RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 28 e-2004 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.20180154

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Educação Médica

Educação médica e tecnologias digitais de informação e comunicação: possibilidades e dilemas

Medical education and digital information and communication technologies: possibilities and dilemmas

Pollyanna Roberta Campelo Gorgens1; Paulo César Resende Andrade2

1. Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Programa de Pós-Graduaçao em Educaçao, Faculdade de Medicina. Diamantina, Minas Gerais - Brasil
2. Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Programa de Pós-Graduaçao em Educaçao, Instituto de Ciência e Tecnologia. Diamantina, Minas Gerais - Brasil

Endereço para correspondência

Pollyanna Roberta Campelo Gorgens
E-mail: pollycampelo@hotmail.com

Recebido em: 06/02/2018
Aprovado em: 22/11/2018

Instituiçao: Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Programa de Pós-Graduaçao em Educaçao, Faculdade de Medicina - Diamantina - Minas Gerais - Brasil

Resumo

Este estudo tem o objetivo de analisar a evolução dos processos de educação médica que culminaram na inserção cada vez maior das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs). Foram discutidos o papel atual das TDICs no ensino, as possibilidades educacionais e os dilemas associados ao seu uso pelas instituições de ensino superior. Foi realizado um estudo de pesquisa bibliográfica através de uma revisão sistemática a partir dos descritores: "Educação Médica" e "Tecnologia da Informação". Ao final, oito publicações foram selecionadas. Os estudos encontrados foram analisados e discutidos quanto ao seu conteúdo em três temáticas principais. A mudança na forma de ensinar e aprender modificaram e ainda modificam escolas médicas, favorecendo o uso das tecnologias e trazendo inúmeras possibilidades didáticas atrativas. O referencial teórico estudado aborda ainda a necessidade de intervenções envolvendo a revisão de políticas de incentivo, currículos, metodologias educativas e qualificação técnica e pedagógica dos docentes.

Palavras-chave: Educação Médica; Faculdades de Medicina; Tecnologia Educacional; Tecnologia da Informação.

 

INTRODUÇÃO

A sociedade atual e, por consequência, o perfil do aluno atendido hoje pelas escolas, exigem do professor uma nova postura, moldada por novos conhecimentos e habilidades.1

De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Medicina, uma das habilidades esperadas dos egressos envolve aprender a aprender. Esta habilidade requer o manuseio dos recursos tecnológicos existentes em favor de sua formação e atualização.2

A mudança de paradigma sobre a forma de educar é necessária para o sucesso na formação profissional dos futuros médicos. Neste contexto as TDICs assumem um papel importante trazendo cada vez mais possibilidades didáticas. Apesar disso, diante de um histórico de ensino médico tradicional, centrado no professor, pode haver resistência do uso de recursos didáticos modernos.

Muitas instituições de ensino e muitos docentes utilizam as tecnologias ainda de forma muito rudimentar. Um aspecto a destacar é a falta de coerência entre o declarado nos documentos e o que é de fato realizado durante as disciplinas.1

Este estudo tem o objetivo de analisar a evolução dos processos de educação em medicina que culminaram na inserção das TDICs. Também são discutidas possibilidades atuais no ensino e obstáculos que podem levar a resistência de instituições e de professores para o maior uso das tecnologias.

 

METODOLOGIA

Foi realizado um estudo de pesquisa bibliográfica através de uma revisão sistemática. O estudo ocorreu em duas etapas, no período de novembro a janeiro de 2018.

A primeira etapa foi iniciada com a seleção dos descritores, definidos de acordo com a lista DeCS, os quais foram "Tecnologia Educacional" e "Educação Médica". Os bancos de dados utilizados no estudo foram acessados por meio do Google Acadêmico. Os critérios de inclusão foram: publicações dos últimos dez anos, idiomas português e inglês, compreendidos no período de 2008 a 2018.

Na segunda etapa, após uma leitura criteriosa, foram adotados como critérios de exclusão: os artigos que não se relacionavam ao ensino acadêmico voltado ao cuidado em saúde. Ou seja, foram excluídos estudos voltados a disciplinas da área básica ou que estavam relacionados ao treinamento de grupos de profissionais em sistemas institucionais, como o prontuário eletrônico.

