RMMG - Revista Médica de Minas Gerais

Volume: 33 e-33209 DOI: https://dx.doi.org/10.5935/2238-3182.2023e33209

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Artigo de Revisão

Penicilinas: atualização para a prática clínica

Penicillins: update for clinical practice

Rodrigo Siqueira-Batista1,2; Marcos Mauricio Reis Alves1; Márcio Antônio Gaspar Lara1; Andréia Patrícia Gomes2; Jorge Luiz Dutra Gazineo3; Luciene Muniz Braga2

1. Escola de Medicina, Faculdade Dinâmica do Vale do Piranga (FADIP), Ponte Nova, Minas Gerais, Brasil
2. Departamento de Medicina e Enfermagem, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, Minas Gerais, Brasil
3. Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, Brasil

Endereço para correspondência

Rodrigo Siqueira-Batista
E-mail: rsbatista@ufv.br

Recebido em: 10 Maio 2022
Aprovado em: 25 Janeiro 2023
Data de Publicação: 31 Agosto 2023.

Editor Associado Responsável: Dr. Enio Roberto Pietra Pedroso
Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais
Belo Horizonte/MG, Brasil.

Instituição onde o trabalho foi desenvolvido: Faculdade Dinâmica do Vale do Piranga; Universidade Federal de Viçosa; Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Fontes apoiadoras: Não houve fontes apoiadoras.

Comitê de Ética: Este trabalho não se encontra dentro das definições de pesquisas envolvendo seres humanos. Não há necessidade de apreciação por Comitê de ética.

Registro de Ensaio Clínico (Caso se aplique): Não se aplica.

Conflito de Interesse: Os autores declaram não haver conflitos de interesses.

Resumo

INTRODUÇÃO: A descoberta das penicilinas é um dos marcos da história do cuidado à saúde. Tais medicamentos estão entre os antimicrobianos mais prescritos no mundo, com aplicabilidade, ainda hoje, em distintas enfermidades e complicações infecciosas.
OBJETIVO: Descrever os principais aspectos farmacológicos e terapêuticos das penicilinas, com ênfase no uso clínico desses fármacos.
MÉTODOS: Revisão narrativa da literatura dirigida à atualização dos mais relevantes aspectos farmacológicos e terapêuticos das penicilinas: (1) histórico; (2) mecanismos de ação e resistência bacteriana; (3) penicilinas e imunomodulação; e (4) classificação dos antimicrobianos.
RESULTADOS: A identificação da penicilina G por Alexander Fleming, em 1928, inaugura a “Era dos Antibióticos”. Os fármacos são beta-lactâmicos e, por conseguinte, agem sobre as proteínas ligadoras de penicilina (PBPs), impedindo a adequada formação de peptidoglicanas, o que produz lise osmótica das células bacterianas. São descritas propriedades imunomoduladoras dos medicamentos, cuja relevância ainda permanece controversa. A classificação dos fármacos permite distinguir os seguintes grupos: penicilinas naturais, aminopeniclinas, isoxazolilpenicilinas, carboxipenicilinas e ureidopenicilinas.
CONCLUSÃO: As penicilinas seguem como importantes medicamentos na atualidade. O prescritor deve atuar em concordância com os pressupostos do uso racional de antimicrobianos, o que contribui para reduzir o risco de desenvolvimento de resistência bacteriana, fenômeno que tem adquirido, nas últimas décadas, trágicos contornos em diferentes partes do mundo.

Palavras-chave: Antibacterianos; Farmacorresistência bacteriana; Penicilinas; Proteínas de ligação às penicilinas.

 

INTRODUÇÃO

A descrição da ação antibacteriana da penicilina G foi uma das mais importantes contribuições da ciência na esfera da saúde mundial1. A partir desse evento inaugural, foram alocados investimentos em pesquisas no campo da terapia antimicrobiana, ainda na primeira metade do século XX, levando posteriormente à identificação de outras classes de antibióticos. Na literatura médica, há relatos de sua ação antibacteriana no final do século XIX, como aqueles de John Tyndall (1875) e de Ernest Duchesne (1897), relacionados ao efeito do Penicillium glaucum sobre determinadas bactérias1,2.

Entretanto, foi somente em 1928 que o cientista escocês Alexander Fleming, pesquisando cepas de bactérias do gênero Staphylococcus, observou que as placas de cultura haviam sido contaminadas acidentalmente por um fungo do gênero Penicillium, o qual impedia o crescimento bacteriano. Em 1940, Ernst Boris Chain e Howard Walter Florey comprovaram sua ação antibacteriana em seres humanos, proporcionando aos três cientistas o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 1945. A descoberta das penicilinas acarretou uma revolução no tratamento de diversas enfermidades e complicações infecciosas, para as quais ainda não havia terapêutica específica à época, revolucionando assim a Medicina, impulsionando a indústria farmacêutica e representando um divisor de águas na História das Ciências da Saúde: o antes e depois do advento desses medicamentos1,2. Ressalta-se que, desde então, os antimicrobianos passaram a figurar entre os remédios mais prescritos no mundo, o que também se nota no Brasil, país no qual representam cerca de 40% dos fármacos utilizados na prática clínica2.

