ISSN (on-line): 2238-3182
ISSN (Impressa): 0103-880X
CAPES/Qualis: B2
Fatores de risco nas entorses de tornozelo em crianças e adolescente atletas: uma revisão integrativa
Risk factors for ankle sprains in children and adolescent athletes: an integrative review
Victor Hugo Morais Ruela; Gabriela Silva Bochi; Eli Ávila Souza Júnior
Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG), Faculdade de Medicina, Alfenas, Minas Gerais, Brasil
Endereço para correspondênciaGabriela Silva Bochi
E-mail: gabriela.bochi@sou.unifal-mg.edu.br
Recebido em: 10 Janeiro 2022
Aprovado em: 25 Julho 2022
Data de Publicação: 13 Dezembro 2022
Editor Associado Responsável: Marco Antônio Percope Andrade
Instituição: Faculdade de Medicina - Universidade Federal de Alfenas. Alfenas, Minas Gerais, Brasil
Conflito de Interesse: Não há
Resumo
INTRODUÇÃO: As entorses de tornozelo são as lesões em membros inferiores mais frequentes em crianças e adolescentes atletas. Identificar os fatores de risco envolvidos nas práticas esportivas auxilia o planejamento de estratégias preventivas dessas lesões.
OBJETIVOS: Revisar os dados disponíveis na literatura sobre os fatores de risco relacionados à ocorrência de entorse de tornozelo em crianças e adolescentes praticantes de esportes.
MÉTODOS: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura realizada nos portais SciELO, PubMed e BVS. Foram incluídos trabalhos publicados entre 2015 e 2021, obtidos pelas combinações dos descritores "entorse", "tornozelo", "criança", "adolescente", "esportes" e "fatores de risco", que respondiam a questão de pesquisa: "Quais os fatores de risco para entorses de tornozelo em crianças e adolescentes praticantes de esportes?".
RESULTADOS: Nove estudos foram selecionados para revisão. Os fatores de risco associados a maior chance de ocorrência de entorse de tornozelo foram a história de entorse de tornozelo prévia, equilíbrio deficiente, déficit na força de extensão do quadril, maior repetição máxima no leg press, maior força isocinética do quadríceps, diferença entre as pernas em relação à força de abdução de quadril, sexo feminino, alto IMC, maior idade, tempo de prática maior que seis anos, jogo de basquete em relação ao jogo de futebol, alterações anatômicas como joelho recurvado e aumento da queda do navicular.
CONCLUSÃO: A variedade de delineamentos de estudos, amostras e esportes abordados na literatura revisada resultou na
Palavras-chave: Entorses; Tornozelo; Crianças; Adolescentes; Esportes; Fatores de Risco.
INTRODUÇÃO
As taxas de incidência de lesões em tornozelos em jovens atletas são altas, especialmente as entorses1,2. Entre atletas de 14 a 17 anos, os casos de entorse de tornozelo correspondem a 92,2% de todas as lesões de tornozelo3. Os esportes com as taxas mais altas de entorse de tornozelo, em atletas do ensino médio nos Estados Unidos, são: basquete feminino, basquete masculino e ginástica feminina4.
A entorse de tornozelo mais comum é a lateral, que ocorre frequentemente pelo mecanismo de inversão e flexão plantar do pé, em uma alta velocidade e intensidade maior que o normal, resultando em lesão dos ligamentos talofibular anterior e calcaneofibular5,6. As entorses de tornozelo geram relevantes consequências aos atletas, como tempo perdido no esporte e, a longo prazo, instabilidade crônica do tornozelo4,7. Nesse cenário, identificar os fatores de risco intrínsecos e extrínsecos para a ocorrência de entorse de tornozelo em crianças e adolescentes praticantes de esportes é uma poderosa ferramenta para prevenir tais lesões8.