Os artigos encontrados foram analisados quanto ao seu conteúdo, divididos em três temáticas principais e discutidos. Durante a discussão dos principais achados, foram utilizadas fontes complementares, para maior embasamento. Estas fontes complementares foram obtidas por pesquisa livre em sites de ambientes virtuais de aprendizagem, sites de instituições de ensino superior e livros sobre educação.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A busca inicial pelas palavras chave retornou 398 publicações. Após os critérios de inclusão foram encontradas 317 publicações e após a leitura criteriosa, 8 publicações foram selecionadas para presente estudo (Figura 1).

 


Figura 1. Descrição das etapas de busca e seleção dos estudos Fonte: elaborado pelos autores

 

Nas tabelas 1 e 2 estao apresentados, respectivamente, o número de estudos selecionados por temática e os autores dos estudos por temática.

 

 

 

 

A seguir serao discutidos os principais achados para cada uma das três temáticas.

Temática 1 - evolução das primeiras escolas médicas no Brasil e inserção das TDICs

O primeiro curso de Medicina no Brasil foi criado em 1808, em Salvador. Esses primeiros cursos eram, na verdade, "escolas de cirurgia", pois formavam cirurgioes e não médicos. Estes continuavam a se formar na Europa, sobretudo em Portugal.3

Entre 1812 e 1815, ocorreram as primeiras reformas das escolas médicas, que passaram a ser chamadas Academias Médico Cirúrgicas. Neste momento a duração dos cursos foi ampliada de quatro para cinco anos. Em 1832, as instituições são transformadas em Faculdades de Medicina, adotando as regras e programas da Escola Médica de Paris, com a duração de seis anos. Os alunos recebiam o título de "Doutor em Medicina, Farmacêutico e Parteiro".3

Entre os diversos aspectos relativos à inadequação da formação médica, o fator mais agravante diz respeito ao perfil do médico formado: centrado na doença e na medicalização. O hospital era o centro de toda a formação médica.4 Naquela época não se tinha a concepção atual de que a maior parte dos atendimentos médicos podem ser resolvidos sem necessidade de hospitalização. Muito menos se tinha o conceito de Atenção Primária à Saúde e da Medicina de Família.

A partir de 2002, o Ministério da Saúde passou a fornecer patrocínio para as escolas de graduação em medicina que se dispuseram a aderir a projetos de mudança nos currículos de seus cursos. Essas mudanças incluíam o enfoque nas necessidades de saúde da população e do SUS e a adoção de metodologias ativas de ensino-aprendizagem.4

Atualmente vive-se mais uma reforma do ensino médico. As DCN dos Cursos de Graduação em Medicina2 definiram um conjunto de competências e habilidades a serem adotadas pelas instituições de ensino médico no Brasil. Os profissionais devem ser capazes de aprender continuamente, tanto na sua formação, quanto na sua prática. Desta forma, os profissionais de saúde devem aprender a aprender. A estrutura curricular deve contemplar uma organização centrada no estudante. Esta estrutura trouxe a oportunidade de incluir as TDICs como parte de uma nova concepção de ensino e aprendizagem.

A expressão Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) surgiu a partir do final da década de 70, com o desenvolvimento da informática e da comunicação entre computadores. As formas que sugiram a partir da década de 90 passaram a se chamar Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs), pois o funcionamento se baseia na lógica binária, que consiste no fato de que toda informação deve ser expressa na forma de dois dígitos.5

Atualmente, dentro do contexto da educação, as TICs fazem referência a qualquer tecnologia utilizada para apoiar e melhorar a aprendizagem dos alunos, considerando, por exemplo, livros e filmes.6 Já o termo TDICs envolve as tecnologias em que o computador é o instrumento de uso principal.1

A redução de custo de computadores e a facilidade de acesso à internet tem trazido importantes implicações na educação. A maior parte das faculdades de medicina dispoe de extensa rede informatizada, que deixou de ser uma simples ferramenta de informação para se tornar um componente central no ambiente de ensino e aprendizagem.7

Temática 2 - o papel das TDICs no ensino médico hoje e possibilidades

A educação médica traz a oportunidade de utilizar métodos únicos que surgem no contexto "cuidado com a pessoa". No final do curso, durante o período de internato, os alunos permanecem longos períodos fora do campus, em estágios na rede hospitalar ou em comunidades geralmente localizadas em outros municípios. Neste momento, o uso das TDICs facilita o suporte aos alunos, onde quer que estejam.