Há quase um século, as penicilinas são antimicrobianos utilizados no cuidado à saúde dos enfermos com resultados satisfatórios, contribuindo para salvar milhões de vida nesse período e, portanto, devem ser considerados muito mais do que uma mera descoberta científica2. Tais fármacos – classificados em naturais e semissintéticos3 – são considerados os antibióticos de escolha para profilaxia de recorrência de febre reumática; profilaxia de recorrência de erisipela em membros inferiores; profilaxia de infecções causadas por Haemophilus influenzae e Streptococcus pneumoniae em crianças menores de cinco anos com asplenia anatômica ou funcional (incluindo anemia falciforme) ou agamaglobulinemia; profilaxia de endocardite infecciosa em procedimentos dentários em pacientes com alto risco; profilaxia de infecções neonatais precoces causadas por Streptococcus agalactiae em gestantes em trabalho de parto com menos de 37 semanas ou colonizadas (urina e/ou swab anal e/ou swab vaginal) por S. agalactiae ou com ruptura de membranas com ≥18 horas ou com febre (≥38oC) no intraparto; prevenção de surtos de infecções causadas por Streptococcus pyogenes (grupo A), principalmente em militares em programa de treinamento; tratamento de infecções causadas por S. pyogenes e S. agalactiae; tratamento de endocardite infecciosa causada por cepas de Streptococcus gallolyticus (bovis) e Streptococcus do grupo viridans altamente sensíveis à penicilina; tratamento de infecções causadas por Eikenella corrodens, Listeria monocytogenes e Staphyloccoccus aureus sensíveis à meticilina; tratamento de sífilis (primária, secundária ou terciária); terapêutica da otite média; tratamento de actinomicose; terapêutica das formas graves de leptospirose; dentre outras4-12. Mycoplasma spp., Chlamydia spp., Legionella spp., Rickettsia spp. e fungos são microrganismos considerados intrinsecamente resistentes às penicilinas7.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou, em 2017, que a resistência bacteriana aos antimicrobianos é um dos principais problemas de saúde no mundo e que as prescrições inadequadas constituem sua principal causa13. Ainda segundo a OMS, bactérias tais como Acinetobacter baumannii, Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella pneumoniae e Escherichia coli estão classificadas como prioridade crítica de resistência, ressaltando-se também a urgência para a descoberta de novos fármacos com atividade contra esses patógenos14. Deve ser destacado que, atualmente, cerca de 50% de todas as prescrições de antibióticos visa ao tratamento de alguma infecção de via aérea superior (IVAS)15. As penicilinas estão entre os antimicrobianos mais utilizados para esse fim, ainda que estudos recentes apontem que 30 a 50% das prescrições de antibióticos sejam inapropriadas16,17.

Com base nessas preliminares considerações, o objetivo do presente artigo é revisar os principais aspectos das penicilinas, enfatizando seu uso na prática clínica cotidiana.

 

MÉTODOS

O presente manuscrito, do ponto de vista metodológico, representa uma revisão narrativa da literatura – a qual “descreve e discute o estado da ciência de um tema específico ou tema do ponto de vista teórico e contextual” (Botelho et al., 2011, p. 125)18, em termos do seu “papel fundamental para a educação continuada” (Rother, 2007, p. v)19 ao permitir que o leitor adquirira e atualize o “conhecimento sobre uma temática específica em curto espaço de tempo” (Rother, 2007, p. v)19 – com vistas à atualização dos principais aspectos farmacológicos e terapêuticos das penicilinas. Desse modo, diferente de uma revisão sistemática – que tem por escopo “responder a uma pergunta específica sobre um problema específico da área da saúde” (Ercole et al., 2014, p. 9,10)20 – a pesquisa bibliográfica ora empreendida é apropriada para “descrever e discutir o desenvolvimento ou o ‘estado da arte’ de um determinado assunto, sob ponto de vista teórico ou contextual” (Rother, 2007, p. v)19.

Com efeito, foram buscadas referências – artigos, livros e documentos publicados por organismos governamentais e sociedades científicas – a partir do conhecimento dos autores, as quais foram analisadas criticamente. Os manuscritos selecionados foram lidos na íntegra para extração dos dados mais relevantes. As informações obtidas – em textos publicados em inglês, espanhol e português – possibilitaram a organização dos seguintes tópicos, os quais constituíram os elementos essenciais abordados nos Resultados e Discussão: (1) aspectos históricos da descrição dos fármacos; (2) mecanismos de ação e resistência bacteriana; e (3) penicilinas e imunomodulação; e (4) classificação dos antimicrobianos.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Breve histórico

As investigações desenvolvidas por Robert Koch e Louis Pasteur foram utilizadas por vários estudiosos, no decorrer do século XX, para o desenvolvimento da “Teoria dos Germes”, a qual tornou possível uma associação de microrganismos a doenças bem conhecidas. Tal encaminhamento permitiu a busca de fármacos específicos para o tratamento dessas entidades nosológicas, para o que foram envidados esforços da comunidade científica, desde a virada do século XIX para o século XX. Contudo, pode-se considerar, de certo modo, que foi o acaso que mudou os rumos no tratamento antimicrobiano1,2.