Entre os potenciais fatores de risco encontrados na literatura para entorse de tornozelo em praticantes de esporte estão o tipo de esporte, função/posição do atleta, regime de treinamento, história de entorse de tornozelo anterior, sexo, idade, alto índice de massa corporal, qualidade de sono, anatomia, biomecânica, diminuição da força e propriocepção, flexibilidade, estabilidade postural e agilidade9-11. Os fatores de risco para a ocorrência de entorses de tornozelo em atletas são bem investigados. No entanto, pouco foi discutido sobre os fatores de risco associados a crianças e adolescentes atletas. Nesse sentido, o presente estudo objetiva revisar os dados disponíveis na literatura sobre os fatores de risco relacionados à ocorrência de entorse de tornozelo em crianças e adolescentes praticantes de esportes.
MÉTODOS
A elaboração da presente revisão seguiu as etapas de confecção de uma revisão integrativa, com a definição do tema e dos objetivos da revisão, escolha das palavras-chave e seu uso na busca da literatura, definição de fatores de inclusão e exclusão, seleção dos estudos através da aplicação desses fatores, coleta de dados, análise dos dados obtidos e a apresentação deles de forma descritiva12,13. A busca na literatura disponível se norteou pela seguinte questão: "Quais os fatores de risco para entorses de tornozelo em crianças e adolescentes praticantes de esportes?". A elaboração da questão de pesquisa foi fundamentada na estratégia PICO14. Os descritores utilizados foram: entorses (sprains, esquinces), tornozelo (ankle, tobillo), criança (child, niño), adolescente (adolescent, adolescente), esportes (sports, deportes), fatores de risco (risk factors, factores de riesgo). Foram utilizados os operadores lógicos "AND" e "OR" para busca.
Os fatores de inclusão compreendiam artigos publicados no período entre 2015 a maio de 2021 nas plataformas SciELO, PubMed e BVS; estudos primários e secundários; nas línguas português, inglês e espanhol; que possuíam idade média da população estudada inferior a 19 anos; e apresentassem em seus resultados evidências acerca dos fatores de risco para entorses de tornozelo em atletas jovens.
Os estudos foram excluídos quando seu enfoque era tratar de instabilidade crônica do tornozelo, não apresentar entorse de tornozelo como a lesão mais relatada e não apresentar como objetivo o estudo dos fatores de risco.
A busca foi realizada em maio de 2021 e resultou em 1.151 artigos. Após a remoção das duplicações restaram 474 artigos que foram organizados com auxílio de gerenciador de referências bibliográficas. Foi realizada uma seleção a partir da leitura dos resumos dos estudos, embasada nos critérios de inclusão e exclusão. 29 publicações foram selecionadas para leitura na íntegra e, destas, 9 preenchiam todos os critérios definidos. As estratégias de busca foram sintetizadas na Figura 1, como recomenda a declaração PRISMA15.
Para extração de dados dos estudos selecionados foi utilizada uma adaptação de um instrumento validado16. Visando diminuir possíveis vieses de interpretação, dois pesquisados analisaram os artigos de forma independente, selecionando-os com base nos critérios de inclusão e exclusão. Posteriormente, o resultado da seleção de cada pesquisador foi comparado. As divergências de seleção foram resolvidas através da discussão entre os dois pesquisadores e um terceiro pesquisador. Os artigos foram classificados com relação ao nível de evidência científica, de acordo com a Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ).
RESULTADOS
Entre os nove artigos selecionados, dois foram publicados em 2015, dois em 2016, dois em 2017, um em 2018, um em 2020 e um em 2021. Quanto ao país de origem das publicações, 66,7% (n=6) foram realizados nos Estados Unidos da América, 11,1% (n=1) no Brasil, 11,1% (n=1) na Finlândia e 11,1% (n=1) no Irã. Em relação à metodologia, observou-se a predominância de estudos observacionais, sendo que 44,4% (n=4) estudos de coorte, 11,1% (n=1) de caso-controle, 22,2% (n=2) transversal, 11,1% (n=1) revisão sistemática e 11,1% (n=1) revisão não sistemática.
