbito dorsal, em razao do uso de colar cervical continuamente para estabilidade das vértebras cervicais, era impedido de mudar de decúbito. Os medicamentos em uso eram anti-inflamatórios e analgésicos. Como tratamento anterior à pesquisa, fez uso de curativo de carvao e, posteriormente, com gel de alginato de cálcio e sódio. Após três meses de alta hospitalar e sem presença de cicatrização da ferida, ingressou no estudo para o tratamento com laser da úlcera por pressão.

Esse paciente foi submetido ao tratamento com laser de AsGa, recebendo também orientações educativas sobre a realização do curativo, higiene pessoal, alimentação, alívio da pressão e uso de dispositivos como colchão piramidal para alívio da pressão. O paciente seguiu corretamente as orientações de prevenção e tratamento, conseguindo completa cicatrização da ferida em 22 sessões, como se observa na Figura 2.

 


Figura 2 - Fotos ilustrativas da UP antes e após laserterapia com AsGa.

 

Relato de caso 3

O terceiro paciente foi U.M.P., do sexo masculino, com 52 anos, paciente com amputação transtibial do membro inferior direito por acidente de trânsito, o qual fazia uso de prótese e desenvolveu úlcera por pressão de estágio III na extremidade do coto, com 2,4cm de comprimento, 4,6cm de largura e 1cm de profundidade, sem formação de túnel. Apresentava aspecto do leito da ferida misto, com esfacelo e tecido de cor vermelha, com presença de média quantidade de secreção purissanguinolenta e ausência de odor. A pele circundante apresentava-se rosada, com pouco edema, seca e frágil. Sentia dor na regiao lateral da ferida periodicamente; o teste de sensibilidade demonstrou-se normal. Sem alterações na temperatura da borda da ferida.

Na anamnese, observou-se que o usuário em uso de prótese para deambular exercia grande descarga de peso e pressão sobre a extremidade do coto, além de causar repetidos traumatismos e apresentar edema na extremidade do coto. O usuário era portador de hipertensão arterial, em uso de medicação de forma irregular. Como tratamentos anteriores, citou o uso de óleo de girassol, Trofodermin, Minâncora e Rifocina spray. Atualmente, limpa a ferida com água corrente e sabao, aplica Minâncora e utiliza material de curativo fornecido pelo posto de saúde, tendo acompanhamento em casa por enfermeira do Sistema Unico de Saúde (SUS).

Após três anos sem presença de cicatrização, foi encaminhado para tratamento com o laser AsGa. Foram realizadas 46 aplicações, sendo que, a partir da 29ª aplicação, foram associados ao tratamento o acompanhamento de enfermeiro e a aplicação de curativo da Johnson. Foram dadas orientações sobre a realização do curativo, higiene da prótese, alimentação, alívio da pressão sem utilização da prótese em casa, além do uso de dispositivos como colchão piramidal e almofada de ar em cadeira de rodas. A evolução nesse período pode ser observada na Figura 3, após 46 sessões de laserterapia.

 


Figura 3 - Fotos ilustrativas da UP antes e após laserterapia com AsGa.

 

Houve uma redução na profundidade da ferida para 0,5cm, mantendo-se os mesmos tamanhos de altura e largura. Observou-se pouca melhora na cicatrização da úlcera por pressão, porém uma pequena melhora no aspecto da referida úlcera. O paciente faltava seguidamente aos atendimentos, acabando por abandonar o tratamento. Ao contatarmos com a mae do paciente, a mesma relatou que ele era alcoólatra e não seguia nenhuma orientação dada pela equipe, o qual tinha abandonado o lar.

 

DISCUSSÃO

Mesmo com uma amostra reduzida, não se pode ignorar a importância clínica dos resultados obtidos com o tratamento, por se tratar de feridas crônicas de difícil cicatrização. A mensuração e o registro fotográfico das feridas mostram que houve progresso significativo, com cicatrização completa dos processos ulcerativos de dois usuários, com apenas um sujeito não apresentando melhora da cicatrização. Constatou-se que esse último não seguia as orientações de prevenção dadas, abandonando o tratamento.

Vale salientar que, de acordo com Marcom e André,17 as exposições radiantes para o tratamento de feridas situam-se numa faixa que varia aproximadamente entre 1 e 9 J/cm2. No entanto, para Abrahao et al.16 e para Rocha et al.18 não existe ainda um consenso no que diz respeito aos parâmetros da irradiação e qual o melhor tipo de laser utilizado no tratamento de feridas crônicas, mas normalmente encontra-se na literatura que o uso clínico dos lasers de HeNe e de AsGa para incremento da circulação no local da ferida deve variar entre 1 a 5J/cm2. Neste estudo, utilizaram-se os lasers HeNe e AsGa com dose de 5 J/cm2, corroborando esses achados.