Em 1928, o cientista Alexander Fleming, no laboratório do Hospital St. Mary’s de Londres, após voltar de férias, observou uma placa de Petri, a qual fora contaminada por um fungo que impedia o crescimento bacteriano. Constatou-se, posteriormente, que tal fungo pertencia ao gênero Penicillium, cuja espécie envolvida foi reconhecida outrora como Penicillium notatum e, atualmente, como Penicillium chrysogenum21. Assim, há quase um século, a descoberta de Fleming iniciava uma mudança radical nos rumos da Medicina. Entretanto, somente após cerca de duas décadas da sua descrição, a penicilina foi produzida em larga escala, sendo utilizada no tratamento de feridas dos soldados “aliados” na Segunda Guerra Mundial1,2.

A descrição da penicilina produziu, então, o início da “Era dos antibióticos”, mas, infelizmente, cada descoberta foi consistentemente seguida pelo surgimento de resistência antimicrobiana21. Originalmente, Staphylococcus aureus era muito sensível à penicilina, mas a frequência de cepas de S. aureus resistentes em ambiente hospitalar aumentou durante o período de 1942 a 1958, atingindo um valor superior a 70% de todos os isolados. A resistência foi devida à produção de beta-lactamases (penicilinases), enzimas que hidrolisam rapidamente a penicilina, sendo tal fenômeno mediado por conjugação de plasmídeos7. Em 1961, a primeira cepa de S. aureus resistente à meticilina – e, por extensão, considerada resistente a todos os antibióticos beta-lactâmicos, incluindo cefalosporinas, monobactâmicos e carbapenemas – foi identificada no Reino Unido22, inaugurando um novo capítulo na resistência microbiana aos antibióticos, como se comentará a seguir.

Mecanismo de ação e resistência bacteriana

As bactérias têm vários componentes em sua parede celular, com destaque para o peptidoglicano, o qual tem como função promover estabilidade mecânica rígida essencial às bactérias. As penicilinas, como os demais beta-lactâmicos (cefalosporinas, carbapenemas e monobactâmicos), possuem em sua estrutura química o anel beta-lactâmico. Esses fármacos se conectam às proteínas de ligação às penicilinas (PBP – penicillin binding proteins), as quais estão presentes na membrana celular das bactérias. Tal processo impede a última etapa da formação de peptidoglicanos, provocando lise osmótica das células bacterianas, o que resulta, desse modo, em uma ação bactericida nas bactérias suscetíveis8.

A resistência aos antimicrobianos é um fenômeno natural, mas se torna um problema preocupante quando é acelerada pela utilização incorreta de tais fármacos14. O uso indiscriminado e excessivo de antimicrobianos na comunidade, em hospitais ou até mesmo na agropecuária, contribuiu diretamente para o desenvolvimento da resistência bacteriana, elevando os custos dos tratamentos, reduzindo as opções terapêuticas disponíveis, além de determinar a hospitalização prolongada dos pacientes, aumentando ainda mais as taxas de morbiletalidade22,23.

A resistência bacteriana pode sobrevir por dípares mecanismos, sejam intrínsecos ou adquiridos. A resistência intrínseca advém de modo natural, por meio de aspectos biológicos inerentes aos microrganismos. Já a resistência adquirida emerge a partir da pressão seletiva exercida pelo uso – muitas vezes indiscriminado – de antimicrobianos, podendo advir de mutações genéticas, a partir de genes de resistência que podem ser compartilhados entre as espécies bacterianas23-25. As bactérias podem exibir resistência intrínseca ou adquirir resistência aos antibióticos beta-lactâmicos por quatro mecanismos principais: (a) alteração da afinidade do fármaco às PBP, (b) impossibilidade do fármaco em chegar ao sítio de ação por alterações na membrana externa, (c) produção de beta-lactamases que inativam as penicilinas (penicilinases) e (d) efluxo do fármaco através da membrana externa de bactérias Gram-negativas23,26.

Penicilinas e imunomodulação

As penicilinas, como os demais antimicrobianos, agem na viabilidade e no crescimento de bactérias patogênicas. Todavia, estudos demonstraram que além de sua atividade bactericida, há uma ação imunomoduladora27-29, a despeito da relevância terapêutica dessas propriedades ainda permaneça controversa30. Essa atividade ocorre pela inibição de liberação de citocinas pró-inflamatórias – tais como, IL-1β, IL-6, IL-8 – o que produz, consequentemente, uma redução da resposta inflamatória.

Antibióticos beta-lactâmicos têm a capacidade de ativar a expressão do GLT-1 (transportador de glutamato) em células astrogliais, capturando assim o excesso de glutamato na fenda sináptica, e entregando-o no interior dos astrócitos onde são novamente convertidos em glutamina31. A desregulação no transporte do glutamato está envolvida na patogênese de diversas doenças neurológicas como acidente vascular encefálico, epilepsia, esclerose múltipla, doença de Alzheimer, mal de Parkinson, entre outros32.