Os estudos selecionados analisaram a relação entre diferentes variáveis e a incidência de entorse de tornozelo em atletas menores de 19 anos. O histórico de uma lesão de tornozelo prévia foi apresentado como fator de risco em dois artigos, assim como o mau desempenho em testes de equilíbrio. Os demais fatores de risco descritos a seguir foram citados apenas uma vez entre os artigos revisados. Em relação aos aspectos anatômicos, atletas com joelho recurvato e queda no navicular apresentaram maior risco para entorses de tornozelo. O índice de massa corpórea (IMC) elevado foi observado como fator de risco para atletas de futebol americano. Tratando-se de futebol, foi observado maior risco para praticantes que fazem o uso de chuteira com travas, jogam na grama e em posições defensivas. Em relação à idade, evidenciou-se que o grupo de atletas mais velhos (16 a 18 anos) foi mais acometido que o grupo de atletas mais novos (11 a 15 anos). Além disso, a prática de mais de 6 anos de handebol foi relacionada com um maior risco de lesões em comparação com 3 ou menos anos de prática. Acerca do sexo, foi observado em uma das publicações que atletas jovens do sexo feminino têm maior amplitude de movimento da articulação do tornozelo, maior histórico de entorses e três vezes mais risco de sofrê-las do que atletas homens da mesma idade.
Em relação à força, foi observado como fator de risco a maior repetição máxima (RM) no leg press em ambos os sexos. Em homens, associou-se a maior força máxima isocinética do quadríceps com uma maior incidência de lesões. Em mulheres, essa associação foi observada com a diferença da força de abdução do quadril entre as pernas. Já com relação à extensão do quadril, menores forças foram identificadas como um fator de risco para as entorses em jogadores de futebol de campo do sexo masculino.
Na Tabela 1 estão resumidas as principais informações dos estudos selecionados para análise na presente revisão integrativa.
DISCUSSÃO
Entre os fatores de risco para entorse de tornozelo em crianças e adolescentes atletas, foi identificada a história anterior de entorse de tornozelo nos estudos de Owoeye et al. (2018)17 e Saki et al. (2021)8. Em contrapartida, Gribble et al. (2016)18 não encontraram associação estatisticamente significativa entre a história anterior de entorse de tornozelo e a ocorrência de novo entorse de tornozelo em competições de futebol. A discussão para essa questão sugere que a definição do preditor história anterior de entorse de tornozelo pode ser influenciada pelo tempo de exposição aos jogos, que provavelmente é baixo no conjunto de infantojuvenis analisados por Gribble et al. (2016)18. Diversos estudos na literatura abordam a entorse de tornozelo prévio como preditor de uma nova entorse em atletas11,19-23. Tal relação se apoia no restabelecimento da saúde da articulação. A entorse do tornozelo envolve a ruptura ou estiramento dos ligamentos estabilizadores da articulação do tornozelo. Diante de um processo inadequado de cicatrização da lesão, os ligamentos podem não recuperar sua anatomia e capacidade funcional. A estabilidade mecânica relacionada à cicatrização pode não ocorrer em até um período de seis semanas a três meses. O retorno às atividades antes desse período pode levar a quadros de recorrência da entorse11,24.