As TDICs têm papel de favorecer a criação de um cenário de prática virtual compatível com a vivência do aluno.8 Elas estimulam o resgate de conceitos e prévias em busca de novas informações e associações, que podem ser discutidas tendo o professor como um mediador. Ou seja, elas podem ser utilizadas dentro da proposta de aprender a aprender e em acordo com as diretrizes atualmente propostas para os curso de medicina.

Segundo Ward7, existem três níveis de materiais online. O primeiro nível envolve anotações que podem ser compartilhadas sem edições. O segundo nível envolve interatividade através de testes de múltipla escolha e ferramentas de feedback. O terceiro nível envolve uma programação personalizada como animações e simulações associadas a recursos de busca científica. Este terceiro nível tem se desenvolvido cada vez mais dentro dos cursos médicos.

Diante da quantidade de informações disponíveis de qualidade e reputação variável é necessário treinamento para escolha do conteúdo realmente relevante. Assim, o investimento em computadores e outras tecnologias não serve somente para atrair bons alunos, mas para desenvolver habilidades essenciais na profissão, que depende cada vez mais do computador.7

As atividades de ensino à distância têm ganhado espaço progressivo na educação superior, buscando facilitar a comunicação do estudante com o docente. O ambiente virtual de aprendizagem pode ser empregado como espaço de convergência, voltado para compartilhar as diversas vivências experimentadas pelos estudantes nos diferentes cenários. A experiência do uso de EaD como estratégia na educação permanente dos profissionais de saúde teve como marco, no Brasil, a instituição do Sistema Universidade Aberta do Sistema Unico de Saúde (UNA-SUS), em 2010. Este sistema foi criado com a finalidade de atender às necessidades de capacitação e educação permanente dos trabalhadores do Sistema Unico de Saúde (SUS), por meio do desenvolvimento da modalidade de educação à distância na área da saúde.9

Estas novas propostas educacionais privilegiam metodologias que trabalham a construção de conhecimentos a partir da vivência de experiências na comunidade. Os conteúdos são oferecidos na forma de problemas e as relações devem entao ser construídas e adaptadas à estrutura cognitiva prévia do aluno para o processo final da assimilação.10

Quando o professor utiliza um vídeo como atividade de ensino, ele traz uma narrativa com linguagens superpostas, atraentes e rápidas. Ao utilizar a internet como ferramenta de pesquisa em sala, os alunos podem interagir com as informações apresentadas, não permanecendo passivos.11

A câmera de vídeo é um exemplo de recurso, que pode ser utilizada para gravar um cenário de prática que será posteriormente discutida por uma equipe juntamente com a pessoa avaliada. Esta pessoa receberá comentários e ao se ver, pode assumir postura de autocorreção para as práticas futuras. Este é um exemplo de uso correto do vídeo. Por outro lado, o uso vídeo em sala de aula que não possui muita ligação como conteúdo ou quando há problemas inesperados ou de forma exclusiva, são exemplos de uso incorreto da tecnologia no ensino.12 Jogos de simulação, fóruns e pesquisas em base de dados são outros exemplos de estratégias que podem ser utilizadas dentro da proposta de aprendizado construtivista.

Uma forma bastante conhecida de uso de TDICs no meio médico é a simulação virtual interativa, em que o aluno pode treinar suas habilidades clínicas e cirúrgicas em um ambiente simulado a partir do uso de manequins. Este recurso permite que o aluno possa realizar intervenções como aferir a pressão arterial, realizar ausculta cardiorrespiratória ou administrar medicações, antes da prática com o paciente. Apesar disso, não há evidências sobre os benefícios destas tecnologias sobre o método tradicional de ensino, com treinamento direto com o paciente.7

A Stanford University13, nos Estados Unidos, utiliza as TDICs pedagogicamente em um espaço restrito a comunidade acadêmica local, porém alguns espaços em experimentação são abertos ao público. É o caso do jogo Septris, desenvolvido por médicos, para o ensino e tratamento da Sepse. Neste jogo o participante pode examinar o paciente, solicitar exames, propor tratamentos e consultas com especialistas. Se bem-sucedido, o paciente irá receber alta e um novo caso será proposto. Existe um tempo para realizar as ações e para que os exames fiquem prontos. Enquanto isso, condutas iniciais devem ser tomadas para que o paciente pare de descer na tela principal. Se estas ações são incorretas ocorre uma rápida piora e quando o paciente chega à base da tela ocorre o óbito. Este é um exemplo de adequada utilização das TDICs como ferramenta de ensino-aprendizagem na área médica.