Efeito imunomodulador adicional induzido por penicilinas foi descrito por Lee et al. (2016)33. Nesse estudo, demonstrou-se que camundongos pré-tratados por cinco dias com ampicilina apresentaram menos danos neuronais ao serem colocados sob isquemia global transitória do prosencéfalo. Aparentemente, esse resultado se deveu não apenas em decorrência da ativação de GLT1, mas também pela atenuação da imunorreatividade que a hipoxia celular produz34.

Investigações demonstraram que derivados das penicilinas possuem atividade anti-inflamatória em pacientes portadores de febre reumática, atuando assim na diferenciação dos linfócitos T humanos29. Diversos estudos também já demonstraram a ação imunomoduladora dos antimicrobianos, principalmente entre os macrolídeos e as tetraciclinas. Todavia, estudos recentes demonstram que, no grupo das penicilinas, existem antibióticos com ações potencialmente neuroprotetoras, antioxidantes, analgésicas ou imunomoduladoras27. Em virtude dessas ações imunomoduladoras, antibióticos ditos “imunossupressores” mostraram-se promissores no tratamento de doenças inflamatórias ou autoimunes30.

 

CLASSIFICAÇÃO DAS PENICILINAS

1. Penicilinas “naturais”

As penicilinas ditas naturais abrangem as penicilinas G (Cristalina, Procaína e Benzatina) e a penicilina V1,2.

- Penicilina G cristalina, administrada por via intravenosa (IV): em adultos de 2 a 4 milhões de unidades a cada 4 horas; em crianças 300.000 unidades/kg/dia, divididas em 6 doses34.

- Penicilina G procaína, administrada por via intramuscular (IM), de 12 a 24 horas: em adultos de 600.000 a 1 milhão de unidades/por dia; em crianças 50,000 unidades/kg por dia34.

- Penicilina G benzatina, administrada por via IM em dose única semanal: em adultos de 1,2 a 2,4 milhões de unidades; em crianças 50,000 unidades/kg34.

- Penicilina V, administrada por via oral (30 minutos a 2 horas antes das refeições): em adultos de 125 a 500mg, a cada 6 horas; em crianças, 25 a 75mg/kg/dia, divididos em 3 a 4 doses.

O espectro antimicrobiano das penicilinas naturais engloba Actinobacillus actinomycetemcomitans, Actinomyces spp., Arachnia spp., Bacteroides melaninogenicus, Bacteroides oralis, Bacillus anthracis e muitos outros Bacillus spp. (exceto B. cereus), Bifidobacteria spp., Bordetella pertussis, Borrelia burgdorferi, Borrelia hermsii, Capnocytophaga canimorsus, Cardiobacterium hominis, Clostridium (exceto algumas cepas de C. perfringens, C. tertium e C. butyricum), Corynebacterium diphtheriae e muitas outras corinebactérias (exceto JK), Eikenella corrodens, Erysipelothrix rhusiopathiae, Eubacterium spp., Fusobacterium necrophorum, Fusobacterium nucleatum, Haemophilus influenzae (cepas não produtoras de beta-lactamase), Kingella kingae/indologenes, Lactobacilli spp., Leptospira spp., Leuconostoc spp., Listeria monocytogenes, Moraxella spp. (não catarrhalis), Neisseria lactamica, Neisseria meningitidis (mas com sensibilidade reduzida à penicilina em alguns países, inclusive no Brasil), Pasteurella multocida, Peptococci spp. e Streptococcus anaeróbios, Prevotella melaninogenica, Propionibacterium spp., Spirillum minus, Streptobacillus moniliformis, Streptococcus agalactiae, Streptococcus pneumoniae (exceto cepas com resistência intermediária e de alto nível), Streptococcus pyogenes (grupo A), Streptococcus spp. (alfa e beta hemolítico), Treponema pallidum, Veillonella spp7. Entre as cepas de S. aureus que são sensíveis à meticilina, até 25% delas podem também ser sensíveis à penicilina35-38. O uso de penicilina no tratamento de infecções por S. aureus suscetíveis à penicilina pode resultar em melhores desfechos clínicos para os pacientes35,38; no entanto, nesses casos, os médicos devem considerar a solicitação de teste para detectar a produção de penicilinases35,37.

A penicilina G benzatina é o tratamento de escolha para pacientes com sífilis e deve ser administrada com intervalo de uma semana entre as doses no tratamento da sífilis latente tardia, quando são aplicadas três doses semanais de 2.400.000U, por via intramuscular21. Resultados de uma revisão sistemática recente apóiam o uso da penicilina em neonatos com sífilis congênita possível, altamente provável ou confirmada. Evidências de alta e moderada qualidade sugerem que provavelmente não há diferenças entre a penicilina G benzatina e a penicilina G procaína em relação aos desfechos de ausência de manifestações clínicas de sífilis ou cura sorológica em recém-nascidos com sífilis congênita38. O tratamento de escolha da neurossífilis é a penicilina G cristalina39,42. Outras indicações clínicas do uso da penicilina G benzatina são: tratamento de faringite por S. pyogenes, profilaxia de febre reumática e terapêutica alternativa de portadores assintomáticos de C. diphtheriae43,44. Não há evidências de que S. pyogenes tenha se tornado resistente à penicilina ao longo dos anos45,46.