Na literatura, não há consenso acerca da relação do equilíbrio com a incidência de entorses de tornozelo. Por exemplo, para McHugh et al. (2006)22 o equilíbrio não foi um fator de risco significativo para entorses de tornozelo em atletas do ensino médio. No entanto, dentre as produções revisadas, Gribble et al. (2016)18 e Onate et al. (2016)25 foi associado o déficit de equilíbrio com um maior risco de entorse de tornozelo. Segundo Gribble et al. (2016)18, os atletas que sofreram entorses de tornozelo obtiveram uma pontuação menor no teste de equilíbrio Star Excursion Balance Test (SEBT) em alcance anterior do que os atletas não lesionados. O SEBT é um teste muito utilizado para avaliação do equilíbrio, que consiste em uma sequência de movimentos em oito direções com um dos membros inferiores, enquanto se equilibra no membro contralateral26. Onate et al. (2016)25, assim como o estudo supracitado, relataram a relação entre o mau desempenho no SEBT e risco aumentado de entorses de tornozelo. Além disso, também citou que maiores níveis de oscilação postural estão associados com maiores incidências de entorse de tornozelo. No entanto, descreveu que o mau desempenho no teste de excursão no plano frontal a partir de uma plataforma elevada não pode ser utilizado como um preditor para entorses de tornozelo. Dessa forma, fica evidente que a metodologia utilizada nos testes de equilíbrio pode ter uma importância na variação dos resultados. Conforme Rivera et al. (2017)27, programas de treinamento de propriocepção foram efetivos para reduzir a incidência de entorses de tornozelo, sendo mais uma evidência que colabora para a relação entre o equilíbrio e entorses de tornozelo.
Com relação à associação entre índice de massa corporal (IMC) e risco aumentado de entorse de tornozelo, apenas o estudo de Gribble et al. (2016)18 apresentou essa associação entre os jogadores de futebol americano. Em contraste, os estudos de Owoeye et al. (2018)17 e Higashi et al. (2015)28 não sugerem que o IMC seja um fator de risco para entorse de tornozelo. Owoeye et al. (2018)17 discutem que essa relação pode ser específica para o esporte, sendo que o alto IMC não é fator de risco para entorse de tornozelo em jogadores de futebol de campo e basquete, de acordo com seus achados.
Estudos prévios demonstram o risco aumentado da ocorrência de entorses de tornozelo em crianças e adolescentes atletas com alto IMC22,23. No estudo de Tyler et al. (2006)23 a incidência de entorse de tornozelo aumentou cerca de quatro vezes em atletas com sobrepeso. Altos índices de massa corporal podem estar associados à inatividade física e falta de prática de atividades que promovam o suporte de peso. Além disso, em jogadores mais pesados, a força aplicada nos ligamentos do tornozelo na fase de suporte é maior, ou seja, há um momento de inércia maior ao redor do eixo do tornozelo, o que propicia lesões no tornozelo10.
De acordo com Saki et al. (2020)8, os aspectos anatômicos relacionados com uma maior incidência de entorse de tornozelo foram o joelho recurvato e queda do navicular acentuada. O joelho recurvato ou genu recurvatum é uma hiperextensão que excede em 5 graus a extensão normal do joelho, o ângulo da extensão do joelho pode ser medido com um goniômetro disposto no plano sagital entre o fêmur e a tíbia29,30. De acordo com Yazdani et al. (2020)31, as deformidades no membro inferior, em específico o joelho recurvato, desvia o eixo do membro inferior gerando déficits de propriocepção, equilíbrio e, dessa forma, aumentando o risco de lesões de membro inferior. Já a queda do navicular consiste no deslocamento vertical do navicular quando aplicada uma carga sob a articulação subtalar, sendo que o deslocamento do navicular possibilita avaliar a pronação subtalar32. A queda do navicular pode ser medida com uma régua através da comparação entre a altura do navicular com o indivíduo sentado, sem carga, com a altura do navicular com o indivíduo em pé, com carga30. O aumento da queda do navicular é considerado pela literatura como um fator de risco para lesões nas extremidades dos membros inferiores, mas há poucos estudos correlacionando diretamente a queda do navicular com a incidência de entorses de tornozelo. Por outro lado, há evidências que o decréscimo da queda do navicular pode ser um fator protetor contra lesões de pé para atletas de corrida33.
Dois trabalhos revisados, Hietamo et al. (2021)2 e De Ridder et al. (2016)34, analisaram a relação entre força muscular e lesões em tornozelo, especialmente entorses de tornozelo. Enquanto Hietamo et al. (2021)2 encontraram associação entre maior força muscular dos membros inferiores e ocorrência de lesões em tornozelo, De Ridder et al. (2016)34 associaram um maior risco de entorse de tornozelo à diminuição da força dos músculos extensores do quadril.