O aumento da circulação local, a proliferação celular e a capacidade de cicatrização do tecido conjuntivo através da síntese de colágeno são alguns dos efeitos observados pelo uso dos lasers, o que contribui na reparação de perdas de substância, sobretudo em úlceras de diversas origens, queimaduras, feridas traumáticas e operatórias.12,15 Dessa forma, foi possível observar nas fotos retiradas dos três pacientes em estudo que houve aumento na produção do colágeno, de modo a fechar a úlcera por pressão.

Este estudo demonstrou que os lasers de HeNe e de AsGa foram eficazes no tratamento desse tipo de úlcera. Tanto um laser como o outro apresentaram resultados de cicatrização completa, o que vem a confirmar os estudos de Mester e Jaszsagi-Nag,19 pioneiros em tratamentos com laser de baixa potência, nos quais foram irradiadas feridas de difícil cicatrização com o laser HeNe, obtendo como resultados 875 úlceras totalmente curadas e fechadas em um período de 12 a 16 semanas, 160 com considerável melhora e apenas 85 sem mudanças consideráveis. Neste estudo, foi necessário um número maior de sessões, ou seja, 52, 22 e 46, respectivamente, nos três casos. Rocha et al.18 descrevem ainda a boa evolução clínica de 12 pacientes com úlceras por pressão tratadas com AsGa.

Em investigação realizada por Stefanello e Hamerski,20 foi utilizada irradiação laser de AsGa 904 nm, com 6 J/cm2, no processo de cicatrização de úlcera por pressão, duas vezes por semana, durante sete semanas, utilizando-se o laser com aplicações do tipo pontual e varredura. Foi verificado que, após as 14 sessões, houve a cicatrização completa da úlcera em estudo. Pode-se verificar que esse achado apresentou uma boa resolutibilidade em um pequeno espaço de tempo.

Nesta pesquisa, o menor tempo encontrado para o fechamento completo da úlcera por pressão foi de 22 sessões. Dessa forma, esse fato leva a crer que aqueles indivíduos que seguiram corretamente as orientações dadas obtiveram uma melhor resposta na cicatrização das feridas em um curto período de tempo, mostrando que a educação em saúde tem um papel fundamental nesse processo. A laserterapia possui um bom efeito sobre o fechamento de úlceras de difícil cicatrização, sendo o autocuidado do paciente um grande aliado ao tratamento.

De acordo com Reis et al.,21 educação em saúde é um processo que induz à mudança de comportamento relativo à saúde. Constitui um processo destinado a manter e elevar o nível de saúde da população e, ao mesmo tempo, reforçar a manutenção de hábitos positivos de saúde. Trata-se não somente o individual, mas também o coletivo, com vistas à promoção de informações e ações em saúde, motivação de hábitos que mantenham a saúde e previnam as doenças.

Na presente pesquisa, verificou-se que dois dos pacientes entenderam a importância de seguir as orientações transmitidas com o intuito de incrementarem o seu processo de cura e, assim, evitarem a formação de novas úlceras por pressão. Assim, é possível verificar que a educação em saúde também foi capaz de promover uma maior qualidade de vida para esses indivíduos.

Observou-se neste estudo que os lasers em questao demonstraram uma efetividade na cicatrização de feridas de caráter crônico, mesmo com diversas tentativas de tratamentos anteriores. Uma das situações abordadas com grande ênfase foi a orientação quanto à limpeza da ferida (de forma estéril), além de informações pertinentes à formação das úlceras e aos principais fatores locais ou sistêmicos aos quais os usuários estavam expostos.

Foi desenvolvido um folder com orientações de saúde, dicas de prevenção e cardápio nutricional para os portadores de feridas crônicas, além de capacitação para mudança de decúbito e indicação de dispositivos no alívio da pressão, pois se pôde observar que os pacientes e seus cuidadores tinham pouca ou nenhuma informação a esse respeito. De acordo com Millao et al.,22 a falta de conhecimento sobre o autocuidado interfere diretamente na recuperação dos portadores de feridas. As ações educativas são de extrema importância e precisam ser estendidas a todos os clientes, tendo como referência a criação de vínculo com os profissionais, o que poderá auxiliar na aderência ao tratamento, além de propiciar mais informação sobre os cuidados em geral com a saúde.

Em trabalho realizado por Barbui e Cocco23 com pacientes diabéticos, verificou-se que os clientes sabiam dos cuidados adequados que deveriam ter com a sua saúde para evitar as complicações, porém o autocuidado não era realizado corretamente. Mesmo se tratando de afecções diferentes, porém que também necessitavam de cuidados especiais, observou-se neste estudo que os portadores de úlcera por pressão insistiam em não realizar as condutas corretamente, mesmo sendo orientados adequadamente, corroborando, assim, os dados encontrados.