O principal evento adverso após o uso da penicilina G é a hipersensibilidade; muitos pacientes relatam que são alérgicos à penicilina, mas poucos apresentam reações clinicamente significativas (menos de 5%)38. Podem ocorrer exantema morbiliforme, febre, eosinofilia, nefrite intersticial, dermatite de contato, anemia hemolítica (em altíssimas doses administradas por via intravenosa), reação de Jarisch-Herxheimer (geralmente limitada ao tratamento de sífilis ou de leptospirose) e convulsões (principalmente em pacientes com disfunção renal). Menos frequentemente podem ocorrer mioclonia, parestesia, hiperreflexia e coma7,8.

A penicilina V tem espectro antimicrobiano semelhante ao da penicilina G, porém é 5 a 10 vezes menos ativa contra Neisseria spp., Haemophilus spp. e alguns anaeróbios. Seu uso é preferível ao da penicilina G benzatina na profilaxia da febre reumática em portadores de cardiopatias graves, uma vez que casos de colapso vasovagal foram relatados após uso profilático de penicilina G benzatina nesses pacientes21. Seus efeitos adversos são semelhantes aos da penicilina G, exceto pela ausência de distúrbios neurológicos. Uma diferença importante entre a penicilina G e a penicilina V é que a segunda é mais estável em pH ácido, sendo, assim, melhor absorvida no trato gastrointestinal34.

2. Aminopenicilinas

São penicilinas semissintéticas, nas quais um agrupamento amino foi adicionado na cadeia lateral, aumentando assim seu espectro de ação em relação às penicilinas naturais e com vias de administração parenteral ou oral24. Dentre os fármacos que fazem parte desse grupo, incluem bacampacilina, ciclaciclina, epiciclina, hetaciclina, lenampicilina, metampicilina, pivampicilina, talampicilina, amoxicilina e ampicilina, sendo as duas últimas utilizadas na prática médica brasileira1,2.

A ampicilina pode ser administrada por via oral ou parenteral e sua dose usual varia entre 50 a 100mg/kg/dia, por via oral, a cada 6 horas, ou 50 a 300mg/kg/dia, por via IM ou IV, a cada 6 horas. Já no tratamento de meningoencefalites por bactérias suscetíveis, a dose utilizada é de 200 a 400mg/kg/dia, por via IV, a cada 4 ou 6 horas (máximo de 12 gramas/dia)3,47. O espectro de ação da ampicilina engloba Streptococcus spp., Enterococcus spp. (mais ativa in vitro do que a penicilina G), L. monocytogenes (mais ativa in vitro do que a penicilina G); E. corrodens, alguns Gram-negativos entéricos (Salmonella spp., Shigella spp. e Proteus mirabilis), H. influenzae (não produtor de beta-lactamase)8,34. Não deve ser utilizada no tratamento de infecções por S. aureus, pois é frequentemente inativada pela penicilinase produzida por essa bactéria. Tem uma atividade limitada in vitro contra bactérias anaeróbias. É inativa contra Pseudomonas spp., Citrobacter spp., Serratia spp., Enterobacter spp., Providencia spp. e Acinetobacter spp.34.

As reações adversas incluem hipersensibilidade, aumento transitório de aminotransferases, nefrite intersticial, trombocitopenia e, quando utilizada por via oral, eventos gastrointestinais, tais como diarreia, náuseas e vômitos.

A amoxicilina é administrada por via oral, com dose usual de 30 a 50mg/kg/dia a cada oito horas, já para adultos a dose preconizada é de 0,5 a 1 g a cada 8 ou 12 horas, embora tenham sido usadas doses de até 1 g a cada 4 horas36. Seu espectro de ação engloba Streptococcus spp., Enterococcus spp., L. monocytogenes; alguns Gram-negativos entéricos (Salmonella spp.), H. influenzae (não produtor de beta-lactamase) e Helicobacter pilori. Em comparação à ampicilina, amoxicilina é duas vezes mais ativa in vitro contra E. faecalis e Salmonella spp., mas duas vezes menos ativa in vitro contra Shigella spp.7,8,48.

As principais reações adversas da amoxicilina são semelhantes às da ampicilina; todavia possui uma melhor absorção oral que a ampicilina (74 a 92%), devido à sua maior estabilidade em pH ácido, sendo, por isso, mais apropriada do que a ampicilina na terapia sequencial de penicilinas administradas por via parenteral (penicilina G ou ampicilina)40,50.

A ampicilina e amoxicilina são inativadas pelas beta-lactamases presentes tanto nas bactérias Gram-negativas quanto nas Gram-positivas. Assim, se torna necessária uma combinação desses fármacos aos inibidores de beta-lactamase, que inibem a ação das beta-lactamases e impedem a destruição dos antibióticos por essas enzimas. Os inibidores das beta-lactamases atualmente disponíveis na prática clínica são o ácido clavulânico, sulbactam, tazobactam, avibactam, relebactam e vaborbactam, sendo os dois primeiros combinados com as aminopenicilinas25,51. Zidebactam e nacubactam atualmente estão sob investigação em ensaios clínicos51.