Ambientes de aprendizado estruturados e com muitas funcionalidades têm se tornado mais simples com sistemas como o Blackboard14, Eliademy15 e KhanAcademy16. Estes sistemas foram desenvolvidos para que o coordenador do curso, com mínima habilidade em TDICs, possa criar todo um módulo, sem treinamento prévio.

A iniciativa pioneira no curso de medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) envolvendo o Moodle, ambiente de virtual de ensino e aprendizagem escolhido pela instituição, foi em uma disciplina semipresencial do Estágio de Aplicação em Medicina Comunitária Local. Durante a disciplina os alunos realizam um estágio supervisionado na modalidade internato nas Unidades de Atenção Primária a Saúde. Os alunos definem um tema baseado em uma situação problema vivida por algum discente, em reuniao presencial, com criação de um mapa conceitual, com o que já conhecem sobre a temática debatida e as lacunas que ainda faltam a ser preenchidas. Posteriormente são chamados para interagir entre si através de um fórum na plataforma Moodle. Durante o fórum, os discentes debatem sobre as lacunas e buscam preenchê-las, a partir de referências bibliográficas que compartilham na plataforma sob supervisão do docente.17

A UNA-SUS, vinculada Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UNA-SUS/UFCSPA), tem desenvolvido estratégias educacionais em Realidade Virtual Imersiva (RV), recurso que possibilita simular uma situação real em ambientes digitais. O uso da RV na educação em saúde contribui para melhor qualidade dos processos educativos e para a humanização da plataforma de ensino à distância, em que o aluno imprime caráter pessoal na prática. A UNA-SUS/UFCSPA investe neste recurso como ferramenta de estímulo para imersão do aluno, possibilitando-o visualizar, manipular e interagir com os conteúdos educacionais, permitindo resposta em tempo real.18

O VR Atenção Domiciliar é o primeiro jogo em RV imersiva voltado para o ensino em Atenção Primária à Saúde (APS). Os profissionais de saúde podem ter a experiência de fazer uma Visita Domiciliar sem sair de casa em um ambiente que simula a prática do dia a dia de atuação.18 Este jogo permite ao aluno construir conhecimento e desenvolver habilidade através da simulação da experiência situacional (Figura 2).

As TDICs também possuem espaço no meio médico como instrumento avaliativo. Hurley Myers, da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, trabalhou mais de dez anos na construção de um método que permitia adaptar a dificuldade do questionário com base nas respostas do aluno ao longo da avaliação, evitando o sentimento e frustração diante de questoes muito fáceis ou muito difíceis. Porém existem dificuldades relacionadas a autenticação do aluno e número de estações disponíveis.7

Temática 3 - dilemas atuais do uso das TDICs no ensino médico

A sociedade atual já nasce inserida no contexto de novas tecnologias e existe o contato cada vez mais precoce com as mesmas. As TICs e TDICs trazem um empoderamento cada vez maior das pessoas em informações de saúde. Existem websites em que o próprio paciente realiza a marcação de sua consulta na agenda médica e escolhe o médico por especialidade, localização e valor da consulta.

A formação médica atual reconhece a autonomia do paciente em decidir a conduta de forma compartilhada com o médico e este deve estar sempre atualizado para ter condições de orientar o paciente com foco em ações curativas e preventivas.

De maneira semelhante, os alunos de hoje não são os mesmos para os quais o sistema educacional foi inicialmente elaborado e representam gerações que cresceram em contato com essas novas tecnologias. A prática pedagógica universitária não pode se restringir a informar o aluno, pois existem vários espaços fora da universidade onde podem ser encontradas informações.

Para aprender a aprender, identificando conhecimentos prévios e formulando questoes para a busca de respostas cientificamente consolidadas, conforme as DCN dos Curso de Medicina,2 é necessário manuseio dos recursos tecnológicos existentes em favor de sua formação e atualização.