A associação descrita por De Ridder et al. (2016)34 pode ser justificada pela importante contribuição que os músculos extensores do quadril possuem na desaceleração do centro de massa corporal e no controle postural. Posições inadequadas do pé podem ser corrigidas pela ação conjunta da musculatura do quadril e do pé. Os atletas que possuem uma menor força muscular no quadril tendem a ter menor capacidade de amortecer o impacto de uma manobra de alta velocidade e manter o equilíbrio. Assim, os elementos estabilizadores da articulação do tornozelo, como os ligamentos, são submetidos a uma maior carga e estão mais susceptíveis a lesão35. Outros estudos associam a ocorrência de entorse de tornozelo e a diminuição da força abdutora do quadril, embora Hietamo et al. (2021)2 e De Ridder et al. (2016)34 não tenham encontrado esta associação entre atletas jovens do sexo masculino36,37.
Embora Hietamo et al. (2021)2 tenham estabelecido a hipótese de que uma menor força muscular dos membros inferiores estaria associada a um maior risco de lesões, seus achados demonstraram o contrário. Possivelmente, atletas jovens e com maior força muscular possuem maiores chances de lesão ligamentar por submeterem suas articulações a maiores forças mecânicas, já que correm e mudam de posição rapidamente10.
O'Kane et al. (2016)38, em seu estudo cita aspectos do futebol de campo que podem ser fatores de risco para entorse de tornozelo. O uso de chuteira com travas foi um dos fatores de risco identificados. Também foi identificada a proporção direta entre o tamanho das travas e o risco de lesão, pois presume-se que o atrito gerado entre as travas e a grama possa gerar uma sobrecarga na articulação do tornozelo. O fato de jogar na grama natural ou artificial também aparece como um fator de risco, visto que a maioria dos jogadores lesionados jogaram na grama e com chuteira com travas. Também foi observado que jogadores de posições defensivas estão mais sujeitos a entorse de tornozelo, evento cuja causa mais provável é a maior quantidade de jogadas de contato requeridas pela posição defensiva. Achados semelhantes foram encontrados por Junge e Dvorak (2013)39 em atletas profissionais adultos, em que 80% das lesões foram causadas por contatos entre jogadores e a parte do corpo mais lesionada foi o tornozelo.
Amplitude de movimento (ADM) é o ângulo de deslocamento total de uma articulação, sendo que o método mais comum de medi-la é com um goniômetro40. A ADM aumentada nos movimentos de dorsiflexão, flexão plantar, inversão e eversão do pé, geralmente é relatada na literatura como um dos preditores para entorse de tornozelo, mas há estudos onde esse achado não é observado, como pode ser observado na metanálise de Kobayashi et al. (2016)41. Sugimoto et al. (2017)9 relataram que mulheres possuem uma maior amplitude de movimento, em flexão plantar e inversão, do que os homens, porém a ADM não foi identificada como um fator de risco para entorse de tornozelo em jovens atletas. No estudo de Saki et al. (2021)8 a ADM aumentada foi identificada como fator de risco potencial para entorse de tornozelo, porém não foi identificada como um fator de risco significativo.
Embora não tenha identificado associação entre idade e ocorrência de entorse de tornozelo em suas populações estudadas, De Ridder et al. (2016)34 relataram uma maior incidência de entorses de tornozelo em atletas mais velhos. Já Owoeye et al. (2018)17 identificaram, por meio de regressão univariada, a variável idade como preditora de entorse de tornozelo, sendo que jogadores de basquete e futebol de campo de 16 a 18 anos apresentam mais chances do que os de 11 a 15 anos de sofrerem uma entorse de tornozelo. Um maior tempo de prática esportiva é investigado no estudo de Higashi et al. (2015)28, em que foi demonstrada associação estatisticamente significativa entre experiência com o handebol acima de seis anos e lesões musculoesqueléticas, especialmente as entorses localizadas no tornozelo. Possivelmente as características dos jogadores mais velhos e com maior experiência na prática esportiva, como maior competitividade e disposição a correr riscos, influenciam uma maior taxa de entorse de tornozelo. Além disso, atletas mais experientes estão envolvidos em um maior número de jogos e tendem a apresentar mais lesões42.