Amoxicilina/ácido clavulânico pode ser administrada por via oral e parenteral, sendo a dose usual por via oral de amoxicilina, de 30 a 50mg/kg/dia, a cada 8 ou 12 horas, ou 30 a 100mg/kg/dia de amoxicilina IV, a cada 6 ou 8 horas, tendo as mesmas reações adversas da amoxicilina. Citrobacter freundii, Enterobacter cloacae, Hafnia alvei, Klebsiella aerogenes, Morganella morganii, Plesiomonas shigelloides, Providencia rettgeri, Providencia stuartii, Serratia marcescens, Yersinia enterocolitica, Aeromonas hydrophila, Aeromonas veronii, Aeromonas dhakensis, Aeromonas caviae e Aeromonas jandaei geralmente exibem resistência intrínseca em relação à amoxicilina/ácido clavulânico. Ademais, tal fármaco é inativo contra Pseudomonas spp. e S. aureus resistentes à meticilina (MRSA)48,50. Deve ser comentado que dois estudos de coorte (retrospectiva) de âmbito nacional, conduzidos nos Estados Unidos, mostraram que amoxicilina/ácido clavulânico foi eficaz no tratamento ambulatorial de diverticulite, tendo o benefício adicional de reduzir o risco de colite pseudomembranosa, quando comparado ao tratamento com metronidazol e fluoroquinolona52.

Ampicilina/sulbactam é administrada por via IV com dose usual de 50 a 150mg/kg/dia de ampicilina a cada 6 horas. Ampicilina/sulbactam é uma opção no tratamento de infecções causadas por Acinetobacter calcoaceticus e complexo A. baumannii (inclusive cepas resistentes às carbapenemas)51,53-57, a despeito do aumento crescente da resistência dos Acinetobacter spp. ao antimicrobiano já ter sido relatado no Brasil58. A ampicilina/sulbactam não é ativa in vitro contra P. aeruginosa e MRSA52.

Amoxicilina/sulbactam tem o mesmo espectro de ação das combinações acima; é administrada por via oral ou parenteral, na dose usual de 30 a 50mg/kg/dia de amoxicilina VO ou IV, a cada 8 horas, e possui as mesmas reações adversas que a amoxicilina. Tal associação apresenta uma atividade in vitro menor contra o A. baumanni que a ampicilina/sulbactam59.

Um estudo experimental de meningite por Bacillus anthracis, em coelhos, demonstrou a eficácia da combinação de ampicillina ou amoxicilina como um inibidor de beta-lactamase no tratamento dessa condição infecciosa, comparativamente ao tratamento com meropenem ou piperacilina60.

Na profilaxia ou tratamento de infecções associadas a mordeduras por cães, gatos ou humanos, geralmente um beta-lactâmico associado a um inibidor de beta-lactamase – tal como amoxicilina/ácido clavulânico por via oral (ou ampicilina-sulbactam, se a terapia por via intravenosa estiver indicada) – é o tratamento de escolha. Tal associação tem atividade in vitro contra os principais agentes etiológicos dessas infecções: P. multocida, E. corrodens, Streptococcus spp., anaeróbios e S. aureus (não MRSA)44,61.

3. Antiestafilocócicas (Isoxazolilpenicilinas)

As isoxazolilpenicilinas são análogos semissintéticos da penicilina, os quais apresentam alta resistência à clivagem pela penicilinase, sendo representadas pela cloxacilina, dicloxacilina, flucloxacilina, oxacilina, meticilina e nafcilina1,2.

A meticilina foi a primeira penicilina antiestafilocócica a ser produzida e apresentava uma importante resistência à ação das beta-lactamases de cepas de S. aureus. Entretanto, no início da década de 1960, surgiram bactérias resistentes a esse antimicrobiano. Seu uso foi descontinuado até não ser mais empregada atualmente na prática médica, devido à nefrotoxicidade, sendo, então, substituída principalmente pela oxacilina, dicloxacilina e a flucloxacilina8. Sua importância é atualmente histórica; com a denominação de cepas de S. aureus resistentes à meticilina (MRSA)1,2.

A oxacilina é a isoxazolilpenicilina mais empregada cotidianamente; tem como única via de administração a IV, com uma dose que pode variar de 100 a 200mg/kg/dia, até no máximo de 12g/dia, divididos em intervalos de 4 ou 6 horas. Seu espectro de ação engloba cepas de S. aureus e Staphylococcus epidermidis sensíveis à meticilina, Streptococcus spp. (exceto S. pneumoniae resistente à penicilina), sendo inativa contra Enterococcus spp., L. monocytogenes, enterobactérias, Neisseria gonorrhoeae e B. fragilis8,34. A oxacilina é mais eficaz do que a vancomicina no tratamento de pacientes com infecções causadas por S. aureus sensíveis à meticilina39,61. A indicação exordial da oxacilina é o tratamento das infecções por S. aureus (sensível à meticilina) provenientes da comunidade1,2.

As principais reações adversas da oxacilina são incluem hipersensibilidade, hepatite (associada principalmente ao uso prolongado do antibiótico), nefrite intersticial e leucopenia8 (esta última, eventualmente, pode assumir marcante gravidade).