Apesar disso, existe uma tradição oral e presencial de transmissão de conhecimento, com o ensino centrado no professor, o aluno como receptor passivo e a avaliação como reprodução do conteúdo em sala. Por isso, o professor precisa reconhecer a tecnologia como recurso, atuando como mediador na construção do conhecimento para enfrentar de determinada situação.8

A simples utilização da informática na escola não significa repensar a educação. O computador pode ser utilizado tanto para reforçar o processo tradicional de ensino e aprendizagem, quanto para criar condições para o aluno construir seu conhecimento. A disponibilização de video aulas e materiais de estudo associado a interação entre professores e alunos a partir de e-mails é um exemplo de virtualização da sala de aula, porém não configura um ambiente virtual de aprendizagem. Assim, o processo de formação docente deve oferecer condições para o professor entender como integrar o computador na sua prática pedagógica e permitir que o discente atue de forma ativa no desenvolvimento de novas competências.19

As escolas conectadas podem fazer uma integração maior entre a sala de aula, as atividades práticas e os espaços virtuais de aprendizagem. Podem disponibilizar as informações básicas de cada assunto, atividade ou projeto num ambiente virtual e fazer atividades se conectam com a vida no entorno a partir de tablets, celulares ou notebooks, dentro e fora da sala de aula. Apesar disso, mesmo em escolas com menos recursos também é possível desenvolver projetos significativos e relevantes para os alunos, ligados à comunidade, utilizando tecnologias simples como o celular, por exemplo.20

As Instituições de Ensino Superior (IES) têm sido estimuladas a refletir acerca das mudanças do processo da educação e romper com estruturas cristalizadas de ensino tradicional. Os métodos inovadores de ensino e aprendizagem mostram claramente o movimento de migração do "ensinar" para o "aprender", o desvio do foco do docente para o aluno, que assume a corresponsabilidade pelo seu aprendizado. Um dos grandes desafios para as IES é capacitar de forma contínua o corpo docente e proporcionar infraestrutura para o emprego dos variados métodos de ensino e aprendizagem.10

Cada escola precisa definir um plano estratégico apoiando e capacitando coordenadores, professores e alunos para trabalhar mais com metodologias ativas e com currículos mais flexíveis. Muitas instituições contratam profissionais pouco atualizados, mal remunerados, sobrecarregados de atividades e de alunos e sem a disciplina necessária para gerenciar fóruns, prazos e atividades. O mesmo acontece com parte dos alunos, pouco autônomos, com deficiências na formação básica. O ambiente digital para quem não está acostumado é confuso, distante, pouco intuitivo e desagradável. Ainda estamos avançando muito pouco em relação ao que é preciso.20

Para que toda esta tecnologia tenha resultado, alguns pontos precisam também de investimentos, como a formação permanente do professor, a compreensão das novas tecnologias e a compreensão de técnicas para mediação pedagógica e avaliação.21

Segundo Duarte, aprender sozinho não se situa em um nível mais elevado do que a aprendizagem resultante da transmissão de conhecimentos por alguém. É possível postular uma educação que fomente a autonomia intelectual e moral através justamente da transmissão das formas mais elevadas e desenvolvidas do conhecimento social existente. Segundo o autor, é uma ilusão considerar que adquirir o método científico é mais importante do que adquirir o conhecimento científico já existente. Se assim fosse, o indivíduo só poderia adquirir o método de investigação a partir do "aprender a aprender", ou seja, através de uma atividade autônoma.22

 

CONCLUSÃO

A mudança na forma de ensinar e aprender nas escolas médicas, trouxeram um cenário favorável para inserção das tecnologias no ensino. Hoje é difícil imaginar um curso superior que não utilize computador ou internet em algum momento do curso. A medida que as tecnologias se aprimoram, as possibilidades se tornam mais atrativas e mais complexas, ampliando, inclusive, o conceito de estar junto no tempo e no espaço.

Diante da autonomia docente na execução do trabalho educativo, a incorporação das TDICs como instrumento de aprendizagem permanece um desafio que depende da vontade do docente em investir em sua formação técnica e modificar suas práticas pedagógicas. Depende também do gestor adaptar o currículo do curso de forma a incentivar o uso das tecnologias.

Apesar de tantas mudanças, isso não significa que a "Pedagogia Tradicional" é ruim. Ela foi praticada por muitos anos e é defendida por muitos autores nos dias de hoje. Transmitir ao aluno o conhecimento de como se deve "aprender a aprender" é tao importante quanto o conteúdo que o aluno está aprendendo de forma autônoma. E isso não quer dizer que o método de aprender está pronto. Ele é continuamente aperfeiçoado no cotidiano de cada aluno.

Percebe-se uma tendência atual a favor do blended learning. Isso envolve misturar o ensino tradicional com as metodologias ativas assim como ensino presencial e com o ensino a distância. Assim, o professor deve planejar suas atividades de acordo com a metodologia mais adequada ao seu perfil, aos seus alunos e aos seus objetivos de aprendizagem.

 

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