Nesse sentido, segundo Gomes et al.24 e Chayamiti e Caliri,25 torna-se necessário que seja incorporada ao cotidiano dos pacientes a educação em saúde, porque é de fundamental importância que tenham acesso às medidas de prevenção e cuidados sobre as úlceras por pressão. Considera-se que exista nas práticas educativas uma troca entre o cliente, a família e a equipe multiprofissional, para melhorar o desenvolvimento de ações preventivas e profiláticas importantes, no intuito de diminuir o impacto do agravo. Busca-se, entao, a construção da cidadania com qualidade de vida.

Consoante pesquisa realizada por Rogenski e Kurcgant,26 o custo de um usuário com úlcera por pressão é muito maior do que a prevenção de tal afecção, verificando-se que os pacientes que receberam algum tipo de prevenção apresentaram os menores custos em relação aos outros. O custo médio diário do paciente que não recebeu orientações quanto à prevenção da úlcera por pressão superou o custo médio diário do paciente que recebeu estas em 45% dos casos.

No contexto internacional, são várias as diretrizes que abordam o tratamento e a prevenção da úlcera por pressão, as medidas interdisciplinares e as ações educacionais, buscando, assim, a inserção da prática. No Brasil, no entanto, ainda não existem essas diretrizes.27 Apesar do crescimento de pesquisas e publicações na área nos últimos anos, ainda não foram suficientes para a implementação de recomendações diferentes daquelas existentes. Dessa forma, especialistas no assunto recorrem às diretrizes internacionais para fazerem recomendações aos cenários da saúde brasileira.

Todos os profissionais da área da saúde responsáveis pelo acompanhamento do paciente devem estar cientes dos principais fatores de risco para o desenvolvimento das úlceras por pressão, adotando medidas de prevenção para eliminar forças de pressão contínua, cisalhamento ou fricção, evitando a formação dessas. É necessário maior conhecimento sobre o tema aos profissionais da saúde, principalmente aos fisioterapeutas que convivem com o problema no dia-a-dia, seja no atendimento domiciliar, em clínicas ou em hospitais, e maior esclarecimento da população em geral a respeito do assunto para um trabalho de prevenção mais eficaz.

Observou-se que todos os pacientes já haviam tido algum tipo de acompanhamento da ferida por profissionais da saúde, porém não lhes foi dada nenhuma orientação adequada com relação à prevenção e aos cuidados específicos. A falta de educação em saúde e o tratamento em locais onde os profissionais não estao devidamente capacitados tornam o processo de cicatrização desses ferimentos mais crítico e lento.22

Hoje, há maior percepção de que todos os profissionais da saúde precisam se envolver na prevenção das úlceras por pressão, com o intuito de expandir os conhecimentos e dar suporte a práticas adequadas. Sabe-se que as úlceras por pressão contribuem significativamente para a morte do usuário, em decorrência de infecções que podem se tornar generalizadas. Por isso, há a necessidade do advento de tratamentos inovadores, a exemplo do laser, para acelerar a cicatrização, bem como faz-se mister dar orientações e realizar a prevenção destas, pois deixar de fazê-lo se configura como uma negligência no ato de cuidar prestado pelo profissional da saúde que se depara com essa situação.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta pesquisa, observaram-se que os lasers Hélio-Neônio (HeNe) e Arseneto de Gálio (AsGa) apresentaram-se como eficazes no processo de cicatrização e que os usuários que seguiram as orientações e cuidados de prevenção obtiveram melhores resultados do que aqueles que não os seguiram.

Acredita-se que os fatores que poem os usuários em risco de desenvolver as úlceras por pressão são os mesmos que dificultam a cicatrização dessas feridas. Além disso, julga-se que uma boa terapêutica, como a laserterapia, pode ser mais efetiva quando esses fatores são tratados e corrigidos concomitantemente.

É necessário intervir de forma a otimizar a cicatrização e a prevenir o surgimento de novas úlceras. Para esse fim, é importante o conhecimento dos fatores individuais que dificultam a cicatrização e o uso das medidas de prevenção no atendimento a esses pacientes. Essa percepção, para os profissionais da saúde, principalmente para o fisioterapeuta, é de extrema pertinência, na intenção de dar suporte a práticas adequadas e de melhorar os resultados dos usuários que apresentam ou que estejam na iminência de desenvolver as lesões causadas pela pressão. Com efeito, como a amostra deste estudo foi de caráter reduzido, faz-se necessária a realização de novas pesquisas na área com o intuito de evidenciar os achados.

 

REFERENCIAS

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