4. Carboxipenicilinas

Descrita em 1965, a classe contempla a carbenicilina, primeira penicilina com atividade anti-Pseudomonas. Os principais fármacos são: carbenicilina, carfecilina, carindacilina e ticarcilina. São penicilinas semissintéticas e inativadas por beta-lactamases e possuem mecanismo de ação semelhante ao da penicilina G1,2.

A carbenicilina, como uma das principais representantes do grupo das carboxipenicilinas, tem como espectro de ação, em linhas gerais, germes Gram-positivos sensíveis à penicilina G (porém é menos ativa que este fármaco) e Gram-negativos como P. aeruginosa, Proteus spp., Enterobacter spp., Acinetobacter spp. e Serratia spp. É utilizada na dose usual de 100 a 500mg/kg/dia, IV, a cada 1, 2 ou 4 horas. Dentre os efeitos colaterais destacam-se: hipersensibilidade, distúrbios da coagulação (disfunção plaquetária), hepatite medicamentosa e convulsões (particularmente em pacientes com insuficiência renal crônica), além do risco de sobrecarga de sódio. É um medicamento praticamente inativo contra Klebsiella spp. e inativo contra Enterococcus spp., S. aureus, Haemophilus spp. produtores de beta-lactamases, N. gonorrheae e Moraxella produtores de beta-lactamases8.

Outro importante representante das carboxipenicilinas é a ticarcilina que, em sua apresentação farmacológica disponível no Brasil, inclui a associação com o ácido clavulânico (inibidor de beta-lactamase). Seu espectro de ação inclui S. aureus sensível à meticilina, Streptococcus spp., Gram-negativos (incluindo Klebsiella spp., Enterobacter spp. e P. aeruginosa), anaeróbios (inclusive muitas cepas de B. fragilis). É utilizada em crianças na dose de 200 a 300mg/kg/dia, IV, a cada 6 horas (em recém-natos – 200mg/kg/dia, wIV, a cada 6 horas) e em adultos 3,1g/dose, IV, a cada 4 ou 6 horas. Os efeitos colaterais incluem hipersensibilidade, distúrbios da coagulação (disfunção plaquetária), hipocalemia, sobrecarga de sódio, hepatite medicamentosa e convulsões. É importante salientar a inatividade da droga contra Enterococcus spp. e MRSA8.

Atualmente, a ticarcilina, carbenicilina e indanil carbenicilina (éster de carbenicilina usado para administração oral) não são mais usados na prática clínica nos EUA, em virtude das grandes doses necessárias, do maior potencial de toxicidade e da disponibilidade de alternativas terapêuticas mais potentes34. Ademais, nenhuma das carboxipenicilinas está incluída na relação nacional de medicamentos essenciais elaborada pelo Ministério da Saúde, no Brasil62.

5. Ureidopenicilinas (anti-Pseudomonas)

As ureidopenicilinas, também chamadas por alguns autores de penicilinas de quarta geração ou penicilinas de espectro ampliado, são antibióticos semissintéticos derivados da adição de uma molécula de ureia à cadeia da ampicilina. É uma classe de antibióticos ampla com vários representantes: alpacilina, aspoxicilina, azlocilina, furazlocilina, furbenicilina, mezlocilina, piperacilina e pirbenicilina. Porém, apenas a piperacilina associada ao tazobactam é utilizada no Brasil2. Ainda dentro das ureidopenicilinas, existem as sulfobezilpenicilinas representadas por sulbenicilina, sulfocilina e suncilina.

No Brasil, a piperacilina está associada ao tazobactam (inibidor de beta-lactamase) e possui amplo espectro de ação: S. aureus sensível à meticilina, Streptococcus spp., E. faecalis, Gram-negativos (incluindo Klebsiella spp., H. influenzae, M. catarrhalis, Yersinia enterocolitica e P. aeruginosa), anaeróbios (inclusive a maioria das cepas de B. fragilis). Bactérias tais como Enterobacter spp., Serratia spp., Citrobacter spp., Salmonella spp., e Stenotrophomonas maltophilia são na maioria das vezes resistentes à piperacilina/tazobactam. Ademais, tal antibiótico não tem atividade contra cepas de MRSA e Enterococcus spp. resistentes à vancomicina (VRE)8,26,34.

Cepas de E. coli e Klebsiella spp. produtoras de beta-lactamases de espectro expandido (ESBL) muitas vezes são sensíveis à piperacilina/tazobactam in vitro, mas tem havido certa relutância em usar este antimicrobiano, visto que a possibilidade de falha terapêutica é alta, quando outros antibióticos beta-lactâmicos, excetos as carbapenemas, são utilizados no tratamento de infecções causadas por essas bactérias63-65.

É empregada em adultos geralmente na dose de 4,5g (4,0g de piperacilina/0,5g tazobactam), IV, em infusão prolongada (3 a 4 horas), a cada 6 horas (se o clearance de creatinina for maior do que 40ml/minuto)8,66,67. É segura e eficaz em crianças e neonatos na dose de 80mg/kg dose de piperacilina e 10mg/kg dose de tazobactam a cada 8 horas em menores de 9 meses e 100mg/kg dose de piperacilina e 10mg/kg dose de tazobactam a cada 8 horas em maiores de 9 meses68.