Sugimoto et al. (2017)9 identificaram uma maior chance das atletas do sexo feminino, em comparação com os do sexo masculino, apresentarem uma história de entorse de tornozelo. Owoeye et al. (2018)17 também investigaram o sexo como um fator de risco, porém não identificaram esta associação entre crianças e adolescentes praticantes de futebol de campo e basquete. A investigação na literatura acerca da incidência de entorses de tornozelo relacionada ao sexo demonstra uma maior taxa em atletas do sexo feminino4,43. No estudo epidemiológico de Swenson et al. (2013)4, as meninas apresentaram mais chances do que os meninos de sofrer uma entorse de tornozelo no futebol, beisebol e no atletismo.
Em geral, os estudos apresentaram heterogeneidade metodológicas, o que pode ter contribuído para os resultados variados. Variações entre os estudos em relação as definições do número de participantes, ao sexo, à idade média, ao tempo de acompanhamento nos estudos de coorte prospectivo, ao conceito de lesão reportável, ao modo de coleta de dados (mensuração ou autorrelato) e ao esporte praticado determinaram os diversos fatores de risco reunidos nesta revisão. O tipo de esporte praticado pelas crianças e adolescentes atletas foi um dos principais elementos que explicam essa diversidade. Cada esporte possui particularidades em sua prática e mecanismos de lesão. O basquete feminino e o masculino, que entre os demais esportes apresentam o maior risco para entorse de tornozelo, possuem como principal mecanismo de lesão o contato com o jogador. Já a ginástica feminina apresenta uma maior proporção de casos de entorse de tornozelo por contato com a superfície4,44. Revisões posteriores poderiam limitar a análise dos fatores de risco para entorses de tornozelo entre crianças e adolescentes praticantes de um esporte específico, a fim de que se sintetize as condições que possam ser focos de prevenção desse tipo de lesão nas práticas esportivas.
CONCLUSÃO
A determinação de fatores de risco de lesões é fundamental para entender as condições que geram as mecânicas causadoras das lesões e, dessa forma, promover medidas preventivas para evitá-las ou controlá-las. No presente estudo, a partir da revisão integrativa da literatura foram observados os seguintes fatores de risco para entorses de tornozelo em crianças e adolescentes atletas: a força muscular, como déficit na força de extensão do quadril, maior repetição máxima no leg press, maior força isocinética do quadríceps e diferença entre as pernas em relação à força de abdução de quadril; equilíbrio deficiente; entorse de tornozelo prévio; sexo feminino; alto IMC; maior idade; tempo de prática maior que 6 anos; jogo de basquete em relação ao jogo de futebol; alterações anatômicas como joelho recurvado e aumento da queda do navicular.
Contudo, ficou evidente a escassez de estudos acerca de fatores de risco para entorses de tornozelo em atletas crianças e adolescentes, principalmente estudos que abordassem especificamente entorses de tornozelo. Portanto, identifica-se a necessidade de mais estudos na temática para promover maiores resultados nos achados.
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
As contribuições dos autores estão estruturadas de acordo com a taxonomia (CRediT) descrita abaixo: Conceptualização, Curadoria de dados, Análise formal, Investigação, Metodologia, Recursos, Visualização, Redação - rascunho original: Victor Hugo Morais Ruela e Gabriela Silva Bochi. Conceptualização, Análise formal, Investigação, Metodologia, Administração do projeto, Supervisão, Validação, Redação - revisão e edição: Eli Ávila Souza Júnior.
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Copyright© 2022 Ruela et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Licença Internacional que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.
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