As reações adversas podem incluir eventos gastrointestinais (diarreia e náuseas), reações de hipersensibilidade, convulsões, hipocalemia discreta, risco de hemorragias (alterações da função plaquetária são menos comuns do que com as carboxipenicilinas)8,26 e nefrotoxicidade quando administrada concomitantemente com a vancomicina (observada em uma meta-análise recente de estudos prospectivos)69.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os antimicrobianos em geral – e as penicilinas, em particular – estão entre os fármacos mais prescritos no mundo e no Brasil, contexto que amplia a responsabilidade dos profissionais pelo seu uso racional na prática clínica, tendo em vista, especialmente, as indicações, as contraindicações, os impactos sobre os microrganismos e os efeitos adversos.

A resistência dos patógenos aos antimicrobianos é um fenômeno relacionado ao uso – muitas vezes indiscriminado – de fármacos na saúde de animais humanos e não humanos. Com efeito, há necessidade de melhorar o controle e a vigilância dos medicamentos anti-infecciosos, uma vez que a conectividade de ecossistemas naturais e artificiais (p. ex., agrícolas, hospitalares e outros) possui relação direta com a emergência, a evolução e a disseminação de germes resistentes. Dessa feita, uma das interessantes estratégias de abordagem do problema é a abordagem One Health, de acordo com a qual o fenômeno da resistência de microrganismos aos antimicrobianos deve ser trabalhada em termos das diferentes interações estabelecidas no âmbito do ambiente, reduzindo o risco de ameaças à saúde global70-73.

Outro aspecto importante, no que concerne ao uso das penicilinas, diz respeito aos eventos de hipersensibilidade (os quais foram comentados em diferentes momentos do presente artigo). Deve-se ressaltar o baixo risco de quadros alérgicos graves pelos fármacos e, especialmente, o uso impreciso do termo “alergia”, por familiares e profissionais de saúde, no cotidiano da prescrição de antimicrobianos. Nesses termos, há necessidade de treinamento das equipes de saúde para a diferenciação entre os eventos de hipersensibilidade mediados por imunoglobulina E (IgE), as intolerâncias medicamentosas e as demais reações idiossincráticas que podem ocorrer dias após exposição. Portanto, antes de descartar as penicilinas como opção – pela hipótese de alergia prévia – torna-se necessária a realização de uma anamnese detalhada e da análise dos riscos e dos benefícios da opção – ou não – pela prescrição de uma penicilina e, eventualmente, de algum outro beta-lactâmico2,8,40.

A partir dessas considerações, o presente artigo buscou apresentar informações atualizadas concernentes às principais penicilinas utilizadas no Brasil para o tratamento de condições infecciosas. Os elementos revisados poderão auxiliar, assim se espera, na escolha do antimicrobiano mais adequado possível, tendo em vista o conceito de antibiótico ideal – de acordo com Schechter (1998)74 –, que reúne os seguintes requisitos: ser seletivo contra os microrganismos e ter toxicidade mínima para o paciente; manter a microbiota saprófita inalterada; não ser indutor de resistência em patógenos sensíveis; ter ação bactericida; manter biodisponibilidade em relação à via de administração; ser estável em solução e ter meia vida prolongada; possuir excelente penetração em diversos órgãos, fluídos e tecidos; ser altamente eficaz independente das condições locais como pH e temperatura e, por fim, possuir baixo custo74.

O antibiótico ideal, evidentemente, não existe no mundo real, mas como conceito permite aos prescritores a escolha do fármaco mais adequado às necessidades do paciente. Nesse sentido, o manejo dos conhecimentos sobre as penicilinas é útil para auxiliar a indicação desses medicamentos – quando estes se mostram como o antimicrobiano mais ideal possível –, minimizando os riscos de seu uso indiscriminado, cujas consequências, muitas vezes desastrosas, são a exposição das pessoas aos riscos não justificáveis de efeitos adversos e a pressão de seleção sobre as bactérias, acentuando o já grave problema de resistência bacteriana.

The young physician starts life with twenty drugs for each disease, and the old physician ends life with one drug for twenty diseases.”

(Sir William Osler, 1903)75.

 

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Rodrigo Siqueira-Batista, Autor principal; participação ativa no planejamento, coleta de informações, conclusão e revisão final.

Marcos Mauricio Reis Alves, participação na coleta de informações, redação, conclusão e revisão final.

Márcio Antônio Gaspar Lara, participação na coleta de informações, redação, conclusão e revisão final.

Andréia Patrícia Gomes, participação na coleta de informações, redação, conclusão e revisão final.

Jorge Luiz Dutra Gazineo, participação na coleta de informações, redação, conclusão e revisão final.

Luciene Muniz Braga, participação na coleta de informações, redação, conclusão e revisão final.

 

COPYRIGHT

Copyright© 2022 Siqueira-Batista et al. Este é um artigo em acesso aberto distribuído nos termos da Licença Creative Commons Atribuição que permite o uso irrestrito, a distribuição e reprodução em qualquer meio desde que o artigo original seja devidamente citado.

 

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